Arquivo do mês: fevereiro 2009

Dalila Teles Veras (Teia de Poemas)

Vida murada

Sombrios
os muros encobrem
cidade e cidadãos
(o medo aquartelado
medo de ter medo)

Acuados
calados
diante da própria inépcia
———————————————-

Navegando

Velas à solta
minha nau enlouquecida
crava
em tua pele bravia
(gosto de alga e sal)
:
definitiva chancela

—————————————————-
Elemento em fúria

Ao pé das antigas tabuletas
grafitadas de sangue e esperma
foi desatrelada a canga
– campo de palha e fel
campesina
despiu as presunções
sobraçou as certezas
deter
minou
:
indignar-se
riscar o fósforo
centelha restauradora
– campo de figos e mel
————————————-

Paisagem

Regressar
porque se é partida e fuga
e sempre deixamos alguém à espera
É rocha e água este tempo
de areias difusas a paisagem
represada na garrafa

E o gênio à espera
à espera
de caridosas mãos que o desarrolhem
e o tornem eterno e faça-se a história

Que são os anos para quem
vive sob permanente encantamento?
Que é da existência
quando desfeita a paisagem?
————————————

Forasteiros registros nordestinos

Nordestino é feito juriti, avoa depois do tiro mesmo com as tripas de fora. Teimoso, feito pau de buriti, quantas vezes tentem afundá-lo, quantas ele vem pra riba”
Chico Boíba, lavrador piauiense

I
As sementes no solo
O homem na soleira
esperam
hipotéticas chuvas
incerta germinação

II
O feijão
no solo cristado
nega-se a crescer
o homem
amarga na soleira
a fome antecipada

III
Solitária garça
mergulha no rio
solitário homem
atira a tarrafa
fatalistas, bem sabem ambos
da incerteza do gesto
————————————————

Performance

a serena dama borda almofadas e ouve música antiga As notas do cravo de Rameau cravam verbetes em seu peito Flechas de envenenada emoção Incendeiam-se os átomos Explode o bastidor Rebentam as linhas nos nós e o sofá agora tapete mágico sobrevoa campinas e campos minados Arde a arte e o urdir é semântico Pássaro de incendiadas asas em vôo cego de sede e queimaduras
Demônios a postos Folhas em branco preparam-se Com a mesma solenidade com que há pouco bordava almofadas e ouvia música antiga a poeta modela palavras e poemas Apalpa letra a letra como faz com as laranjas e maçãs no mercado Escolhe as mais perfumadas e brilhantes Encadeia cor a cor tom sobre tom como nas linhas do bordado

soltar os nós e urdir as formas ?será da arte este eterno bordaR?
———————————————

Paisagem marítima

Os guarda-sóis, cogumelos inúteis
espalham a cor, mais nada
Mulheres-lagartas untadas
deitam-se ao largo
fritando carnes e ócio

Na embalsamada paisagem
minhas lentes – único movimento
por vezo e ofício
fotografam o avesso
em invisível translação
————————————-

Falsos haicais

entre dentes
as coisas dantes
emoções requentadas

nada além
do caminhar entre ramagens
e dos bolsos cheios de amoras

folha madura estala
sábia, a terra a recolhe
húmus para a memória
————————————

Subúrbio

corpos-húmus
em quartos-túmulos
homens
dois numa cama
dez num quarto
cem num ônibus
mil na cidade
térmitas
corpos-sem-memória
pedras-vivas
morro acima
sísifos
———————————

10 de junho

Olhos e carne a beber o verde-rubro
bandeira escancarada à emoção.

Vinho
(será ele o luso símbolo
ou o sangue que ferve e incendeia
este pendão?).

Saudade
mordendo feito bicho
feito tempo, feito chama.

Orgulho
raça amálgama de raças
cravos de abril rasgando a história
língua pátria outra para milhões

Camões
nem é preciso que o digas
nem compêndios, calendários ou cantigas
apenas o sangue a rugir em campanário
rubro lembrete
mais do que nunca hoje é dia
de sentir-se português.
————————————————–

A fotografar vidas

capturo e eternizo
com o vidro despolido
de minha Yashica
teu sorriso, teu gesto
tua vida em começo
me surpreendo com a idéia
pueril, mágica e banal
de guardar as vidas
queridas
nas gavetas
rio-me
de minha onipotência
—————————
Viuvez sem espera

Negras, as mulheres
nos verdes campos
ceifam a cor.

Curvas as foices
cortando ervas
côncavas as enxadas
cavando dores.

Negras e curvas, as mulheres
adubam com nênias a terra
em definitiva viuvez
—————————

Sol sem aço

ou relendo Mishima em clara manhã de sol
agasalhada de sol
visto a paisagem
sobrepele escandalosamente azul
contemplo
este mesmo céu de Mishima
e sei
que não haverá compensação
nem morte alguma absoluta
a justificar este momento.
agasalho-me e creio
como só quem sabe e viu
o sabre só deve ser desembainhado
a prumo
na exata medida do riscado
————————

Meu Pai – Retrato Falado

Da palavra escrita, tudo ignora
acha que ler demais faz mal
à saúde e aos olhos
(à semelhança de Caeiro
acredita apenas no que vê e vive
nas árvores, nos pássaros, na Tv)
Elegeu, durante oito décadas
algumas (poucas) verdades
imarcescíveis

Também à maneira de Caeiro
não acredita em metafísica
(aliás, ignora solenemente o termo)
mas vez ou outra, elege um Menino Jesus
que tanto pode ser o seu médico
(compreende suas dores – sábio para sempre)
alguém que lhe fale em espanhol
ou aquele que lhe diga apenas o que deseja ouvir

Na memória auditiva
preservou frases imutáveis
válidas para todas as ocasiões
(tantas vezes repetidas
até serem transformadas em verdade)

Não acredita em fantasmas
nem que o homem chegou à lua
Odeia políticos e política
(o Presidente é o culpado por tudo)

No plano dos afetos
os pais e os irmãos
a primeira namorada
a companheira definitiva
os filhos e os netos
dois ou três amigos de infância
(nenhum na velhice – já morreram todos)

Algumas (poucas) paixões:
fotografar
conduzir automóveis
criar passarinhos
vangloriar-se de seus (ingênuos) feitos

Não aceita que lhe falem da velhice
(nenhuma de suas mazelas, acredita,
dela é decorrente)

Um homem frugal
de pensamento concreto
(o que nós vemos das cousas são as cousas)
O mundo resume-se
à sua ética particularista e particularíssima
(o mundo – e o corpo – como vontade)
—————

Fontes:
VERAS, Dalila Teles. Lições de Tempo. SP: Pannartz,1983.
VERAS, Dalila Teles. Inventário Precoce. SP: Pannartz, 1983.
VERAS, Dalila Teles. Elemento em Fúria. Teresina, PI: Academia Piauiense de Letras, 1989.
VERAS, Dalila Teles. Forasteiros Registros Nordestinos (plaquete). SP: Livrespaço, 1991.
VERAS, Dalila Teles. A Palavraparte. SP: Alpharrabio, 1996.
VERAS, Dalila Teles. Madeira: do Vinho à Saudade. SP: Alpharrabio, 1997.
VERAS, Dalila Teles. À Janela dos dias – poesia quase toda. SP: Alpharrabio, 2002

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Dalila Teles Veras (Poesia Madeirense)

A atividade literária na Ilha da Madeira, ou Região Autônoma da Madeira, como preferem chamá-la os seus habitantes, é intensa, contando hoje com uma vasta bibliografia, muito especialmente na poesia.

Difícil seria, nesta breve notícia sobre a poesia na Madeira, estudar com o rigor exigido esse conjunto de obras e classificá-las como literatura madeirense, posto que esse é um terreno escorregadio de polêmicas que, volta e meia, sobem à superfície fazendo patinar quem por ele transite.

A questão sobre a existência ou não de uma literatura madeirense persiste, inclusive, entre os próprios escritores locais e, colocada em mero posto de observadora, limito-me a falar dessas anotações.

Examinemos alguns trechos retirados de comunicações apresentadas no I Encontro Regional de Escritores, realizado no Funchal em 1989:

– Irene Lucília cita Agustina Bessa Luís que escreveu: “A Madeira tem plantações de romance como bananais e vinha jaquet. É um nunca mais acabar de personagens, situações, vidas e histórias que não se entende o silêncio das letras acerca delas”. Polemicamente, a própria Irene acrescenta: “Tudo está ali. A obra feita. A ilha viva, autêntica deslumbrante e mágica, obsessiva e dominadora, não precisa de ser recriada por mecanismos de ficção. Por si só, em corpo real ela basta à paixão, preenche os escaninhos do prazer, avassala até à saturação e ao confrangimento”, concluindo com uma nova citação de Agustina, que “a paixão dos lugares tornou-se (…) universal fato de paralisia do trabalho”. Interessante observar que, apesar dela mesma, Irene, ser uma eterna exaltadora dessa “ilha viva”, aponta esse mesmo detalhe também como fator paralisante da criação intelectual. O que, neste caso, convenhamos é um pouco de exagero céptico.

Já o poeta Carlos Nogueira Fino, assume, sem nato ser, a sua insularidade e os seus resultados literários: “O que somos desenha-se do mar a sulcos íngremes: um canto chão perante a majestade antiga dos navios; uma impressão de asas vagarosas sobre o céu do silêncio; (…) Aqui nascemos, ou aqui chegamos, com raízes precárias. Elas se encarregam de crescer por nós em busca do que somos. Deixai crescer, portanto, o chão de onde brotamos, universal pela razão das árvores, até fazer-se a voz que nos revela.”.

Pragmático, o escritor João Dionísio coloca: “com a consagração constitucional da Autonomia, ou a transformação da Ilha da Madeira em Região Autônoma da Madeira, “surge a literatura da Região Autônoma da Madeira”. Anteriormente a esse fato histórico, diz ele, “a literatura madeirense ou da Madeira pertence à literatura portuguesa, como qualquer outra literatura escrita por portugueses. (…) Podemos dizer, agora, que somos a outra gente da literatura portuguesa, com os nossos amores e desamores, mas, sobretudo, com a nossa realidade. Somos a outra gente para sermos a mesma gente da literatura portuguesa. Mas, com uma diferença em relação aos nossos antepassados: eles tiveram a Independência, nós temos a Autonomia. O que significa: somos da literatura portuguesa e somos uma literatura da língua portuguesa. Trazemos, portanto, para a História da Literatura Portuguesa a nossa diferença econômica, social e política, isto é, um ponto de vista literário sobre as estruturas. E, ao enriquecermos a História da Literatura Portuguesa enriquecemos, também, a outra vertente: a História da Literatura de Língua Portuguesa. Em resumo: a partir da data e do fato autonômico, começamos a construir a História da Literatura Madeirense.”

Polêmicas e rótulos à parte, não fica difícil observar que a condição insular, os fatores geográficos e culturais específicos (“o homem fechado sobre si mesmo e, simultaneamente disperso no infinito“, conforme Ferreira de Castro, escritor fascinado pelas pequenas ilhas sobre as quais tanto escreveu), acabam por emprestar ao povo madeirense uma feição cultural muito própria e que, inegavelmente o distingue dos demais portugueses, tanto no seu modo de ser e de estar quanto na sua própria visão de mundo. Isso, é claro, é tema para estudioso de antropologia social, mas, de alguma forma, é fácil observar que esses fatores acabam refletidos também na maneira do madeirense se expressar literariamente e, assim, torna-se matéria de análise sócio-literária.

No nosso cômodo ponto de vista de observadores, essa condição insular refletida no imaginário ilhéu, só fez por enriquecer a literatura produzida na Madeira, emprestando-lhe uma singularidade que a eleva a presença marcante e reconhecível no cenário da literatura de língua portuguesa.

A poesia contemporânea portuguesa de maior expressividade, conta com pelo menos três poetas nascidos na Madeira, Herberto Helder (Funchal, 1930) considerado um dos maiores poetas portugueses da atualidade, José Agostinho Baptista (Funchal, 1948) e José Viale Moutinho (Funchal, 1945) este, dono também de uma extensa obra em prosa, além de Natália Correia e de Sophia de Mello Breyner Andresen, elas também das ilhas, mas dos Açores.

Esses poetas, contudo, por terem alcançado uma posição de destaque no cenário literário português e europeu, não são rotulados como “poetas das ilhas”, “madeirenses” ou “açorianos”, são simplesmente poetas portugueses, como deve ser. Apesar de viverem (viveu, no caso de Natália), fora das ilhas (melhor seria dizer que eles apenas “nasceram” nas ilhas, não se “fizeram” nelas) trazem, aqui e ali, na sua gênese mais profunda, esses fatores de que falamos, ainda que, admitamos, apenas por conta do atavismo.

O que é notável é que a Ilha ainda lhes marca a memória e a palavra, como bem o demonstra este poema de José Viale Moutinho:

ANTIMEMÓRIA COM FUNCHAL
ao Manuel Freire

havia asas pelo corpo sobre os mapas do mar
e a coberto da ilha e da espada cravada
no mais distante rochedo de qualquer praia
de súbito matou a sua primeira gaivota

a guerra aproximava-se do fim era junho
e nunca mais coltaria à casa submersa
persianas corridas rendas de latas verdes
que o homem da música lhe traria numa caixa

morria-se de dentes podres deslizando montes
alguns silêncios se descobriam pelas mãos
e os olhos adoeciam noutra costa distante
de barcos e de redes de rostos encardidos

sem saudade nem reconhecimento do luto
moviam-se as raízes sobre as águas lodas
suposto país que se formara no profundo
e aí reinava o inventado el-dom sebastião

Há, no entanto, um grupo de poetas, nascidos ou residentes na Madeira, que optaram por lá permanecer e dali passaram a impor a sua singular poesia ao próprio Portugal que, é preciso que se diga, ainda olha com certo desdém e desconfiança tudo que não venha do Terreiro do Paço de Lisboa (“as muralhas da continentalidade que tão ínfimo interesse revelam em favor da cultura portuguesa insular”, no dizer do sempre inflamado e competente poeta José António Gonçalves.

A escritora Natália Correia, em prefácio à coletânea Ilha 2, 1979, assim refere-se à poesia madeirense: “Despojai-vos da presunçosa cornada e vinde à Ilha. O continente encerra-vos? Fecha-vos as idéias em inquiridos de antolhadas teorias? Entendei que a poesia é superação do continente. Conteúdo fervente. Como a Ilha, contida. Mas pela animação perpétua do mar. A vida sempre a surgir da água, Madre Marinha. (…) Fechai vossos guichets de bancários da estese e vinde à Ilha. Aqui a poesia é grátis. A criação revela-se geneticamente insular. Daí serem as Musas originariamente aquáticas.”. Natália, como se vê, confirma a marca “genética” da insularidade dessa poesia e exalta, em alto e bom som, a sua qualidade.

O fato de apontarmos essa marca insular na poesia dos madeirenses não significa estarmos, em nenhuma hipótese, a nos referir a qualquer idéia estética de regionalismo, mas, antes, a uma poesia que, no seu conjunto, apresenta uma facies própria que a identifica pelo particular e que, por seus méritos, a coloca na universalidade exatamente pela coragem de ser regional.

Se o Brasil mal conhece a literatura contemporânea portuguesa depois de Eça e Pessoa, que dizer dessa poesia, ainda pouco conhecida em seu próprio país, com um imenso mar a isolá-la e a separar-nos?

Trazer, portanto, a um encontro de língua portuguesa um pouco da poesia feita na madeira é apenas um gesto de tentar (re)unir e (inter)cambiar os poetas e a cultura que o mar separa e que os convênios e acordos oficiais não consegue aproximar. Daí o fato de ser esta apenas uma breve notícia da poesia na Madeira, trazida por uma leitora atenta, desvestida dos méritos acadêmicos para uma análise mais adequada a uma comunicação.

Dentre os muitos poetas madeirenses da atualidade, selecionamos os nomes de José António Gonçalves, Irene Lucília, Carlos Nogueira Fino, José de Sainz-Trueva, Ângela Varela e Maria Aurora Carvalho Homem, não só por sua representatividade dentro do atual panorama poético madeirense, como também por terem merecido o justo destaque da própria crítica portuguesa e, finalmente, por concordarmos com a excelência de suas obras.

Pequena bibliografia e breve antologia da poesia madeirense:

José António Gonçalves – Nasceu em São Martinho, Funchal, Madeira, em 13 de junho de 1954. Escritor e jornalista. Presidente da Direção da Associação da Escritores da Madeira, da qual é um dos fundadores, membro da Associação Portuguesa de Escritores, Coordena o movimento Ilha e dirige e edita a coleção Cadernos Ilha
Publicou: Poesia – É Madrugada e Sinto, 1974; Pedra-Revolta, 1975; 20 Textos para Falar de Mim, 1988; Antologia Verde, 1991; Os Pássaros Breves, 1995; Tem o Poder da Água (obra poética 1973-1995), 1996, À Espera dos Deuses, 1999; Giacomo Leopardi e o Suave Desprendimento do Infinoto, 1999; A Aventura na Casa dos Livros, 2000; Lembro-me desses Natais; 2000. Ficção – Réstea de Qualquer Coisa, crônicas, 1973; Organizou e integrou as antologias Ilha, 1975; Ilha 2, 1979; Ilha 3, 1991; Ilha 4, 1994; O Natal na Voz dos Poetas Madeirenses, 1989; Poet´Arte 90, 1990; Poesia na Ilha, 1991; Crônicas do Norte, textos de Horácio Bento de gouveia (seleção, organização e prefácio de sua autoria), 1994. Filmografia – Açores Outono (documentário), 1978; Madeira – Bordado de Sonho (documentário), 1980; Ora… o Mar (conto – teledramático), 1988; Retratos da Madeira, (série biográfica, 6 episódios), 1989; Canto da Ilha (Programa do 20º aniversário da RTP-M), 1992; e O morto, 1994.

PÔR-DO-SOL
para Virgílio Higino Pereira

Este é o mar que se veste de vermelho,
convidado pelo ocaso do poema
para o baile do fim do dia.

Ei-lo à distância, abraçando a periferia
de um olhar que se perde nas falésias,
sorridente na brevidade da sua figura.

Poderia o ilhéu dar o salto inconsciente,
entregando-se ao sal rosado do seu vestuário,
curioso por provar a água do seu bordado.

Porém, resguarda-se no calor da terra,
pisando a ilha com a carne da sua loucura,
acorrentado às ervas que nascem no recolher das casas.

E suspira, como um anjo esquecido
na multidão solitária que percorre as ruas,
perguntando pelo lugar onde descansam as suas asas.
(in Aventura na casa do livros)

Irene Lucília – Irene Lucília Mendes de Andrade, é natural do Funchal (1938). Licenciada em Pintura pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa. Professora de Educação Visual. Desenvolveu diversificada atividade, como produtora de radio, autora de textos para a infância e no domínio das artes plásticas participou em vários exposições na Madeira e nos Açores. É membro da Associação de Escritores da Madeira.
Publicou: Poesia – Hora Imóvel, 1968; Histórias que o Vento Conta, 1979; Palavras que Levo em Viagem, in Ilha 2, 1979; O Pé Dentro D´Água, 1982; Ilha Que é Gente (cantigas), complementado com um disco single, 1986; “A Mão Que Amansa os Frutos”, 1990. Sobre a Memória deste Dias, in Ilha 3, 1991; Amargo é o Estar do Tempo, in Ilha 4, 1994. Romance – Angélica e a sua Espécie, 1993. Está representada em várias antologias. Tem colaboração dispersa por vários jornais e revistas.

Sete partidas

1 a boca curta
2 o timbre inútil
3 alguns percursos inviáveis
soterrados
sob o peso deslumbrado dos asfaltos
4 intentos e caminhos reduzidos
a um tráfego de cansaços e esquecimento
5 a ilusão horizontal dos olhos
rasando a virtude da água
6 a dolorosa porção de espaço
perimetria do espasmo e dos espantos
enorme convulsão
entre o silêncio e a fábula
7 o gesto insuficiente do coração
entre o mar e o mar como se
mais mundo não houvesse e só
os territórios interiores
fatigados duma melancólica geografia.

as sete partidas duma viagem inflexível
quedam-se à volta de muitas raízes
e duma dramática sedução de flores
onde a luz quebra o viço generoso das sombras
e reforça a intensidade fátua dos perfis suspeitos.
(in Amargo é o Estar do Tempo, Ilha 4, 1994)

José de Sainz-Trueva – nasceu em São Gonçalo, Funchal, a 9 de junho de 1947. Membro da Direção da Associação de Escritores da Madeira e Associação Portuguesa de Escritores entre outras associações. Chefe de Divisão de Proteção ao Patrimônio Cultural da Direção de Serviços do Patrimônio e Atividades Culturais.
Publicou – Espaço na Relva, in Ilha 2, 1979; Entre os Olhos, in Ilha 3, 1991; Musa Grata, in Ilha 4, 1994; está representado em inúmeras antologias; Tem publicado textos de investigação sobre temas madeirenses nas revistas Atlântico, Islenha, Girão e no suplemento do Diário de Notícias do Funchal, bem como colaborou em várias outras publicações.

De um só golpe
um anjo decepado
afunda-se na lama
o nó aperta
esfuma-se a restinga
imóvel rosa dúctil
virada do avesso
secura e culpa
ao fim de cada hora
o que te faço?
vibra
escasso amor
é laço é ferida em carne viva
(in Entre os Olhos – Ilha 3, 1991)

Mais secreto é o dia
rio livre
sem lei

como um vulto na rua

de
sombra e
sol

sem
certeza de
nada bravo como um
touro
(in Musa Grata, Ilha 4, 1994)

Carlos Nogueira Fino – Nasceu em Évora em 25.11.50. Reside na Madeira desde dezembro de 1959. Mestre em Educação (análise e organização de ensino). Docente na Universidade da Madeira. Deputado à Assembléia Legislativa Regional. Membro da Associação de Escritores da Madeira e da Sociedade Portuguesa de Autores.
Publicou – XXIII Poemas de Ilhamar, 1987 – prêmio Leacock 87); Simbiose, 1988, de parceria com o escultor Celso Caires; Este Cais Vertical, 1989; Iniciação à Luz in Ilha 3, 1991; Contemplação do Olhar, 1992; (Pre)Meditação, 1992; Alquimias, in Ilha 4, 1994

a ambigüidade não é a que insinua
no cerne das palavras o corte
com as coisas

mas esta saliência na significação das árvores
onde assentamos a aparência da imobilidade

entretanto pulula
na dissolução das folhas
a azáfama do solo
0o0

mas não direi estas palavras
sem abri-las por dentro
como te abro e me revelo
para conhecer-te

o gérmen do teu nome inscrito
no meu nome
(in (PRE)MEDITAÇÃO)

Ângela Varela (de seu nome completo, Ângela Maria Varela Miranda Rodrigues), natural da Ilha da Madeira, Camacha, é licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras de Lisboa, com a dissertação O Poema em Prosa na Literatura Portuguesa. Lecionou no Ensino Secundário em Paris, no Funchal, em Oeiras e na Escola de S.João do Estoril onde é professora efetiva, além de ter exercido o cargo de Leitora de Português na Universidade de Estrasburgo (França). Prepara tese de Doutorado sobre a poética do “poema em prosa”.

Publicou: Espaços de Passagem, in Ilha 3, 1991; Corpo – Ilha, in Ilha 4, 1994. Tem publicação dispersa de ensaio e (ou) poesia nas revistas Colóquio/Letras e Sílex, de Lisboa, Nova Renascença, do Porto, Atlântico, da Madeira e Nordès, de Vigo, bem como em jornais da Madeira e Lisboa. Publica crônicas no Diário de Notícias do Funchal

A Fala das coisas

Olhar. Olhar apenas: o mar soprado sobre a terra a olhar.
As nuvens boiam no balão do espaço – bolhas no vidro.
O muro é branco – agudamente branco. O ângulo da perna
branco encaixa no fundo azul.

Mancha. Massa apenas. Abafa o som de todas as palavras.
Deixa que as coisas falem sem filtro – com a voz do olhar.

Corpo Mineral

As casas-cavernas talhadas na rocha. O sol a penetrar nos
poros da pele. A espuma a golfar das cavidades do nariz,
da boca.

Maré-cheia os olhos-linha de horizonte.

Os cabelos-algas boiando. O perfil de pedra, lavado
no fluxo das águas salgadas. O musgo do corpo descarnado
do calor animal, do sopro vegetal:

no reino mineral a escavar-se.
(in Ilha 4, 1994)

Maria Aurora Carvalho Homem – Nasceu em Beira Alta, radicada na Madeira desde 1974. Cursou Filologia Românica na Universidade de Coimbra. Foi jornalista em A Capital e Diário de Lisboa. Produziu programas infantis na televisão portuguesa, ganhando o prêmio de Imprensa em 1968, como melhor apresentadora de Televisão. Na Madeira, entre outras atividades, foi professora, coordenadora da revista Margem, fez rádio e televisão, com destaque para o premiado programa “Letra Dura & Arte Fina”.
Publicou: Raízes do Silêncio, 1982; Ilha a Duas Vozes (com João Carlos Abreu), 1988; Vamos Cantar Histórias (infantil, 1991; Juju, a Tartaruga (infantil), 1992; A Santa do Calhau (contos), 1993; Cintilações (poesia sobre aquarelas de Mellos), 1995 e Para Ouvir Albinoni (contos), 1995, além de estar antologiada em várias publicações.

UM JEITO DE DIZER SOLIDÃO

A palavra não chega a ser murmúrio
Mastigo-a na sombra a intervalos breves:
é um dizer silencioso
um tempo sem rosto
uma ausência presente em cada gesto.
A palavra viaja no meu corpo
prendo-a na franja dos olhos
corrompe a limpidez da distância
na precisão incolor dos dias.
É cardo, gume, alfazema e jasmim.
Persigo-a neste gesto de quem quer.
A palavra é este olhar de tudo cheio
este cheiro de noite
este acaso de nada
adágio sufocado em catedral vazia
vôo raso de pássaro vadio.
A palavra tem rosto de mulher
olhar de noiva eternamente virgem
é a pele que me veste cada dia
e que me despe à noite devagar.
Faço-a minha na ternura calada
de quem desfolha rosas no outono.
Caladas nos dizemos:
amantes confessados

Fonte:
Comunicação apresentada no III Encontro Luso-Afro-Brasileiro de Língua Portuguesa – Literaturas e Comunicação Social, Faculdade Casper Líbero, SP, Capital, em maio 2000. Este texto consta do Anais do referido encontro, publicado em 2 volumes, pela Imprensa Oficial do Estado/Faculdade Casper Líbero, em 2001.
http://www.dalila.telesveras.nom.br/

Foto de Pedro Gaia = http://olhares.aeiou.pt/

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Dalila Teles Veras (1946)

Dalila (Isabel Agrela) Teles Veras, natural do Funchal, Ilha da Madeira, Portugal, (1946), emigrou com a família para o Brasil (São Paulo, Capital), em 1957. Em 1972, após seu casamento com o advogado e escritor Valdecirio Teles Veras, radicou-se em Santo André, cidade onde nasceram suas três filhas, Carolina, Isabela e Alice, na qual reside até hoje.

Publicou mais de uma dezena de livros, nos gêneros poesia, crônica e o livro “Minudências”, um diário do ano de 1999. Participou de inúmeras antologias no país e no exterior. Possui trabalhos (artigos, ensaios e textos literários) publicados em jornais e revistas de todo o país e do exterior.

Assinou, de 1995 a 1999, a coluna semanal Viaverbo, no Caderno “Cultura & Lazer” do Diário do Grande ABC.

É filiada à União Brasileira de Escritores, entidade onde ocupou os cargos de Secretária Geral, Diretora e membro do Conselho, nas gestões de 1986/88, 1990/92 e 1994/96.

Fundadora do Grupo Livrespaço de Poesia (1982-1993) que manteve intensa atuação na divulgação da poesia e publicou 5 coletâneas. Foi uma das editoras da revista literária Livrespaço, ganhadora do Prêmio APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte, como melhor realização cultural de 1993.

Animadora cultural, há mais de três décadas colabora na organização de cursos, seminários e congressos. É freqüentemente convidada a proferir palestras e participar de debates em Faculdades e instituições culturais, bem com a assessorar e criar projetos literários, como ciclos de debates, exposições, mesas redondas. Participou de dezenas de concursos como integrante do júri.

Participou, como convidada da UNESCO, do Colóquio Imprensa de Língua Portuguesa no Mundo, realizado em junho de 1991, em Paris, com a comunicação “A Imprensa Alternativa no Brasil como resistência cultural”. Coordenou dezenas de oficinas de criação literária, dentre as quais, “O Laboratório da Paixão”, na Oficina da Palavra, Casa Mário de Andrade, SP.

Participou do Projeto “O Escritor nas Bibliotecas” (1993/1994) da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, bem como do Escritor 96 – promovido pela mesma Instituição.

Eleita “Intelectual do Ano”, 1997, no Prêmio Capital, instituído pelo Jornal cultural O Capital, de Aracaju – SE.

Desde 1992 é diretora-proprietária da Alpharrabio Livraria e Editora, em Santo André, SP, referência cultural na região, onde promove constante atividade voltada para a difusão da cultura, das artes e o debate de idéias no Grande ABC. Dirige a Alpharrabio Edições, chancela que já publicou mais de 70 títulos e edita o jornal literário “Abecês”.

Dentro os inúmeros projetos sob a sua direção e produção, destaca-se o projeto “7 Anos 7 Cidades – Culturas”, comemorativo aos 7 anos da Livraria Alpharrabio (1999) que durante 7 meses dedicou um mês a cada uma das cidades da Região do Grande ABC, mostrando diversos artistas e discutindo aspectos da cultura de cada uma delas. Desse projeto participaram diretamente mais de 100 pessoas (artistas, produtores e pessoas ligadas à cultura regional), merecendo enorme destaque na imprensa e menção honrosa das Câmaras Municipais das Cidades de Santo André, Rio Grande da Serra e Ribeirão Pires.

Organizou, em parceria com Luzia Maninha Teles Veras, o livro “Alpharrabio 12 Anos – Uma história em curso” (Alpharrabio Edições, 2004, 346 pgs.), minucioso levantamento de mais de 500 atividades e inúmeras transcrições debates, todos desenvolvidos na Alpharrabio Livraria e Editora.

Colaborou, como curadora da área de literatura, do evento Plataforma ABC, em três diferentes edições, bem como do PALAVRAPONTOCOM, promovidos pelo SESC, unidade São Caetano do Sul.

Foi responsável por uma página literária nos Cadernos CEAPOG (Centro de Estudos de Pós-Graduação), publicação semestral do IMES – Instituto Municipal de Ensino Superior de , em 12 números daquela publicação.

Em 2000 a revista Livre Mercado outorgou-lhe o Prêmio Desempenho de Empreendedora Cultural.

Em 2004 a Câmara Municipal de Santo André outorgou-lhe o título de Cidadã Honorária.

Livros publicados:

Poesia

• Lições de Tempo. SP: Pannartz,1982 (2ª ed., 1983).
• Inventário Precoce. SP: Pannartz, 1983.
• Madeira: do Vinho à Saudade. Col. Cadernos Ilha. Funchal, Madeira (Portugal): José António Gonçalves editor, 1989 (2ª ed., fac-simile, SP: Alpharrabio Edições, 1997).
• Elemento em Fúria. Teresina, PI: Academia Piauiense de Letras, 1989.
• Forasteiros Registros Nordestinos (plaquete). SP: Livrespaço, 1991.
• Poética das Circunstâncias (plaquete). SP: Alpharrabio Edições, 1996.
• A Palavraparte. SP: Alpharrabio Edições, 1996.
• À Janela dos dias – poesia quase toda. SP: Alpharrabio Edições, 2002
• Vestígios. plaquete, edição fora do comé}rcio, 200 exemplares numerados e rubricados pela autora, Alpharrabio Edições, 2003
• Poesia do Intervalo. poemas, com desenhos de Guedo Gallet, livro de arte (Alpharrabio Edições, 2005, 200 exemplares numerados e rubricados pelos autores.
• Solilóquios. plaquete, 200 exemplares numerados e rubricados pela autora, Alpharrabio Edições, 2005
• Pecados. caixa artí}stica, publicada por ocasiã}o da comemoração dos 60 anos da autora, com 7 poemas ilustrados em 7 pranchas pelos artistas André Miranda, Constanç}a Lucas, Guedo Gallet, Mariano Amaral Neto, Perkins T. Moreira, Ricardo Amadasi e Sian, 200 exemplares, numerados e rubricados pela autora, Alpharrabio Edições, 2006
• Retratos Falhados, Coleção Ponte Velha, Editora Escrituras, 2008

Prosa
• A Vida Crônica (crônicas). SP: Alpharrabio Edições, 1999.
• As Artes do Ofício – um olhar sobre o ABC (crônicas). SP: Alpharrabio Edições, 2000
• Minudências (diário). SP: Alpharrabio Edições, 2000.

Fonte:
http://www.dalila.telesveras.nom.br/

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Entrevista com Dalila Teles Veras

Entrevista concedida ao escritor Floriano Martins

FLORIANO: Comecemos falando da ponte existente entre o nascimento em Funchal e a residência brasileira em São Paulo. De que maneira as variações nessa paisagem cultural – do insular ao continental – foram aguçando os sentidos do poeta?

DALILA Ninguém cruza a linha do Equador impunemente. Atada à cinta, a carga atávica, heranças avós das quais dificilmente nos desvencilhamos. Ante a impossibilidade do retorno é preciso render-se e assimilar a cor circunstancial e, do sal recolhido na travessia, temperar esse novo viver. Para além do Bojador, a dualidade se faz presente, o sentido agudo de ser estrangeiro. Não são mais os mares que começam, mas terras que nunca se acabam. As raízes, veias abertas, passam a receber influências novas, convívios outros, determinando nova visão de mundo e, claro está, que isso irá refletir lá adiante nos sentidos da poeta.

FLORIANO: O convívio com duas tradições líricas sensivelmente distintas, como o são a portuguesa e a brasileira, imagino também deve ter sido um aspecto bastante enriquecedor em tua formação. Paralelo ao enriquecimento como convivias com a percepção do abismo que separa ambas as tradições?

DALILA: No Brasil, aportada ainda menina e tendo aqui completado minha escolaridade, talvez a primeira percepção tenha sido a de que, em tese, a língua era (quase) a mesma, mas a práxis cultural não.
Cresci ouvindo minha bisavó materna recitando Bocage e Camões, e minha mãe valendo-se das trovas populares para celebrar todas as ocasiões. Bebi de todas as tradições, portuguesas e brasileiras, desde o lírico Augusto Gil e sua balada da neve, que aos 9, 10 anos, declamava com paixão nas festas escolares no Funchal e, já no Brasil, os românticos brasileiros, como Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela e Castro Alves, que li com devoção na adolescência. Os portugueses modernos descobri por minha conta e risco, já em terras brasileiras. Pessoa em primeiro, um mergulho do qual necessitei muito tempo para emergir e, enfim, poder nadar por outras águas.
Na minha memória de leituras não há uma percepção desse possível abismo entre as duas literaturas, antes, uma fusão, como foi a vida, amalgamada pelo sincretismo cultural. Isso se refletiu, inclusive, num aspecto conceitual no que concerne à minha “nacionalidade literária”. Quando da minha opção pela palavra como ofício, enfrentei outro dilema: não era possível ser uma escritora portuguesa escrevendo como brasileira. Apazigüei-me, considerando-me uma escritora brasileira que nasceu em Portugal. A língua como a pátria possível.

FLORIANO: No diálogo com essas duas tradições, há algumas particularidades que tenham alcançado uma mais alta voltagem em termos de afinidades estéticas? Não me refiro exatamente a autores, mas sim a aspectos de linguagem. E também quero que te sintas livre para aqui mencionar outros focos apaixonantes e mesmo influentes, não somente em termos de ambientação Brasil-Portugal e menos ainda exclusivamente literários.

DALILA: Em termos de afinidades estéticas, a pintura talvez tenha sido a que primeiro se estabeleceu, como até hoje tem sido. Ao tempo que lia os românticos, encantava-me com os impressionistas, queria, àquela época, atingir uma escrita diáfana, uma realidade “borrada” como nos jardins de Monet, mas a tentativa poética não passou de um “borrão” mesmo. A minha poesia muito tem dialogado com a pintura, em especial com a de Constança Lucas, Hugo Gallet, Ricardo Amadasi, André Miranda, Mariano do Amaral Neto, Sian, Perkins T. Moreira, pintores/escultores, meus contemporâneos, que admiro e com os quais já realizei trabalhos conjuntos.
Quando de minha tomada de consciência estética, vi-me diante do impasse em que se meteu toda a poesia depois dos anos 50 no Brasil: filiar-me a grupos com (ainda) severas imposições canônicas, nas quais a poesia deve cumprir um papel formal exacerbado, os chamados poetas-críticos, o que, absolutamente, nunca foi minha vocação, ou buscar uma voz que encontrasse o equilíbrio entre a pesquisa formal e a emoção como sua dimensão humana.
Todas as escolas fizeram de mim uma poeta sem escola nem geração, mesmo porque penso que a segunda metade do século XX não formou gerações literárias, mas vozes, em muitos casos, dissonantes, que retiraram da tradição, do modernismo e das vanguardas apenas aquilo que mais lhes interessou.
Acredito, entretanto, que essa aparente insubordinação de não pertencer a “escolas” não exclui o fato de se estar ligada, em termos de linguagem, a uma determinada “corrente literária” que, a meu ver, estaria representada por uma certa marca ou parentesco planetário.
Nestes 25 anos de exercício poético, sem deixar de experimentar outras possibilidades de dicção e linguagem, venho perseguindo o caminho da concisão, a busca da densidade de significados em versos cada vez mais econômicos.

FLORIANO: Transcendência singular e evocações de intenso caráter de consagração convivem, em tua poesia, com uma leitura cosmopolita de aspectos memoriais e visão crítica. Há um interlocutor almejado por um plano estético? Com quem buscas dialogar?

DALILA: Desde os meus 11 anos de idade que vivo numa metrópole. Sou, portanto, um ser urbano, com pouca possibilidade de refletir a natureza que não tenha sido transformada pelo homem. Tento, de dentro do olho desse furacão, refletir essa realidade complexa que é a da cidade moderna e as minúcias do seu cotidiano, onde velocidades incompatíveis com a natureza humana não mais permitem o direito ao silêncio, ao ócio ou à própria reflexão. Não tenho propriamente uma intenção em transcender essa realidade, mas transformá-la em outra realidade, espelho do espelho, o que não exclui uma dose memorial, recriada, já que não há verdade nas memórias, ainda que também acredite que o esquecimento pode ser repositário delas, caixa de Pandora, à espera que alguém a destampe.

FLORIANO: Estatísticas irrefutáveis alertam para um quadro perigosamente agravado ao longo do tempo, que é o índice de leitura per capita do brasileiro. Evidente que não se pode esquecer que aí também se revela uma condição intelectual do país, ou seja, também nossos intelectuais lêem abaixo do sustentável. Entenda-se, ao menos teoricamente, por condição intelectual aquela que abriga tanto o universo literário (autores e críticos, por exemplo), como clero, imprensa, academia e casta política. O resultado dessa cadeia viciosa é uma espiral cuja expansão se dá sempre em sentido degenerativo. Como se pode romper com isto?

DALILA: A escola precisa voltar a priorizar a leitura e estimular a pesquisa e o pensar, única maneira de formar cidadãos que possam fazer escolhas. O ensino optou por “instrumentalizar” o cidadão para o mercado, deixando de lado a cultura humanística, única capaz de transformar, de preparar cidadãos para o discernimento. Como disse Edgar Morin, “o conhecimento racional, empírico e técnico deve conviver com o simbólico, o mítico e o poético”. A pessoa que lê não reproduz, mas pensa e cria, toma decisões. Vive-se na era do simulacro e do fragmento, onde a lei do mais “fácil” impera. O conhecimento, que advém da leitura, requer esforço, dá trabalho. Será preciso uma verdadeira brigada pró-leitura, diante da concorrência e da facilidade enganosa que o advento da Internet incutiu nos mais jovens, a ponto de se achar que livro é coisa do passado, que a Internet é o melhor meio de “estudo” e que basta clicar no “Google” para encontrar, imprimir e entregar, prontinho, ao professor, qualquer pesquisa, sobre qualquer assunto, sem a necessidade de nem mesmo ler o que se imprimiu. A leitura não poderá ficar de fora dos grandes debates atuais. É uma questão irrenunciável que deverá obrigatoriamente se transformar em uma estratégia para uma revolução que deve passar pelo intelecto e pela vontade política.

FLORIANO: Tua integração ao ambiente da produção cultural em São Paulo possui uma conotação talvez ainda não corretamente avaliada, desde as atividades em torno do grupo Livrespaço até a criação deste espaço nobre de produção e difusão literária que é a Livraria e Editora Alpharrabio. Qual a tua percepção deste caso incomum entre brasileiros, de alguém que é essencialmente escritor e se desdobra em uma aventura de abrir condições editoriais e de circulação para seus pares e gerações mais jovens?

DALILA: De fato, são poucos os que se dedicam à “disseminação” e ao debate da cultura e esses estão divididos em duas categorias: aqueles ligados à chamada cultura do espetáculo, que dependem de patrocínios e da lógica do mercado para circular. Além disso, e por isso mesmo, encontram facilidades com leis de incentivo, patrocínios, etc.; a segunda categoria, se é que se pode chamar assim, é a dos abnegados, que, por vocação pessoal ou por uma lei não identificada, dedicam-se às causas da cultura e da arte, quixotes urbanos, numa sociedade que pouco está se importando para o que não represente entretenimento, moda ou lazer. Sempre tive a convicção de que todo escritor deveria ir além do papel, ou seja, exercer também “outros papéis”, entre eles o da solidariedade entre seus pares e, sobretudo, a contribuição para a promoção da leitura. Essa foi uma das preocupações do grupo Livrespaço, contribuir para a formação de leitores de todas as maneiras possíveis. Sou uma editora de circunstâncias. Jamais obtive qualquer resultado financeiro com aquilo que publiquei. Publico por um desejo que chamo de utopia da página impressa. Jamais fui movida a metas, como mandam as leis empresariais, mas a inquietações e, no caso da edição, publico aquilo que me seduz, que acredito tenha possibilidades de permanecer como literatura e também, em alguns casos, pelo prazer de ver um escritor em seu momento de nascimento para, depois, como já aconteceu, vê-lo trilhar caminhos que sejam reconhecidos.

FLORIANO: O convívio com a prosa (crônicas, diário, crítica esparsa), de que maneira interfere em tua poesia?

DALILA: A transversalidade cultural, as identificações no lugar da identidade, talvez seja a marca do nosso tempo. O diário continua sendo uma prática, tentativa de aprisionar os dias. Dele e de todos os outros textos, por vezes me acontece identificar uma frase como verso e que acaba se transformando em cerne de um poema. Como também me acontece ao contrário, ou seja, de um verso, construir uma crônica.

FLORIANO: Dos livros todos reunidos em À Janela dos Dias até a presente edição, podemos falar em saltos, abismos, conseqüências ou alguma outra avaliação mais pertinente?

DALILA: Acredito que não haja nenhum salto, mas talvez a confirmação de uma certa “dicção” que ali já estava presente, assim como também uma retomada do poema em prosa, onde resvalo pelo discursivo mas que, assim como em A Palavraparte, que é de 1996, impõe-se como condição dentro da proposta temática, neste caso, os “retratos”.

FLORIANO: Esquecemos algo?

DALILA: Sempre haveria algo a dizer, mas também o calar pode vir carregado de significados que poderão ser descobertos, assim espero, pelo leitor dos poemas.

Fonte:
VERAS, Dalila Teles. Retratos Falhados. Ed. Escrituras, 2008. prefácio.

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João Cirino Gomes (Floresta Encantada)

Os moradores da floresta encantada viviam em festa e fantasia.

Cascudinho e Douradinho eram dois peixinhos, e moravam em um riacho que cortava a floresta.

Naquela tarde ensolarada os dois amiguinhos brincavam de pular.

Douradinho se dizia campeão de salto em altura. Como Cascudinho não queria ficar atrás, começou a disputa.

A cada pulo olhavam pra fora da água, apostando quem enxergava mais longe.

Na volta diziam o que tinham visto.

Depois de vários saltos, Douradinho voltou com a novidade.

– Esta chegando alguém.

– Quem será? – Perguntou Cascudinho que era curioso.

– Não sei, mas vamos ver – respondeu Douradinho.

Em seguida, viram a dona Anta, e suas duas filhas, Antônia e Antonieta que se aproximavam… Depois de saciarem a sede, elas se sentaram na relva e se puseram a conversar.

Em dado momento, Antônia pediu: – Mamãe; conta àquela estória do menino que era desobediente?

-É mesmo mamãe! – Concordou sua irmã Antonieta toda empolgada.

Depois de algumas insistências, dona Anta começou: – Era uma vez um garoto branquinho, que morava com sua mãe na floresta. A mulher era muito bondosa, mas seu filho se tornou um peralta. João de Barro é quem o diga. O garoto vivia o perseguindo.

Dona Sabiá também não tinha sossego, e já estava magra de tanto fugir das pedradas do menino. Com sua perversidade o malvado tirava a paz de todos os moradores da floresta. Muitas vezes o garoto tentou derrubar a casinha, que João de barro construíra com sacrifício.

Sua maior magoa, era ver João de barro e Joaninha cantarem felizes da vida, sobre os galhos da paineira.

Certa tarde, depois de muito matutar, o menino resolveu que acabaria com aquela alegria. Escondido da mãe pegou um tição no fogão, e foi para a floresta.

Todo empolgado juntou um monte de folhas, e acendeu uma fogueira junto ao tronco da paineira, onde morava João de barro.

– Eles vão ver comigo – dizia o perverso, esfregando a mão de contentamento.

Deitou-se na relva, e ficou olhando para o alto, esperando o resultado da sua perversidade. Mas pegou no sono, e as chamas começaram a se alastrar.

João de barro e Juaninha percebendo o perigo; cantavam tentando desperta-lo, mas nada do menino acordar.

Quando as chamas lamberam seu calcanhar, ele se levantou e pensou em fugir, porem já era tarde… Desesperado tentou subir na arvore para se livrar das labaredas. Quando se agarrou em um galho foi ao chão e quebrou a perna. Então aumentou seu desespero; não conseguia se levantar, e começou a gritar.

Tanto gritou que sua mãe veio ao seu socorro.

Depois de enfrentar as chamas, a bondosa senhora o pegou no colo, e o levou para a casa.

Mas o malvado tinha se queimado, e estava pretinho como um carvão.

Desde então, ganhou o apelido de Saci Perere.

***

– Mamãe agora conta àquela estória do bicho papão? – Pediu Antonieta.

– Vamos para casa, pois já esta ficando tarde. Amanhã eu conto – concluiu dona anta, e saiu, sendo seguida por suas filhas.

Os dois amiguinhos também se despediram.

E quando iam se afastando, apareceu “Odoro”, tio de Douradinho, que chegava para fazer uma visita a sua irmã Dorotéia.

– Ao avistar o sobrinho, Odoro perguntou: – Que você esta fazendo até estas horas longe de casa menino?

– Tio eu e meu amigo Cascudinho estávamos ouvindo a dona Anta contar a estória de um menino muito levado, que se chama Saci Perere. Ele era malvado, e não obedecia a sua mãe, e talvez por isso tenha recebido um castigo.

– Quando eu era jovem, ouvi falar deste menino – disse Odoro.

– O que você ouviu titio?

– Vamos pra casa, chegando lá eu conto.

Então Douradinho abanou a cauda mais rapidamente, e devido a sua grande curiosidade pediu: – O tio vai contando pelo caminho! – Fique calmo guri, eu vou contar, agora ande vamos!

Nem bem entraram por entre as pedras, onde morava Dourotéia, e o garoto já estava ao lado do tio, pedindo ansioso: – Agora conta!

Diante da insistência, Odoro começou a narrativa.

– Certa tarde eu nadava na maior tranqüilidade, quando notei dois pescadores se aproximando em uma canoa.

Ao invés de prestarem atenção no que estavam fazendo, eles remavam distraidamente, conversando animadamente.
Eu aproveitei estas distrações, e tirei a isca do anzol deles por varias vezes. Mas não querendo abusar da sorte, e já de barriga cheia, fiquei ouvindo suas conversas.

O mais velho disse:

– Este riacho me parece encantado, em todo lugar que vou pescar, nunca perco uma fisgada, quando puxo sai uma lasca de um peixão, e aqui já puxei varias vezes; perdi varias iscas e não peguei nada.

– Como assim encantado? – Perguntou o pescador mais novo, ao contador de prosa, que usava um chapelão de palha.

– Rapaz, eu tenho um compadre chamado Bentinho, que cuida de uma roça pra estas bandas, – disse o velho.

Certa vez ele me contou, que quando voltava do trabalho, resolveu pegar umas espigas de milho. Chegando a casa debulhou o milho e colocou numa panela. Em seguida encheu o cachimbo com um fumo que ele mesmo cultivava, e começou a meditar:

– Depois de comer um punhado de pipoca, dou uma tragada no meu cachimbo e vou descansar.

Com estes pensamentos, deitou-se na rede e ficou balançando, esperando a pipoca estralar.

E como estava cansado, meu compadre adormeceu.

Quando acordou, foi até o fogão, e notou que não havia nenhum grão de pipoca na panela. Então ele ficou cismado.

Pegou seu cachimbo, e nele também não tinha fumo.

– Eu não lembro de ter fumado, – pensou ele.

Olhou para um canto, olhou para o outro, coçou a cabeça, e perguntou a si mesmo, – será que estou caducando? Não pode ser; também não comi pipoca, e tenho certeza que eu trouxe milho. A maior prova disso são as palhas que estão aqui!

Naquela noite meu compadre ficou matutando até tarde.

No dia seguinte foi para a roça, e trabalhou o dia todo pensativo.

À tarde quando saiu do trabalho, olhou para o milharal, e pegou outras espigas.

Chegando a sua casa debulhou o milho e colocou na panela. Pegou seu cachimbo encheu de fumo, e o deixou sobre o fogão.

Deitou-se na rede, e ficou ali com um olho fechado e o outro aberto, fingindo que cochilava.

Logo escutou um assobio. Em poucos instantes um menino pretinho chegou pulando numa perna só. Entrou porta adentro e foi direto ao fogão. Encheu a mão de pipoca, e levou a boca. Lambeu os beiços, e despejou o restante da pipoca dentro da toca.

Depois pegou uma brasa colocou no cachimbo, deu uma baforada e saiu.

Já no terreiro, deu uma gargalhada e sumiu.

– Então é isso seu safado? – pensou meu compadre.

Eu estouro pipoca; você vem e come, fuma meu cachimbo, e ainda sai dando risada?

– Há, mas eu vou te dar uma lição; vou sim, pode esperar seu danado!-Disse meu compadre; que estava bravo feito uma onça.

No dia seguinte, fez à mesma coisa, escolheu três rechonchudas espigas de milho, com belas cabeleiras ruivas, e foi para casa.

Lá chegando, debulhou o milho e colocou na panela.

Só que ao invés de por fumo no cachimbo, colocou pólvora. Deitou – se na rede, e ficou fingindo que cochilava…

Não demorou muito ouviu o assobio, logo o pretinho entrou sorridente pulando numa perna só. Foi para o fogão, experimentou um punhado de pipoca e despejou novamente o restante dentro da toca. Pegou o cachimbo, e quando o ascendeu e deu uma tragada, a pólvora se incendiou e, bumm!

Com a explosão, e a fumaceira, o Saci tomou um susto e caiu de costas.

Meu compadre deu um grito, e só viu o vulto que se engatinhou por baixo da rede e fugiu.

Bentinho foi até a porta e gritou: – Viu seu safado, quem ri por ultimo ri melhor! Em seguida deu uma gargalhada e retornou para dentro da casa ainda enfumaçada.

Quando já se deitava na rede, notou que na sua pressa, o Saci tinha esquecido a toca cheia de pipoca.

O dia seguinte amanheceu fazendo muito frio, e Bentinho resolveu dormir até mais tarde.

Assim que o sol começou a surgir, escutou um choro.

Saiu para o quintal, e viu o saci chorando.

– Porque chora seu peralta? – Perguntou Bentinho.

-É que eu estou com muito frio. Por favor, seu moço me devolva minha toca. Sem ela eu não tenho magia.

– Então você esta querendo a toca de volta, para continuar aprontando das suas em?

– Não seu moço, eu prometo não fazer mais artes.

– Se for assim eu devolvo.

Depois de colocar a toca na cabeça, o Saci agradeceu e se foi. Daí em diante ninguém mais ouviu falar nele!

***

– Tio, amanhã a dona Anta vai contar uma estória do bicho papão, será que ele existe mesmo?

– Já faz muito tempo que não ouço falar nele! – Respondeu Odoro.

– Há muito tempo atrás, o rei Leão autorizou o Bicho Papão comer todas as crianças desobedientes.

Com medo do Bicho Papão, as crianças se tornaram boas, e não desobedeciam mais seus pais.

Desta forma aconteceu que o Bicho Papão ficou sem alimentação, pois o rei tinha autorizado ele comer somente as crianças teimosas.

Com fome; Bicho Papão que era cheio de astúcia, resolveu fazer uma festa. Sua intenção era convidar todos os animais, e come-los um a um.

O Bicho Preguiça ficou incumbido de entregar os convites.

Quando chegou o dia da festa, nenhum convite ainda tinha sido entregue.

E o bicho papão desiludido, virou uma fera.

Chamou o Bicho Preguiça de lerdo, de irresponsável… E o Bicho Preguiça chateado com as ofensas respondeu:

– Se você ficar me criticando, e me apressando; eu não vou entregar droga de convite nenhum.

Então o Bicho Papão se afastou resmungando, mas não desistiu.

No dia seguinte, resolveu organizar uma nova festa.

Desta vez, o macaco que era mais ágil, é quem iria entregar os convites.

Só tinha um inconveniente, precisavam de um barco, pois a festança seria em uma ilha.

E os animais da floresta, sem desconfiar das intenções do Bicho Papão, começaram a trabalhar na construção do barco.
No dia da festa, o Pavão apareceu todo empolgado com sua plumagem colorida.

O Coelho e dona Coelha, davam saltos de alegria.

Todos entraram no barco e seguiram em direção a ilha.

A festa estava animada…. A bicharada dançava, pulava e batia palmas.

O macaco batucava, a cigarra chiava, a coruja cantava e tocava sanfona, e o bode corria entre os convidados, fazendo a maior farra.

E o Bicho Papão em um canto, Matutava:

– Vou embebedar a todos… Assim será mais fácil come-los!

O Gambá foi o primeiro a ficar bêbado, e queria brigar com o Tatu.

Então Bicho Papão apartou a briga e disse:

– Eu levarei o compadre ao riu para se refrescar. Abraçou-se ao Gambá e se afastaram. – Este é o primeiro que vou comer, – pensou ele.

Assim que chegaram ao rio, viu que tanto ele quanto o Gambá estavam fedendo.

Por mais que o esfregasse aquele mau cheiro persistia. Varias vezes tentou engolir o gambá, chegou até a tapar o nariz, mas quando se aproximava com a boca aberta, sentia o fedor, fazia ânsia e se afastava.

Depois de muito tempo dentro da água gelada, o bicho papão começou a espirrar. – Atichim… Atichim… Revoltado, e com fome, abandonou o bêbado em um canto, e decidiu voltar para o baile.

Antes, porem, resolveu soltar o barco na correnteza.

Enquanto desamarrava o barco dizia: – Agora ninguém mais sai daqui. E quando eu sarar desta gripe, vou comer todos, um após o outro.

Mas o Pavão que estava de ressaca, foi beber água no rio. Ao ouvir o que o bicho papão dizia, voltou voando para a festa, e lá chegando contou para bicharada o que tinha visto e ouvido.

De madrugada a coruja começou a cantar um estranho refrão:

– Coitado de quem não sabe?

E a bicharada respondia: – Ainda bem que estou sabendo!

E o refrão continuava. – Coitado de quem não sabe…! – Ainda bem que estou sabendo…

– Atichim… Que musica é esta? – Perguntou o Bicho Papão.

– Então o compadre não sabe? – Vem vindo um temporal ai, e o vento vai levar tudo pelos ares – respondeu o macaco.

– Não diga! E como eu farei compadre? Eu não quero ser levado pelo vento! – Disse o Bicho Papão temeroso.

– Nós vamos nos amarrar nas arvores! – Informou o macaco.

– E o compadre pode me amarrar?- Perguntou o Bicho Papão.

-Sim! Só que você será o ultimo! – Falou o macaco, que era muito maroto.

– Eu sendo o dono da festa, tenho o direito de ser amarrado primeiro! – Questionou o Bicho Papão.

– Então vamos consultar os convidados, – disse o macaco. – Se todos estiverem de acordo, faremos a sua vontade!
Só tem um inconveniente, precisamos de um cipó bem forte.

-Pode deixar que eu pego o cipó! – Falou o bicho papão.

Entrou na floresta, e logo retornou com uma braçada de cipó.

Então os animais amarraram o Bicho Papão em um tronco, e lhe deram uma surra com vara de marmelo.

Depois jogaram o tronco na correnteza.

E o Bicho Papão se foi rio abaixo.

Se ainda existe não sei. Mas que existiu, existiu! Isso eu falo e afirmo! – Disse Odoro.

Fontes:
Colaboração do autor. http://www.autores.com.br/
Saci Pererê = http://centoeuma.com.br/
Bicho-Papão = http://www.jangadabrasil.com.br/

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Arquivado em Literatura Infantil

Sandra M. Júlio (Amanhecer dos Sonhos…)

Pintura à óleo de Angela Kelly Topan
Hoje, minhas letras choram a inquietude desta ausência… Desconhecendo toda lógica, adentram à cumplicidade da solidão em horizontes que transcendem sonhos e desilusões.

Escrevem-se com a transparente tinta da saudade imortalizando instantes quando, à mercê da noite, pensamento e fantasia beijaram-me os lábios, adormecidos na carência das tuas digitais… Momentos que ainda refletem no espelho dos meus olhos uma lágrima pacífica ao anseio de incansáveis esperas.

Esperança se faz paisagem, estação para cansados hiatos que ainda esculpem o cotidiano de cada dia.

Entre as treitas do sorriso, palavras aprimoram rimas num asfixiar de lamentos onde a covardia negou à realidade, sonhos…

Sob uma vírgula, emoção esconde a semente da alegria. Vacilo onde se oculta o pecado da felicidade.

Tanto de mim… quanto de ti, compondo a sinfonia de nossas vidas… Uma sinfonia vazia de tons e pautas onde caminhos e escolhas são apenas crenças da falibilidade de convicções e verdades.

No cansaço do olhar, a brisa de todas as estações ignoram o farfalhar do tempo e, nesta desordem a razão escreve seus tolos ditames.

Tropeço porém no pulsar do coração… Na essência desnuda que só às estrelas é dado conhecer, quando desabitada de mim, a elas entrego-me.

Hoje, introspectivas, minhas letras vasculharam universo, paraíso e inferno, onde o presente alicerça a magia da solidão, mesmo sabendo que em outros silêncios existem janelas abertas ao amanhecer de novos sonhos.

Fonte:
Colaboração de Douglas Lara.
http://www.sorocaba.com.br/acontece

Pintura = fotografia de José Feldman

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I Seminário de Direito Militar em Curitiba

Segundo Centro Integrado de Defesa Aérea e
Controle de Tráfego Aéreo
OBJETIVO:

O I Seminário de Direito Militar no CINDACTA II tem por objetivo proporcionar o exame de temas jurídicos afetos ao quotidiano das Organizações Militares no que tange à seara do direito penal militar, direito processual penal militar, direito administrativo militar e legislações correlatas; bem como, promover integração entre as assessorias jurídicas das Forças Armadas e Ministério da Defesa.

PÚBLICO-ALVO:

Adjuntos, Assistentes e Assessores Jurídicos que atuam no âmbito do Ministério da Defesa, Militares das Forças Armadas e das Polícias Militares, Professores de Escolas Militares e Universidades, Acadêmicos de Direito e Convidados.

DATA:
4 e 5 de Março de 2009.

LOCAL:
Auditório 14 BIS no CINDACTA II
Rua Pref. Erasto Gaertner, 1000
Curitiba – PR

PROGRAMA:

4 DE MARÇO DE 2009 – (QUARTA-FEIRA)

12h40min às 13h40min – Credenciamento dos participantes.
13h40min – Solenidade de Abertura.
14h00min – Palestra de Abertura
Tenente-Brigadeiro-do-Ar Flávio de Oliveira Lencastre
Ministro Presidente do Superior Tribunal Militar (STM)
Tema: “Justiça Militar da União”.

14h40min – Palestra
Coronel Aviador Leonidas de Araújo Medeiros Junior
Comandante do CINDACTA II
Tema: “Segundo Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo – CINDACTA II – Estrutura e Missão”.

15h10min às 15h30min – Intervalo para o Café.
15h30min – Palestra
Dr. Alexandre Augusto Quintas
Juiz-Auditor Substituto da Auditoria da 5ª Circunscrição da Justiça Militar
Tema: “Questões controvertidas atinentes à lavratura do Auto de Prisão em Flagrante Delito”.

16h10min – Debates.
16h30min – Palestra
Dr. Alexandre Reis de Carvalho
Promotor de Justiça Militar – Procuradoria de Justiça Militar em Curitiba-PR
Tema: “A atuação do Ministério Público Militar em decorrência do recebimento de notícia-crime e denúncia apócrifa”.

17h10min – Debates.
17h30min – Encerramento do 1º dia.

5 DE MARÇO DE 2009 – (QUINTA-FEIRA)

8h30min – Palestra
Dr. Sérgio Fernando Moro
Juiz Federal da 2ª Vara Criminal de Curitiba – Seção Judiciária do Paraná
Tema: “Considerações acerca do parágrafo 2º, do art. 142, da Constituição da República Federativa do Brasil: não cabimento de habeas-corpus em relação a punições disciplinares militares”.

9h10min – Debates.
9h30min – Palestra
Dra. Lucélia Biaobock Peres de Oliveira
Procuradora-Chefe da União no Paraná
Tema: “Representação em juízo das Organizações Militares e de seus agentes, promovida pela Advocacia Geral da União”.

10h10min – Debates.
10h30min às 10h50min – Intervalo para o Café.
10h50min – Palestra
Dr. Marcelo José Araújo
Advogado Especialista em Trânsito, Professor de Direito de Trânsito e Assessor Jurídico do Conselho Estadual de Trânsito do Paraná
Tema: “Trânsito e Forças Armadas – Polêmicas e Curiosidades”

11h30min – Debates.
11h50min – Intervalo para o Almoço (livre).
14h30min – Palestra
1º Tenente QCOA SJU Inayá Potyra F. Fortes Oliveira
Consultoria Jurídica-Adjunta do Comando da Aeronáutica (COJAER)
Tema: “Necessidade do Legal Advisor no Teatro de Operações – entendimento consolidado na Força Aérea Brasileira”.

15h10min – Debates
15h30min – Palestra de Encerramento
Dr. Flávio Flores da Cunha Bierrenbach
Ministro do Superior Tribunal Militar (STM)
Tema: “Forças de Paz: A participação brasileira em missões da ONU e os aspectos legais”.

16h10min – Debates.
16h30min – Solenidade de Encerramento.

INSCRIÇÕES GRATUITAS:

Através de e-mail contendo Nome, Posto/Graduação, Cargo/Função, Organização Militar/Órgão Público, Entidade de Ensino (se for o caso), número de telefone e endereço de e-mail para seminariodireitomilitar@gmail.com até 02/03/2009.

INFORMAÇÕES:
(41) 3251-5280
Assessoria Jurídica do CINDACTA II

Fonte:
Colaboração do Dr. Valter M. Toledo

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Clauder Arcanjo (Uma Romântica!)

Entrou em casa, resolvera verificar pessoalmente. Uma vontade de desmascarar as fuxiqueiras do bairro. “Desocupadas! Mal-amadas! Sim, mal-amadas!”

Abriu a porta da frente, e correu os olhos pela sala. Tudo no seu lugar: a poltrona recém-comprada, em doze prestações; a cristaleira ainda do casamento, presente da madrinha Maria das Neves; o tapete ao centro, e o televisor, onde ela assistia aos amores das oito. “Uma romântica!”

Mais alguns passos, o corredor que levava aos quartos. Apenas o silêncio. Àquela hora, sabia-a na casa da mãe. Todas as manhãs, pontualmente, às nove, lá estava. Muitas vezes ficava para o almoço. Odiava a solidão, dizia-lhe.

Quando abriu a porta do quarto de casal, um aperto no coração. A cama bem arrumada, os lençóis vermelhos, e o bicho de pelúcia junto aos travesseiros. “Uma romântica!”

Sentou-se no banquinho junto ao espelho, deu por uns olhos fundos a espiá-lo. “Sou eu!?…” A cabeça tomada pelos comentários da rua. “Abra o olho, seu Domingos! Abra o olho, homem!…”

Deitou-se na cama. De repente, as lágrimas, num choro convulso, enorme. Ao cheirar-lhe o baby-doll, o desabafo, em desespero:

– Uma safada! Uma safada!…
===================
Sobre o Autor
Antonio Clauder Alves Arcanjo (Clauder Arcanjo) é cronista semanal, resenhista literário – sob o heterônimo Carlos Meireles – e colaborador de sites, revistas e jornais de várias partes do País.

Fonte:
Literatura – Revista do Escritor Brasileiro n° 35 – Ano XVII, setembro de 2008
http://literaturarevistadoescritor.blogspot.com/

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Pedro Dubois (Humano)

Na sujeição a fraqueza
como relógio emociona.
O choro declarado repõe
a sensibilidade. Simplifica.
Dignifica. Democratiza.
A lágrima não derramada
inunda o sentido: desanda
a máscara. Amoldada.
A criança ressurgente
diz do tempo. Sujeito
objetado à história.
Desfeito efeito.
Dispostos versos
no marco do crescimento:
trajeto e obstáculo.
Desacompanhada sombra
em que o vulto se certifica
como humana forma.

Fonte:
Colaboração do autor

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Arquivado em O poeta no papel

Dicionário de Folclore (Letra A)

Este DICIONÁRIO DE FOLCLORE PARA ESTUDANTES foi uma idéia da professora Rúbia Lóssio, estagiária na Coordenadoria de Estudos Folclóricos, do Instituto de Pesquisas Sociais, da Fundação Joaquim Nabuco.

A professora Rúbia Lóssio, no exercício de sua profissão, sempre constatou a existência de dificuldades, da parte de seus alunos, que não dispunham de um dicionário de folclore, que usasse uma linguagem mais acessível, e no qual as manifestações folclóricas fossem verbeteadas com simplicidade e clareza.

Achei a idéia interessante e, de parceria, começamos a elaborar este dicionário, procurando não confundir o aluno com teorias, divergências de pontos de vista entre os autores, procurando sempre descomplicar os assuntos, omitindo a paternidade autoral, sem confundir, procurando eliminar dúvidas.

Trabalho feito a quatro mãos, este dicionário, gerado na Fundação Joaquim Nabuco, como não poderia deixar de acontecer, terá seus possíveis desacertos, que serão corrigidos nas próximas edições, quando apontados pelos estudiosos no assunto.

Como todo mundo sabe, não existe nada completo, nada perfeito e, assim sendo, este dicionário não poderia ser a exceção de uma regra universal.

Assim, esperamos nós, seus autores, que este DICIONÁRIO DE FOLCLORE PARA ESTUDANTES tenha o mérito de ser pioneiro na sua especialidade e que seja compreendido o nosso esforço, esforço este que consumiu bastante tempo, com a finalidade de ser preenchida uma lacuna e de havermos feito um trabalho à altura da necessidade existente.
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ABC. São quadras ou sextilhas que começam com cada uma das letras do alfabeto. Os ABCs são muito antigos no mundo todo. Usados na literatura popular em versos, também conhecida como literatura de cordel (veja LITERATURA DE CORDEL), os ABCs contam a vida de heróis populares, estórias de cangaceiros valentes, de santos, de estadistas famosos.
ABACAXI. É uma fruta muito saborosa e seu nome também é dado às pessoas que não sabem dançar e pisam os pés do parceiro. É como também se nomeiam os problemas de difícil solução.
ABAFA-BANANA. Quando as bananas estão ficando amarelas são colhidas, amontoadas e cobertas com as folhas secas da bananeira, para que fiquem bem madurinhas. Essa é a razão pela qual abafa-banana é o nome que se dá às roupas masculinas (os ternos) feitas de tecidos grossos, quentes, pesados como a casemira, impróprios para nosso clima tropical, mas que eram usados nas décadas de 30 a 50, aqui, no Nordeste.
ABAFO. É o frevo-de-rua, conhecido por frevo-de-encontro, no qual os trombones predominam. É chamado de abafo porque abafa o som da orquestra de outro clube de frevo que se encontre nas imediações.
ABOIO. É um canto triste, geralmente com poucas e alguns até sem palavras, entoado pelos vaqueiros quando conduzem a boiada. Alguns vaqueiros, entretanto, improvisam versos como no aboio cantado: “- Ei, boi!./ Ei, vaca malhadinha!…”
ABRE-ALAS. 1. É o carro alegórico que simboliza a escola de samba e, no desfile, vem em seguida à Comissão-de-Frente; 2. O Abre-Alas, de Chiquinha Gonzaga, foi a primeira canção do carnaval carioca (1899).
ABRIDEIRA. É o começo de tudo: a primeira dança, o primeiro copo de bebida, o primeiro prato do almoço ou do jantar. E saideira é o último copo, a última rodada, quando a reunião vai terminar.
ABUSÃO. É a superstição que o povo tem de fazer ou não alguma coisa. Por exemplo: a) deixar o chinelo emborcado, a mãe pode morrer; b) passar por baixo de uma escada não é bom, podem acontecer desgraças na vida da pessoa; c) abrir-a-boca (bocejar) e não fazer o sinal da cruz, o diabo pode entrar.
ACADEMIA. 1. É um jogo ginástico infantil, muito antigo, no qual a criança pula com um pé só, para apanhar a pedrinha que jogou do primeiro até o último quadrado. Em outras partes do país o jogo também é conhecido como amarelinha, cademia. 2. Nome que se dá ao coro masculino de uma escola de samba.
ACALANTOS. Os acalantos são cantados pelas mães do mundo todo para adormecer seus filhos: 1. “Boi, boi, boi/Boi da cara preta/Vem pegar este menino/Que tem medo de careta”; 2. “Xô, xô, pavão/Sai de cima do telhado/Deixe meu filho dormir/Seu soninho sossegado”; 3. “Nanai, meu menino/Nanai meu amor/A faca que corta/Dá talho sem dor”. O mesmo que cantiga-de-ninar, berceuse, cantiga-pra-botar-menino-pra-dormir.
ACARAJÉ. É um bolo de feijão–fradinho com molho de pimenta-malagueta, cebola, camarão. Muito vendido em tabuleiros e barracas de Salvador, é considerado um prato da culinária baiana.
ADÁGIO. O adágio é uma das fórmulas clássicas da sabedoria popular. Tem forma rítmica, com sete sílabas. Os brasileiros não fazem diferença entre adágio, anexim, rifão, máxima, ditado, dito, e não obedecem ao número de sílabas. Exemplos: Pimenta nos olhos dos outros é refresco, Filho de burro um dia dá coice, Pé de galinha não mata pinto, Quem anda na garupa não pega as rédeas, Sombra de pau não mata cobra, Mulher de janela, nem costura nem panela.
ADIVINHAÇÃO. A adivinhação é universal. Pode ser em prosa, como: “O que é, o que é? Cai em pé e morre deitado? (chuva)”; “O que é, o que é? Tem quatro pés, mas não anda? (mesa)”; “O que é, o que é? Nasce grande e morre pequeno? (vela, lápis)”; “O que é, o que é? De dia está no céu (da boca) e de noite está na água (no copo)? (dentadura)”. A adivinhação pode ser em verso, como a do vinho e do vinagre: “Somos iguais no nome,/ Desiguais no parecer;/ Meu irmão não vai à missa,/ E eu não posso perder,/ Entre bailes e partidas,/ Todas lá me encomendarão;/ Nos trabalhos de cozinha/ Isso é lá com meu irmão”.
ADIVINHANDO–CHUVA. Quando um menino está trelando muito, ou um adulto apronta alguma arte, diz-se que estão adivinhando chuva.
ADUFE. É um pandeiro quadrado, oco, feito de madeira leve, coberto com dois pergaminhos delgados, tocado com todos os dedos, menos o polegar que serve para sustentá-lo.
AFOXÉ. Cordão carnavalesco de negros na Bahia, trajando roupas principescas de fazendas brilhantes, entoando canções de candomblé na língua nagô ou ioruba.
AGOGÔ. É um instrumento musical de origem africana, usado nos candomblés. É uma dupla campânula de ferro na qual se bate com uma varinha de metal, cada campânula produzindo um som diferente. Também é usado nas orquestras de carnaval, principalmente quando estão tocando o maracatu pernambucano.
AGOURO. Veja ABUSÃO
AGOSTO. É o oitavo mês do ano. No mundo todo agosto é conhecido como o mês da desgraça, da infelicidade, quando coisas horríveis acontecem com as pessoas. Não é bom casar, viajar, fazer negócios, mudar de casa, durante o mês de agosto, porque nada dá certo.
AGUARDENTE. Bebida de alto teor alcoólico, obtida pela destilação de frutos, cereais, raízes, sementes, etc. A mais conhecida é a aguardente feita de cana-de-açúcar.
AIPIM. É o nome que se dá à macaxeira, mandioca doce. No Nordeste, o aipim é mais conhecido como macaxeira. Os índios faziam vinho de aipim, muito bom para o fígado, servido nas festas dos indígenas brasileiros. No Nordeste, quando um homem conduz uma mulher e consente que ela caminhe pela extremidade da calçada, é chamado de macaxeira. A mulher deve ficar sempre à direita de quem vem e à esquerda de quem vai.
AJUDAR-A-MORRER. No sertão nordestino quando alguém está sofrendo muito, custando a morrer, sua família chama o ajudador, uma pessoa que, conforme o nome está dizendo, ajuda o doente a morrer mais depressa, cantando incelença, rezando. Veja INCELENÇA.
ALAMOA. A alamoa aparece na Ilha de Fernando de Noronha. É uma mulher de cor branca, de longos cabelos louros, nua, para tentar os pescadores. Os homens vêem a alamoa, ficam apaixonados por sua beleza e, de repente, ela se transforma num esqueleto horrível, perseguindo quem foge dela. A alamoa mora no Pico, uma elevação rochosa situada no Arquipélago. Toda sexta-feira a Pedra do Pico se abre e, na chamada ponta do Pico, aparece uma luz que atrai as mariposas e os homens que se encontram nas imediações.
ALCEU MAYNARD ARAÚJO nasceu no dia 21 de dezembro de 1913, na cidade de Piracicaba, SP. Formou-se professor em 1930 e veio para São Paulo, ingressando no Curso Colegial e Científico do Colégio Ipiranga. Em 1944 bacharelou-se na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, depois do que exerceu diversas funções e pertenceu a diversas entidades. Na área do Folclore publicou: Cururu (1948), Danças e ritos populares de Taubaté (1948), Folia de Reis de Cunha (1949), Rondas infantis de Cananéia (1952), Literatura de cordel (1955), Ciclo agrícola, calendário religioso e magias ligadas às plantações (1957), Poranduba paulista (1958), Folclore do mar (1958), Medicina rústica (1961), Novo dicionário brasileiro – verbetes de folclore (1962), Folclore nacional (1964), Pentateuco nordestino (1971), além de muitos ensaios e artigos na imprensa brasileira e revistas especializadas. Já é falecido.
ALECRIM. É uma planta usada na medicina popular para curar tosse, rouquidão, falta de ar. Combate o mau-olhado.
ALFAZEMA. É uma planta com a qual se faz um perfume tradicional e é usada, também, para que o enxoval dos recém–nascidos fique cheiroso. No quarto da parturiente, a tradição manda queimar alfazema. Também é usada nos banhos de cheiro.
ALFELÔ. É um dos doces dos mais antigos trazidos pelos árabes para a Espanha e Portugal. Os colonizadores portugueses trouxeram o alfelô para o Brasil. É ainda vendido em algumas cidades do Nordeste. É uma pasta de mel em ponto grosso, “puxado” até clarear; depois se fazem colunas finas, embrulhadas em papel colorido. Quando o alfelô é feito com mel de engenho passa a ser chamado de puxa–puxa. É uma delícia.
ALFENIM. É um doce popular, feito de massa de açúcar muito branquinha, em forma de flor, sapato, cachimbo, peixe, etc. Foi trazido pelos árabes para Portugal e Espanha. Os colonizadores portugueses trouxeram o alfenim para o Brasil.
ALFINETE. O alfinete está ligado a muitas superstições, dentre as quais, as seguintes: alfinete apanhado no chão, dá felicidade no dia em que é apanhado; alfinete que foi usado em vestido de noiva deve ter a ponta cortada e ser atirado fora para não ser utilizado por outra pessoa, para não diminuir a felicidade da noiva. Alfinetes também são o dinheirinho que os maridos dão às esposas para as suas pequenas despesas. Dois alfinetes amarrados em cruz, com linha preta, trazem a desgraça para a casa onde forem escondidos. Para acabar com o feitiço é bom, a pessoa que achou, urinar neles.
ALHO. O alho combate a tosse em forma de chá ou lambedor, e a dor de dente quando colocado na cavidade do dente. O cheiro do alho afasta todas as feitiçarias e onde houver alho não haverá bruxaria por perto. Os lobisomens e as mulas sem cabeça fogem do alho como o Diabo da cruz.
ALPARCATA. É uma sandália de couro presa aos pés por meio de uma correia. No Nordeste sertanejo a alparcata geralmente é leve, de couro cru, chamada de alparcata de rabicho. Os frades costumam usar alparcatas que são os sapatos mais baratos. Na linguagem popular essa sandália também é conhecida como alpargata, alpercata, alpregata, pregata, pracata.
ALPARGATA. Veja ALPARCATA
ALPERCATA. Veja. ALPARCATA
ALPREGATA. Veja ALPARCATA
ALTIMAR PIMENTEL nasceu no dia 30 de outubro de 1936, na cidade de Maceió, AL, havendo exercido as seguintes funções: diretor do Teatro Santa Rosa (João Pessoa), diretor do Departamento de Extensão Cultural da Paraíba, coordenador do Núcleo de Pesquisa e Documentação de Cultura Popular da Paraíba, diretor da Rádio Correio da Paraíba, assessor cultural do Instituto Nacional do Livro (Rio de Janeiro), assessor cultural da Pró-Reitoria para Assuntos Comunitários da UFPB (1977-1979), assessor administrativo da Câmara dos Deputados (Brasília, 1980), membro do Conselho Estadual de Cultural da Paraíba (1963), secretário do Conselho Consultivo de Alto Nível do Instituto Nacional do Livro (Rio de Janeiro, 1969), redator da Coordenação do Ministério da Agricultura (Brasília, 1974), assessor de imprensa do Ministério da Agricultura (Brasília, 1975), assessor de divulgação de Imprensa e relações públicas da Câmara dos Deputados (Brasília, 1975), do jornal Correio Braziliense (Brasília, 1976), da Agência de Notícias dos Diários Associados (Brasília, 1976), do Jornal e da Rádio Correio da Paraíba (João Pessoa, 1970/76). Publicou, na área do Folclore, O coco praieiro (1968), O Diabo e outras entidades míticas no conto popular (1969), O mundo mágico de João Redondo (1971), Estórias da boca da noite (1976), Saruã, lenda de árvores e plantas do Brasil (1977), Barca da Paraíba (1978), Catálogo prévio do conto popular da Paraíba (1982), Estórias de Cabedelo (1990), Estórias de São João do Sabugi (1990), Incantion (Flórida, USA, 1990), Estórias do Diabo (1995), Estórias de Luzia Tereza (1995), Contos populares brasileiros – Paraíba (1996), Contos populares de Brasília (1998), Como nasce um cabra da peste (adaptação teatral do livro de igual título, de Mário Souto Maior, 1997). Autor de várias peças teatrais, Altimar Pimentel também publicou muitos ensaios e artigos na imprensa brasileira.
ALUÁ. É uma bebida de milho ou de abacaxi, depois de fermentados. Usa-se, também, principalmente em Pernambuco, o aluá feito com arroz. No Ceará, o aluá é feito com milho torrado, fermentado com água e rapadura que, em Pernambuco, recebe o nome de quimbembé.
ALVÍSSARAS. Recompensa que se dá à pessoa que traz boas notícias ou que entrega coisas perdidas.
AMADEU AMARAL nasceu no dia 6 de novembro de 1875, em Monte-Mor, SP. Fez o curso primário em Capivari. Com onze anos de idade, em 1888, foi para São Paulo trabalhar como menino de recados na firma Lion & Cia. Sabe-se que freqüentou o curso anexo da Faculdade de Direito, trocando-o pelo de Jornalismo que trazia nas veias como herança de seu pai, João de Arruda Leite Penteado, fundador da Gazeta de Capivari (1885). Foi auto-didata. Começou a trabalhar no Correio Paulistano e, em seguida, em O Estado de São Paulo, foi oficial de gabinete do Chefe de Polícia, trabalhou na Secretaria de Justiça de São Paulo. Em 1922, mudou-se para o Rio de Janeiro, secretariando a Gazeta de Notícias, foi Diretor do Imposto de Renda e, transferido para Belo Horizonte ou Porto Alegre, resolveu pedir demissão. Retornou a São Paulo, nomeado diretor do Ginásio Moura Santos (1927/8). Foi membro da Academia Brasileira de Letras, na vaga de Olavo Bilac (1919) e da Academia Paulistana de Letras. Jornalista, poeta, novelista, conferencista, folclorista, Amadeu Amaral publicou vários livros. Na área de Folclore, são de sua autoria, O dialeto caipira (1920), A poesia da viola (1921) e Tradições populares (obra póstuma, 1948). Faleceu em São Paulo, no dia 24 de outubro de 1929.
AMARELINHA. Veja ACADEMIA.
AMAZONAS. São mulheres indígenas, guerreiras, exímias cavaleiras, sem marido, que amputavam um dos seios para melhor empunharem seus arcos e flechas. Foram avistadas, pela primeira vez, em 24 de junho de 1541, por Frei Gaspar de Carvajal, na foz do Rio Jamundá, na Amazônia.
AMENDOIM. Também conhecido por mendobi, mandubi, amendoí, menduí, manobi, midubim, o amendoim, assado ou cozinhado, com sal, é consumido no mundo inteiro também como tira-gosto nos cock-tails. Conta a tradição que o amendoim só deve ser plantado por mulheres. Plantado por homem, ele não nasce.
AMIGA. É um prato feito com o caldo do feijão, engrossado com farinha, temperado com pimenta, cebola, a gosto da pessoa. Também tem o nome de remate e, no Recife, é conhecido como apito.
AMULETO. É toda medalha, inscrição, bentinho, venera, figa, figura ou qualquer objeto que se traz pendurado no pescoço ou na roupa, com um broche, para prevenir as doenças, curá-las, destruir os malefícios e desviar as calamidades. É usado por todos os povos desde o começo do mundo.
ANDAR. Tem menino que custa a andar. Para que ele comece a andar é bom fazê-lo caminhar em volta de sua casa nas três primeiras sextas-feiras durante três meses seguidos. Ou segura-se a criança pelas mãos, dizendo-se, três vezes: – “Vamos para a missa, menino!”
ANEL. Feito de metal, de madeira, de osso, de plástico ou de vidro, o anel é usado há séculos como adorno ou com um significado especial por todos os povos. A aliança é usada pelos noivos no dedo anular da mão direita e, pelos casados, no da mão esquerda. As viúvas passam a usar as duas alianças no mesmo dedo. Na linguagem infantil, os dedos têm outros nomes: o polegar é o cata-piolho, o indicador é o fura-bolo, o médio é o maior de todos, o anular é o senhor vizinho, o mínimo é o mindinho. Os meninos costumam brincar de anel. Faz-se uma roda de meninos e meninas e um deles, com um anel entre as mãos, vai passando pelas mãos dos outros e, entre as mãos da pessoa de sua preferência, namorado ou namorada quase sempre, deixa o anel. Depois um deles é argüido: “- Onde é que está o anel?”. Se o indagado disser com quem está o anel, ele continuará a brincadeira, passando o anel. Se errar, sai da brincadeira, leva um bolo ou outro castigo.
ANEXIM. Veja ADÁGIO.
ANGU. É uma papa mole de fubá de milho ou de farinha de mandioca, feita com água e sal, ou com leite, ou caldo de peixe, de carne ou de camarão para se comer com guisado ou carne assada. Também se faz o angu, no Nordeste, de outra maneira: somente à base de milho, do xerém (angu doce, na ceia, e salgado, para ser comido com carne).
ANJINHOS. São anéis de ferro, com parafusos, presos a uma tábua, para apertar os polegares dos criminosos e fazê-los confessar seus crimes. Também foram usados no tempo da escravidão.
ANJO. Diz-se das criancinhas quando morrem. Como não chegaram a pecar, vão para o céu e são anjos.
ANJO DA GUARDA. É o anjo que Deus dá a cada pessoa quando nasce, para protegê-la, defendê-la, mostrando sempre o caminho do bem. Antes de dormirem, as mães costumam rezar, com seus filhos, a oração do anjo da guarda: “Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador, que a ti me confiou a piedade divina, sempre me rege, guarde e governe e ilumine. Amém”. Ou “Amigo bom, Anjo de Deus, vinde guiar os passos meus. Fazei-me uma boa criança”.
ANO-NOVO. Celebrado com muita festa, muita comida, muita bebida e dança, a festa do Ano-Novo é comemorada no primeiro dia do ano que começa, representado por uma criança recém-nascida, enquanto que o ano velho, o que passou, é representado por um velho de longas barbas e de andar trôpego, apoiado num bastão. O povo criou uma série enorme de crendices e superstições ligadas à entrada do Ano-Novo. No primeiro minuto do Ano- Novo, a pessoa deve estar com uma cédula de maior valor na mão direita ou no sapato do pé direito para dar o primeiro passo para ser feliz e nunca lhe faltar dinheiro. Deve estar vestida de branco (influência dos cultos afro-brasileiros) ou de amarelo, que é a cor do ouro. Rompido o Ano-Novo, a pessoa deve dar o primeiro passo com o pé direito. Também é bom fazer o seguinte: 1. Comer sete caroços de romã e guardar as sementes na carteira para garantir um ano sem aperto; 2. Usar roupas novas, inclusive as íntimas; 3. Comer carne de porco, porque o porco fuça para frente, evitando carne de peru, que cisca para trás; 4. Guardar a rolha da garrafa de champanhe num lugar que ninguém possa descobrir; 5. Trocar toda a roupa da cama; 6. Fazer muito barulho, gritar, quando romper o ano, que é para afugentar os maus espíritos; 7. Jogar moedas da calçada para dentro de casa, para atrair dinheiro; 8. Livrar-se de tudo quanto for velho, quebrado, imprestável; 9. Acender todas as luzes da casa para receber um Ano-Novo cheio de luz e de alegria.
ANTÔNIO, Santo. Fernando de Bulhões nasceu em Lisboa, Portugal, no dia 15 de agosto de 1195. Ingressou na Ordem de São Francisco em 1220 e, como frade, recebeu o nome de Antônio. Faleceu no dia 13 de junho de 1231, em Arcela, perto de Pádua, na Itália. É um dos santos mais populares não somente em Portugal como também no Brasil. É considerado como santo casamenteiro. Quando as moças não encontram rapazes para casar fazem promessas a Santo Antônio e muitas delas conseguem um marido. Santo Antônio também ajuda a encontrar as coisas perdidas. Os escravos africanos pintaram de preto uma imagem de Santo Antônio que passou a ser conhecido como Santo Antônio dos Pretos.
ANTÔNIO SILVINO. Era este o nome de guerra de Manuel Batista de Moraes, nascido em Afogados da Ingazeira, PE, em 1875. Como o assassino de seu pai não foi preso, Antônio Silvino procurou fazer justiça com as próprias mãos, à sua maneira. Durante quatorze anos foi o governador do Sertão. Era um cangaceiro que respeitava as mulheres, distribuía dinheiro, tomado dos ricos (as moedas), com os pobres. Vivia sempre perseguido pelas forças policiais de vários estados do Nordeste. Foi ferido em combate em Taquaritinga, PE, no dia 28 de novembro de 1914 e preso. Depois de cumprir quase toda a pena a que fora condenado, Antônio Silvino morreu em Campina Grande, PB, em agosto de 1944. Muitos folhetos de feira foram escritos pelos poetas populares sobre sua valentia, seus combates, sua vida.
APARTAÇÃO. No sertão, o gado é criado solto. As vacas e os bois são ferrados com a marca do dono. E, depois do inverno, o gado é reunido pelos vaqueiros das fazendas para ser entregue aos seus donos. É a apartação, uma das melhores festas do sertão, com muita comida, baile, reunindo vaqueiros e fazendeiros. Acontece, então, a vaquejada. Veja VAQUEJADA.
APITO. É um pequeno instrumento de sopro, usado pelo regente de uma orquestra, para avisar o início do toque de um frevo e, também, pelo mestre da bateria das escolas de samba. Veja AMIGA.
ARANHA. Diz o povo que quando Nossa Senhora, com São José e o Menino Jesus iam fugindo para o Egito, perseguidos pelos soldados de Herodes, esconderam-se em uma gruta e uma aranha teceu uma teia na entrada e os soldados não acharam os fugitivos, razão pela qual Nosso Senhor abençoou a aranha e sua teia. Não é bom desmanchar uma teia de aranha porque ela traz felicidade. Botando uma aranha num saquinho de pano e pendurando esse saquinho no pescoço de uma pessoa que sofra de algum mal na garganta, essa pessoa ficará curada.
ARARA. É uma dança engraçada. Todos os pares estão dançando, menos um rapaz que, em determinado momento, grita: Arara! Todos os rapazes trocam suas damas e quem ficar sem dama para dançar é o novo arara.
ARCO-ÍRIS. Também conhecido como arco, arco celeste, arco-da-chuva, olho de boi, arco-da-velha, o arco-íris não é muito amigo dos agricultores porque ele bebe a água dos rios, dos açudes, das lagoas. Para acabar com o arco-íris costumam fazer filas de pedrinhas, de gravetos, pauzinhos e ele vai embora porque não gosta de linhas retas.
ARENGA-DE-MULHER. Diz-se, no Nordeste, da chuva fraca, fina, insistente, que não pára.
ARGUEIRO. Para retirar um argueiro do olho nada como esfregar a pálpebra e dizer: “Vai-te argueiro, pro olho do companheiro”! Ou então botar uma semente de alfavaca na pálpebra e esfregá-la.
ARIANO SUASSUNA nasceu no dia 16 de junho de 1927, na cidade de João Pessoa, PB. Fez o primário em Taperoá, PB. Concluiu o curso de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Recife (PE), em 1946. Professor de Estética e Teoria do Teatro na Universidade Federal de Pernambuco, foi poeta e, quando ainda era estudante de Direito, fundou, com Hermilo Borba Filho e outros, o Teatro do Estudante de Pernambuco. Renomado teatrólogo, romancista, foi membro fundador do Conselho Federal de Cultura e, em 1969, Diretor do Departamento de Extensão Cultural da Universidade Federal de Pernambuco. Levando a literatura popular em verso para suas peças teatrais, Ariano Suassuna, na área de Folclore, publicou A poesia clássica do sertão nordestino (1949), Coletânea da poesia popular nordestina: romances do heróico (1962), Coletânea da poesia popular nordestina: romances do ciclo heróico – conclusão (1964).
ARRASTA-PÉ. Baile popular. O mesmo que bate-chinela, forró.
ARRASTAR-A-MALA. Diz-se de quem deu uma viagem perdida, isto é, de quem foi procurar uma pessoa e não a encontrou, por exemplo.
ARRIBAÇÃ. Também conhecida como ribaçã, rebaçã, avoante, avoete, é uma ave de imigração que aparece no sertão nordestino. A arribação chega no fim do inverno, em bandos, nas caatingas, passando nos lugares onde encontram o capim-milhão, que é a alimentação que prefere. Os caçadores entram em ação e abatem uma quantidade enorme de arribaçãs que são vendidas nas feiras.
ARRUDA. Amuleto contra o mau-olhado. A casa que tiver um pé de arruda plantado no jardim as forças contrárias desaparecem. É uma planta muito usada nas macumbas, nos candomblés, nos catimbós. Na medicina popular a planta funciona como fortificante do sistema nervoso, como sudorífico e também como aperitivo. Suas sementes, secas e queimadas, combatem os insetos.
ASCENSO FERREIRA nasceu em 1895, na cidade de Palmares, PE, onde passou sua infância e adolescência, tendo sua mãe como professora. Aos treze anos foi obrigado a trabalhar na loja de um tio para ajudar no orçamento doméstico. Com alguns amigos fundou, em 1917, a sociedade literária Hora Literária de Palmares, com reuniões dominicais, quando os sócios liam e discutiam suas produções intelectuais. No mesmo ano estreou como poeta, publicando Pro Pace, soneto dedicado a Oliveira Lima, no Jornal do Recife. Participou do movimento modernista (Mário de Andrade foi seu hóspede, certa vez) e colaborou nos jornais e revistas da época, percorrendo os grandes centros literários do país lendo seus famosos poemas. Publicou: Catimbó (1927), Cana Caiana (1939), Xehenhem (1951), 64 poemas e 3 historietas populares (livros e discos) (1958), Catimbó e outros poemas (1939). Na área de Folclore escreveu Maracatu, Presépios e Pastoris, O bumba-meu-boi, na revista Arquivos, da Prefeitura do Recife, 1942-1944. Faleceu em 1965.
ASSOMBRAÇÃO. É o aparecimento de barulhos, de vozes, de correntes arrastadas, de gemidos, de sons misteriosos, de luzes em casas mal-assombradas.
ASSUSTADO. Existente até hoje, o assustado é a maneira de se comemorar o aniversário de uma pessoa amiga, sem que ela saiba. Juntam-se os amigos, compram-se os comes e bebes, contrata-se uma pequena orquestra e, de surpresa, aparecem todos na casa do aniversariante, onde dançam, comem, bebem e conversam até tarde da noite.
ATABAQUES. São tambores feitos com peles de animais, espichadas sobre a abertura de um pau oco e que servem para marcar o ritmo de danças religiosas nos clubes afro-brasileiros e foram trazidos pelos escravos africanos.
ATIRADEIRA. É o mesmo que tiradeira, estilingue, funda, setra, baladeira, badoque ou bodoque. São duas tiras de borracha de câmara de ar de automóvel amarradas nas extremidades de uma pequena forquilha e que vão ser fixadas num pequeno pedaço de couro onde é colocada uma pedrinha. Pegando-as a forquilha com a mão esquerda e, com a mão direita, esticando-se as tiras de borracha, a pedrinha é arremessada até certa distância. A baladeira serve para caçar passarinhos.
AVIÃO. Veja ACADEMIA.
AVOANTE. Veja ARRIBAÇÃ.
AVOETE. Veja ARRIBAÇÃ.
AXÉS. É a mistura do sangue dos animais sacrificados nos cultos afro-brasileiros.
AZIA. Calor de estômago, azedume. Para melhorar é bom dizer três vezes: “Azia, ave-maria”.
AZUL e ENCARNADO. São as cores dos dois cordões dos pastoris. Há uma explicação católica sobre a cor dos cordões dos pastoris: o encarnado representa o manto de Jesus Cristo e o azul representa o manto de Nossa Senhora. Veja PASTORIL.

Fonte:
LÓSSIO, Rúbia. Dicionário de Folclore para Estudantes. Ed. Fundação Joaquim Nabuco

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Machado de Assis (Verba Testamentária)

“… Item, é minha última vontade que o caixão em que o meu corpo houver de ser enterrado, seja fabricado em casa de Joaquim Soares, à rua da Alfândega. Desejo que ele tenha conhecimento desta disposição, que também será pública. Joaquim Soares não me conhece; mas é digno da distinção, por ser dos nossos melhores artistas, e um dos homens mais honrados da nossa terra…”

Cumpriu-se à risca esta verba testamentária. Joaquim Soares fez o caixão em que foi metido o corpo do pobre Nicolau B. de C.; fabricou-o ele mesmo, con amore; e, no fim, por um movimento cordial, pediu licença para não receber nenhuma remuneração. Estava pago; o favor do defunto era em si mesmo um prêmio insigne. Só desejava uma coisa: a cópia autêntica da verba. Deram-lha; ele mandou-a encaixilhar e pendurar de um prego, na loja. Os outros fabricantes de caixões, passado o assombro, clamaram que o testamento era um despropósito. Felizmente, — e esta é uma das vantagens do estado social, — felizmente, todas as demais classes acharam que aquela mão, saindo do abismo para abençoar a obra de um operário modesto, praticara uma ação rara e magnânima. Era em 1855; a população estava mais conchegada; não se falou de outra coisa. O nome do Nicolau reboou por muitos dias na imprensa da Corte, donde passou à das províncias. Mas a vida universal é tão variada, os sucessos acumulam-se em tanta multidão, e com tal presteza, e, finalmente, a memória dos homens é tão frágil, que um dia chegou em que a ação de Nicolau mergulhou de todo no olvido.

Não venho restaurá-la. Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa apagar o caso escrito. Obra de lápis e esponja. Não, não venho restaurá-la. Há milhares de ações tão bonitas, ou ainda mais bonitas do que a do Nicolau, e comidas do esquecimento. Venho dizer que a verba testamentária não é um efeito sem causa; venho mostrar uma das maiores curiosidades mórbidas deste século.

Sim, leitor amado, vamos entrar em plena patologia. Esse menino que aí vês, nos fins do século passado (em 1855, quando morreu, tinha o Nicolau sessenta e oito anos), esse menino não é um produto são, não é um organismo perfeito. Ao contrário, desde os mais tenros anos, manifestou por atos reiterados que há nele algum vício interior, alguma falha orgânica. Não se pode explicar de outro modo a obstinação com que ele corre a destruir os brinquedos dos outros meninos, não digo os que são iguais aos dele, ou ainda inferiores, mas os que são melhores ou mais ricos. Menos ainda se compreende que, nos casos em que o brinquedo é único, ou somente raro, o jovem Nicolau console a vítima com dois ou três pontapés; nunca menos de um. Tudo isso é obscuro. Culpa do pai não pode ser. O pai era um honrado negociante ou comissário (a maior parte das pessoas a que aqui se dá o nome de comerciantes, dizia o marquês de Lavradio, nada mais são que uns simples comissários), que viveu com certo luzimento, no último quartel do século, homem ríspido, austero, que admoestava o filho, e, sendo necessário, castigava-o. Mas nem admoestações, nem castigos, valiam nada. O impulso interior do Nicolau era mais eficaz do que todos os bastões paternos; e, uma ou duas vezes por semana, o pequeno reincidia no mesmo delito. Os desgostos da família eram profundos. Deu-se mesmo um caso, que, por suas gravíssimas conseqüências, merece ser contado.

O vice-rei, que era então o conde de Resende, andava preocupado com a necessidade de construir um cais na praia de D. Manuel. Isto, que seria hoje um simples episódio municipal, era naquele tempo, atentas as proporções escassas da cidade, uma empresa importante. Mas o vice-rei não tinha recursos; o cofre público mal podia acudir às urgências ordinárias. Homem de estado, e provavelmente filósofo, engendrou um expediente não menos suave que profícuo: distribuir, a troco de donativos pecuniários, postos de capitão, tenente e alferes. Divulgada a resolução, entendeu o pai do Nicolau que era ocasião de figurar, sem perigo, na galeria militar do século, ao mesmo tempo que desmentia uma doutrina bramânica. Com efeito, está nas leis de Manu, que dos braços de Brama nasceram os guerreiros, e do ventre os agricultores e comerciantes; o pai do Nicolau, adquirindo o despacho de capitão, corrigia esse ponto da anatomia gentílica. O outro comerciante, que com ele competia em tudo, embora familiares e amigos, apenas teve notícia do despacho, foi também levar a sua pedra ao cais. Desgraçadamente, o despeito de ter ficado atrás alguns dias, sugeriu-lhe um arbítrio de mau gosto e, no nosso caso, funesto; foi assim que ele pediu ao vice-rei outro posto de oficial do cais (tal era o nome dado aos agraciados por aquele motivo) para um filho de sete anos. O vice-rei hesitou; mas o pretendente, além de duplicar o donativo, meteu grandes empenhos, e o menino saiu nomeado alferes. Tudo correu em segredo; o pai de Nicolau só teve notícia do caso no domingo próximo, na igreja do Carmo, ao ver os dois, pai e filho, vindo o menino com uma fardinha, que, por galanteria, lhe meteram no corpo. Nicolau, que também ali estava, fez-se lívido; depois, num ímpeto, atirou-se sobre o jovem alferes e rasgou-lhe a farda, antes que os pais pudessem acudir. Um escândalo. O rebuliço do povo, a indignação dos devotos, as queixas do agredido, interromperam por alguns instantes as cerimônias eclesiásticas. Os pais trocaram algumas palavras acerbas, fora, no adro, e ficaram brigados para todo o sempre.

— Este rapaz há de ser a nossa desgraça! bradava o pai de Nicolau, em casa, depois do episódio.

Nicolau apanhou então muita pancada, curtiu muita dor, chorou, soluçou; mas de emenda coisa nenhuma. Os brinquedos dos outros meninos não ficaram menos expostos. O mesmo passou a acontecer às roupas. Os meninos mais ricos do bairro não saíam fora senão com as mais modestas vestimentas caseiras, único modo de escapar às unhas de Nicolau. Com o andar do tempo, estendeu ele a aversão às próprias caras, quando eram bonitas, ou tidas como tais. A rua em que ele residia, contava um sem-número de caras quebradas, arranhadas, conspurcadas. As coisas chegaram a tal ponto, que o pai resolveu trancá-lo em casa durante uns três ou quatro meses. Foi um paliativo, e, como tal, excelente. Enquanto durou a reclusão, Nicolau mostrou-se nada menos que angélico; fora daquele sestro mórbido, era meigo, dócil, obediente, amigo da família, pontual nas rezas. No fim dos quatro meses, o pai soltou-o; era tempo de o meter com um professor de leitura e gramática.

— Deixe-o comigo, disse o professor; deixe-o comigo, e com esta (apontava para a palmatória)… Com esta, é duvidoso que ele tenha vontade de maltratar os companheiros.

Frívolo! três vezes frívolo professor! Sim, não há dúvida, que ele conseguiu poupar os meninos bonitos e as roupas vistosas, castigando as primeiras investidas do pobre Nicolau; mas em que é que este sarou da moléstia? Ao contrário, obrigado a conter-se, a engolir o impulso, padecia dobrado, fazia-se mais lívido, com reflexo de verde bronze; em certos casos, era compelido a voltar os olhos ou fechá-los, para não arrebentar, dizia ele. Por outro lado, se deixou de perseguir os mais graciosos, ou melhor, adornados, não perdoou aos que se mostravam mais adiantados no estudo; espancava-os, tirava-lhes os livros, e lançava-os fora, nas praias ou no mangue. Rixas, sangue, ódios, tais eram os frutos da vida, para ele, além das dores cruéis que padecia, e que a família teimava em não entender. Se acrescentarmos que ele não pôde estudar nada seguidamente, mas a trancos, e mal, como os vagabundos comem, nada fixo, nada metódico, teremos visto algumas das dolorosas conseqüências do fato mórbido, oculto e desconhecido. O pai, que sonhava para o filho a Universidade, vendo-se obrigado a estrangular mais essa ilusão, esteve prestes a amaldiçoá-lo; foi a mãe que o salvou.

Saiu um século, entrou outro, sem desaparecer a lesão do Nicolau. Morreu-lhe o pai em 1807 e a mãe em 1809; a irmã casou com um médico holandês, treze meses depois. Nicolau passou a viver só. Tinha vinte e três anos; era um dos petimetres da cidade, mas um singular petimetre, que não podia encarar nenhum outro, ou fosse mais gentil de feições, ou portador de algum colete especial sem padecer uma dor violenta, tão violenta, que o obrigava às vezes a trincar o beiço até deitar sangue. Tinha ocasiões de cambalear; outras de escorrer-lhe pelo canto da boca um fio quase imperceptível de espuma. E o resto não era menos cruel. Nicolau ficava então ríspido; em casa achava tudo mau, tudo incômodo, tudo nauseabundo; feria a cabeça aos escravos com os pratos, que iam partir-se também, e perseguia os cães, a pontapés; não sossegava dez minutos, não comia, ou comia mal. Enfim dormia; e ainda bem que dormia. O sono reparava tudo. Acordava lhano e meigo, alma de patriarca, beijando os cães entre as orelhas, deixando-se lamber por eles, dando-lhes do melhor que tinha, chamando aos escravos as coisas mais familiares e ternas. E tudo, cães e escravos, esqueciam as pancadas da véspera, e acudiam às vozes dele obedientes, namorados, como se este fosse o verdadeiro senhor, e não o outro.

Um dia, estando ele em casa da irmã, perguntou-lhe esta por que motivo não adotava uma carreira qualquer, alguma coisa em que se ocupasse, e…

— Tens razão, vou ver, disse ele.

Interveio o cunhado e opinou por um emprego na diplomacia. O cunhado principiava a desconfiar de alguma doença e supunha que a mudança de clima bastava a restabelecê-lo. Nicolau arranjou uma carta de apresentação, e foi ter com o ministro de estrangeiros. Achou-o rodeado de alguns oficiais da secretaria, prestes a ir ao paço, levar a notícia da segunda queda de Napoleão, notícia que chegara alguns minutos antes. A figura do ministro, as circunstâncias do momento, as reverências dos oficiais, tudo isso deu um tal rebate ao coração do Nicolau, que ele não pôde encarar o ministro. Teimou, seis ou oito vezes, em levantar os olhos, e da única em que o conseguiu fizeram-se-lhe tão vesgos, que não via ninguém, ou só uma sombra, um vulto, que lhe doía nas pupilas ao mesmo tempo que a face ia ficando verde. Nicolau recuou, estendeu a mão trêmula ao reposteiro, e fugiu.

— Não quero ser nada! disse ele à irmã, chegando a casa; fico com vocês e os meus amigos.

Os amigos eram os rapazes mais antipáticos da cidade, vulgares e ínfimos. Nicolau escolhera-os de propósito. Viver segregado dos principais era para ele um grande sacrifício; mas, como teria de padecer muito mais vivendo com eles, tragava a situação. Isto prova que ele tinha certo conhecimento empírico do mal e do paliativo. A verdade é que, com esses companheiros, desapareciam todas as perturbações fisiológicas do Nicolau. Ele fitava-os sem lividez, sem olhos vesgos, sem cambalear, sem nada. Além disso, não só eles lhe poupavam a natural irritabilidade, como porfiavam em tornar-lhe a vida, senão deliciosa, tranqüila; e para isso, diziam-lhe as maiores finezas do mundo, em atitudes cativas, ou com certa familiaridade inferior. Nicolau amava em geral as naturezas subalternas, como os doentes amam a droga que lhes restitui a saúde; acariciava-as paternalmente, dava-lhes o louvor abundante e cordial, emprestava-lhes dinheiro, distribuía-lhes mimos, abria-lhes a alma…

Veio o grito do Ipiranga; Nicolau meteu-se na política. Em 1823 vamos achá-lo na Constituinte. Não há que dizer ao modo por que ele cumpriu os deveres do cargo. Integro, desinteressado, patriota, não exercia de graça essas virtudes públicas, mas à custa de muita tempestade moral. Pode-se dizer, metaforicamente, que a freqüência da câmara custava-lhe sangue precioso. Não era só porque os debates lhe pareciam insuportáveis, mas também porque lhe era difícil encarar certos homens, especialmente em certos dias. Montezuma, por exemplo, parecia-lhe balofo, Vergueiro, maçudo, os Andradas, execráveis. Cada discurso, não só dos principais oradores, mas dos secundários, era para o Nicolau verdadeiro suplício. E, não obstante, firme, pontual. Nunca a votação o achou ausente; nunca o nome dele soou sem eco pela augusta sala. Qualquer que fosse o seu desespero, sabia conter-se e pôr a idéia da pátria acima do alívio próprio. Talvez aplaudisse in petto o decreto da dissolução. Não afirmo; mas há bons fundamentos para crer que o Nicolau, apesar das mostras exteriores, gostou de ver dissolvida a assembléia. E se essa conjetura é verdadeira, não menos o será esta outra: — que a deportação de alguns dos chefes constituintes, declarados inimigos públicos, veio aguar-lhe aquele prazer. Nicolau, que padecera com os discursos deles, não menos padeceu com o exílio, posto lhes desse um certo relevo. Se ele também fosse exilado!

— Você podia casar, mano, disse-lhe a irmã.

— Não tenho noiva.

— Arranjo-lhe uma. Valeu?

Era um plano do marido. Na opinião deste, a moléstia do Nicolau estava descoberta; era um verme do baço, que se nutria da dor do paciente, isto é, de uma secreção especial, produzida pela vista de alguns fatos, situações ou pessoas. A questão era matar o verme; mas, não conhecendo nenhuma substância química própria a destruí-lo, restava o recurso de obstar à secreção, cuja ausência daria igual resultado. Portanto, urgia casar o Nicolau, com alguma moça bonita e prendada, separá-lo do povoado, metê-lo em alguma fazenda, para onde levaria a melhor baixela, os melhores trastes, os mais reles amigos, etc.

— Todas as manhãs, continuou ele, receberá o Nicolau um jornal que vou mandar imprimir com o único fim de lhe dizer as coisas mais agradáveis do mundo, e dizê-las nominalmente, recordando os seus modestos, mas profícuos trabalhos da Constituinte, e atribuindo-lhe muitas aventuras namoradas, agudezas de espírito, rasgos de coragem. Já falei ao almirante holandês para consentir que, de quando em quando, vá ter com Nicolau algum dos nossos oficiais dizer-lhe que não podia voltar para a Haia sem a honra de contemplar um cidadão tão eminente e simpático, em quem se reúnem qualidades raras, e, de ordinário, dispersas. Você, se puder alcançar de alguma modista, a Gudin, por exemplo, que ponha o nome de Nicolau em um chapéu ou mantelete, ajudará muito a cura de seu mano. Cartas amorosas anônimas, enviadas pelo correio, são um recurso eficaz… Mas comecemos pelo princípio, que é casá-lo.

Nunca um plano foi mais conscienciosamente executado. A noiva escolhida era a mais esbelta, ou uma das mais esbeltas da capital. Casou-os o próprio bispo. Recolhido à fazenda, foram com ele somente alguns de seus mais triviais amigos; fez-se o jornal, mandaram-se as cartas, peitaram-se as visitas. Durante três meses tudo caminhou às mil maravilhas. Mas a natureza, apostada em lograr o homem, mostrou ainda desta vez que ela possui segredos inopináveis. Um dos meios de agradar ao Nicolau era elogiar a beleza, a elegância e as virtudes da mulher; mas a moléstia caminhara, e o que parecia remédio excelente foi simples agravação do mal. Nicolau, ao fim de certo tempo, achava ociosos e excessivos tantos elogios à mulher, e bastava isto a impacientá-lo, e a impaciência a produzir-lhe a fatal secreção. Parece mesmo que chegou ao ponto de não poder encará-la muito tempo, e a encará-la mal; vieram algumas rixas, que seriam o princípio de uma; separação, se ela não morresse daí a pouco. A dor do Nicolau foi profunda e verdadeira; mas a cura interrompeu-se logo, porque ele desceu ao Rio de Janeiro, onde o vamos achar, tempos depois, entre os revolucionários de 1831.

Conquanto pareça temerário dizer as causas que levaram o Nicolau para o Campo da Aclamação, na noite de 6 para 7 de abril, penso que não estará longe da verdade quem supuser que — foi o raciocínio de um ateniense célebre e anônimo. Tanto os que diziam bem, como os que diziam mal do imperador, tinham enchido as medidas ao Nicolau. Esse homem, que inspirava entusiasmos e ódios, cujo nome era repetido onde quer que o Nicolau estivesse, na rua, no teatro, nas casas alheias, tornou-se uma verdadeira perseguição mórbida, daí o fervor com que ele meteu a mão no movimento de 1831. A abdicação foi um alívio. Verdade é que a Regência o achou dentro de pouco tempo entre os seus adversários; e há quem afirme que ele se filiou ao partido caramuru ou restaurador, posto não ficasse prova do ato. O que é certo é que a vida pública do Nicolau cessou com a Maioridade.

A doença apoderara-se definitivamente do organismo. Nicolau ia, a pouco e pouco, recuando na solidão. Não podia fazer certas visitas, freqüentar certas casas. O teatro mal chegava a distraí-lo. Era tão melindroso o estado dos seus órgãos auditivos, que o ruído dos aplausos causava-lhe dores atrozes. O entusiasmo da população fluminense para com a famosa Candiani e a Meréia, mas a Candiani principalmente, cujo carro puxaram alguns braços humanos, obséquio tanto mais insigne quanto que o não fariam ao próprio Platão, esse entusiasmo foi uma das maiores mortificações do Nicolau. Ele chegou ao ponto de não ir mais ao teatro, de achar a Candiani insuportável, e preferir a Norma dos realejos à da prima-dona. Não era por exageração de patriota que ele gostava de ouvir o João Caetano, nos primeiros tempos; mas afinal deixou-o também, e quase que inteiramente os teatros.

— Está perdido! pensou o cunhado. Se pudéssemos dar-lhe um baço novo…

Como pensar em semelhante absurdo? Estava naturalmente perdido. Já não bastavam os recreios domésticos. As tarefas literárias a que se deu, versos de família, glosas a prêmio e odes políticas, não duraram muito tempo, e pode ser até que lhe dobrassem o mal. De fato, um dia, pareceu-lhe que essa ocupação era a coisa mais ridícula do mundo, e os aplausos ao Gonçalves Dias, por exemplo, deram-lhe idéia de um povo trivial e de mau gosto. Esse sentimento literário, fruto de uma lesão orgânica, reagiu sobre a mesma lesão, ao ponto de produzir graves crises, que o tiveram algum tempo na cama. O cunhado aproveitou o momento para desterrar-lhe da casa todos os livros de certo porte.

Explica-se menos o desalinho com que daí a meses começou a vestir-se. Educado com hábitos de elegância, era antigo freguês de um dos principais alfaiates da Corte, o Plum, não passando um só dia em que não fosse pentear-se ao Desmarais e Gérard, coiffeurs de la cour, à rua do Ouvidor. Parece que achou enfatuada esta denominação de cabeleireiros do paço, e castigou-os indo pentear-se a um barbeiro ínfimo. Quanto ao motivo que o levou a trocar de traje, repito que é inteiramente obscuro, e a não haver sugestão da idade é inexplicável. A despedida do cozinheiro é outro enigma. Nicolau, por insinuação do cunhado, que o queria distrair, dava dois jantares por semana; e os convivas eram unânimes em achar que o cozinheiro dele primava sobre todos os da capital. Realmente os pratos eram bons, alguns ótimos, mas o elogio era um tanto enfático, excessivo, para o fim justamente de ser agradável ao Nicolau, e assim aconteceu algum tempo. Como entender, porém, que um domingo, acabado o jantar, que fora magnífico, despedisse ele um varão tão insigne, causa indireta de alguns dos seus mais deleitosos momentos na terra? Mistério impenetrável.

— Era um ladrão! foi a resposta que ele deu ao cunhado.

Nem os esforços deste nem os da irmã e dos amigos, nem os bens, nada melhorou o nosso triste Nicolau. A secreção do baço tornou-se perene, e o verme reproduziu-se aos milhões, teoria que não sei se é verdadeira, mas enfim era a do cunhado. Os últimos anos foram crudelíssimos. Quase se pode jurar que ele viveu então continuamente verde, irritado, olhos vesgos, padecendo consigo ainda muito mais do que fazia padecer aos outros. A menor ou maior coisa triturava-lhe os nervos: um bom discurso, um artista hábil, uma sege, uma gravata, um soneto, um dito, um sonho interessante, tudo dava de si uma crise.

Quis ele deixar-se morrer? Assim se poderia supor, ao ver a impassibilidade com que rejeitou os remédios dos principais médicos da Corte; foi necessário recorrer à simulação, e dá-los, enfim, como receitados por um ignorantão do tempo. Mas era tarde. A morte levou-o ao cabo de duas semanas.

— Joaquim Soares? bradou atônito o cunhado, ao saber da verba testamentária do defunto, ordenando que o caixão fosse fabricado por aquele industrial. Mas os caixões desse sujeito não prestam para nada, e…

— Paciência! interrompeu a mulher; a vontade do mano há de cumprir-se.

Fontes:
ASSIS, Machado de. Papéis avulsos. (Volume de contos, publicado em 1882). Costaflosi Ltda., 1998.
Imagem = http://ainternetmeassusta.blogspot.com

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Adriana Falcão (O doido da garrafa)

Ele não era mais doido do que as outras pessoas do mundo, mas as outras pessoas do mundo insistiam em dizer que ele era doido.

Depois que se apaixonou por uma garrafa de plástico de se carregar na bicicleta e passou a andar sempre com ela pendurada na cintura, virou o Doido da Garrafa.

O Doido da Garrafa fazia passarinhos de papel como ninguém, mas era especialista mesmo em construir barquinhos com palitos. Batizava cada barco com um nome de mulher e, enquanto estava trabalhando nele, morria de amores pela dona imaginária do nome. Depois ia esquecendo uma por uma, todas elas, com exceção de Olívia, uma nau antiga que levou dezessete dias para ser construída.

Batucava muito bem e vivia inventando, de improviso, músicas especialmente compostas para toda e qualquer finalidade, nos mais variados gêneros. Uai aí aquela da mulher de blusa verde atravessando a rua apressada, e o Doido da Garrafa imediatamente compunha um samba, uma valsa, um rock, um rap, um blues, dependendo da mulher de blusa verde, do atravessando, da rua e do apressada. Geralmente ficava uma obra-prima.

Gostava muito de observar as pessoas na rua, do cheiro de café, de cantar e de ouvir música. Não gostava muito do fato de ter pernas, mas acabou se acostumando com elas. De cabelo ele gostava. Em compensação, tinha verdadeiro horror a multidão, bermudão, tubarão, ladrão, camburão, bajulação, afetação, dança de salão, falta de educação e à palavra bife.

Escrevia cartas para ninguém, umas em prosa, outras em poesia, como mero exercício de estilo.

Tinha mania de dar entrevistas para o vento e já sabia a resposta de qualquer pergunta que porventura alguém pudesse lhe fazer um dia.

Ajudava o dicionário a explicar as coisas inventando palavras necessárias, como dorinfinita.

Adorava álgebra, mas tinha particular antipatia por trigonometria, pois não encontrava nenhum motivo para se pegar pedaços de triângulos e fazer contas tão difíceis com eles.

Conhecia mitologia a fundo.

Tinha angústia matinal, uma depressão no meio da tarde que ele chamava de cinco horas, porque era a hora que ela aparecia, e uma insônia crônica a quem chamava carinhosamente de Proserpina.

Sentia uma paixão azul dentro do peito, desde criança, sempre que olhava o mar e orgulhava-se muito disso.

Acreditava no amor, mas tinha vergonha da frase.

Às vezes falava sozinho, Preferia tristeza à agonia.

Todas as noites, entre oito e dez e meia, era visto andando de um lado para o outro da rua, método que tinha inventado para acabar de vez com a preocupação de fazer a volta de repente, quando achava que já tinha andado o suficiente. (Preferia que ninguém percebesse que ele não tinha para onde ir.) Enquanto andava, repetia dentro da cabeÇa incessantemente a palavra ecumênico sem ter a menor idéia da razão pela qual fazia isso.

Durante o dia o Doido da Garrafa trabalhava numa multinacional, era sujeito bem visto, supervisor de departamento, ganhava um bom salário e gratificações que entregava para a mulher aplicar em fundos de investimento.

No fim do ano ia trocar de carro.

Era excelente chefe de família.

Não era mais doido do que as outras pessoas do mundo, mas sempre que ele passava as outras pessoas do mundo pensavam, lá vai o Doido da Garrafa, e assim se esqueciam das suas próprias garrafas um pouquinho.

Fonte:
FALCÃO, Adriana. O doido da garrafa. SP: Ed. Planeta do Brasil, 2003.
Capa do livro = http://ilvia.blogspot.com

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Carlos de Oliveira (1921 – 1981)

Carlos Alberto Serras de Oliveira (Belém do Pará, 10 de Agosto de 1921 — Lisboa, 1 de Julho de 1981) .

Em Belém do Pará se encontravam seus pais, portugueses cumprindo o fado (curto) da emigração. Longe da tranquilidade que só uma adaptação conseguida transporta, regressam a Portugal em 1923, fixando-se primeiro na Camarneira, onde vivia um seu avô, e quatro anos mais tarde em Febres para onde o pai, o saudoso Dr. Américo de Oliveira, virá exercer medicina depois de ter sido designado médico municipal. Aqui, Carlos frequenta a Escola Primária, onde foi discípulo da Professora Maria dos Prazeres Barbosa Baptista.

É pois aqui, em plena Gândara, que o “Carlitos”, como era conhecido, passará a infância e a juventude, mantendo sempre ao longo da sua vida e na sua obra uma forte ligação a esta região.

Meu pai era médico de aldeia, uma aldeia pobríssima: Nossa Senhora das Febres. Lagoas pantanosas, desolação, calcário, areia. Cresci cercado pela grande pobreza dos camponeses, por uma mortalidade infantil enorme, uma emigração espantosa. Natural portanto que tudo isso me tenha tocado (melhor, tatuado). O lado social e o outro, porque há outro também, das minhas narrativas ou poemas publicados (…) nasceu desse ambiente quase lunar habitado por homens(…)[O Aprendiz de Feiticeiro, p. 204].“Trago a janela de muito longe, da casa de meu avô”(idem, p. 173).

Durante dois anos (1931-33) frequenta o ensino secundário em Cantanhede, vila que inspirará a “Corgos” dos seus romances. Vai depois para Coimbra (1933), onde frequenta o Liceu D. João III, cidade onde permanecerá até 1948. Aí estuda e acabará por formar-se em Histórico-Filosóficas. Convive com grandes figuras da Cultura Portuguesa, consagrados já uns, outros, como ele, sedentos de conhecer: Afonso Duarte, João José Cochofel, Joaquim Namorado, Fernando Namora são alguns íntimos seus.

Durante este “período coimbrão” da sua vida publica o seu primeiro livro de poemas, Turismo (1942), com ilustrações de Fernando Namora. Publica depois o seu primeiro romance, Casa na Duna (1943) logo seguido de Alcateia (1944), livro que virá a ser apreendido pela PIDE, a polícia política de Salazar.

Visita Febres nas férias, sempre que pode, fazendo-se acompanhar, por vezes, de Fernando Namora com quem jogava a malha no Largo em convívio com populares.

Em 1945 publica um novo livro de poesias, Mãe Pobre. Os anos 1945 e seguintes serão, para Carlos de Oliveira, bem profícuos quanto à integração e afirmação no grupo que veicula e auspera por um “novo humanismo”, com a participação nas revistas Seara Nova e Vértice e a colaboração no livro de Fernando Lopes Graça Marchas, Danças e Canções – coletânea de poesias de vários poetas, musicadas por aquele, canções que vieram a ser conhecidas por “heróicas”.

Termina em 1947 a sua Licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas, e no ano seguinte instala-se definitivamente em Lisboa, não deixando, contudo, de se deslocar periodicamente a Coimbra e à Gândara.

Um ano mais tarde casa com Ângela, uma jovem madeirense que conhecera em Coimbra enquanto estudante e que será a sua companheira de todas as horas. A ela dedica o escritor alguns dos seus livros (o romance Finisterra), poemas como “Carta a Ângela” e “Ilha” de Terra de Harmonia e ainda alguns excertos, como é o caso do seguinte em que surge referida anagramaticamente como Gelnaa:

Ainda jovem quando a conheci, os olhos mais claros do que hoje (a vida escureceu-lhos bastante), o cabelo solto num halo de bruma e brisa, que faz pensar nos amanheceres da sua ilha (…)”(O Aprendiz de Feiticeiro)

Em 1953 publica Uma Abelha na Chuva, o seu quarto romance e, unanimemente reconhecido como uma das mais importantes obras da literatura portuguesa, estando integrado nos conteúdos programáticos da disciplina de português no ensino secundário.

Em 1957 organiza, com José Gomes Ferreira, numa abordagem do imaginário popular os dois volumes de Contos Tradicionais Portugueses, alguns deles posteriormente adaptados ao cinema por João César Monteiro.

Em 1968 publica dois novos livros de poesia, Sobre o Lado Esquerdo e Micropaisagem e colabora com Fernando Lopes no filme por este realizado e terminado em 1971, Uma Abelha na Chuva, a partir da obra homônima. Publica em 1971 O Aprendiz de Feiticeiro, coletânea de crônicas e artigos, e Entre Duas Memórias, livro de poemas, pelo qual lhe é atribuído no ano seguinte o Prêmio de Imprensa. Em 1976 reúne toda a sua poesia em Trabalho Poético, dois volumes, apresentando os livros anteriores, revistos, e os poemas inéditos de Pastoral, livro que será publicado autonomamente no ano seguinte. Publica em 1978 o seu último romance Finisterra, paisagem povoada de inspiração gandaresa, obra que lhe proporciona a atribuição do Prêmio Cidade de Lisboa, no ano seguinte.

Morre na sua casa em Lisboa a 1 de Julho de 1981.
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É um dos grandes poetas deste século, combinando a preocupação de intervenção social (neo-realismo) com a reflexão sobre a escrita no próprio processo da sua produção, o que cnfere à sua obra grande densidade e agudeza nos efeitos diversificados da sua leitura (Mãe Pobre, 1945, Entre Duas Memórias, 1971).

O mesmo se pode dizer em relação aos seus romances, nos quais se detecta uma evolução da problemática neo-realista mais pura (Casa na Duna, 1943) até à sua elaboração através da sobriedade do sentimento e do protesto (Uma Abelha na Chuva, 1953), culminando na complexidade de Finisterra (1978), composto a partir de mecanismos de repetição ficcional e de decalque temático e descritivo, que emerge na fronteira da oscilação da modernidade na nossa história literária.

Poesia
* Turismo (1942);
* Mãe Pobre (1945);
* Colheita Perdida (1948);
* Descida aos Infernos (1949);
* Terra de Harmonia (1950);
* Cantata (1960);
* Micropaisagem (1968, 1969);
* Sobre o Lado Esquerdo, o Lado do Coração (1968, 1969);
* Entre Duas Memórias (1971);
* Pastoral (1977).

Romance
* Casa na Duna (1943; 2000);
* Alcateia (1944; 1945);
* Pequenos Burgueses (1948; 2000);
* Uma Abelha na Chuva (1953; 2003);
* Finisterra: paisagem e povoamento (1978; 2003).

Crônicas
* O Aprendiz de Feiticeiro (1971, 1979).

Antologia
* Poesias (1945-1960) (1962);
* Trabalho Poético (1976; 2003).

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/
http://cvc.instituto-camoes.pt/literatura/carlosoliveira.htm
http://www.cm-cantanhede.pt/biblioteca/personagens_co.asp

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Carlos de Oliveira (Teia de Poesias)

(a grafia original foi mantida)

Amazónia

I
Selva.
O negro, o índio
e o mais que me souber.
O fogo doutro céu,
o nome doutro dia.
Tudo o que estiver
nos nervos
quem me deu.

II
Navegação.
O Amazonas
atira os barcos ao mar.
Defende o seu coração
Marca as zonas
de navegar

III
Fruto.
Minha selva
de nervos.
Potros,
potros na selva.

Maré cheia,
árvores em parto,
ondas sobre ondas
dum inferno farto.
Inferno pleno.
Terras verdes
e céu moreno.

Sol loiro.
Estrídulo, de hastes vermelhas.
Toiro.

Plasma.
Nus, torcidos.
Estrelas, que poucas.
Vento de todos os sentidos.
Bocas.

IV
Céu.
Apalpo e oiço
o silêncio. O silêncio
adensou e rangeu.

V
Anjos
entregam-se a anjos
e caem na terra
embebedados.
A terra

freme,
sabor de sol que lhe ficou
do dia calcinado,
treme

minhas orgias doiradas
enquanto as asas dos anjos
caem maculadas.
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Elegia de Coimbra

Gela a lua de março nos telhados
e à luz adormecida
choram as casas e os homens
nas colinas da vida.

Correm as lágrimas ao rio,
a esse vale das dores passadas,
mas choram as paredes e as almas
outras dores que não foram perdoadas.

Aos que virão depois de mim
caiba outra sorte em herança:
o oiro depositado
nas margens da lembrança.
—————————–

Leitura

Quando por fim as árvores
se tornam luminosas; e ardem
por dentro pressentindo;
folha a folha; as chamas
ávidas de frio:
nimbos e cúmulos coroam
a tarde, o horizonte,
com a sua auréola incandescente
de gás sobre os rebanhos.

Assim se movem
as nuvens comovidas
no anoitecer
dos grandes textos clássicos.

Perdem mais densidade;
ascendem na pálida aleluia de que fulgor ainda?
e são agora
cumes de colinas rarefeitas
policopiando à pressa
a demora das outras
feita de peso e sombra.
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Soneto fiel

Vocábulos de sílica, aspereza,
Chuva nas dunas, tojos, animais
Caçados entre névoas matinais,
A beleza que têm se é beleza.

O trabalho da plaina portuguesa,
As ondas de madeira artesanais
Deixando o seu fulgor nos areais,
A solidão coalhada sobre a mesa.

As sílabas de cedro, de papel,
A espuma vegetal, o selo de água,
Caindo-me nas mãos desde o início.

O abat-jour, o seu luar fiel,
Insinuando sem amor nem mágoa
A noite que cercou o meu ofício.
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Estrela

Legenda
para aquela estrela
azul
e fria
que me apontaste
já de madrugada:
amar
é entristecer
sem corrompermos
nada.
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Salmo

A vida
é o bago de uva
macerado
nos lagares do mundo
e aqui se diz
para proveito dos que vivem
que a dor
é vã
e o vinho
breve.
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Infância

Sonhos
enormes como cedros
que é preciso
trazer de longe
aos ombros
para achar
no inverno da memória
este rumor
de lume:
o teu perfume,
lenha
da melancolia.
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Gândara

IV

Ao lume da estrumeira
lagos esverdeados.
Passam os meninos a tarde inteira
a olhar os lagos encantados.

Os vermes que apodrecem
aconchegando-nos nas mãos avaras:
os dedos dos meninos enegrecem,
os lagos ficam mais claros.

Já esqueceram a lagoa e a maneira
de atirar pedras às águas calmas como um manto.
Enfeitiçados, os lagos da estrumeira
trazem-nos naquele encanto.
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Estalactite IV, VI e VIII

Localizar
na frágil espessura
do tempo,
que a linguagem
pôs
em vibração
o ponto morto
onde a velocidade
se fractura
e aí
determinar
com exactidão
o foco
do silêncio.

Algures
o poema sonha
o arquétipo
do voo
inutilmente
porque repete
apenas
o signo, o desenho
do Outono
aéreo
onde se perde a asa
quando vier
o instante
de voar

Caem
do céu calcário,
acordam flores
milénios depois,
rolam de verso
em verso
fechadas
como gotas,
e ouve-se
ao fim da página
um murmúrio
orvalhado.
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Seguindo o fio

seguindo o fio
da tinta
que desenha
as palavras
e tenta
fugir ao tumulto
em que as raízes
grassam,
engrossam, embaraçam
a escrita
e o escritor:
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Nevoeiro

A cidade caía
casa a casa
do céu sobre as colinas,
construída de cima para baixo
por chuvas e neblinas,
encontrava
a outra cidade que subia
do chão com o luar
das janelas acesas
e no ar
o choque as destruía
silenciosamente,
de modo que se via
apenas a cidade inexistente.
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Fotomontagem = José Feldman

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Carlos de Oliveira (Dunas)

Contar os grãos de areia destas dunas é o meu ofício actual. Nunca julguei que fossem tão parecidos, na pequenez imponderável, na cintilação de sal e oiro que me desgasta os olhos. O inventor de jogos meu amigo veio encontrar-me quase cego. Entre a névoa radiosa da praia mal o conheci. Falou com a exactidão de sempre:

“O que lhe falta é um microscópio. Arranje-o depressa, transforme os grãos imperceptíveis em grandes massas orográficas, em astros, e instale-se num deles. Analise os vales, as montanhas, aproveite a energia desse fulgor de vidro esmigalhado para enviar à Terra dados científicos seguros. Escolha depois uma sombra confortável e espere que os astronautas o acordem.”

Fontes:
http://www.triplov.com/poesia/carlos_de_oliveira/

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Segunda Edição do Prêmio Literário Carlos de Oliveira (inscrições até 15 de Abril)

Aberto a autores lusófonos.

A segunda edição do Prêmio Literário Carlos de Oliveira, aberto a autores dos países lusófonos, encerra-se em 15 de Abril, quando termina o prazo de entrega de obras concorrentes, anunciou hoje a Câmara de Cantanhede.

Instituído pelo Município de Cantanhede e pela Fundação Carlos de Oliveira, o prêmio visa estimular “a criação literária numa homenagem a uma das grandes referências” da literatura portuguesa da segunda metade do Século XX.

Consiste numa verba pecuniária de 5.000 euros, suportada pela Câmara de Cantanhede (Coimbra), que assegura também a edição da obra vencedora e os custos inerentes ao processo, segundo uma nota divulgada hoje pelo gabinete de comunicação da autarquia.

De acordo com o regulamento, podem concorrer autores de todos os países de língua oficial portuguesa, que podem candidatar-se apenas com uma obra, inédita e não publicada, em narrativa (conto ou romance).

Na primeira edição do concurso, a obra vencedora foi “Quase Tudo Nada”, do escritor e jornalista Arsénio Mota, tendo sido distinguidos com menções honrosas “Parede de Adobo”, de João Carlos Costa da Cruz, e “Visões do Azul”, de Emília Ferreira.

O júri será constituído por cinco elementos – o presidente da Câmara de Cantanhede, ou alguém por si indicado, representantes da Fundação Carlos de Oliveira, da Universidade de Coimbra e da Associação Portuguesa de Escritores e uma personalidade do meio literário português, especialmente convidada para o efeito.

O vencedor será conhecido durante a primeira quinzena de Julho e a entrega do prêmio decorrerá no dia 25 desse mês, em cerimônia pública.

Segundo a mesma nota, a segunda edição do galardão é coordenada pela Fundação Carlos de Oliveira, constituída em Setembro de 2008 pelo Município de Cantanhede e por Ângela de Oliveira, viúva do escritor.

Promover o desenvolvimento e a dinamização do estudo da obra de Carlos de Oliveira e do seu lugar na literatura portuguesa é o principal objetivo da instituição, que ficará sediada em Febres, na casa onde o escritor viveu durante vários anos.

O edifício foi adquirido pela autarquia para esse efeito e será alvo de um processo de reabilitação e ampliação de acordo com o projeto já elaborado pelo arquiteto Francesco Marconi.

Com a intervenção de fundo a realizar no imóvel, será criado um equipamento vocacionado para o desenvolvimento de atividades culturais, pedagógicas e de investigação literária, tendo como referência a vida e obra do escritor, mas que contemplará outras vertentes, entre as quais o estímulo à criação literária.

Além do edifício, o patrimônio da fundação integra o espólio do escritor, constituído por livros e manuscritos, os direitos de autor e outros bens cedidos pela viúva.

Para assegurar a prossecução dos seus objetivos, será criado “um Centro de Estudos sobre Carlos de Oliveira, a sua geração e a literatura portuguesa, numa perspectiva comparativa, interdisciplinar e inter-artística, no sentido de fomentar o estudo do valioso legado literário do escritor junto do grande público e, em particular, dos estudantes de diferentes graus de ensino”.

O autor de “Uma Abelha na Chuva” e de “Finisterra” nasceu em Belém do Pará, no Brasil, em 1921, e morreu em 1981 em Lisboa. Estudou em Coimbra e viveu durante diversos anos em Febres (Cantanhede), onde o seu pai exercia medicina.

Fonte:
Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece

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Machado de Assis (A Carteira)

…DE REPENTE, Honório olhou para o chão e viu uma carteira. Abaixar se, apanhá la e guardá la foi obra de alguns instantes. Ninguém o viu, salvo um homem que estava à porta de uma loja, e que, sem o conhecer, lhe disse rindo:

– Olhe, se não dá por ela; perdia a de uma vez.

– É verdade, concordou Honório envergonhado.

Para avaliar a oportunidade desta carteira, é preciso saber que Honório tem de pagar amanhã uma dívida, quatrocentos e tantos mil réis, e a carteira trazia o bojo recheado. A dívida não parece grande para um homem da posição de Honório, que advoga; mas todas as quantias são grandes ou pequenas, segundo as circunstâncias, e as dele não podiam ser piores. Gastos de família excessivos, a princípio por servir a parentes, e depois por agradar à mulher, que vivia aborrecida da solidão; baile daqui, jantar dali, chapéus, leques, tanta cousa mais, que não havia remédio senão ir descontando o futuro.

Endividou se. Começou pelas contas de lojas e armazéns; passou aos empréstimos, duzentos a um, trezentos a outro, quinhentos a outro, e tudo a crescer, e os bailes a darem se, e os jantares a comerem se, um turbilhão perpétuo, uma voragem.

– Tu agora vais bem, não? dizia lhe ultimamente o Gustavo C…, advogado e familiar da casa.

– Agora vou, mentiu o Honório.

A verdade é que ia mal. Poucas causas, de pequena monta, e constituintes remissos; por desgraça perdera ultimamente um processo, cm que fundara grandes esperanças. Não só recebeu pouco, mas até parece que ele lhe tirou alguma coisa à reputação jurídica; em todo caso, andavam mofinas nos jornais.

D. Amélia não sabia nada; ele não contava nada à mulher, bons ou maus negócios. Não contava nada a ninguém. Fingia se tão alegre como se nadasse em um mar de prosperidades. Quando o Gustavo, que ia todas as noites à casa dele, dizia uma ou duas pilhérias, ele respondia com três e quatro; e depois ia ouvir os trechos de música alemã, que D. Amélia tocava muito bem ao piano, e que o Gustavo escutava com indizível prazer, ou jogavam cartas, ou simplesmente falavam de política.

Um dia, a mulher foi achá lo dando muitos beijos à filha, criança de quatro anos, e viu lhe os olhos molhados; ficou espantada, e perguntou lhe o que era.

– Nada, nada.

Compreende se que era o medo do futuro e o horror da miséria. Mas as esperanças voltavam com facilidade. A idéia de que os dias melhores tinham de vir dava lhe conforto para a luta. Estava com trinta e quatro anos; era o princípio da carreira: todos os princípios são difíceis. E toca a trabalhar, a esperar, a gastar, pedir fiado ou emprestado, para pagar mal, e a más horas.

A dívida urgente de hoje são uns malditos quatrocentos e tantos mil réis de carros. Nunca demorou tanto a conta, nem ela cresceu tanto, como agora; e, a rigor, o credor não lhe punha a faca aos peitos; mas disse lhe hoje uma palavra azeda, com um gesto mau, e Honório quer pagar lhe hoje mesmo. Eram cinco horas da tarde.

Tinha se lembrado de ir a um agiota, mas voltou sem ousar pedir nada. Ao enfiar pela Rua da Assembléia é que viu a carteira no chão, apanhou a, meteu no bolso, e foi andando.

Durante os primeiros minutos, Honório não pensou nada; foi andando, andando, andando, até o Largo da Carioca. No Largo parou alguns instantes, enfiou depois pela Rua da Carioca, mas voltou logo, e entrou na Rua Uruguaiana. Sem saber como, achou se daí a pouco no Largo de S. Francisco de Paula; e ainda, sem saber como, entrou em um Café. Pediu alguma coisa e encostou se à parede, olhando para fora. Tinha medo de abrir a carteira; podia não achar nada, apenas papéis e sem valor para ele. Ao mesmo tempo, e esta era a causa principal das reflexões, a consciência perguntava lhe se podia utilizar se do dinheiro que achasse. Não lhe perguntava com o ar de quem não sabe, mas antes com uma expressão irônica e de censura. Podia lançar mão do dinheiro, e ir pagar com ele a dívida?

Eis o ponto. A consciência acabou por lhe dizer que não podia, que devia levar a carteira à polícia, ou anunciá la; mas tão depressa acabava de lhe dizer isto, vinham os apuros da ocasião, e puxavam por ele, e convidavam no a ir pagar a cocheira. Chegavam mesmo a dizer lhe que, se fosse ele que a tivesse perdido, ninguém iria entregar lha; insinuação que lhe deu ânimo.

Tudo isso antes de abrir a carteira. Tirou a do bolso, finalmente, mas com medo, quase às escondidas; abriu a, e ficou trêmulo. Tinha dinheiro, muito dinheiro; não contou, mas viu duas notas de duzentos mil réis, algumas de cinqüenta e vinte; calculou uns setecentos mil réis ou mais; quando menos, seiscentos. Era a dívida paga; eram menos algumas despesas urgentes. Honório teve tentações de fechar os olhos, correr à cocheira, pagar, e, depois de paga a dívida, adeus; reconciliar se ia consigo. Fechou a carteira, e com medo de a perder, tornou a guardá la.

Mas daí a pouco tirou a outra vez, e abriu a, com vontade de contar o dinheiro. Contar para quê? era dele? Afinal venceu se e contou: eram setecentos e trinta mil réis. Honório teve um calafrio. Ninguém viu, ninguém soube; podia ser um lance da fortuna, a sua boa sorte, um anjo… Honório teve pena de não crer nos anjos…

Mas por que não havia de crer neles? E voltava ao dinheiro, olhava, passava o pelas mãos; depois, resolvia o contrário, não usar do achado, restituí lo. Restituí lo a quem? Tratou de ver se havia na carteira algum sinal.

“Se houver um nome, uma indicação qualquer, não posso utilizar me do dinheiro,” pensou ele.

Esquadrinhou os bolsos da carteira. Achou cartas, que não abriu, bilhetinhos dobrados, que não leu, e por fim um cartão de visita; leu o nome; era do Gustavo. Mas então, a carteira?… Examinou a por fora, e pareceu lhe efetivamente do amigo. Voltou ao interior; achou mais dois cartões, mais três, mais cinco. Não havia duvidar; era dele.

A descoberta entristeceu o. Não podia ficar com o dinheiro, sem praticar um ato ilícito, e, naquele caso, doloroso ao seu coração porque era em dano de um amigo. Todo o castelo levantado esboroou se como se fosse de cartas. Bebeu a última gota de café, sem reparar que estava frio. Saiu, e só então reparou que era quase noite. Caminhou para casa. Parece que a necessidade ainda lhe deu uns dois empurrões, mas ele resistiu.

“Paciência, disse ele consigo; verei amanhã o que posso fazer.”

Chegando a casa, já ali achou o Gustavo, um pouco preocupado e a própria D. Amélia o parecia também. Entrou rindo, e perguntou ao amigo se lhe faltava alguma cousa.

– Nada.

– Nada?

– Por quê?

Mete a mão no bolso; não te falta nada?

– Falta me a carteira, disse o Gustavo sem meter a mão no bolso. – Sabes se alguém a achou?

– Achei a eu, disse Honório entregando lha.

Gustavo pegou dela precipitadamente, e olhou desconfiado para o amigo. Esse olhar foi para Honório como um golpe de estilete; depois de tanta luta com a necessidade, era um triste prêmio. Sorriu amargamente; e, como o outro lhe perguntasse onde a achara, deu lhe as explicações precisas.

– Mas conheceste-a?

– Não; achei os teus bilhetes de visita.

Honório deu duas voltas, e foi mudar de toilette para o jantar. Então Gustavo sacou novamente a carteira, abriu a, foi a um dos bolsos, tirou um dos bilhetinhos, que o outro não quis abrir nem ler, e estendeu o a D. Amélia, que, ansiosa e trêmula, rasgou o em trinta mil pedaços: era um bilhetinho de amor.

Fontes:
Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro
http://www.bibvirt.futuro.usp.br. In CD Rom E-Learning n.3. Digerati

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Mario Quintana (A Vida…)

A vida são deveres, que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira…
Quando se vê, já terminou o ano…
Quando se vê, passaram-se 50 anos!
Agora, é tarde demais
para ser reprovado…
Se me fosse dada, um dia,
outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente
e iria jogando, pelo caminho,
a casca dourada
e inútil das horas…
Dessa forma, eu digo: não deixe de fazer algo que gosta devido à falta de tempo. A única falta que terá, será desse tempo que, infelizmente, não voltará mais.

Fonte:
http://www.velhosamigos.com.br/

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Nicanor Filadelfo Pereira (Porque escrevo)

Aqui estou confortavelmente acomodado nesta poltrona giratória. À minha frente, uma pequena tela a reverberar luz no seu mais intrigante tom de cinza. Meus dedos repousam suaves sobre pequenos objetos quadriláteros. Intuitivamente os dedilho e me pergunto: por que escrevo? Minha alma, instigada, começa a percorrer o etéreo… Diáfanas imagens iniciam o seu pairar dolente que, pouco a pouco, começam fluir palavras, palavras e verbos, verbos e conjunções. – Mas o verbo é a palavra! – E palavras não são verbos e verbos não são palavras? As conjunções vão unindo palavras e os verbos juntam-se às palavras. As conjunções não conjugam os verbos. As palavras levam os verbos a se conjugarem conjuntamente, em extrema simbiose e cumplicidade.

E nessa conjunção de alma e de imagens e divagações e sonhos, eis que surge o texto, e do texto surgem idéias que se entretecem, entrelaçando-se num fluir gostoso, inebriante, como o voar da borboleta azul, num florido jardim em manhã primaveril. A minha alma entra em devaneio… Ao devanear, entro no êxtase de imagens e de palavras e as conjugo como se a voar estivesse sobre o etéreo das imagens, sobre o etéreo das palavras, e as tomo como asas. Voando, vou ao mais profundo dos sentimentos e percorro a alma. Esquadrinho-a, constato, então, que amo. E, amando, descubro que amar é verbo, verbo que tem o condão da vida e que a vida necessita do verbo, do verbo que dá vida à palavra. Daí porque escrevo: porque amo e, ao amar, eu escrevo e, se escrevo, é porque amo a palavra. Amando vou escrevendo, escrevendo vou amando, amando o que escrevo.

Fonte
Cenario Cultural. http://www.cintianmoraes.com.br/colaboradores/nicanor.html

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José Saramago (Memorial do Convento)

Apesar de ter sido trazida da Áustria já há dois anos, especialmente para gerar o sucessor ao trono de D. João V, rei de Portugal, a rainha D. Maria Ana Josefa parece não conseguir engravidar. Sendo o rei um símbolo de virilidade, ela é quem é considerada infértil e, conseqüentemente, a única culpada pelo fato de o rei ainda não ter tido herdeiros. Quando, ao cair da noite, o rei se prepara para ir ao quarto da rainha para mais uma tentativa, chega ao palácio D. Nuno da Cunha, bispo inquisidor, acompanhado de um velho frade franciscano, Antônio de S. José, que propõe uma solução para o problema do rei. Diz o frade que a rainha engravidaria assim que o rei prometesse construir um convento para os frades da ordem dos franciscanos na vila de Mafra. Feita a promessa, o casal real vai finalmente para o quarto.

Depois de consumado o ato sexual, rei e rainha dormem e sonham cada um com seus próprios desejos, suas diferentes fantasias: ela sonha que tem um encontro amoroso com seu cunhado, o Infante D. Francisco, enquanto o rei sonha que seu pênis está se transformando em árvore e, logo em seguida, em colunas do convento que ele prometera construir para os franciscanos.

Em tom irônico, o narrador revela suspeitas de que, antes mesmo da promessa, talvez a rainha já estivesse grávida e que talvez o padre o já sabia disso. Em todo caso, se a concepção da rainha ocorresse, o fato seria visto como mais um entre os vários milagres tradicionalmente relacionados à ordem de São Francisco. Diz-se, por exemplo, que um tal frei Miguel da Anunciação, mesmo depois de morto, conservara seu corpo intacto durante dias, atraindo, desde então, uma grande quantidade de devotos para sua igreja. Em outra ocasião, a imagem de Santo Antônio, que vigiava uma igreja franciscana, locomovera-se até à janela, onde ladrões tentavam entrar, passando-lhes assim um grande susto. E do convento de S. Francisco de Xabregas conta-se que, certa vez, suas lâmpadas tinham sido roubadas, e logo depois foram encontradas, como se por acaso, num mosteiro de jesuítas. A gravidez da rainha foi atribuída ao poder milagroso de Santo Antônio ou, segundo outros, à ameaça que um frade velho fizera contra a imagem do santo, acusando o protetor de descuido.

Passado o “entrudo” , como de costume, durante a quaresma as ruas se encheram de gente que fazia cada um suas penitências. Segundo a tradição, a quaresma era a única época em que as mulheres podiam percorrer as igrejas sozinhas e assim gozar de uma rara liberdade que lhes permitia até mesmo de se encontrarem com seus amantes secretos. Porém, D. Maria Ana não podia gozar dessas liberdades, pois, além de ser rainha, agora se encontrava grávida. Assim, tendo ido para a cama cedo, consolou-se em sonhar outra vez com D. Francisco, seu cunhado. Passada a quaresma, todas as mulheres retornaram para a reclusão de suas casas.

Em contraste com os conflitos da família real está a história de Baltasar Mateus, um homem de 26 anos, conhecido como “o Sete-Sóis”. Baltasar dirige-se a Lisboa, caminhando pela estrada real, depois de ter sido soldado e perdido a mão esquerda em uma batalha contra a Espanha, para decidir a quem pertenceria o trono espanhol. Com um que lhe servia de mão e um espigão de ferro que funcionava como uma arma, Baltasar pede esmola em Évora e, a caminho de Lisboa, mata um ladrão que havia tentado assaltá-lo. Não sabendo ainda se ficaria em Lisboa ou se continuaria viagem em direção a Mafra , onde ainda viviam seus pais, Baltasar anda pelas ruas da capital e conhece João Elvas, com quem, junto a outros mendigos, vai passar a noite num “telheiro abandonado”. Antes de dormir, cada um conta histórias de crimes que ocorreram na cidade, os quais são comparados às mortes que alguns deles presenciaram na guerra.

Não somente por causa da gravidez de cinco meses, mas também por estar de luto pela morte de seu irmão, a rainha Maria Ana deixa de freqüentar o grande auto-de-fé na praça do Rossio em Lisboa, evento muito popular, que já há dois anos não ocorria. Ali seriam castigados pela Inquisição diversos casos de heresia.

Entre os condenados pelo Santo Ofício, um é focalizado com maior destaque. É Sebastiana Maria de Jesus, acusada de ser feiticeira e cristã-nova . Sebastiana, durante alguns parágrafos, torna-se a narradora da história.

Sebastiana Maria de Jesus tem uma filha de 19 anos: Blimunda, jovem de poderes sobrenaturais, que assiste à procissão ao lado do padre Bartolomeu Lourenço. Perto dela está um homem, Baltasar Mateus, o Sete-Sóis, a quem ela se dirige e cujo nome procura saber. Voltando a sua casa, Blimunda leva consigo o padre e deixa a porta aberta para que o recém-conhecido também possa entrar. Depois de o padre sair, Blimunda convida Baltasar para que fique morando em sua casa, pelo menos até que ele tivesse que voltar a Mafra . No dia seguinte, ao acordar, Blimunda, sem abrir os olhos, come um pedaço de pão e promete a Baltasar que nunca o olharia “por dentro”.

Começa aqui a fiel e duradoura amizade entre os três personagens que se contrapõem aos personagens da família real, heróis da historiografia oficial. Inicia-se também a relação amorosa entre Baltasar e Blimunda, que ocupará o centro da narrativa.

Ao encontrar-se com o padre Bartolomeu Lourenço, que estava procurando usar sua influência no palácio para conseguir dinheiro. Baltasar fica sabendo que o padre era conhecido como “o Voador”, por ter criado uma máquina a qual todos ridicularizam, chamando de “a passarola”. Baltasar aceita o convite do padre para ser seu ajudante no projeto de construir a tal “máquina de voar”, mas enquanto não chega o dinheiro para o material necessário, fica trabalhando em um açougue.

Enquanto isso, no palácio, para decepção do rei, a rainha dá à luz uma menina, Maria Xavier Francisca Leonor Bárbara, que é batizada por sete bispos. Apesar de o frade Antônio de S. José já ter morrido quando do nascimento da criança, a promessa do rei de construir o convento seria mantida.

Baltasar, que sempre dormia no lado direito da enxerga _ , procura saber por que Blimunda sempre comia pão ao acordar, antes mesmo de abrir os olhos. Ele já tinha tentado descobrir o mistério através do padre Bartolomeu Lourenço que, apesar de conhecer a verdadeira razão, não a quis revelar, dizendo apenas que voar é um mistério pequeno se comparado ao mistério de Blimunda. Certa manhã, tentando desvendar esse mistério de uma vez por todas, Baltasar esconde o pão de Blimunda que, ao acordar, começa a procurá-lo desesperadamente. Finalmente, depois de receber o pão das mãos de Baltasar, Blimunda revela que tem o poder de “olhar por dentro das pessoas”, o que podia fazer somente quando estava em jejum. No dia seguinte, para provar-lhe seu poder (ou infortúnio), Blimunda, ainda em jejum, sai à rua com Baltasar, evitando olhá-lo, já que antes tinha prometido não “olhá-lo por dentro”.

Dentre as coisas que vê, Blimunda descreve a gravidez de uma mulher, o que existe no subsolo, o órgão sexual de um jovem, apodrecido por doença venérea, e até mesmo uma moeda enterrada no chão.

Enquanto no palácio nascia D. Pedro, segundo filho da família real, e o rei viajava a Mafra para escolher o lugar onde seria erguido o convento monumental, Baltasar e Blimunda mudam-se para a abegoaria na quinta do duque de Aveiro, amigo do rei, em S. Sebastião da Pedreira. Além de proporcionar-lhe o lugar de trabalho, o rei, que se interessara pelo projeto do padre como uma criança se interessa por um brinquedo novo, com sua amizade e influência protegia o padre das garras da Inquisição que, caso viesse saber dos projetos do padre, teria motivos suficientes para acusá-lo de heresia.

Na quinta do duque de Aveiro, Padre Bartolomeu, com a ajuda de Baltasar e Blimunda, prossegue na construção da passarola. Decide, então, partir à Holanda, onde dizem que os sábios conhecem os mistérios da alquimia e a natureza do éter , o único elemento que, segundo ele, estava faltando para que sua invenção fosse concluída.
Baltasar e Blimunda, depois que o padre parte, decidem mudar-se para Mafra , terra natal de Baltasar. Antes de partir, o casal decide assistir, ao invés de mais um auto-de-fé que seria realizado na praça do Rossio, a uma outra festa popular, a tourada. Assim como os autos-de-fé , as touradas sempre terminavam com um forte cheiro de carne queimada, proveniente do churrasco realizado no final da festa _ . Ao chegar à casa da família em Mafra , acompanhado de Blimunda, Baltasar é recebido por sua mãe, Marta Maria, já que João Francisco, seu pai, estava trabalhando no campo. Baltasar fica sabendo que sua única irmã, Inês Antônia, estava casada com Álvaro “Pedreiro” Diogo. Dos dois filhos desse casal, apenas um sobreviveria, sendo que o outro morreria ao atingir a mesma idade em que o infante D. Pedro, filho de D. João V, também morreria, anos mais tarde.

Baltasar fala à família de suas intenções de ficar morando com a mulher em Mafra . A família acolhe bem Blimunda, depois de se certificar de que ela não era judia ou cristã-nova , o que não era completamente verdade. O pai informa ao filho recém-chegado de que abrira mão de suas terras na Vela, pois elas haviam sido desapropriadas para a construção do convento, uma obra monumental que, segundo acreditavam, traria muitos empregos para os moradores da região, especialmente para o cunhado de Baltasar, que era pedreiro. Baltasar vai visitar as obras do convento e, ao retornar, encontra Blimunda conversando com Maria Marta, de quem a jovem se tornaria companheira e ajudante, enquanto Baltasar iria trabalhar com o pai no cultivo de terras que não lhes pertenciam.

Encontrando-se o rei bastante enfermo, seu irmão aproveita as perspectivas que lhe são favoráveis e revela à rainha seu interesse em tornar-se seu marido e o novo rei. O infante D. Francisco declara saber que é objeto dos sonhos da rainha, numa conversa que seria a primeira entre tantas que finalmente acabariam por destruir o desejo original que ela experimentara. Mesmo depois de recuperada a saúde do rei, seus antigos sonhos nunca teriam aquele mesmo encanto de antigamente, já que ela tem plena consciência de que sua condição de mulher e rainha mudaria pouco, fosse ela casada com um ou outro irmão.

Voltando da Holanda, onde estivera por três anos, o padre Bartolomeu Lourenço dirige-se à quinta de S. Sebastião da Pedreira, encontrando a albegoaria abandonada. Algumas semanas depois, parte em direção a Coimbra, de onde conta retornar já “doutor em cânones”. Antes, porém, decide visitar o casal amigo em Mafra , onde, ao chegar, encontra um pároco, Francisco Gonçalves, que lhe oferece um quarto para ficar hospedado. Em conversa com Blimunda e Baltasar, o padre Bartolomeu conta-lhes o que descobrira na Holanda, ou seja, que ao contrário do que se pensa, o éter não é uma substância que possa ser encontrada pelas artes da alquimia, mas que, antes de subir ao céu, o éter existe dentro das pessoas, pois nada mais é do que a “vontade” de cada um. Assim, o padre pede a Blimunda que olhe dentro das pessoas e encontre essa “vontade”, que é como uma nuvem fechada. E que, cada vez que percebesse a vontade de alguém escapando, que ela a capturasse usando um frasco contendo âmbar, que é a substância que atrai o éter.

Em Mafra, pela primeira vez Blimunda comunga conforme manda os ensinamentos da igreja católica, ou seja, em jejum. Ao fazê-lo, vê na hóstia uma nuvem fechada, o que muito a impressiona. Já tendo o padre ido para Coimbra há algum tempo, o casal decide partir de volta à quinta, assim que passassem as festividades de inauguração dos alicerces do convento, cujas primeiras pedras seriam colocadas pelas mãos do próprio rei.

Dias antes da inauguração dos alicerces, uma grande tempestade de vento, comparável ao “sopro de Adamastor” derruba a igreja de madeira construída especialmente para a cerimônia. Sabendo do acidente, o rei começa a distribuir moedas de ouro, e distribui ainda mais quando os pedreiros voltam ao trabalho e reconstroem a igreja em dois dias, de modo que o que era catástrofe passou a ser visto como milagre. No primeiro dia de festividades, a inauguração foi feita em cerimônias restritas a poucos convidados e, no dia seguinte, (ou seja, a 17 de novembro de 1717, seis anos depois de o rei ter feito sua promessa), realizou-se uma grande festa pública.

De volta à quinta do Duque de Aveiro, Baltasar desmonta a passarola que, abandonada, encontrava-se com a estrutura enferrujada e os panos cheios de mofo. Pouco tempo depois chega o padre, que logo quer saber quantas vontades Blimunda já recolhera. Ao ouvir que até então havia apenas trinta “vontades” na garrafa, o padre lhe diz que eram necessárias pelo menos duas mil. Baltasar continua trabalhando na “máquina de voar” enquanto padre Bartolomeu vai constantemente a Coimbra, a fim de concluir seus estudos. Quando volta definitivamente para Lisboa, o padre fica conhecendo o músico Domenico Scarlatti , napolitano de 35 anos, professor particular de música da infanta D. Maria Bárbara que, a essas alturas, já tem nove anos de idade. O encontro dos dois homens estimula uma discussão sobre o poder extraordinário da música e a essência da verdade, comparando-se finalmente a música do italiano com a oratória do padre.

Em outra ocasião, o padre e o compositor se encontram e juntos vão à S. Sebastião da Pedreira, onde o padre revela seu segredo ao músico e apresenta-lhe a “trindade terrestre”, composta por ele, o amigo e ajudante Baltasar e sua companheira Blimunda.

Depois da partida do italiano que, tendo prometido que voltaria trazendo seu cravo e o tocaria para o casal e para a passarola, o padre Bartolomeu Lourenço começa a trabalhar em um sermão que estava preparando para a festa do Corpo de Deus. Nesse sermão, que a princípio receberia a aprovação e até mesmo a admiração dos padres e censores do Santo Ofício, o padre questiona os fundamentos da doutrina cristã da trindade divina.

Sabendo de uma epidemia de febre amarela que, trazida do Brasil, se alastrava por Lisboa e já matara quatro mil pessoas em três meses, o padre Bartolomeu pede a Blimunda que aproveite a ocasião para recolher as vontades que se desprendem do peito dos moribundos. Blimunda faz o que o padre lhe pedira e, no final da epidemia, consegue recolher as duas mil vontades necessárias para fazer voar a “passarola”. O casal acaba se tornando conhecido em Lisboa, por sempre andar pela cidade sem medo da epidemia.

Depois de cumprida a tarefa, Blimunda fica doente e, durante toda sua convalescença, o músico Scarlatti vai tocar-lhe cravo, o que contribui para a restauração de sua saúde.

Estando as vontades recolhidas e a máquina de voar já pronta, nada falta para que o invento do padre seja testado. Além disso, o rei já não pode fazer nada para que o Duque de Aveiro lhes empreste a quinta onde trabalham. O padre, que andava receoso do Santo Ofício, vai ao palácio se certificar da proteção e amizade do rei, mas volta aflito, pois descobrira que o Santo Ofício já estava a sua procura. Assim, só lhe resta propor ao casal que os três terminem rapidamente o projeto e juntos fujam na “máquina de voar”. Assim, depois de retirarem o telhado da abegoaria e colocarem tudo o que possuem dentro da máquina, deixando para trás apenas o cravo de Domenico Scarlatti , a “passarola” enfim levanta vôo. Scarlatti , que chegara à quinta a tempo de ver a máquina subir aos ares, senta-se ao cravo e toca uma música, antes de lançar o instrumento ao fundo de um poço.

Depois de passarem despercebidos sobre a cidade de Lisboa, os três sobrevoam a vila de Mafra , onde várias pessoas vêem a máquina voadora, julgando ser uma aparição do Espírito Santo. Encontrando dificuldades para controlar a máquina, finalmente a fazem aterrissar, graças à iniciativa de Blimunda de segurar junto a seu peito as duas esferas contendo as “vontades”.

No dia seguinte, o casal impede o padre, que se encontrava aflito de emoção ou de medo, de atar fogo à máquina. Mas não podem impedir que ele parta sozinho mata adentro, para nunca mais voltar. Blimunda e Baltasar escondem a máquina sob a ramagem e partem na mesma direção tomada pelo padre, até chegarem, depois de alguns dias, a Mafra , onde uma procissão celebrava o milagre que o povo acreditava ter presenciado. Ali, Baltasar, a exemplo de tantos outros moradores locais, começa a trabalhar nas obras do convento, cuja dimensão e quantidade de homens que emprega muito o impressionam, apesar de achar o ritmo com que se desenvolve demasiado lento. Chegam notícias do terremoto de Lisboa, que foi seguido de inaudita tempestade _ . Apesar dos estragos causados por ambos os desastres, implementaram-se os negócios de vários setores da sociedade e, em particular, da igreja, que freqüentemente se aproveitava das catástrofes para alimentar a religiosidade popular.

Dois meses depois de terem chegado a Mafra , Baltasar decide voltar ao Monte Junto, onde haviam deixado a máquina de voar. Ele a encontra no mesmo lugar, mas necessitando de alguns reparos. A partir de então, ele faria visitas freqüentes ao local, cuidando da manutenção da máquina, sempre com uma certa esperança de reencontrar o padre. Algum tempo depois, Domenico Scarlatti chega a Mafra , onde fora visitar as obras do convento, ficando hospedado na casa de um visconde. Ao se cruzarem na rua, Blimunda e Scarlatti , tentando evitar as suspeitas dos moradores, que poderiam achar estranho duas pessoas de níveis sociais tão diferentes se conhecerem, conversam às escondidas. O músico trazia a notícia da morte do padre Bartolomeu de Gusmão em Toledo, Espanha, para onde ele havia fugido no dia 19 de novembro, o dia da tempestade em Lisboa. Em seguida, enquanto no palácio o rei medita sobre suas riquezas, celebra-se em Mafra uma missa para um grande número de trabalhadores.

A construção do convento exige esforços colossais e causa muitas vítimas. Um dos eventos mais penosos foi o transporte, da vila de Pêro Pinheiro até a vila de Mafra , de uma imensa pedra, destinada a ser a laje de uma varanda sobre o pórtico da igreja. Seiscentos homens e um grande número de bois foram utilizados na empreitada, que durou oito dias, durante os quais não faltaram acidentes fatais. Um dos casos mais dramáticos foi o do trabalhador Francisco Marques, que acabou esmagado sob uma roda de um carro de bois.

Depois de quase quatro anos em Mafra , Blimunda pela primeira vez pede a Baltasar para acompanhá-lo em uma de suas visitas periódicas ao Monte Junto. Depois de lá chegarem, resolvem passar a noite para que, ao amanhecer, Blimunda, ainda em jejum, se certificasse de que as vontades ainda estavam guardadas dentro de cada uma das duas esferas.

Enquanto isso, na residência real, D. João V manifesta seu desejo de construir uma Basílica em Portugal como a de S. Pedro em Roma. Para dar conta do projeto gigantesco, o rei chama o arquiteto alemão João Frederico Ludovice (ou Ludwig), que o dissuade da idéia, com o argumento de que o rei não viveria o suficiente para ver a obra concluída. Convencido, o rei decide então ampliar a dimensão do projeto do convento de Mafra, de modo que, ao invés de 80, coubessem nele 300 frades, o que muito agrada ao provincial dos franciscanos da Arrábida. O projeto é, sem dúvida, ambicioso demais para os recursos do reino, o que se reflete em conversa, imaginada pelo narrador, entre o rei e o almoxarife ou guarda-livros.

Finalmente, o rei decide que a sagração da basílica deveria ser realizada dois anos mais tarde, no dia vinte e dois de outubro de 1730, quando ele completasse 41 anos, estivesse ou não a obra concluída. Com a ampliação do projeto, tornara-se necessário que se recrutasse um grande número de trabalhadores, dentre os quais muitos seriam levados a fazer o trabalho contra a própria vontade, o que causaria grande tristeza a muitas famílias de toda a região. Simultaneamente, as famílias reais de Portugal e de Espanha logo se preparariam, em 1729, para se unirem através de dois casamentos.

De fato, a “troca das princesas” uniria, em 1729, as famílias reais de Portugal e Espanha, segundo um acordo que já havia sido concluído havia quatro anos. Mariana Vitória, da Espanha, de 11 anos, seria trazida a Portugal para que se casasse com o infante D. Pedro, enquanto Maria Bárbara, de 17 anos, seria levada a Espanha para unir-se a Fernando, dois anos mais novo que a noiva. Assim, uma comitiva leva a família real até a fronteira dos dois países, sobre o rio Caia, em Elvas, passando por Mafra . Na região de Mafra , os trabalhadores, que à força são levados às obras do convento, chamam a atenção da princesa e por um momento lhe despertam compaixão.

Além da coincidência entre o nascimento da princesa e a promessa do rei de construir o convento de Mafra , no nível popular, duas outras histórias convergem. João Elvas, que conhecera Baltasar em Lisboa logo depois da guerra, acompanha, junto a um grupo de pedintes, a comitiva à fronteira onde está situada sua cidade natal. Ao conversar com um certo Julião Mau-Tempo, que menciona a enorme pedra transportada até Mafra, João Elvas lembra-se do ex-soldado, seu amigo Baltasar, com quem o interlocutor havia trabalhado.

Em 1730, pouco mais de um ano depois da “troca das princesas”, a basílica do convento seria enfim consagrada, mesmo estando as obras, tanto as da basílica como as do convento, ainda longe de serem concluídas. Várias estátuas de santos desfilam pelas ruas e são transportadas até o local onde seriam instaladas. Blimunda e Baltasar resolvem ver as imagens dos santos Segundo acreditam, os santos passariam a noite conversando pela última vez, antes de serem isolados em seus nichos, na basílica.

Ao amanhecer, Baltasar decide ir sozinho ao Monte Junto, verificar o estado da “passarola”. Ao tentar fazer os já costumeiros reparos na máquina, Baltasar tropeça e rasga os panos que cobriam as esferas, de modo que quando os raios de sol as atingem, a máquina inesperadamente levanta vôo. Blimunda vai procurá-lo no dia seguinte, ao mesmo tempo em que romarias se dirigem à sagração da basílica, mas não encontra seu amado, apenas o espigão de ferro, que ela não hesita em usar quando um frade a tenta violá-la.

Blimunda continua a procurar Baltasar durante nove anos, perambulando por todas as partes do país. Sua jornada termina em Lisboa, em situação semelhante àquela em que conhecera Baltasar. Em 1739, em um auto-de-fé na praça do Rossio, onze vítimas encontram-se a caminho da fogueira – inclusive o dramaturgo Antônio José da Silva, “O Judeu”. Estava lá também Baltasar, cujo vulto Blimunda vê. Quando Baltasar está para morrer, sua “vontade” se desprende e é finalmente recolhida dentro do peito de sua amada Blimunda.

Fontes:
1100 Cursos e Apostilas. CEC0004 – Digerati Com. Tecnologia Ltda. (CD ROM)
Capa do Livro = http://www.submarino.com.br

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Teste o seu Português 1

O pior erro que você pode cometer na vida é o de ficar o tempo todo com medo de cometer algum erro“.

Deleitemo-nos com Carlos Drummond de Andrade:

No meio do caminho
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

Obs.: Tal texto não tem sequer uma palavra a ser alterada sob o ponto de vista do novo acordo ortográfico. Você percebe que não há palavras com sinal gráfico (diacrítico).

Deixemos as pedras no meio do caminho e leiamos, também de Drummond:

Privilégio do mar
Neste terraço mediocremente confortável,
bebemos cerveja e olhamos o mar.
Sabemos que nada nos acontecerá.
O edifício é sólido e o mundo também.
Sabemos que cada edifício abriga mil corpos
labutando em mil compartimentos iguais.
Às vezes, alguns se inserem fatigados no elevador
e vem cá em cima respirar a brisa do oceano,
o que é privilégio dos edifícios.
O mundo é mesmo de cimento armado.
Certamente, se houvesse um cruzador louco,
fundeado na baía em frente da cidade,
a vida seria incerta… improvável…
Mas nas águas tranquilas só há marinheiros fiéis.
Como a esquadra é cordial!
Podemos beber honradamente nossa cerveja.

Obs.: O segundo texto do poeta tem apenas uma palavra a ser alterada sob o ponto de vista do novo acordo ortográfico (tranquilas). O trema desapareceu, foi eliminado das palavras portuguesas, devendo ser usado apenas em nomes estrangeiros.

Vamos ver se você já está se acostumando com a nova ortografia.

1 – Você teve uma ótima ______________.
a ( ) idéia;
b ( ) ideia.

2 – Sua ___________ não me incomoda.
a ( ) feiura;
b ( ) feiúra.

3 – Eu _________ todas as suas falhas.
a ( ) perdôo;
b ( ) perdoo.

4 – Coitados, eles ___________ de tudo!
a ( ) descreem;
b ( ) descrêem.

5 – Essa onda de ___________ está cada vez mais ____________.
a ( ) seqüestros – freqüente;
b ( ) sequestros – frequente.

Respostas na lateral esquerda ao final

Fonte:
Terezinha Bellote Chaman.
http://www.dgabc.com.br/

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Escritor brasileiro recordista no Guinness com mais de mil livros publicados

Com uma idéia na cabeça e uma Olivetti nas mãos, José Carlos Ryoki de Alpoim Inoue escreveu 999 livros em 6 anos sobre os mais variados temas. Best-sellers assinados com pseudônimos estrangeiros — James Monroe, George Fletcher, Jeff Taylor, Bill Purse e muitos outros, somando um total de 39 nomes “americanizados” — “Era uma exigência das editoras”, explica Ryoki.

Seu milésimo livro acompanha um prefácio do jornalista Alexandre Garcia: “As histórias de seus livros são de tirar o fôlego. Como os eventos ocorrem em minutos e dias, Ryoki faz os batimentos cardíacos dos leitores aumentarem. É difícil interromper a leitura por causa da narração que acontece como num filme, como no bom cinema americano com todos os ingredientes repletos de sexo, corrupção, violência, política, espionagem e um final surpreendente. Ryoki é o Pelé da literatura.”

Recentemente ele lançou pela Editora Globo o livro “SAGA”, um romance de 365 página que conta a história de quatro gerações de uma família japonesa no Brasil.

E o livro técnico de número 1.074, pela Summus Editorial, “Vencendo o desafio de escrever um romance”, onde trata o processo criativo e redacional como técnica, enfatizando a disciplina, a pesquisa e a organização. A obra traz informações valiosas tanto para escritores iniciantes como para os que já publicaram e desejam se aprimorar.

E vem por aí o “O Fruto do Ventre”, um livro que, segundo a Editora Record, promete ser um sucesso com mais de 500 páginas repletas de ação e muito suspense.

Críticos e jornalistas falam sobre o autor que já teve seu seu nome como objeto de matérias em importantes publicações e programas de TV, como a Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Jornal do Brasil, Folha da Tarde, Jornal da Tarde, Valeparaibano, Gazeta de Vitória, A Tribuna, revistas Veja, IstoÉ e Manchete, no Brasil; revista Lire e Culture, na França; Der Spiegel, na Alemanha; Wall Street Journal (matéria de capa), nos USA; e várias outras publicações ao redor do mundo; programas Jô Soares – Onze e Meia (SBT) Globo Repórter e Fantástico (Rede Globo), e foi entrevistado pela Radio Culture de Paris e pela Nippon Televison Network, de Tóquio, entre outros:

“A maioria das pessoas não conseguem ler na mesma velocidade que ele escreve.” Jô Soares, Jô Onze e Meia

“Ele produz capítulos inteiros durante suas idas ao banheiro.” Matt Moffet, Wall Street Journal

“O mais produtivo escritor do Brasil e do mundo tem seus trabalhos escritos com um português perfeito.” ANSA Agency

“Não é difícil encontrá-lo escrevendo em seu PC de 6 às 2 da manhã.” Fantástico, TV Globo

“A produção literária do incansável Ryoki Inoue levou-o não apenas ao Guinness Book como o autor mais prolífico do mundo, mas também a ser comparado a Georges Simenon por alguns críticos internacionais. Outros comparam seu estilo e sua velocidade de produção com Sidney Sheldon. Outros dizem que ele pode ser posto ao lado de Harold Robbins, principalmente pela forma como tece as tramas de seus thrillers.” Flávio Tiné

“Ryoki alimenta sozinho mais de 400 mil leitores por mês.” Eduardo Bueno, Estadão

O milésimo livro marca a virada na carreira de José Carlos Ryoki de Alpoim Inoue. E agora, Presidente? Um romance político-policial que aproxima esse escritor de ficção da realidade brasileira.” Paulo Pestana, Correio Brasiliense

“Junto com a imaginação e o dom de escrever, o que o torna especial é sua disciplina e determinação.” Goulart de Andrade

“A maioria das edições dos livros escritos por Ryoki alcançam mais de 10 mil exemplares. Todos eles são vendidos imediatamente.” Severino Francisco, Correio Brasiliense

Quem quiser já pode aproveitar e baixar no site http://www.ryoki.com.br/ seis de seus livros, como “A Carta Amassada” e “A Bruxa”, escrito em 1992, desta vez utilizando-se do computador.

Fonte:
http://www.overmundo.com.br/overblog/

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José Carlos Ryoki de Alpoim Inoue (1946)

Tudo começou há 55 anos, exatamente no dia 22 de julho de 1946, em São Paulo, quando Ryoki nasceu de mãe portuguesa e pai japonês. Formou-se em medicina em 1970 e largou-a em 1986 para tornar-se escritor, editando seus pocket-books, sob nada mais, nada menos, que 39 pseudônimos, por exigência de seus editores. Sua grande especialidade na época foi o estilo policial, onde as tramas apresentavam muita ação, espionagem e traições. Porém, jamais deixou de escrever sobre um tema que sempre o apaixonou: o faroeste. Suas novelas de banguebangue são verdadeiros filmes que prendem o leitor da primeira página à última, de tal forma que algumas montadoras de automóveis proibiam seus empregados de entrarem na fábrica com esses livros pois eram capazes de abandonar a linha de produção enquanto não terminassem completamente a leitura.

Foi também editor e redator dos periódicos Farol do Sul Capixaba (Piúma/ES), Notícias do Japão (1992-93/SP), International Press (1993-94/SP – Tóquio), O Riso do Corujão (1996-97/Campos do Jordão); das revistas Amazônia (1992/Giparaná – RO), Letra Verde (1997-98/Campos do Jordão) e Vertente (1997/São José dos Campos – SP) e cronista de diversos jornais e publicações, por seis anos.

Quando chegou à marca dos mil livros, com a obra E Agora, Presidente? (prefaciado pelo jornalista Alexandre Garcia), Ryoki decidiu-se por uma mudança em sua carreira literária, abandonando os livros de bolso e passando a escrever romances maiores, publicados com seu próprio nome. Seus temas são simplesmente tudo, a vida, o cotidiano, os debates sociais, histórias de gente comum e de gente não tão comum.

Em 1992, fez o lançamento de seu livro A Bruxa na Bienal Internacional do Livro (SP). Um outro marco na vida do autor foi a publicação, em 1993, no Japão, de seus livros Conexão Perigo: São Paulo-Tóquio, O Preço do Tráfico, Operação Amazônia e Sempre há Esperança, voltados para o público nipobrasileiro residente naquele país. Já no ano seguinte, implantou o Pólo Editorial de Pocket Books para a América Latina, em Piúma (ES).

Seu nome já foi objeto de matérias em importantes publicações e programas de TV, como a Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Jornal do Brasil, Folha da Tarde, Jornal da Tarde, Valeparaibano, Gazeta de Vitória, A Tribuna, revistas Veja, IstoÉ e Manchete, no Brasil; Portugal Diário, revista Lire e Culture, na França; Der Spiegel, na Alemanha; Wall Street Journal (matéria de capa), nos USA; e várias outras publicações ao redor do mundo; programas Jô Soares – Onze e Meia (SBT) Globo Repórter e Fantástico (Rede Globo), e foi entrevistado pela Radio Culture de Paris e pela Nippon Televison Network, de Tóquio, entre outros.

Ao ver Ryoki no Guinness Book, Matt Moffett, jornalista americano do Wall Street Journal, teve sua curiosidade despertada para o processo de criação do escritor, querendo ver pessoalmente para crer, como alguém poderia produzir histórias de sucesso em tão pouco tempo. Assim, lançou um desafio ao escritor e aportou em São José dos Campos (onde Ryoki morava na época), no final de janeiro de 1996. Uma semana depois, Moffett contou como nasceu o livro de Ryoki Inoue – Seqüestro Fast Food, elaborado em uma noite, mais precisamente das 23h30 às 4h – num dos jornais mais famosos do mundo.

Com 1.060 livros, de seu próprio punho, publicados, sua produção compulsiva não parava nunca. Chegou a escrever três romances por dia, trabalhando madrugadas a dentro. Hoje a marca é de 1076.

Para ele, o segredo do processo criativo está em noventa e oito por cento de suor, um por cento de talento e um por cento de sorte. Além disso, disciplina e aplicação é o que faz com que ele consiga ficar sentado diante de seu computador e daí não saia antes do the end de sua nova obra.

Ryoki continua a escrever: está produzindo vários romances, faz trabalhos como ghost writer para pessoas famosas e para empresas, escreve roteiros e, com o objetivo de aperfeiçoar seus conhecimentos no campo da espionagem — obviamente para melhor criar seus romances — dedica-se à pesquisa e ao estudo da Inteligência Competitiva, fazendo inúmeras traduções de livros, artigos e teses para empresas desse ramo. Atualmente, o objetivo de Ryoki é produzir um romance por ano, no máximo dois.

Formado médico pela USP, especialista em Cirurgia do Tórax, Ryoki deixou a medicina em 1986 para se tornar escritor.

Em pouco tempo, dominava 95% dos pocket books publicados no Brasil: escreveu 999 novelas em seis anos, entre estórias de faroeste, guerra, policiais, espionagem, amor e ficção científica.

Quando, em 1992, sugeriu aos seus editores uma melhora na apresentação gráfica dos livros de bolso brasileiros, espantou-se com o pouco caso que eles todos manifestaram quanto ao seu projeto. Não interessava a nenhum editor melhorar a qualidade gráfica e literária dos livros que produziam e muito menos de competir em nível internacional.

Abandonou, então os pockets para se dedicar a livros maiores, mais elaborados e com maior qualidade gráfica.

Só que Ryoki se deparou com um outro problema: nenhuma editora brasileira tinha fôlego para publicar e distribuir sua fenomenal produção: uma média de seis novos títulos por mês. Ninguém é de ferro e, por fim, Ryoki cansou-se desse ritmo alucinante. Ele, então, decidiu reformular seus objetivos e durante esse intervalo de tempo, Ryoki não deixou de escrever: produziu vários romances, trabalhou como ghost writer para pessoas famosas e para empresas, escreveu roteiros e, com o objetivo de aperfeiçoar seus conhecimentos no campo da espionagem — obviamente para melhor criar seus romances — dedicou-se durante três anos à pesquisa e ao estudo da Inteligência Competitiva e fez inúmeras traduções de livros, artigos e teses para empresas desse ramo. Atualmente, o objetivo de Ryoki é produzir um romance por ano, no máximo dois.

Devido à sua intensa e extensa produção literária, desde 1993, Ryoki Inoue figura no International Guinness Book of Records, como o homem que mais escreveu e publicou livros em todo o planeta.

Fonte:
http://www.ryoki.com.br/biografia.htm

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José Carlos Ryoki de Alpoim Inoue (O Sebo )

Pouco maior que uma quitanda e quase tão sujo quanto uma peixaria malcuidada, este estabelecimento comercial não deixa de ter seu encantamento, sua poesia.

Todo o mobiliário se resume a uma escrivaninha em que o proprietário faz suas anotações, duas cadeiras ordinárias e montanhas de livros espalhadas pelo meio da loja, empilhadas pelos cantos, que sobem pelas paredes formando uma decoração caótica e complicada. Em todos os montes são desrespeitados os princípios mais elementares do equilíbrio e vê-se claramente que não há a menor preocupação com a estética. Aliás, não é mesmo possível adotar qualquer ordem de arrumação, pois os volumes, cada um diferente do outro em tamanho, cor e forma, não permitem tal luxo.

E há um certo aroma no ar! Sim, pois assim como uma quitanda ou uma peixaria tem seus cheiros característicos, esta loja também tem o seu: é um cheiro de mofo, de poeira misturada com nicotina e papel velho. Pode ser que seja o inferno para os asmáticos, mas conheço muitas pessoas que adoram essa mescla de estranhos perfumes… Entre elas há até as que dizem que esse é o cheiro da verdadeira intelectualidade.

Estamos num sebo, numa loja de livros usados, de segunda ou mesmo de enésima mão.

Já pela simples disposição das mercadorias, vemos que é absolutamente impraticável toda e qualquer operação de limpeza.

Faxina, então, nem pensar! Imaginem ter de levar tudo aquilo parra algum lugar para se poder passar um pano no chão! Varrer, apenas varrer, já é uma tarefa complicada e arriscada, pois seria muito fácil misturar com o lixo diversos opúsculos e livretos que jazem pelo assoalho em completa intimidade com pontas de cigarro, papéis de bala, palitos de fósforos queimados e muitas outras coisas ainda bem menos nobres e poéticas. Isso, é claro, sem falar do perigo de se esbarrar numa avultada pilha de enciclopédias, mal equilibrada sobre um dicionário, e causar um monumental desastre… Há até o risco de morte. A morte sob o peso do conhecimento!

Encontrar, especificamente, uma obra ali? Tarefa totalmente impossível. Nessa loja, compra-se aquilo que o acaso faz cair nas mãos. Lobato está ao lado de Eça que, por suas vez, está por cima de Montaigne, que, inexplicavelmente, está apoiado em Rousseau — que se encontra frente a frente com Byron. O positivismo se avizinha do tomismo e Kant se deixa montar por Sartre e por Baudelaire. James Joyce disputa um instável lugar com Hemingway, enquanto Jorge Amado e Simone de Beauvoir empurram Thomas Mann para uma posição perigosa.

Sorrindo, vemos que inimigos mortais em vida se encontram agora lado a lado, deitados juntos, placidamente instalados. Talvez em seus túmulos, eles estejam remexendo, cheios de revolta…

Fontes
http://www.ryoki.com.br/sebo.htm
Imagem = http://www.overmundo.com.br/

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Paulo Afonso Ramos (Velhice)

Velho com cachimbo (Rodrigo Quaresma)
Parei à porta do destino, por tantas ruas que andei e com tantas pessoas me cruzei em gestos impensados e com palavras agridoces, que nem dei pelo tempo passar…

Sempre acreditei que um dia, longínquo dia, eu te encontraria. Sempre te vi como um destino para lá de Marte e nem sequer questionei a minha loucura …

Oh! Louco de emoção, por estar à tua porta, por estar contigo, num tempo quase parado e em que me sobra quase tudo … apenas me falta a agilidade do meu corpo torneado de outros tempos …

Nem sei se foi o destino que se cruzou com a minha velhice ou se foi ao contrário, nem sei se posso almejar o futuro.

Hoje interiorizei a tua imagem de sapiência e de cautela disfarçada, agarrei o teu silêncio na bravura desse espaço suave … hoje comecei um novo ciclo.

Agora, deixa-me desfrutar os momentos. Deixa-me mesmo que não queiras …

Fontes:
In Programa Lugar Aos Outros. http://www.truca.pt/raposa_textos/
Pintura = http://blog.oxys.com.br/

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Natália Bonito (Poemas Avulsos)

Natália Bonito, uma jovem com 21 anos, natural de Canhas, uma povoação da freguesia da Ponta do Sol, na Madeira. É, atualmente, finalista do curso de Economia, na Universidade da Madeira. Escreve desde os 12 anos, sendo em 2005, com 18 anos, apoiada pela Câmara Municipal da Ponta do Sol, na edição do seu primeiro trabalho de poesia, intitulado “Amor do meu Viver”.

No passado dia 27 de Setembro foi lançado o seu segundo livro, intitulado “A Janela deste Mar”, com a chancela da Corpus Editora. Está já a preparar outro livro de poemas que terá como título “Quatro Dimensões”.

É desta obra o primeiro poema intitulado “Inspiração”..

Inspiração

Vejo-te na sombra de um abraço,
Procuras a relatividade perdida
Na noite infinda de cansaço
Noite de entrega jamais esquecida.

Vejo-te presa no meu regaço
Sequiosa, floras a excitação prometida
Em beijos tocados no compasso
Da sinfonia foragida.
Vejo-te na dimensão deste espaço
Onde te rasgas despida
Para gáudio do aplauso
Desta miragem suicida.

Vejo-te nua, poética passo a passo
Por entre a penumbra desta descida
Que ampara cada pedaço
Desta visão entorpecida.
——————————
Apaixonantes sensações

Arde em mim a sensação
Dos minutos sem fim
Como se tudo fosse inspiração
Doce, com sabor a jasmim,
Como se eu fosse alma e coração
E tu pedaço de mim.

Clamo a evidência perfeita
Dos abraços ancorados
Na submissão desfeita
Pelo poder dos corpos suados
Que em cada palavra eleita
Oferecem poemas amados.

Olho o infinito da escuridão
Nesta noite de calmaria,
E sonho com a tua mão
Estendida na periferia
Do meu latente coração
Num gesto de sintonia.

Por instantes, sinto o teu respirar
Bem perto da liberdade
Que a minha mente teima em traçar
Com purpurina e vaidade
Na esperança de ver chegar
O momento da feliz verdade.

E vejo-te, ao longe, a sorrir…
Aproximas-te com lentos passos
Regateando as flores por abrir
Com gestos delicados e rasos
Que fazem lembrar notas a cair
Na pauta musical dos abraços.

És tu, apaixonante,
A vida do meu respirar;
És tu, meu amante,
Alma límpida por amar,
Rosto marcante
Que teima em ficar.
—————————–
Ingrata submissão

Regresso à existência
Inexistente deste abraço
Como se a clemência
De cada passo
Não fosse mais que veemência
Inculto cansaço
Vil desobediência.

Sigo as pinceladas
Do quadro pintado à beira mar
Onde as ondas apaixonadas
Quiseram beijar
As pedras encharcadas
Das palavras por poetizar
Rudes ausências demoradas.

E mais uma vez regresso ao seguimento
Da curvatura lembrada
Nos céus do firmamento
Onde a lua ancorada
Dançou ao sabor do vento
Uma dança recusada
Sem desculpa ou argumento.

Sigo com o espírito calado,
A alma cede e é só escuridão
No resquício rasgado
Do meu coração
Despedaçado
Pela ingrata submissão
De ser apaixonado.
——————————–
Estrofes solitárias

O silêncio derruba a sensação
De ser verso descoberto
Na estrófica dimensão
Deste poema aberto.

Sinto as alvíssaras prometedoras
A derrubar
As pontes ameaçadoras
Do verbo criar.

Sozinha,
Choro a angústia do tormento
Grito o desalinho da frieza
Espero encontrar o alento
Desejo libertar a tristeza.

Sozinha,
Creio na sepultura dos incrédulos
Anseio um céu bem maior
Invento a loucura dos belos
Finjo ser primavera do amor.
——————————–
Não engano meu coração

Entra em mim uma imprópria vontade…
Somente um grito por gritar
Engana minha triste saudade;
Somente uma noite por chegar
Acalma o fulgor da idade.
Sempre acreditei na luz da vida,
Brinquei às paixões fulminantes
E na brincadeira, esquecida,
Deixei à nora meus amantes…
Agora meu castigo é chorar,
Chorar uma inocência perdida,
Uma pureza que não mais quer voltar:
Fugiu sem alma, nem vida,
Juntamente com aquele amar…
E não engano meu coração,
Porque sou eu quem mais ama:
Sou eu amor e paixão,
Fogo que queima a própria chama…

in A Janela deste Mar
—————————————

Fugaz eternidade de viver

Cerca-me uma fugaz eternidade!
A aura celeste perde-se
Em ritos de bela vaidade
Que ofuscam o interior
Da mais singela cidade
Construída com amor
E muito pesar da idade…
Eu também teria nesta procura
Um insensato querer,
Uma réstia de loucura,
Um fogo que teima em arder
Mas que muito não dura,
Pois morrer é viver
Uma manhã mais escura…

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Adriana Falcão (O homem que só tinha certezas)

Nem o homem feliz de Maiakovsky nem o homem liberto de Paulo Mendes Campos, resolvi imaginar outra improbabilidade. Digamos que aparecesse agora, justo aqui no Brasil, no Rio de Janeiro, mais exatamente, bem aí na sua frente, um homem que só tivesse certezas.

O homem que só tinha certezas quase nunca usava ponto de interrogação, e em seu vocabulário não constavam as expressões: talvez, quiçá, quem sabe, porventura.

Parece que foi de nascença. Ele já teria vindo ao mundo assim, com todas as certezas junto, pulou a fase dos por quês e nunca soube o que era curiosidade na vida. Na escola, era uma sensação. Mas não ligava muito pra isso não. E cresceu achando muito natural viver derramando afirmações pela boca. Tinha resposta pra tudo, o homem que só tinha certezas, mas o maior orgulho do homem eram as certezas mais duvidosas que ele tinha. A certeza de que o mais fraco ia vencer, de que as coisas iam melhorar, de que o desenganado ainda teria muitos anos pela frente.

A notícia espalhou-se rapidamente. Como ele vivia no meio de pessoas, e pessoas vivem cheias de dúvidas, logo começaram a pedir sua opinião para os mais diversos assuntos, os triviais e os de grande importância, e ele, certo de que podia viver muito bem de suas certezas, virou um consultor. Pendurou em sua porta uma placa onde estava escrito “Consultor de tudo” e o negócio foi crescendo aos pouquinhos. Devido ao boca-a-boca favorável de clientes e a um único anúncio no rádio, passou a atender, sem nenhum exagero, milhares de pessoas por dia, até que limitou o número de consultas diárias para quatrocentos e oitenta, um minuto e meio por pessoa, o que era mais do que suficiente para uma resposta certa desde que a pergunta não fosse muito longa.

Chegava gente do país inteiro e depois de outros continentes, pessoas comuns, pessoas ilustres, todas elas indecisas, mas cada pessoa só tinha direito a uma pergunta por consulta, o que as deixava mais indecisas ainda. Certa vez uma moça chegou na dúvida se devia perguntar primeiro sobre o amor ou o trabalho, no que o homem respondeu, sobre o amor, é claro, senão você não vai conseguir trabalhar direito, e deu por encerrada a consulta. O homem que só tinha certezas aconselhou um garoto tímido a tomar quatro cervejas, encorajou um político receoso a aprovar um projeto esquisitíssimo que se destinava a melhorar a vida dos homens, avisou a uma senhora preocupada com os anos que no caso dela nada melhor do que beijos na boca, desentorpeceu um rapaz doente de amor por uma mulher que gostava de outro, convenceu o ministro da fazenda de que ou o dinheiro era pouco, ou eram muitos os homens, ou ele estava louco, ou alguém tinha se enganado nas contas.

Não demorou muito para se tornar capa de todas as revistas e personagem assíduo dos programas de TV. Para cada pergunta havia uma só resposta certa e era essa que ele dava, invariavelmente, exterminando aos pouquinhos todas as dúvidas que existiam, até que só restou uma dúvida no mundo: será que ele não vai errar nunca? Mas ele nunca errava, e já nem havia mais o que errar, uma vez que não havia mais dúvidas.

Num mundo que só tinha certezas, o homem que só tinha certezas virou apenas mais um homem no mundo. Melhor assim, ele pensava, ou melhor, tinha certeza.

Um dia aconteceu um imprevisto, e o homem que só tinha certezas, quem diria, acordou apaixonado. Para se assegurar de que aquela era a mulher certa para ele, formulou cento e vinte perguntas, que ela respondeu sem vacilar, mandou fazer mapas do céu, exames de sangue, contagem de triglicerídeos, planilhas complicadíssimas e finalmente apresentou a moça à sua mãe e ao seu cachorro. Os dois se amaram noites adentro, foram a Barcelona, tiraram fotos juntos, compraram álbuns, porta-retratos, garfos, facas, um escorredor de pratos, tiveram filhos e tal, e, desde então, por alguma razão desconhecida, o homem que só tinha certezas foi perdendo todas elas, uma por uma. No início ainda tentou disfarçar, por via das dúvidas, quem sabe era um mal passageiro? Mas as dúvidas multiplicavam-se como praga (dúvidas se multiplicam?), espalharam-se pelo mundo, e agora, meu Deus? Deus existe? Existe sim. Ou será que não? Ele não estava bem certo.

Fonte:
FALCÃO, Adriana. O doido da garrafa. SP: Ed. Planeta do Brasil, 2003.

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Adriana Falcão (1960)

Solidão é uma ilha com saudade de barco
(Adriana Falcão)

Roteirista e escritora brasileira. Nasceu no Rio de Janeiro, e mudou-se para Recife aos 11 anos de idade. Teve uma história de vida trágica: o pai suicidou e a mãe, um tempo depois, tomou uma dose fatal de comprimidos para dormir.

Formada em Arquitetura, logo após formar-se voltou para o Rio de Janeiro junto com João Falcão, seu marido, que se mudou para lá a fim de fazer teatro. Lá começou a escrever os diálogos, e os atores começaram a gostar de seus diálogos e a usá-los nas peças. Nunca exerceu a profissão de arquiteta, pois logo descobriu sua vocação para a literatura.

Seu primeiro livro, voltado para o público infantil, “Mania de Explicação”, teve duas indicações para o Prêmio Jabuti/2001 e recebeu o Prêmio Ofélia Fontes — “O Melhor para a Criança”/2001, da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Em 2002, publicou “Luna Clara & Apolo Onze”, seu primeiro romance juvenil. Seu romance “A Máquina” foi levado aos palcos por João Falcão. Na televisão, Adriana colaborou em vários episódios de “A Comédia da Vida Privada”, “Brasil Legal” e “A grande família”, todos da Rede Globo. Adaptou, com Guel Arraes, “O Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna, para a TV, posteriormente levado ao cinema.

Outros livros da escritora:“Pequeno dicionário de palavras ao vento” (2003); “A tampa do céu” (2005)-ilustrações de Ivan Zigg e, em conjunto com outros escritores,”Histórias dos tempos de escola: Memória e aprendizado” (2002); “Contos de estimação” (2003); “A comédia dos anjos” (2004); “PS Beijei” (2004); “Contos de escola” (2005); “O Zodíaco – Doze signos, doze histórias” (2005); “Tarja preta” (2005); “Sonho de uma noite de verão” (2007) e “Sete histórias para contar” (2008).

Fontes:
http://www.releituras.com.br/
http://pt.wikipedia.org/
http://www.pensador.info/

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Entrevista com Adriana Falcão

Por: Gabriela Cuzzuol em 25 de julho de 2007.

Os detalhes da trajetória de Adriana Falcão, são tão diferentes que poderiam ter sido extraídos de um de seus livros de ficção. Carioca, criou-se em Recife e voltou para o Rio, quando, depois de se formar em arquitetura resolveu passar a vida fazendo algo de que gostasse, ou seja, escrever. Embrenhou-se pelo universo da publicidade, até que Guel Arraes, diretor humorístico, pegou um de seus textos e resolveu utilizá-lo em teatro. Tempos depois, os dois adaptariam para TV e cinema, O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, que acabaria sendo um divisor de águas do cinema nacional.

Mais uma vez, fez o “caminho inverso” , tendo se firmado primeiro como roteirista, cronista e então embarcando para literatura. .Em 15 anos de carreira são 13 livros, 2 adaptações para cinema, uma peça de teatro e três séries para TV, entre as quais A Grande Família no ar há 7 anos e quarta maior audiência da emissora .

Nesta entrevista Adriana fala de sua trajetória, planos futuros e de “Sonhos de Uma Noite de Verão”, adaptação de Shakespeare “bem abrasileirada” assinada por ela:

Gabriela Cuzzuol: Você é arquiteta. Como enveredou pela literatura?

Adriana : Bem, para começar eu detestava muito arquitetura, não tinha nada a ver. Aí conheci o João, que largou o curso e foi fazer teatro. Fui com ele, mudamos para o Rio e eu comecei a escrever diálogos. Os atores de teatro gostavam e começaram a usar em peças.

Gabriela Cuzzuol: Já imaginava poder viver de arte?

Adriana Falcão: De forma nenhuma. Para qualquer menina brasileira era inimaginável viver qualquer forma de arte, imagine para uma que vivia em Recife! Eu sou carioca, mas fui criada lá! Então, trabalhava como redatora publicitária e me considerava bem feliz por poder ao menos, viver de escrever! O João (Falcão- esposo e sócio de Adriana),começou a trabalhar com isso profissionalmente encarando, inclusive as dificuldades da profissão. Eu,
colaborava, mas vivia de publicidade.

Gabriela Cuzzuol: Sim. E da redatora a roteirista…

Adriana: Pois é. Fui convidada a escrever umas crônicas para a “Veja São Paulo”, entre 1994 e 95. O Guel (Arraes) gostou e pediu para usar. Paralelamente, o João trabalhava com teatro e os atores gostavam dos diálogos que eu escrevia. Então foi assim. Até hoje sou especialista em diálogos, Na “Grande família” por exemplo, é essa a minha maior função e quando tenho que fazer adaptação para roteiro trabalho com um roteirista do lado.

Gabriela Cuzzuol: E com o Guel Arraes você adaptou “O Auto da Compadecida” ?

Adriana: Sim, foi. O Guel é um grande amigo e fizemos boas coisas juntas. Acho inclusive que um texto meu ter caído nas mãos dele, foi uma grande sorte minha.

Gabriela Cuzzuol: E o desenvolvimento da sua carreira passa pela do João Falcão, seu marido?

Adriana: Sim, sem dúvida. Fizemos e ainda fazemos muitas coisas juntas. A adaptação da “A Máquina” para teatro é dele a para cinema foi a parceria, a “Comédia da Vida Privada” e “A Grande Família” também No momento estamos adaptando o meu livro “A Comédia dos Anjos” para cinema . Somos casados há 19 anos e muito próximos.

G.C: Adriana, ainda falando de cinema, em sua opinião se fazem poucos filmes no Brasil?

Adriana: Pouquíssimos. Acho que nós estamos vindo de um período negro no cinema nacional, anos e anos sem produção nenhuma, estamos recomeçando todo um trabalho. João e eu sempre estivemos muito próximos a todo o processo de produção de filmes, no ‘A Máquina” por exemplo acompanhamos tudo bem de perto, e acho inclusive que o processo se parece bastante com o de Tv.

G.C: E isso é ruim?

Adriana: Não necessariamente. Existe esse preconceito de que diretor de TV não pode fazer cinema porque fica com cara de TV e isso não tem nada a ver. O cara que está ali fazendo TV há 20 anos tem todo um conhecimento técnico que pode e deve ser aproveitado. O Jorge Furtado, tem como elemento básico no currículo a experiência em Tv. O Guel também agrega as duas coisas e tal…acho isso muito válido. São inclusive dois grandes diretores, que juntam as experiências em veículos diferentes.

G.C:Ainda tratando de cinema, você acha que faltam roteiristas?

Adriana: Faltam , sobretudo bons . Acho que como passamos muitos anos sem produzir cinema, só agora as pessoas estão se interessando em estudar roteiro, aprender a fazer , se interessando mais aprimorar , investindo nisso. Eu acho que falta um pouco de formação, ou melhor que a formação é algo recente. O Guel costuma dizer que difícil no cinema brasileiro não é diretor, mas roteirista. Não é todo dia que eu olhe um roteiro e ache realmente surpreendente. É difícil de encontrar.

G.C: você as chances para estes novos roteiristas? Está mais difícil começar?

Adriana: Nossa, muito. É muito complicado porque você tem que dar sorte. Eu sinto as vezes que as pessoas têm até certa má vontade em ler um roteiro de alguém que está começando, sabe? Você tem que contar com a sorte de fazer um bom contato, de o roteiro cair nas mãos certas,e aí vai… Eu costumo dizer que tive muita sorte na vida, conhecer o Guel inclusive foi uma delas…
Eu não estaria aqui hoje se não fosse por sorte.

G.C:Então você acha que era o seu caminho?

Adriana: Tenho certeza de que em todo o caminho o importante é a persistência.Se você quer, se acredita, batalha porque um dia vai.
Como eu coloquei, há a necessidade de novos roteiristas.Na “Grande Família” trabalhamos com uma equipe de 7 pessoas que vieram da Oficina da Globo e tem dado muito certo.

G.C: O mercado de cinema necessita de maior produção?

O mercado precisa de mais produção, o país tem que filmar mais. Eu acho um prazer ler roteiro de iniciante porque é bom você ver algo novo, diferente, então leio tudo o que cai na minha mão e acho que não é favor.E tem ainda a ver com minha filosofia de “devolver a vida o que ela me deu”. Acho que tenho muita sorte não apenas no profissional, mas também no pessoal, tenho duas filhas lindas, um casamento bacana, uma profissão que amo. Então tenho mais é que me sentir honrada em poder ser gentil com as pessoas, … não acho que seja favor não. Acho que o nosso cinema precisa de novidade, o nosso país precisa de gente nova , preparada e boa fazendo cinema.

G.C: E falando de literatura Adriana, você acaba de lançar uma releitura de Shakespeare. Como surgiu a idéia?

Adriana: A Editora Objetiva me ligou e falou que tinha o projeto “Devorando Shakespeare”,pelo qual eu, Veríssimo e Jorge Furtado adaptássemos as obras que preferíssemos do autor. Aí, fiquei nervosa duas vezes: primeiro por ser tratar de Shakespeare, segundo por estar ao lado do Veríssimo e do Furtado, que são dois ídolos para mim!
Eu pensei: Nossa, olha a responsabilidade! Vão digitar Veríssimo, Furtado e Shakespeare na Internet e lá estarei eu, ao lado deles! E para piorar, eu não sou profunda conhecedora da obra dele, há outros autores que conheço bem, mas ele não!
Gosto e tudo, mas sei o básico.

G.C:E como foi a opção pelo “Sonhos de uma Noite de Verão”?

Adriana: Pois é, eu gosto muito de realismo fantástico, aquela coisa meio Gabriel García Marques, Vargas Llosa e tal…
Então, pensei em fazer o “Sonhos” por ter essa coisa meio mágica, meio surreal, de quatro noites que parecem uma e no fim é tudo um sonho.

G.C:E a idéia da estória se passar no Carnaval da Bahia, foi simples?

Adriana: Não, foi bem complicado. A idéia da Objetiva era de adaptar o roteiro para uma realidade bem brasileira , então eu pensava, pensava, até que achei que esse negócio de quatro noites que parecem uma poderia acontecer no Carnaval da Bahia.

G.C: Já esteve lá?

Adriana: Sabe que nunca! Ouço falar, os artistas vão e me contam e acho até que nós vemos tanto pela TV que nem precisa ir para saber como é (risos)…

G.C: O “Sonhos…” ironiza essa cultura de celebridades. Coincidentemente, você e João Falcão não são comumente vistos na mídia. É temperamento ou opção?

Adriana: Acho que os dois. Eu sou mais caseira, até porque ando trabalhando demais e quando tenho um tempinho, prefiro curtir a família, reunir os amigos em casa e tal…
João é mais de tocar um violão, confraternizar aqui mesmo. É mais a nossa…

G.C: No Comédia dos Anjos (seu best seller) , você trata das relações familiares. Acha que isso manifesta um traço cultural latino?

Adriana: Totalmente. Eu e João estivemos na França, enquanto fazíamos a adaptação do livro para cinema, e reparamos em como essa relação é diferente lá. Essa coisa do filho em casa aos 30 anos chega a incomodar os pais…Aqui nós choramos quando eles vão embora.

G.C:Ainda falando sobre o “Comédia…”, você diz que ele foi inspirado na sua mãe. São pessoas que te inspiram ou vem mais de situações diversas?

Adriana: Olha tem umas pessoas bem engraçadas que acabam por ser referência.
Tenho um cunhado por exemplo, de quem me lembro quanto estou escrevendo o Agostinho da “Grande Família”. Tipo, ele não tem aquele estilo malandrão, meio irresponsável…mas o jeito “figura” do Agostinho é todo dele. Algo que vi na rua, algo que me contaram…na hora de escrever, vai tudo!

G.C: Você tem livros publicados para o público infantil e infanto-juvenil. Resolveu escrever para este filão por achar que há carência de mercado ou sua forma de narrativa tem elementos que facilitam o contato com esse público?

Adriana: Olha, eu acho que o mercado infanto-juvenil tem uma produção muito pequena. Há muitas coisas para crianças e adultos, mas poucas para aquele período entre uma fase e outra. Mas também acho que meu estilo de escrever tem essa característica de reinventar as coisas, repensar…isto facilita tudo, as coisas mais simples.

G.C: E os próximos projetos, quais são?

Adriana: Bem, João e eu adaptamos para cinema o “Comédia dos Anjos”, que está em fase de produção e terá a Marieta (Severo) como protagonista . Se tudo der certo será lançado em 2008. Estou terminado uma oficina de diálogo, no Teatro Poeira no Rio, que me demandou bastante energia. No fim do mês, quero tirar uns 10 dias para me concentrar apenas na “Grande Família” e depois pensar em futuro com calma.

Fonte:
http://www.overmundo.com.br/overblog/entrevista-com-adriana-falcao

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IV Coletânea de Poesia, Conto e Crônica de Canoas (RS), prorroga inscrição até 20 de Março.

A CASA DO POETA DE CANOAS realizará a 4ª edição de sua coletânea de trabalhos literários, com a finalidade de incentivar e promover o talento de seus associados e simpatizantes. A obra abrangerá os gêneros Poesia, Crônica e Conto. A seguir o Regulamento e a Ficha de Inscrição

REGULAMENTO

1. Poderão participar autores do Brasil e de outros países, desde que as obras sejam em Língua Portuguesa.

2. A Casa do Poeta de Canoas receberá os textos da coletânea impreterivelmente até o dia 20 (vinte) de dezembro de 2008 (prorrogado até 20/3/2009), enviados para o e-mail coletanea@casadospoetas.com.br ou via postal para IV Coletânea Casa do Poeta de Canoas – Rua Araújo Lima, 150 – Canoas/RS – CEP: 992010-110.

3. Cada autor poderá participar com número ilimitado de cotas (páginas), ao valor unitário de R$50,00 (cinqüenta reais) para os associados da Casa do Poeta de Canoas e R$60,00 (sessenta reais) para os não associados. Os associados da Casa do Poeta de Canoas que não estiverem com a contribuição mensal em dia, pagarão a cota de não associado.

4. O material enviado por e-mail (textos, ficha de Inscrição e breve currículo) deverá ser digitado em fonte Times New Roman, corpo 12, entrelinhas 1,5, em formato .doc (Word), acompanhado da cópia do comprovante de depósito com a identificação do depositante.

5. Se enviados via postal, os textos, a Ficha de Inscrição e o breve currículo devem também estar gravados em CD (conforme o item 4) e acompanhados da cópia do comprovante de depósito com identificação do depositante.

6. A Ficha de Inscrição (para preenchimento e envio) e o Regulamento estão disponíveis no endereço http://www.casadospoetas.com.br

7. Os textos deverão ter no máximo a seguinte configuração por página:para cada conto ou crônica: 1ª página – 1.450 caracteres com espaço (toques); a continuação nas demais páginas – 1.650 caracteres com espaço (toques); Cada poesia: 1ª página – 28 linhas com um máximo de 45 caracteres com espaço (toques) por linha; excedendo este número as demais páginas poderão conter 34 linhas com um máximo de 45 caracteres com espaço (toques) por linha. Linhas de espaçamento entre versos são consideradas. Título não contabiliza caracteres nem linhas.

8. Para verificar o número de páginas que o texto ocupará na coletânea, o autor poderá utilizar o e-mail simulador no sítio da Casa do Poeta de Canoas: http://www.casadospoetas.com.br/

9. Por cada cota de R$ 50,00 (sócios) ou R$ 60,00 (não sócios) o autor receberá 3 (três) exemplares da coletânea. O valor da participação deverá ser depositado no Banco Real – Agência 0578 – conta nº 7719931/2, nominado à Casa do Poeta de Canoas – CNPJ 06.284.274/0001-36.

10. Para a participação com 3 (três) páginas ou mais, o pagamento poderá ser feito com até 3 (três) cheques nominais à Casa do Poeta de Canoas descontados até a data limite de 28 de fevereiro de 2009.

11. Os trabalhos serão revisados com autorização dos autores que poderão rever seus textos antes da publicação (através de provão), em reunião a ser marcada especificamente para este fim.

12. Os autores assumem inteira responsabilidade pelos textos e a Casa do Poeta de Canoas reserva-se o direito de recusar textos que configurem plágio, que sejam preconceituosos, de caráter político, étnico, pornográfico ou religioso.

13. Os originais não serão devolvidos.

14. O lançamento da coletânea realizar-se-á em data a ser fixada.

15. A participação dos autores na coletânea dependerá do integral cumprimento do presente Regulamento, cabendo à Comissão Organizadora julgar os casos omissos no mesmo.

E-mail para envio dos trabalhos, Ficha de Inscrição, currículo e comprovante de pagamento
coletanea@casadospoetas.com.br

Saiba quantas páginas ocuparão seus trabalhos!

Para saber com exatidão quantas páginas seu(s) trabalho(s) ocuparão na Coletânea, envie os arquivos (formato .doc – do Word) para o e-mail abaixo. Como cada texto sofre variantes em decorrência de parágrafos e quebra de linhas, a equipe responsável pela formatação da Coletânea fará uma simulação com seu(s) texto(s) e lhe informará o número exato de páginas.
simulador@casadospoetas.com.br

ATENÇÃO – Os textos, depois de realizadas as simulações, serão deletados, não caracterizando o envio oficial para participação na Coletânea. Os textos juntamente com a Ficha de Inscrição, o breve currículo e o comprovante de pagamento devem ser enviados para o e-mail: coletanea@casadospoetas.com.br

Fonte:
Casa do Poeta de Canoas.
www.casadospoetas.com.br

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Wagner Ferreira (A Pedra Prole)

A pedra não se rompe nem se arrasta
É sólida, nossa última arma secreta.
Somos peregrinos nas mãos de todos
Sempre excitados para sermos atirados.
A vida: fardo caminho de pedregulhos.
O amor: a mais bela drusa, pepita mais rara.
Sentimo-nos empedrados, orgulhosos.
O mundo: penedo maior, cósmica pedreira.
Em cada sonho, o palpitar do átomo da pedra.
Enfileirando nossas casas, nossas lápides.
Cristalizando em gloriosas estátuas de lepra
Com seixos inférteis, dormentes, impunes.
Pérolas que não se divorciam nem se abortam.
Espreitam tácitas pelos nossos fracassos.
Na iminência elas esperam, se lapidam…
Proliferam pra vencer também nossos filhos.
Se elas falassem e calassem os homens…
Dinamitando a falésia da nossa paralisia,
Que nos transformou em vermes infames…
Ouro de tolo, poeira, veio da própria hipocrisia
—————————-
Sobre o Autor
Wagner Ferreira nasceu em Sorocaba, é poeta, romancista, cronista, contista, co-autor das antologias Sorocult e Rodamundo em 2008, também colunista do site Sorocult.com, cursou Direito na Fadi e Letras na Unicoc, é autodidata, acumulando várias atividades no comércio e exercendo várias profissões.
Autor do romance místico, “O caçador de milagres”. Um romance de auto conhecimento, que traz sabedorias milenares para a realidade brasileira.

Fonte:
Cenário Cultural. In http://www.cintianmoraes.com.br

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Contamos com sua Participação, Votando até 23 de fevereiro, às 23h59

Caríssimas Amigas e Caríssimos Amigos

Solicito a gentileza de enviar para o e-mail ubt001@gmail.com , votando na melhor trova, até amanhã, 23/Fev/2009, às 23h59.

Esta votação refere-se à escolha da melhor trova do I Concurso Regional de Trovas de Tremembé – Nível UNIVERSITÁRIO – Tema: NATUREZA.

Trata-se do início de um trabalho de divulgação da trova entre os estudantes universitários.

Agradeço a atenção de todos!
Bom feriado a todos!
Atenciosamente,
LUIZ ANTONIO CARDOSO
Delegado da UBT de Tremembé-SP

Nível: UNIVERSITÁRIO – Tema: NATUREZA

.
TROVA nº 01
Eis que a natureza chora…
sente na alma uma agonia.
A beleza foi-se embora…
catarinense atrofia.

TROVA nº 02
Mas que precioso presente
a natureza que temos!
Deixemo-la ao descendente
melhor do que recebemos.

TROVA nº 03
A vida: cores… beleza…
pontos de felicidade.
Cuidemos da natureza
e teremos liberdade.

VOTAÇÃO
MELHOR TROVA – Trova nº

Fonte:
E-mial recebido da UBT.

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Inscrições abertas para o Prêmio São Paulo de Literatura

Neste mês, a Secretaria de Estado da Cultura lança o concurso Prêmio São Paulo de Literatura, o prêmio literário mais bem pago do Brasil. Dois selecionados receberão, cada um, R$ 200 mil, pelos prêmios de Melhor Livro do Ano de 2008 e de Melhor Livro – Autor Estreante do Ano de 2008.

Para concorrer, o autor ou o editor devem fazer inscrição no portal da Secretaria (http://www.cultura.sp.gov.br/ ), no link Incentivo à Cultura – Projetos Incentivados, até 30 de março e podem concorrer livros de ficção no gênero romance lançados em 2008.

A entrega dos documentos exigidos pelo Edital poderá ser efetuada diretamente na Secretaria (R. Mauá, nº 51, Bairro Luz, São Paulo, SP, CEP 01028-900). Os documentos também podem ser enviados pelo Correios com Aviso de Recebimento (A.R), ou por SEDEX com A.R, dentro de uma única embalagem, com a identificação “CONCURSO: PRÊMIO SÃO PAULO DE LITERATURA 2009”. A embalagem deve conter dois envelopes lacrados: o primeiro, com a cópia dos documentos exigidos e a ficha de inscrição, e o segundo, com dez exemplares do livro.

A curadoria do concurso será formada por cinco membros – quatro escolhidos pela Câmara Setorial de Literatura da Secretaria de Estado da Cultura e um representante da Secretaria indicado pelo Secretário da Cultura, João Sayad. O júri inicial e o júri final serão compostos exclusivamente por professores universitários, escritores, livreiros, críticos literários e profissionais atuantes da área literária. Os finalistas do Prêmio serão anunciados no Festival da Mantiqueira, entre 29, 30 e 31 de maio, na cidade de São Francisco Xavier.

EDITAL

“CONCURSO: PRÊMIO SÃO PAULO DE LITERATURA 2009”

O GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO, por intermédio de sua SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA, com sede na Rua Mauá 51, Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, representada por seu secretario, Sr. João Sayad, institui o Concurso “PRÊMIO SÃO PAULO DE LITERATURA 2009” (adiante referido como PRÊMIO), nos termos e condições estabelecidas neste Edital, que se regerá pela Lei Estadual nº 6.544/89, pela Lei Federal nº 8.666/93, e respectivas alterações, assim como pelas demais normas legais e regulamentares pertinentes à espécie, inclusive pela Resolução SC – 04/09.

1 – DO OBJETO
1.1. Estabelecer normas e condições para a seleção de livros escritos em língua portuguesa editados no Brasil em 2008, tendo como finalidade conferir 2 (dois) prêmios:
a) Prêmio São Paulo de Melhor Livro do Ano de 2008; e
b) Prêmio São Paulo de Melhor Livro – Autor Estreante do Ano de 2008.

2 – REQUISITOS PARA A HABILITAÇÃO
2.1. Serão considerados neste PRÊMIO os livros que preencham cumulativamente os seguintes requisitos:
2.2. Quanto ao livro:
a) categoria: ficção no gênero romance;
b) escrito originalmente em língua portuguesa;
c) primeira edição mundial obrigatória no Brasil;
d) primeira edição no período compreendido entre 1º de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2008;
e) em modelo impresso.
2.3. Serão considerados neste PRÊMIO livros de autoria única ou escritos em co-autoria, desde que não façam parte de compilações ou compêndios.
2.4. Para concorrer ao Prêmio São Paulo de Melhor Livro – Autor Estreante do Ano de 2008, o livro deverá ter sido escrito por autor que não tenha publicado outro livro de ficção no gênero romance.
2.5. Não serão aceitos livros cujo conteúdo (parcial ou completo) tenha sido publicado, nas formas impressa e/ou virtual, antes do período determinado no item 2.2. (d).
2.6. Os livros somente poderão ser inscritos em uma única categoria de Prêmio.

3 – INSCRIÇÕES
3.1. As inscrições poderão ser feitas entre 13 de fevereiro de 2009 e 30 de março de 2009, nos dia úteis, das 9:00 às 12:00 e das 13:00 às 17:00, mediante a entrega dos documentos exigidos no item 4. diretamente no Núcleo de Protocolo e Expedição, da Secretaria de Estado da Cultura, situada na Rua Mauá, 51, Bairro Luz, São Paulo – SP , CEP: 01028-900, ou por Via Postal com Aviso de Recebimento (A.R) ou SEDEX com A.R, dentro de uma única embalagem (Envelope, Pacote ou Caixa), com a identificação “CONCURSO: PRÊMIO SÃO PAULO DE LITERATURA 2009”, contendo em seu interior os dois envelopes lacrados conforme descritos no item 4.
3.2. Na hipótese de mais de uma inscrição para o mesmo livro, será considerada válida a primeira inscrição realizada.

4 – DA DOCUMENTAÇÃO
I. (ENVELOPE 1)
4.1. No caso de inscrição feita pelo autor:
a) Ficha de requerimento de inscrição devidamente preenchida (Anexo I);
b) Cópia do R.G. (será considerado documento de identidade: carteira expedida pelos comandos Militares, pelos Institutos de Identificação, pelas Secretarias de Segurança Pública e pelos Corpos de Bombeiros Militares; carteira expedida pelos órgãos de fiscalizadores de exercício profissional (ordens, conselhos etc…); passaporte brasileiro, certificado de reservista, carteira funcional do Ministério Público, carteira profissional expedida por órgão público; carteira de trabalho, carteira nacional de habilitação (somente o modelo novo, com foto);
c) Cópia do CPF válido ou documento que contenha o número do CPF;

d) Nos casos de inscrição realizada por procurador do autor, deverá ser apresentado, juntamente com os demais documentos previstos no item 4.1., o respectivo instrumento de procuração, bem como cópia da Carteira de Identidade e CPF do procurador;
e) O autor menor de 18 (dezoito) anos de idade será assistido por seu responsável (pai/mãe ou representante legal), por meio de instrumento de procuração e apresentação de cópia da Carteira de Identidade e CPF.

4.2. No caso de inscrição feita pela Editora:
a) Ficha de requerimento de inscrição devidamente preenchida (Anexo II);
b) Cópia do CNPJ da Editora;
c) Cópia do CPF válido ou documento que contenha o número do CPF ou do R.G. do representante legal da Editora (vide subitem 4.1. (b)).

II – (ENVELOPE 2)
a) Deverá conter 10 (dez) exemplares do livro;
b) Não serão permitidas alterações, acréscimos e revisões no conteúdo do livro depois de o mesmo ter sido entregue.

5 – DOS ÓRGÃOS DELIBERATIVOS: CURADORIA E JÚRI
5.1. Considera-se, no âmbito deste Edital, que:
a) A Curadoria é formada por 05 (cinco) pessoas, sendo 04 (quatro) escolhidas pela Câmara Setorial de Literatura da Secretaria de Estado da Cultura; e a quinta pessoa um representante da Secretaria de Estado indicado pelo Secretário da Cultura. Todos os membros serão nomeados pelo Secretário da Cultura;
b) O Júri Inicial e o Júri Final serão compostos exclusivamente por professores universitários, escritores, livreiros, críticos literários e profissionais atuantes da área literária, preferencialmente por uma pessoa de cada área. O Júri Inicial e o Final são os responsáveis pela avaliação e votação dos livros concorrentes ao PRÊMIO em suas etapas sucessivas e de acordo com as regras definidas neste Edital.

5.2. Compete à CURADORIA:
a) Responder em nome próprio pelos resultados de todas as etapas do PRÊMIO, inclusive perante a imprensa brasileira e estrangeira;
b) Propor, para aprovação do Secretário da Cultura, os membros do Júri Inicial e Final;
c) Avaliar, em todas as etapas do PRÊMIO, o cumprimento pelos livros inscritos dos requisitos estabelecidos neste Edital;
d) Participar da divulgação do PRÊMIO, pelos meios que se colocarem;
e) Manter compromisso de sigilo quanto às informações das votações dos Júris de todas as etapas do PRÊMIO até a sua divulgação final;
f) Averiguar, a qualquer momento ou etapa do PRÊMIO até a divulgação pública do resultado da votação do Júri Final, se os livros inscritos cumprem os requisitos estabelecidos no item 2 deste Edital;
g) Deliberar por maioria simples de seus membros.

5.3. JÚRI INICIAL
5.3.1. O Júri Inicial do PRÊMIO é composto por 10 (dez) profissionais de reconhecido mérito e competência no meio literário, convidados mediante proposta da Curadoria e aprovação do Secretário.
5.3.2. O Júri Inicial tomará as decisões referentes à Primeira Etapa do PRÊMIO.
5.3.3. Compete ao Júri Inicial, entre 02 de abril de 2009 e 27 de maio de 2009:
a) Votar nos livros que vão compor duas listas de até 10 (dez) livros cada, sendo uma para o Melhor Livro do Ano de 2008 e outra para o Melhor Livro – Autor Estreante do Ano de 2008, as quais serão divulgadas.

5.4. – JÚRI FINAL
5.4.1. O Júri Final é composto por 05 (cinco) pessoas, indicadas pela Curadoria com os mesmos critérios do Júri Inicial.
5.4.2. O Júri Final tomará as decisões referentes à Segunda – e última – Etapa do PRÊMIO.
5.4.3. Compete ao Júri Final, em no máximo 45 (quarenta e cinco) dias:
a) A partir das listas dos livros finalistas obtidas na etapa anterior, eleger, por meio de votação, os dois ganhadores, um para o Prêmio São Paulo de Melhor Livro do Ano de 2008; e outro para o Prêmio São Paulo de Melhor Livro – Autor Estreante do Ano de 2008.
5.4.4. A votação do Júri Final será realizada em reunião presencial na sede da SEC.
5.4.5. Será escolhido um único livro vencedor para cada prêmio.

6 – ORGANIZAÇÃO
6.1. À Secretaria de Estado da Cultura, por meio da UFDPC, compete:
a) Aprovar a Curadoria e seu coordenador;
b) Aprovar o Júri Inicial e o Júri Final, mediante proposta da Curadoria;
c) Definir os termos e as formas de divulgação dos resultados de cada etapa do PRÊMIO;
d) Fazer a gestão geral de todas as etapas e atividades relativas ao PRÊMIO;
e) Participar de todas as etapas do PRÊMIO e das deliberações da Curadoria;
f) Apoiar técnica, logística e administrativamente os trabalhos, preparatórios ou de implementação, da Curadoria e do Júri do PRÊMIO, em todas as suas etapas;
g) Garantir todas as condições logísticas para atender as despesas com diárias e com passagens dos membros da Curadoria e do Júri, se for o caso;
h) Deliberar sobre todos os assuntos no âmbito do PRÊMIO;
i) Zelar pelo cumprimento do Edital do PRÊMIO;
j) Esclarecer e deliberar sobre eventuais dúvidas de interpretação do Edital do PRÊMIO.
6.2. A UFDPC poderá firmar parceria com Organização Social para a realização dessas tarefas relativas ao PRÊMIO.

7 – PREMIAÇÃO
7.1. O valor bruto do Prêmio é de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para o Melhor Livro do Ano de 2008 e de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para o Melhor Livro -Autor Estreante do Ano de 2008. Desses valores serão descontados os impostos previstos por lei.
Parágrafo Único: No caso de livro escrito em co-autoria, o valor do Prêmio será dividido em partes iguais entre os autores vencedores.
7.2. Os vencedores receberão certificado de premiação.
7.3. O valor do prêmio será pago aos vencedores em parcela única e em até 30 (trinta) dias úteis contados da data da divulgação do resultado da votação do Júri Final.
7.4. O pagamento do prêmio será efetuado mediante crédito em conta corrente em nome do vencedor, aberta em instituição bancária a ser definida pela Secretaria de Estado da Cultura.
7.5. O prêmio a que fará jus o vencedor é intransferível e inegociável, e terá validade até o dia 31 de dezembro do corrente ano. Em caso de renúncia à premiação, a SEC deliberará sobre a destinação do seu valor.
7.6. Excepcionalmente, no caso de falecimento do autor, o PRÊMIO poderá ser concedido in memorian. Nesse caso, a entrega será realizada a procurador legalmente constituído para esse fim dentre os herdeiros legais do autor premiado, desconsiderado o prazo fixado no item 7.3. deste Edital.

8 – GESTÃO
8.1. A gestão do PRÊMIO cabe à SEC.
8.2. A decisão do Júri Inicial e do Júri Final em todas as etapas do PRÊMIO será recorrível, limitada ao não atendimento dos requisitos do item 2 deste Edital. O recurso deverá ser endereçado à UNIDADE DE FOMENTO E DIFUSÃO DE PRODUÇÃO CULTURAL – UFDPC no prazo de 10 (dez) dias corridos contados após a divulgação das listas.

9 – DISPOSIÇÕES FINAIS
9.1. É vedada, neste concurso, a participação dos membros do Júri Inicial, Final, da Curadoria e de servidores pertencentes ao quadro da Secretaria de Estado da Cultura, inclusive credenciados, prestadores de serviços e funcionários das organizações sociais vinculadas a esta Secretaria, bem como de parentes até o segundo grau.
9.2. Todos os livros inscritos serão incorporados ao acervo da Secretaria de Estado da Cultura.
9.3. Os vencedores serão informados por carta e/ou por meio eletrônico.
9.4. A inscrição neste Concurso representa a concordância do Autor e da Editora com todos os itens deste Edital.
9.5. Será publicado aviso resumido deste Edital no Diário Oficial do Estado. O Edital estará disponível na íntegra no portal www.cultura.sp.gov.br e na Secretaria de Estado da Cultura.
9.6. Eventuais esclarecimentos referentes a este concurso serão prestados na Secretaria de Estado da Cultura, por meio da UFDPC, na Rua Mauá, 51 – Térreo, em dias úteis, pelos telefones: 11 2627-8268 e 2627-8145 no horário de 10:00 às 17:00 ou pelo email: fomento.sec@gmail.com
9.7. Compõem o presente edital:

Anexo I – Ficha de inscrição (Pessoa Física)


Anexo II – Ficha de inscrição (Pessoa Jurídica)

São Paulo, 13 de fevereiro de 2009.

=============================
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto-USP-DIRETORIA FFCLRP
Avenida dos Bandeirantes, 3900 – Bloco 1 – 14040-901 – Ribeirão Preto – SP
Fones: (16) 3602-3644 / 3602-3670 / 3602-4681 – VOIP (16) 3602-0646 – Fone/fax: (16) 3633-2660
E-mail: adm-diretoria@ffclrp.usp.br / ffclrp@usp.br
Homepage: http://www.ffclrp.usp.br – Portal: http://portal.ffclrp.usp.br

Fontes:
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto-USP-DIRETORIA FFCLRP; e
http://www.cultura.sp.gov.br/

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Neida Rocha (Caderno de Poesias)

PORQUE ESCREVO

Quando as palavras
vem à minha mente,
sinto necessidade
de colocá-las no papel.
Enquanto nascem,
sinto como se eu
as estivessem parindo,
pois doem muito,
mas o resultado
é maravilhoso.
Cada poema
é como um parto dolorido,
mas o fruto destes sentimentos
é um resultado
sem igual,
somente semelhante
ao nascimento
de um filho.
=========================

MEDITAÇÃO

Quando
a tarde
vai embora,
o sol se esconde
e a noite
vem chegando,
surge no céu
a Lua
e as Estrelas.
Então olho
o firmamento,
e meus pensamentos
voam.
Penso
em algo distante
e indefinido.
Não sei
me expressar,
só sinto vontade
de chorar
e agradecer
por viver
e ser
tão
Feliz.
========================

ESPELHO

Olho no espelho
e percebo rugas
em minha alma.
Ouço minha alma
e percebo que estou só.
Meus fantasmas me visitam
para revelar-me
segredos esquecidos.
Quero gritar,
mas a voz cala,
fragmentada de soluços.
Toco minha pele
e busco a emoção adormecida.
Sinto a brisa do perfume ausente
e então volto à realidade,
pois a vida passou
e somente meus sentimentos
permaneceram.
=============================

ESCREVER

Não escrevo
para me exibir.
Não escrevo
para te agradar.
Escrevo
apenas
e tão
somente
para me olhar.
=======================

APENAS…VIVER

Penso
em pintar,
desenhar,
escrever,
filosofar,
cantar,
desejar,
amar,
sonhar.
E às vezes,
eu penso
se não seria
melhor,
apenas,
viver.
===================

GESTOS E OLHARES

Quando eu te conheci
não me prometeste nada,
mas teus olhos diziam
o que não falavas.
Teus carinhos demonstravam
o que não dizias.
Hoje teus olhos estão mudos
e teus braços ocupados.
Dá-me tua mão
para que eu te guie
em direção ao meu amor.
==========================

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Neida Rocha (1954)

NEIDA ROCHA (Neida da Costa Rocha) nasceu na Vila Harmonia, em Canoas/RS, dia 1º de fevereiro de 1954, Aquariana com ascedente em Peixes, filha de José Lopes da Rocha e Tereza da Costa Rocha, criada entre dois irmãos (Nei e Sidnei).
Em 1966, aos 12 anos sofreu queimaduras de 1º, 2º e 3º graus e em conseqüência, uma parada cardíaca, que deixou cicatrizes em seu corpo e sua alma.
Aos 18 anos foi Rainha do Colégio Comercial Protázio Alves.
Na Páscoa de 1973 seu irmão (Nei) passa pela transição.
Aos 19 anos iniciou a Faculdade de Nutrição (Unisinos/RS) o que interrompeu para casar.
Em 1977, grávida, mudou-se, com o marido, para Blumenau/SC.
Em 1978 deu a luz ao seu primeiro filho, Oliver Ney.
Em 1980 escreveu poema PÁSCOA em homenagem ao irmão falecido.

Era Páscoa!
Tu te foste sem um adeus,
sem uma despedida.
Tu te foste sem palavras.
Tu és sempre
motivo de lágrimas,
pois cada vez que em ti penso,
os meus olhos brilham
e há sempre
uma lágrima
querendo rolar.
Tu fizeste muito,
mas muito mais
poderias ter feito.
Como Jesus,
tinhas seguidores!
Era Páscoa!
Como Jesus,
que ressuscitava,
tu morrias
e nascias para
a Vida Eterna!!!

O poema foi publicado no Jornal Correio do Povo (Porto Alegre/RS), iniciando assim, sua vida literária.
Em 1987 deu a luz ao seu filho, Otávio Luis.
Sofreu alguns abortos e escreveu o poema: ANGEL.

Pequeno anjo
que busca a Luz.
Reflete
o Amor transcendente.
Busca a Paz
no convívio com os seus.
Alimenta-se
do Amor Fraterno.

Aos 45 anos retomou os estudos e aos 50 anos concluiu a Faculdade Letras (Português/Inglês) e aos 53 Pós Graduação (Língua Portuguesa) – FURB/SC.
Eterna Buscadora, é Rosacruz, foi Mestre e Monitora Regional em SC.
Em 2000 sua mãe sofreu um AVC e perdeu o movimento do lado direito do corpo e 80 % da fala. Para ela, Neida escreveu o poema: MÃEZINHA.

Tua Metade adormeceu!
Tua voz calou!
Teu braço caiu!
Tua perna parou!
Estás incompleta!
Estás pela metade!
No entanto,
teu coração está vivo
e a metade que funciona
é justamente onde está teu coração.
Agradeço por poder te dedicar
uma parcela do amor,
que tanto me dedicaste.
Sei que tudo isso é passageiro
e que tua garra e tua vontade
te levantarão mais cedo
do que todos pensam.
E sem ter que provar
nada, a ninguém,
breve estarás “inteira”.
E quero ainda dizer-te,
que mesmo estando incompleta,
és mais completa do que muitas “perfeitas”!

Em 2006, os pais visitaram a filha para o casamento de Oliver.
Seu pai, que cuidava de sua mãe, passou pela transição, me Blumenau, 5 dias antes do casamento do neto. Para o pai, Neida escreveu o poema: MEU PAI.

Meu pai não me pariu.
Meu pai não sofreu as dores do parto.
Meu pai não me amamentou.
Minha mãe padeceu no paraíso
e meu pai estava na porta.
Meu pai foi meu ídolo.
Meu pai foi meu algoz.
Meu pai foi meu sustento.
Meu pai calou nos momentos certos
e falou nos momentos necessários.
Meu pai deu-me sua bênção.
Meu pai foi um exemplo.
Meu pai plantou uma árvore.
Meu pai teve um filho, ou melhor, três.
Meu pai escreveu um livro.
Meu pai perdeu um filho.
Eu pari o livro do meu pai
e dei a luz aos meus dois filhos.
Meu pai foi sábio.
Sou o reflexo do meu pai.
Sou o reflexo do seu reflexo.
Meu pai, EU TE AMO!

Em 2007 abandonou um casamento de 32 anos e por isso alterou seu nome literário (Neida Wobeto).

Após 30 anos residindo em SC, retornou a sua terra Natal.
Hoje Neida alia as tarefas de cuidar da mãe com a prática literária.
Tem 8 publicações individuais e participação em 46 Antologias com Contos, Crônicas e Poemas.
EFEMÉRIDES (Poemas – 60 páginas – News Print – Xanxerê/SC – 2007)
MINHA NÃO METADE (Poemas – 110 páginas – Odorizzi – Blumenau/SC – 2005)
DANILO, SUA MOCHILA E SEUS AMIGOS (2ª ed. – revisada – Infantil – 32 páginas
Odorizzi – Blumenau/SC – 2004)
DANILO, SUA MOCHILA E SEUS AMIGOS (Infantil – 24 páginas – Nova Letra – Blumenau/SC – 2002)
SINTO MUITO AMOR (CD de Poemas – 23 poemas – 2002)
SENTI(MO)MENTOS (Poemas – 40 páginas – C.N.Editoria/ – Piracicaba/SP/2000)
CONTRONICAS (2ª edição) (Contos e Crônicas – 32 páginas – C.N.Editoria/ – Piracicaba/SP/2000)

Prêmios

Em 1999 – Menção Honrosa Conc. Conto sobre Animais da APA com o conto ILUSÃO.

Em 1999 – Menção Honrosa 1ª Conc Poemas da CAPOSAN com MEUS MEDOS.

Tenho medo
do esquecimento.
Tenho medo
de ser esquecida.
Tenho medo
que me esqueçam.
Quero estar viva
no coração
das pessoas que amo.
Quero estar presente
na lembrança dos meus.
Quero saber
que me amam.
Quero que sintam
minha presença,
em minha ausência.
Quero que me amem.

Em 1999 – Destaque Especial 1ª Concurso de Poemas da CAPOSAN pelo conjunto das obra: UMA MULHER DE MUITOS HOMENS, MEUS MEDOS E COBRANÇAS.

Em 1999 – Destaque Especial 1ª Concurso de Poemas da CAPOSAN com poema UMA MULHER DE MUITOS HOMENS.
Sou uma mulher de três homens.
Do mais velho sou a amante.
Do mais novo sou o amparo.
Do terceiro sou a cúmplice.
Para o mais velho dou prazer.
Para o mais novo dou carinho.
Para o terceiro dou conselho.
Do mais velho quero amor.
Do mais novo quero afago.
Do terceiro quero amizade.
Mas a todos quero amar
sem medir meu amor.

Em 2000 – Menção Honrosa IV Conc Internacional de Prosa – Mogi das Cruzes/SP.

Em 2002 – Menção Honrosa Sociedade Escritores de Blumenau.

Em 2002 – troféu Coruja, Clube Escritores Piracicaba/SP com o poema: TEU CHAMADO.

Em 2002 – 1º lugar no VIII PRÊMIO POESIA E DESENHO LILIA A PEREIRA DA SILVA
Prefeitura Municipal Itapira/SP com o poema: TEU CHAMADO.
Ouvi teu chamado!
Aqui estou!
A tarde é calma!
Minha alma é serena!
Não estamos próximos, fisicamente,
mas posso sentir tua presença.
A natureza nos une,
pois o ar que respiramos é o mesmo.
O sol que nos aquece é único.
Minha solidão é profunda,
mas gostosa de sentir.
Fecho os olhos
e sinto tua presença.
Teu clamor
chega a minha alma.
Sinto que me chamas.
Eu te respondo
e te aguardo,
para juntos realizarmos
o que já vai em nossas almas.
Quando te encontrar,
não serão necessárias palavras,
mas somente
o murmurar dos nossos olhares,
a serenidade do nosso toque
e a profundidade do nosso beijo.

Em 2003 – 3º lugar do Concurso Piracicaba com o Poema: VIAGEM ASTRAL
Planas sobre mim,
querendo descansar
teu corpo etéreo
sobre o meu físico.
Consegues me localizar
somente pela luz
da minha essência.
Queres partilhas
teus momentos comigo.
Nossas almas se encontram
e seguimos, de mãos dadas,
pelo espaço aéreo,
divagando lentamente,
deslizando suavemente pela noite.
Somos energia da mesma essência.
Somos feitos da mesma matéria
que não é física.
Nossa matéria-prima é o amor.
Quando estamos juntos,
em pensamento,
nossas almas se soltam
e flutuam pelo sempre.

Em 2003 – Destaque Literatura Infantil Sociedade Escritores de Blumenau.

Em 2004 – Menção Honrosa VI Concurso Nac. e Internac. De Contos e Poesia Nuno A Pereira Rio de Janeiro poema PORQUE SOU POETA.
Porque busco viver
os sentimentos da vida,
acreditando na felicidade
como meio para a vida.
Porque sinto a beleza de estar viva,
querendo apenas sentir o sabor do amor,
ouvindo a brisa que desce lentamente,
entregando minha alma ao cósmico.
Porque acredito que a vida vale a pena.
Porque sonho acordada
e vivo o sonho de ser feliz.
Porque vivo a felicidade eterna
com lacunas de alegria.
Porque agradeço
o poder de sentir e a liberdade
de dizer meus sentimentos
com a emoção de estar viva.

Em 2004 – 1º lugar do Concurso do Dia dos Namorados (Programa Conexão Direta, da TV Galega/SC) com a frase:
“SINTO SAUDADE DO QUE NUNCA DISSESTE”

Em 2005 Moção de Louvor Câmara Vereadores Blumenau/SC.

Em 2006 – 1º lugar Concurso Poemas nos Ônibus, em Gravataí/RS com CACHECOL.
Nas malhas da vida,
ponto a ponto,
tracei meus sonhos.
Fundi meus sentimentos
na rede de ilusões.
A malha trançada
resultou em longos braços
que se cruzam
para afagar-te.
Fecha os olhos
e sente meu abraço distante,
acompanhado pelo
aroma do meu amor.

Em 2006 – Troféu Gigantes em Blumenau/SC

Em 2006 – Comenda Letras Catarinenses.

Foi Presidente da Sociedade Escritores de Blumenau (2005 e 2006), publicou três livros da entidade (Um Rio de Letras II, III e Histórias de Natal) e mediou junto ao Prefeito, o espaço para as Artes e Letras (Kunstgarten) em Blumenau/SC.

Foi Vice-Presidente do Conselho Municipal de Cultura de Blumenau/SC (2007).

Em 2007 concorreu à vaga da Academia Catarinense de Letras.

Em 2008 – Menção Honrosa II Concurso Nacional de Poesias da Academia Itajubense Letras: VIVER SOLITÁRIO

Teu viver é solitário.
Buscas refúgio na labuta diária
ocupando teus dias
com tarefas necessárias.
Tua mente busca refúgio
no labirinto da memória,
desejando visualizar
a imagem transparente da mocidade.
Tens consciência da solidão
e permites divagar
nas veredas cintilantes do irreal,
procurando encontrar minha alma
no portal do alvorecer.
Nosso encontro
é concretizado em sonhos
e vagamos pelo etéreo,
confiantes
da concretude
do amor maior,
com a certeza
de que o amor
é transcendente.

Em 2008 – Participação no CONCURSO POESIA NO ÔNIBUS – 2008 da Casa do Poeta de Canoas em parceria com a Secretaria Municipal de Transportes de Canoas e Empresa de Transporte Coletivo SOGAL, com o pomea: BALA ACHADA.
Foi dada a partida!
O tiro foi ouvido
e seu som ecoou nos tímpanos.
O projétil seguiu seu caminho
e cumpriu seu destino
sem saber qual sua missão.
A violência urbana reflete a carência de sentimentos.
A bala inocente segue seu caminho
sem desviar-se de seu propósito.
A retidão (caminho reto) de conduta
deveria ser humana,
mas é a bala perdida que alcança seu objetivo
enquanto os homens desviam-se do seu,
até serem atingidos por uma bala achada.

Em 2008 recebeu o 10º lugar no XXVI Concurso Internacional Literário, na categoria de Poesia da Edições AG. com o poema ENTRE O NASCENTE E O POENTE e o O CAMINHO DE CADA UM.
ENTRE O NASCENTE E O POENTE
Entre o nascente
e o poento do Astro Rei,
as vidas se transformam.
Surgem novos amores,
novos valores
e a vida muda de cara.
Para muitos,
a rotina é a mesma,
dia a dia.
Para outros,
acontecem revoluções.
Vivemos a dualidade.
Podemos escolher as mudanças
ou aceitar o destino.
Ao findar de cada dia
somos diferentes.
—-

O CAMINHO DE CADA UM
Sigo um caminho
que foi traçado,
muito além do meu entender.
Fico horas meditando,
procurando uma resposta.
Tenho sede de saber.
E pergunto a mim mesmo,
por que sou feliz ou infeliz.
Sinto fome de viver.
Mas como sei que tudo passa,
só não passa o meu saber.
Fico horas meditando,
sem saber como e porque,
mas de tudo eu concluo,
sou eu que faço o meu caminho,
eu não posso ser você.
Já pensei em minha vida,
querendo ela mudar,
mas enquanto a vida passa,
não consigo mudar nada,
pois tudo que nela eu passo,
paro e penso:
“que o meu caminho eu traço”,
e nesta vida sigo em frente,
eu só quero é viver.

Em 2008 recebeu “Troféu Coruja” – 2º lugar na Categoria Especial no X Concurso Nacional de Poesias do Clube dos Escritores de Piracicaba/SP com o poema “INTERNET DA NATUREZA”.
Meu escritório é a praia.
Meu computador é o mar.
A Internet é invisível
e a conexão é perfeita
e permanente.
As ondas emocionais
fazem com que eu
comunique-me
com meu interior.
As mensagens são ouvidas
no interior de mim mesma.
Não envio mensagens
a ninguém em especial
e sim à humanidade.
Minha caixa
de mensagens recebidas
é infinita.
A mais importante de todas
é a assinatura personalizada
refletindo minha alma.
O papel de carta
de meus textos
é a Paz Profunda.

Em 2008 foi selecionada para a 17ª edição do Concurso Poemas no Ônibus e no Trem com o poema SONS DA NOITE.
Os sons da noite
me acalentam.
A brisa suave
envolve
meu corpo.
Ouço a madrugada.
Fecho os olhos
para pensar.
O dia inicia
com os mesmos
questionamentos
.

Em 2008 ficou entre os 20 finalistas do Prêmio UFF de Literatura com a crônica CARTA A MINHA NETA ADULTA (conversa de mulher para mulher).Em 2009 premiada no IV Prêmio Literário Valdeck Almeida de Jesus de Poesia/2008 com o poema: REENCONTRO DE ALMAS
Nossos caminhos se cruzaram
e surgiu a amizade sincera.
A estrada solitária
refletia as emoções sentidas.
O destino nos afastou
e seguimos adiante.
Mesmo fatigados
e cobertos de chagas,
reflexo do sofrimento,
nos visitávamos em sonhos.
Nossa distância era rompida
pelos caminhos solitários
da tristeza adormecida.
Outro desatino abraçou-nos
e entre lágrimas nos consolávamos.
A distância desapareceu
e a virtualidade aproximou-nos.
Resgatamos a saudade
e o sentimento adormecido
despertou pulsante
enquanto aceitávamos
ressurgir das cores vibrantes,
reflexo da certeza infantil
na alegria madura.

Fonte:
http://www.neidarocha.com.br

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I Concurso Pontos de Leitura

Todas as regiões brasileiras encaminharam iniciativas culturais ao MinC

As regiões Sudeste e Nordeste tiveram uma participação intensa no Concurso Pontos de Leitura 2008 – Edição Machado de Assis, realizado pelo Ministério da Cultura, por meio da Coordenação-Geral de Livro e Leitura.

A comissão de avaliação, composta por 15 titulares e 10 suplentes, reuniu-se em Brasília no início do mês de dezembro e aprovou 516 iniciativas de todo o país que promovem a prática da leitura dentro das mais diversas comunidades. Vários foram os critérios observados pela comissão, como, por exemplo, ações que democratizam o acesso ao livro e ações que também envolvam a comunidade na gestão do projeto.

Números

Do total de 702 inscrições efetivadas, 274 vieram do Sudeste, que alcançou 39% de participação no concurso. Foram selecionados 207 projetos da região, dos quais 113 são de Pessoas Jurídicas e 94 de Pessoas Físicas.

O estado de São Paulo teve aprovadas 84 iniciativas; Minas Gerais, 59; Rio de Janeiro, 47; e o Espírito Santo, 17.

O Nordeste também apresentou números bastante expressivos no concurso: 245 iniciativas inscritas, das quais 189 foram aprovadas (124 de Pessoas Jurídicas e 65 de Pessoas Físicas), o que garantiu que chegasse à marca dos 35% de participação.

Os nove estados da Região Nordeste tiveram o seguinte resultado em termos de iniciativas selecionadas: Alagoas (16); Bahia (40); Ceará (43); Maranhão (12); Paraíba (16); Piauí (8); Pernambuco (31); Rio Grande do Norte (19); e Sergipe (4).

A Região Sul teve 12% de participação no concurso. Foram 81 inscrições de projetos, dos quais 48 foram selecionados: Paraná (11); Santa Catarina (8); e Rio Grande do Sul (29).

As demais regiões brasileiras – Centro-Oeste e Norte – tiveram a mesma porcentagem de participação: 7% cada uma. O Centro-Oeste inscreveu 49 trabalhos e teve selecionados 30, sendo 11 do Distrito Federal, 8 do Mato Grosso; 7 de Goiás; e 4 do Mato Grosso do Sul.

Da Região Norte foram efetivadas 50 inscrições e aprovadas 44 iniciativas, sendo 7 do Acre; 2 do Amapá; 10 do Amazonas; 14 do Pará; 5 do Tocantins; 4 de Rondônia; e 2 de Roraima.

Critérios

Um dos mais importantes critérios observados para a escolha das iniciativas relaciona-se aos locais de execução das ações, que prioritariamente devem ocorrer nos municípios atendidos pelo Programa Territórios da Cidadania, nas áreas do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) e outros lugares prioritários do Programa Mais Cultura.

Os trabalhos selecionados incentivam a prática da leitura em locais como pontos de cultura, hospitais, presídios, associações comunitárias, residências e outros lugares, conforme mencionado em um dos itens da portaria que o instituiu – Portaria nº 60, assinada pelo ministro Juca Ferreira e publicada no Diário Oficial em 25 de setembro de 2008.

Os responsáveis pelas iniciativas aprovadas vão receber no próximo ano 500 livros, mobiliário básico e computador, visando à renovação/ampliação do acervo.

Fonte:
Gláucia Ribeiro Lira CGLL-Minéstiro de Cultura. In http://www.cultura.gov.br/site/2008/12/26/i-concurso-pontos-de-leitura-3/

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Antonio Roberto de Paula (Campeonatos da vida)

– Tem fogo?

– Tenho.

– Obrigado. Quer fumar?

– Não, fumei agora.

– Que fila, não?

– Já entraram uns trinta.

– E são só cinco vagas.

– Eu tô aqui de bobeira. Não tenho experiência.

– Trabalhei só uns três meses nisso, mas não tem mistério.

– Então você tem mais chances do que eu.

– Sei não. Depois dos 40 o pessoal tem má vontade.

– Que 40 nada. Com 35 já te olham meio atravessado.

– Faz tempo que você tá parado?

– Você diz: sem registro?

– É.

– Uns três anos.

– Eu já faz quatro. Só bico.

– Igual eu. Já vendi cartela de bingo, confecções, fita K-7. Até pão feito em casa eu já entreguei de bicicleta. Agora tô ajudando um amigo a construir uma casa. Não manjo nada. Fico o dia inteiro empurrando carriola e carregando balde de massa.

– Eu tô recolhendo jogo de bicho. O duro é que nunca fui bom de moto. Já passei cada sufoco. A gente tem horário. Sabe como é, né?

– Me avisa quando você for sair deste trampo.

– Tá a fim de encarar?

– Não, é pra um sobrinho meu. O cara é bom de moto e fica o dia inteiro coçando lá em casa.

– Tá, mas do jeito que a coisa anda, acho que não vou sair tão cedo.

– O que você fazia? Qual era a tua profissão de verdade?

– Jogador de futebol.

– Cê tá brincando?

– Não, é sério.

– Jogou onde?

– Interior de São Paulo.

– Em que time?

– Num monte. No Bragantino, Marília, Garça, Linense, Jaboticabal, Paraguaçuense…

– Você jogou no Bragantino?

– Mas saí um pouco antes do Luxemburgo chegar. Lembra daquele time que foi campeão paulista em 90? Tinha o Mauro Silva, Alberto, Mazinho, Gil Baiano, o Tiba…

– Lógico que lembro. Ganhou do Novorizontino na final. Gol do Tiba.

– Pois é. Joguei com aquele pessoal todo.

– Sério?

– Só que fui dispensado um pouco antes. Mas me considero um campeão paulista.

– Como é que é teu nome?

– No futebol a turma me chamava de Índio.

– Não vai me dizer que você é o Índio que jogou no Coritiba, que fez o gol do título brasileiro de 85, na final com o Bangu, no Maracanã?

– Não, aquele é o meu xará.

– O Londrina também tinha um…

– Não, nunca joguei lá.

– Já sei. Você é o zagueiro Índio que começou aqui, no Grêmio Maringá, e virou Ademir no Atlético Mineiro.

– Também não. Este é bem mais novo do que eu.

– Ah, me desculpe, mas não tô lembrado de você.

– Lembra a final do Paulistão de 85?

– Se lembro. O meu São Paulo detonou a Portuguesa. O Cilinho era o treinador. Tinha o Muller, o Silas, o Sidnei… Um timaço. Mas, o que é que tem a ver?

– Joguei a preliminar daquela decisão.

– Como é que eu vou me lembrar de preliminar de decisão?

– Cara, o Morumbi estava lotado. Fiz uma jogada pela lateral…

– Você jogava de lateral?

– Na direita.

– Então você é o Índio que começou no Santos, passou pelo Palmeiras, foi para o Goiás…

– Não, não. Este é outro. Deve estar jogando ainda. Mas como eu estava falando, avancei pela lateral passei por dois e cruzei na medida para o nosso centroavante fazer de cabeça. O Morumbi veio abaixo. Acho que fui um injustiçado. Cruzava melhor do que o Cafu.

– Grande vantagem cruzar melhor do que o Cafu.

– Acho que perdi pelo menos uns quinze anos da minha vida atrás da bola. Não tenho nem a 7ª Série.

– Não esquenta, não. Pelo menos você conheceu muita gente. Valeu como experiência de vida. Melhor do que eu. Fiquei afundado nesta cidade, conheço meio mundo aqui e não consigo um trampo de 300 paus.

– Você trouxe referências?

– Um monte. Mas acho que não vou conseguir emprego nem com o prefeito indicando.

– Tem que ter fé.

– Dê uma olhada para trás. Tem mais de cinqüenta na fila. Como é que você vai competir? Pode crer que tem cara formado aí atrás.

– Formado e que fala inglês.

– E morou nos Estados Unidos e na Europa.

– E não tem mais que 25 anos.

– Vou cair fora da fila.

– Agüenta aí.

– Quer um conselho: sai da fila também. É perda de tempo.

– Não, vou esperar. Vai que o cara lembra de mim.

– Esquece. O que tem de Índio jogando por aí e você é o Índio mais desconhecido de todos. Eu, que acompanho futebol, não me lembro de você. Imagine se eles vão saber quem você é. Além do mais, eles não estão precisando de gente pra cruzar bola.

– É, vamos embora. Tem uma loja de calçados que tá precisando de um vendedor e um faturista.

– Vendedor e o quê?

– Faturista.

– Vamos lá que eu vou pedir esta vaga de vendedor. Cê foi campeão alguma vez?

– Só de torneio início. Mas na 2ª Divisão Paulista nosso time chegou entre os quatro.

– Existem pessoas que nasceram para ser campeãs. Outras, não. Entram somente como figurantes.

– É a vida, meu caro, é a vida.

(livro Da minha janela, publicado em 2003)

Fontes:
http://blogdodepaula.blogspot.com/
Desenho = http://jardimdeurtigas.blogspot.com

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Ulisses Tavares (Um Dia Típico de Um Escritor Brasileiro)

Há mais de quarenta anos (estou com 56, comecei cedo, aos 9) que me revezo entre oito profissões para ganhar a vida.

Me acostumei a, quando me interessa e preciso, exercer uma ou outra atividade e muitas vezes fazer tudo ao mesmo tempo.

Tenho sido jornalista, professor de pós-graduação, compositor, dramaturgo, roteirista de cinema e televisão, criativo publicitário, marketeiro político e treinador de executivos em web business e criatividade.

Nos intervalos, nunca deixei de ser poeta e, talvez por isso, ter uma montanha de livros de poesia para crianças, jovens e adultos, e estar com mais de quatro milhões de exemplares vendidos, o que, no Brasil, até a mim espanta.

Daí, de três anos para cá, resolvi ser apenas escritor profissional.

A decisão foi difícil mas estou satisfeito pelo seu principal efeito colateral: como meu status caiu de um carro importado para um fusquinha, nunca mais serei rico a ponto de atrair mulheres interesseiras.

Quem me amar vai me amar pelo que sou: um poeta tupiniquim, apaixonado, mas durango.

Meio chato é quando novos conhecidos me perguntam minha profissão e eu respondo que sou poeta.

Inevitavelmente, vem a pergunta seguinte:

– Tá bom, mas você trabalha em quê?

Como poeta não trabalha mesmo nunca, segundo o senso comum, acordo eu bem cedinho disposto a escrever meu artigo para esta revista, já atrasado.

Mas, antes, abro os e-mails e vejo se tem alguma coisa urgente para resolver.

Tem várias, pela ordem:

Uma editora não quer aceitar meu contrato de um novo livro porque não abro mão dos 10% de direitos autorais. Como a maioria dos escritores possui outra fonte de renda paralela, também a maioria das editoras se acostumou a pagar menos de 10% já que o autor não vai depender dessa renda para sobreviver. Ou seja, escritor brasileiro é mal pago por culpa dele mesmo, tsc, tsc.

Outra editora alega que é impossível adiantar um dinheiro para que eu escreva um livro histórico, ou seja, um projeto que vai me consumir um ano inteiro. Ao contrário dos estados desunidos e das ôropas, aqui a editora lança uma porção de livros sem custo autoral inicial. Se colar, colou. Se for sucesso, ótimo. Lá fora, o critério é mais rígido. Lança-se menos títulos, mas se investe no projeto do escritor rotineiramente. O Brasil é um dos países que maior quantidade de livros edita no mundo. Mais de 10 títulos novos por dia! E as tiragens são cada vez menores.

E finalmente outro e-mail me informa que minha agente literária é uma chata porque teima em discutir item por item dos meus contratos. Traduzindo: a Maria Moura, minha agente, é uma pentelha porque é profissional cuidadosa. As editoras gostam de escritor que assina tudo sem ler nada, como eu já fiz muitas vezes.

Para não ficar ainda mais careca de preocupação com esses problemas que já estou careca de saber, deixo de lado e me concentro em escrever.

Nem começo e já sou interrompido por dois telefonemas:

O primeiro, um convite para bolar um artigo para uma revista de educação, dirigida as professoras. Pedem minha compreensão para o fato que só podem pagar cem reais pelas quatro páginas de texto. Olho o pedreiro que contratei para consertar as telhas estragadas pelas últimas chuvas em Sampa, com inveja. Ele está me cobrando o preço de 3 artigos da revista!

O segundo telefonema é um convite da secretaria de cultura para um mega evento de poetas e escritores paulistanos. Acontecimento bonito, bem organizado e bem divulgado. O único detalhe dissonante é que o edital não prevê nenhum cachê para os participantes. A alma da festa não irá receber um tostão para o pão nosso de cada dia. Escritores e poetas devem se contentar com os aplausos, desde que tenham dinheiro para a passagem até o palco, claro.

Mas vamos escrever que essa é a vida que escolhi e quis.

Paro na primeira frase porque chegou o carteiro com uma pilha de cartas. Nenhuma cartinha simpática de leitor. Nenhum cartão de feliz aniversário atrasado. Apenas contas a pagar e malas-diretas me oferecendo cartões de crédito. O correio eletrônico tornou o carteiro apenas um portador de más notícias!

Desanimado, leio que esqueci de pagar uma conta de IPTU de anos atrás. Mas posso ficar tranqüilo que a Prefeitura me oferece parcelamento da dívida. Desde que eu perca metade do dia indo até a tesouraria, evidente!

E nem isso posso fazer porque meus rendimentos de direitos autorais não cobrem o valor do IPTU. Acho que nem minha modesta casa vale tanto assim. Como são férias escolares, meus livros infanto-juvenis despencam nas vendas. Há muito tempo que as escolas, via programas do governo, são as únicas e principais compradoras de livros infanto-juvenis. E evidentemente não compram nas férias. E se amanhã o governo deixar de dar verbas para aquisição de livros para distribuição gratuita aos alunos, a maioria das editoras fecha as portas em seguida. Todos os envolvidos nessa questão, se fazem de cegos em tiroteio. Afinal, é chocante saber que em mais de uma década de distribuição gratuita de livros para estudantes de escolas públicas…não se formou um leitor a mais! Simplesmente porque a educação continua uma porcaria frita e os alunos, coitados, mal passados, não aprendem a ler. Sem saber ler, vão fazer o que com os livros que ganham? É como dar rapadura para um banguela. Simples e trágico assim.

Já que não consigo escrever o artigo para a Revista Discutindo Literatura, relaxo e vou para o lançamento de amigos escritores num bar de Vila Madalena. Vai ser bom rir um pouco que não sou de ferro e minha coluna muito menos. Tenho a popular “coluna de escritor”. De tanto escrever horas a fio com a coluna torta, o escritor é um candidato à corcunda de Notre Dame.
O lançamento é interrompido violentamente, o bar fecha as portas, todo mundo sai correndo porque o PCC acabou de incendiar um ônibus na rua ao lado.

Volto pra casa, ligo a televisão e vejo o governador dizendo que a violência está sob controle, que ataques dos bandidos não irão intimidar as autoridades. Como não sou autoridade…fico intimidado.

O dia está terminando e talvez dê tempo de escrever, afinal este é meu ofício.

Mas, humanamente, durmo.

Quem sabe amanhã eu acorde e resolva mudar para uma profissão menos folgada que esta de típico escritor brasileiro.

Sei que minto para mim mesmo, para me consolar.

Escrever, para quem gosta, já não é ofício. Rimando sem querer, é um vício.

Fonte:
http://www.ulissestavares.com.br

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Miriam Mermelstein (Sobre o gosto da leitura na escola)

A autora enumera alguns pressupostos para a introdução dos alunos no mundo da literatura, como a importância de ter um ambiente cultural no qual o livro esteja presente, de ampliar o repertório do aluno apresentando-o a uma diversidade de gêneros textuais, de ensinar a ler com prazer, de respeitar as escolhas dos jovens diante do universo desvelado pelos livros. Aborda ainda a estreita ligação entre o ler e o escrever, oferecendo sugestões de exercícios para o desbloqueio da escrita criativa.

O professor de literatura e crítico literário, Carlos Felipe Moisés, com quem estudo há 10 anos, na apresentação de seu livro “Poesia não é difícil” cita questões muito comuns de serem ouvidas na escola: ‘Como posso gostar de poesia se não a entendo?’ ‘E como entender sem gostar?’

Ficamos em um círculo vicioso, uma armadilha, afirma o autor, pois como saber se gostamos (ou não) se não a conhecemos? Aí entra o papel do professor educador e mediador da cultura em introduzir novos conteúdos e novas experiências no mundo do aluno.

Mas como? Eis a questão crucial. O objetivo deste texto é enumerar alguns pressupostos e algumas atividades de linguagem como idéias a serem adaptadas por vocês, professores, em seus planos.

Um pressuposto refere-se à significação de um ambiente cultural na formação do leitor. Desde muito pequenos, os alunos podem ‘ler’ textos, entendido o verbo de forma não literal: quando o professor lê para a classe, quando o aluno conta suas vivências na roda, quando o aluno ouve o colega contar ou descrever algo, quando o aluno ouve uma cantiga e sua letra, quando o aluno ‘lê’ ilustrações de um livro, quando ele tem acesso constante aos livros da sala ou da biblioteca, quando sabe que a leitura é uma atividade valorizada pelo professor.

Sabemos das dificuldades de obtenção e veiculação de livros nas escolas. Bibliotecas sem bibliotecários, livros não tombados e, portanto, não passíveis de circulação, mas sabemos também que existem outras formas de contornar essa situação. Saraus, pedidos em editoras, mutirões do livro, de organização das salas de leitura, feiras culturais, intercâmbios entre classes, cartas a autoridades competentes, etc. são alguns dos recursos que a escola deve utilizar para garantir o acesso do aluno ao livro.

Outro pressuposto refere-se ao grau de complexidade dos textos e das atividades com textos. Não devemos poupar os alunos de novos desafios. A função da escola é ensinar novidades, ampliar o repertório do aluno com exposição de maior diversidade de gêneros textuais. A dosagem e as exigências serão planejadas considerando que a formação do leitor é um processo de amadurecimento. Quanto antes começar, mais sentido fará na vida do aluno-leitor.

O livro é um objeto inserido em um contexto. Tem autoria, propósito, um tempo e um espaço delimitado (de criação e de circulação). Saber sobre o autor e sua época, conhecer suas condições de produção ajuda a inferir sobre outros tempos e outros espaços. Um exercício interessante é o de comparar textos literários de uma mesma temática, mesmo local e épocas diferentes, ou textos oriundos de culturas diferentes abordando o mesmo tema. “É a polifonia e a pluralidade contra o monólogo e a palavra autoritária”. (Sonia Kramer, 2001). Por exemplo, mixar conteúdos da História com textos literários também é um recurso em que ambas as áreas ficam enriquecidas.

Sabemos que a escola tem um plano a cumprir e dentro dele as atividades de linguagem que devem ser realizadas e avaliadas. Ensinar a ler com prazer, a tirar proveito pessoal da leitura esbarra quase sempre na questão do número de alunos na sala para acompanhar e na dificuldade em avaliar objetivamente o aproveitamento, o prazer e a fruição. Mas sem paixão não avançamos. Principalmente quando pisamos na seara da literatura. Ensinar as características estruturais dos gêneros, as combinações lingüísticas possíveis em um texto, a organização das palavras, a comunicação de idéias não devem matar o prazer, não podem impedir que a leitura faça sentido pessoal e íntimo na vida do aluno.

Outro pressuposto é respeitar a escolha do aluno. Imaginem uma pequena cidade em que seus habitantes só conhecem comida brasileira. Vivem tranqüilos sem saber ou sem querer saber o que existe de diferente lá fora. Aí chega um grupo de imigrantes do Oriente trazendo seus costumes, temperos e especiarias. O que pode acontecer?

A – os dois grupos não se comunicarem.
B – os dois grupos trocarem suas especificidades e criarem um terceiro grupo.
C – os dois grupos aceitarem as mútuas contribuições, mas manterem sua identidade.

Esse é um exemplo do que pode acontecer com quem tem contato com o conhecimento. Transformação. Mas não acontece de imediato, nem uniformemente. É um processo e, como tal, é variável. Especificamente na arte, e dentro dela na literatura, esse processo tem finalidade de aumentar a autoconsciência humana. “A literatura é um autêntico e complexo exercício de vida, que se realiza com e na linguagem”. (Nelly Novaes Coelho, 2000)

As possibilidades combinatórias são muitas e cada um responde de acordo com sua história, seus sentimentos e possibilidades.

Imaginem agora se todas as pessoas da mesma cidade só conhecessem histórias de saci e lobisomem. Chega na cidade o grupo do Oriente trazendo histórias de califas e odaliscas, nunca antes ouvidas.

Respondam: o que pode acontecer?

Essas analogias nos permitem entender o que muda quando o novo penetra em nosso mundo, as dificuldades de aceitação, o acréscimo que pode significar e a mudança que pode provocar.

Existe uma estreita relação entre produção de textos e leitura. Segundo Beatriz Citelli (2001), a escrita constante pode despertar maior interesse pela leitura. O pressuposto subjacente é que durante o percurso da escrita, os alunos tendem a se expressar cada vez melhor com menos clichês e mais identidade.

Nem tudo que nos apresentam ou que conhecemos tem unanimidade. Podemos falar em tendências, cada classe social, cada bairro, cada sala de aula têm características próprias pois vivem histórias de vida similares. Assim, o professor pode dizer: ‘- minha classe gosta de livros de aventuras’, ou ‘minha classe adora gibis’, como um bloco, mas devemos oferecer opções e respeitar as diferenças.

A leitura e a escrita são, portanto, construídas ao longo da vida escolar com respeito à individualidade, incentivo à narração pessoal, desejo de ser lido ou ouvido.

Os passos da escrita criativa:

1 – narrar e escrever tudo e sempre como uma rotina escolar.

2 – encontrar com o professor e colegas um assunto de interesse para escrever.

3 – começar com o que Lucy McCormick Calkins (1986) chama de ensaio, uma primeira escrita.

4 – esboço ou desenvolvimento da escrita. “Ponha no papel”, diz o escritor William Faulkner, “aproveite a chance. Pode ser mau, mas este é o único modo pelo qual você poderá fazer algo realmente bom”.

5 – revisão – ver novamente, ler para os colegas e professor e reescrever em todas as etapas.

6 – edição – fazer o texto excrito circular, mesmo entre os colegas. Quem escreve, escreve para ser lido e, às vezes, a escola engaveta e só corrige os escritos e esquece do seu autor.

Vamos descrever alguns exemplos de exercícios de desbloqueio da escrita criativa:

1 – o professor sugere: “Abri a gaveta e encontrei…”. O aluno continua o texto escrevendo com: palavras que tenham 2 ou 3 sílabas, comecem com p, m ou s, rime, etc.

2 – o professor leva um texto com ausência de pontuação para os alunos lerem e pontuarem.

3 – o professor dá um poema e pede paráfrase com modificações do personagem, do cenário, etc.

4 – imaginar um personagem não humano, descrevê-lo com características humanas.

5 – pensar o que existe no mar e adjacências e escrever um período combinando palavras pelo parentesco sonoro, ex: areia com ceia, alga com algo.

6 – o professor escolhe algumas palavras, ex. – dia – e os alunos devem atribuir um sentido comum e um sentido figura à palavra.

7 – ad-verso: o professor dá dois versos de uma quadra e pede que os alunos emendem com outros dois versos de um outro assunto.

Esses exercícios podem ser trocados, completados em duplas, dramatizados, tec. Nessa etapa ainda não está em pauta o conteúdo, mas o desbloqueio da escrita.

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*Miriam Mermelstein é pedagoga e autora de obras de Literatura Infantil, tendo ministrado as oficinas “A poesia em sala de aula” e “Abraçando a palavra” no CRE Mario Covas, durante o 1º semestre de 2004

Fonte:
http://www.crmariocovas.sp.gov.br/lei_a.php?t=019

Imagem = autor anônimo. Recebida por mail

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Projeto Sábado Cultural (Sorocaba/SP)

O projeto “Sábado Cultural” é realizado no último sábado de cada mês na sede da sociedade localizada no Lageado em Sorocaba, tem por objetivo ser um novo espaço para manifestação da cultura e arte em Sorocaba, sempre com entrada franca. Peças teatrais, números musicais, literatura, poesia, cinema, artes plásticas, todos os setores da cultura terão um novo espaço a partir de agora em Sorocaba.

Bem localizado e com uma boa infra-estrutura, o projeto “Sábado Cultural” viabiliza o encontro do artista com o público, como explica Eliton Tomasi, vice-presidente da S.C.E. Irmãos de Caridade. “Muitos artistas, principalmente os iniciantes, não encontram espaços adequados para se apresentarem. O público mais carente, por sua vez, muitas vezes não tem verba para prestigiar os grandes espetáculos. O projeto Sábado Cultural vem como solução nesse sentido pois abre espaço para toda a classe artística de Sorocaba e região e os ingressos serão sempre em forma de alimentos a serem doados para entidades assistenciais da cidade, tornando assim os eventos 100% viáveis para todas as classes da sociedade, e uma via de colaboração direta com os mais necessitados“.

A primeira edição do projeto teve a apresentação da peça teatral “Fases da Vida” do grupo da Terceira Idade do SESI. Sob a direção de Edna Harder, a peça faz uma reflexão a respeito da existência humana em suas diferentes épocas.

A Sociedade Cultural Espírita Irmãos de Caridade fica próximo à rodoviária de Sorocaba na rua Fagundes Varela, 15 no Lageado. Outras informações: (15) 3211-1621 / 3221-0449 / 9111-2234

Fonte:
Cenário Cultural. http://cintianmoraes.com.br/

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Luciano Bonatti Regalado, novo integrante da Academia Sorocabana de Letras

Academia elege vencedor do Prêmio Literário 2008

O pesquisador Luciano Bonatti Regalado, ganhador do Prêmio Literário Anual Sorocaba de Literatura em 2008, com seu livro “Observando as Aves nas Áreas Verdes de Sorocaba e Região” (Linc: 2007, 198 páginas), é o mais novo integrante da Academia Sorocabana de Letras. Ele ocupará a nova Cadeira nº 34 da instituição, que tem como Patrono Afonso de Escragnolle Taunay. Doutor e Mestre em Engenharia Ambiental pela USP e graduado em Ciências Biológicas pela PUC-SP (Campus de Sorocaba), o novo acadêmico é analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e tem experiência na área de Ecologia, com ênfase em Ornitologia e Gestão de Unidades de Conservação. Atuando principalmente nas áreas de conservação, gestão ambiental, ecologia de comunidades, estudos faunísticos.

Em paralelo, desenvolve pesquisas de arquivo e de campo sobre a documentação primária da Fábrica de Ferro de São João do Ipanema, ajustando-se ao espírito da Cadeira Afonso de Taunay que dará ênfase aos estudos e pesquisas relativas à História Paulista.

Serviço:
Sessão solene de instituição da nova Cadeira nº 34 (Patrono: Afonso de E. Taunay) e posse de seu primeiro titular, Acadêmico Luciano Bonatti Regalado (Comemorando os 70 anos da eleição de Taunay como Membro da Academia Brasileira de Letras)
Data: 19 de fevereiro às 19h30

Fontes:
Cenário Cultural.
http://cintianmoraes.com.br/especiais/index.html
Capa do Livro =
http://www.novoambienteeditora.com.br

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Evandro Luiz Mezadri (Livro de Poesias)

Poeta de Votorantim lançou livro de poesias sobre o seu cotidiano

O “Lunático” de Evandro Luis Mezadri foi lançado na sexta-feira (13), contou com a presença de amigos, familiares, amantes da poesia em um evento emocionante na Biblioteca Municipal. Um orgulho para Votorantim, que a cada ano revela mais autores, Evandro é um exemplo, pois começou a escrever aos dezesseis anos, mesmo ano em que começou a ouvir Rock’ n’ Roll. É sensível aos fatos que o rodeiam, sua primeira obra mostra o paradoxo cotidiano existente dentro de si. Uma linha tênue entre esperanças e desilusões que mesclam todas as vertentes sentimentais como o amor, ódio, opinião social, viagens surreais e experiências pessoais, as quais, fundamentais para a formação do seu universo “Lunático”.

O poeta deixa ao leitor um “livro aberto” de sua vida. “Lunático” expõe um pouco de suas vertentes, pois suas influências vão de Rimbaud a Paulo Leminski, passando por Jim Morrison, Baudelaire e Allen Ginsberg, desfilando ecléticas escolas em seu aprendizado poético.

Quem quiser obter o livro deve entrar em contato com o autor pelo email: evandromezadri@yahoo.com.br
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LUNÁTICO

Parte o lunático…
Vestido pela íntima solidão
Duelando com as sombras do passado
Ruas são labirintos de fogo
aquecidas por cobertores de ossos
Árvores são testemunhas
e suas folhas espiãs
brincando entre os galhos da madrugada

Morcegos voam
entre rasantes tentativas de alegria
Cães ladram
a fome angustiada dos mal-nascidos
Gatos esquartejados nas autovias
e seus cérebros pisoteados
pelos carros rumo ao sul

Parte o lunático…
O riso mórbido como guia
Abre-se uma fenda na abóbada
Raios selvagens estupram
as estrelas donzelas
e elas derramam pelas nuvens
lágrimas vermelhas
Como o gozo de um vinho barato
sobre o solo poeirento da cidade

Parte o lunático…
Em sua hipnótica caravela
Velejando pelos prolíferos mares da loucura
A lua a beijá-lo
Uma tempestade de anseios
derramada em pernas e seios
entrelaçando as veias pulsantes dos desejos
Filho do deleite
Em uma colheita
de douradas novidades
Caminhando pelos campos antes inóspitos
A música refletindo
o erótico flerte
da vida com a morte

Espasmo

Açoite

Finda mais uma luxuriosa noite
ao ser atravessada
pela espada flamante
do divino crepúsculo
E o lunático retorna…
ao seu frio reino de tijolos à vista
Pedindo em seus credos de arremedo
para a alma uma benção
e para o corpo um esteio
quando a amante embriaguez se foi
e a esposa ressaca veio!
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Versos Esquecidos

Voltem até mim, versos esquecidos
Estou pronto para recebê-los em meu cérebro desvalido
Peço-lhes perdão pela indiferença na noite passada
O descaso por não anotar-lhes em minha folha amassada

Trêmulo, atiro-me ao âmago do subconsciente
Rastejo pela tênue verve que ainda me resta acesa
Chamo-lhes em insanas regressões pela minha mente
Desregrado e em prantos, ardendo em incontida morbideza

Lembro-me em flashes, de suas doiradas vogais
Entrelaçadas as margens de púrpuras consoantes
Navegavam nos agitados oceanos de meus ideais
E agora, atracadas no fundo de uma memória gélida
e sufocante

Suplico que retornem, ó versos esquecidos
Reconduzam a alegria a este vate que lhes conclama
Embala novamente os papéis outrora esmaecidos
Com a rajada lírica de suas ecléticas chamas
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Vazio

Da vida, sou detento
Caminho sonolento
Guiado por um trevoso vento
Que enregelou meu sentimento
E deixou meu coração poeirento

Sou um sem talento
Sigo trôpego e lento
Escondo um negro sofrimento
Procuro um colorido alento

Sou um animal sarnento
Rastejo em uma selva de desalento
Vítima de um psíquico atormento
Despejo meu lamento

Sigo solitário e desatento
Criatura inerme que só estará a contento
A sete palmos da terra,
dentro de uma gaveta de cimento

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Ode a um amigo

Aperto no peito,
Boca seca apenas umedecida
pela saliva amarga
do crepúsculo final da vida

Pálpebras trêmulas
vertem visões derradeiras

À frente,
paisagens jubilosas
outrora ornando quadros de verdes campos
são substituídas por estéril e negra avenida
infinda e solitária peregrinação
ao reino do supremo supracitado

De joelhos,
tenta com suas imóveis arcadas
rezar orações improvisadas

As mãos querem tocar
a camisola alva
de uma dama imaginária que surge
em erótica leveza incendiária
envolvendo-o em seus seios
carnudos e plácidos

Acariciando em sua face febril
e impaciente
Esperando o enlace matrimonial
em um medo presente
de se entregar em noite de Fevereiro luzente

Não tenha medo!

A senda será transposta à transição final!
As mesquinharias abortadas,
atrasadas prestações,
falsos amigos,
fabris humilhações
Uma floresta é avistada
Corcéis negros, dragões,
gatos, cães,
albatrozes e felinos atrozes
Harmonia perfeita
regendo a celestial seita

Anjos com douradas harpas
sobrevoam um límpido oceano
onde negros e brancos banham-se juntos
esfregando o pútrido preconceito
destilado no outrora habitado planeta profano

Seu corpo apodrece abaixo do cimento
Sua alma rejuvenesce acima do firmamento

A missão foi cumprida,
e a eternidade é o seu legado
Oh! Saudoso dardo jogado
no alvo certeiro
do destino fecundado
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Dor Paternal…

O pai viu o sangue da vida ornando a criança
Pulou sobre nuvens coloridas até ficar farto
Derrubou uma lágrima alegre ao deixar o parto
Embalando-se em sonhos de esperança

Na vermelhidão de uma aurora, após anos vindouros
A criança cresceu, virou homem e irrompeu estradas,
Perpetuou sua independência em loucas jornadas,
Colhendo de experiências bizarras, negros louros

Amou o inferno a que foi acometido,
Duelou em sendas sinistras e perigosas
Viu mares rubros inundando avenidas fogosas
E uma rajada frontal beijar seu coração empedernido

O pai viu o sangue da morte ornando o filho
Pulou sobre o caixão florido até ficar farto
Derrubou uma lágrima triste ao sofrer um enfarto
Embalando sua alma em uma inerte viagem sem brilho!
=============================
Mais um…

Ruminando capins em pastos melancólicos
Aprisionado em focinheiras hierárquicas
Bebendo no cálice dos sacramentos metódicos
Cordeiro desgarrado das criações anárquicas

Olhar parado, fronte amarelada, peito empoeirado
Coberto por um negro véu enlanguescido
Rastejando tal qual mendigo assombrado
Em seu caminho verdugo de mal-nascido

Servo cômodo sem incômodo pela falta de alento
Faz o sinal da cruz agradecendo a estéril chama de luz
Passa dez horas ao dia celebrando o pífio talento
De ser apenas mais um neste orbe que a todos conduz

E ao envelhecer, em prantos, começa a esmorecer
Enxerga pelo espelho d’alma a centelha de sua mocidade
A rotina arquejante que se prestou a obedecer,
Não lhe permitiu nessa única vida, viver de verdade!
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Enluarada Andança

Ébrio viajante, caminha sobre nuvens esparsas,
Tropeçando em devaneios, equilibrando-se em esperança,
Segue em companhia do cântico mavioso das alvas garsas,
Namorando a natureza, em enluarada andança.

Mantém-se calado, imaginando uma valsa jubilosa,
Em busca de um amor verossímil em cálida candura,
Para tomar nos braços uma musa majestosa,
E sair dançando pelo infinito jardim da brandura.
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Antonio Brasileiro (1944) Caldeirão Poético

ANOTAÇÕES DO IMEMORIADO

A consciência, fiapo de quê,
no mar da alma?

(E o ter que contar os meus segredos,
que eu mesmo guardei
e esqueci.)
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O SIM & OUTROS ACHAQUES

A vida inteira anulada
por falta de outros desígnios,

eis que voltamos ao parque
onde os homens se congregam:

ninguém jamais sabe ao certo
onde o sim das grandes aves,

singramos por mares mansos
que julgáramos esquecidos —

mas eis que a vida se perde
por falta de outros desígnios.

Ou não se perde: é só isto.
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NUANÇA

Meus caminhos, meus mapas,
meus caminhos.

Tudo está em ordem
em minha vida.

Como se faltasse
alguma coisa.
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CÁLICE

A vida não tem roteiros,
só velas que nos acenam
do mar.

Escuta, amiga,
o desfiar das horas:
elas te dirão é tua
é tua a vida.

Toma-a (como se toma
um cálice de rosas)
na mão.
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SONETO DO AMOR PROFANO

Não me consinta o amor tanta alegria,
pois, por não merecê-la, me constrange
o peito (já uma dor, não longe, me
sussurra que este amor sem agonias
não há de consentir em tanta graça),
eis que, perdidamente, já pressinto
— e quanto, e quanto — que em amor, perdidos
todos os lances, não há como obtê-lo
de outro modo que não por sacrifícios /
e eis que este, pois, gratuita dádiva,
me chega às mãos de um modo tão profano,
que quase certo estou de que, se o tenho,
já não o tenho por justo e dadivoso
mas por amor que é fruto só de engano.

E não me engana um amor quando enganoso.
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CEM ANOS

Vejo mãos que me folheiam
buscando-me a fisionomia —
mas já passei, agora
sou apenas poesia.

Vejo rostos que me amam
tentando saber quem fui —
sou um retrato, miragem
que o tempo dilui.

Vejo braços que me acenam
chamando-me insistentemente —
para que, se a folha que passa
passa tão de repente?
=======================

CONCERTO P/ FLAUTA DE CANUDO DE MAMÃO

Vou cativar um beija-flor.
E sairemos por aí:
ele faz poesias, eu vôo.
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A NOITE DAS NOVE LUAS

Deixai-me com meus lírios e minhas luas.
Andar é sempre a mesma
luz
à frente.

Vou explodir com os planetas
vou seguir a rota das galáxias
ai amor
estou prestes a me dissolver
no ar.

Mas deixai-me com meus lírios
e interlúdios
nestes mares nunca mares calmos mares.

Deixai-me com meus lírios
e sonetos.
Vou explodir de luz um dia desses,
amiga, um dias desses.
Deixai-me com meus lírios
e sonetos.

Hás de me encontrar
insone e louco
no meio dos trigais da inconsciência,
ai, declamando
os versos que Van Gogh
não escreveu.
=======================

ARTE POÉTICA

Meus versos são da pura essência
dos poemas inessenciais.

Nada dizem de verídico
não querem nada explicar.

Não narram o clamor dos peitos
não encaram a dor do mundo.

Se por vezes falam alto
é por puro gozo, júbilo.

humor que brota de dentro
como se movem os astros.

Eles, meus versos, são pura
floração de irresponsáveis

flores nascidas nos mangues,
por nascer — mas multicores,

lindas, não importa que os homens
as conheçam ou não conheçam.

(A Pura Mentira, 1982)
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TUDO QUE SOMOS

Tudo que somos,
pouco sabemos.

Um poço imenso,
cheio de sonhos.

Quando choramos,
não nos perdemos.

Viver é um sonho,
Não esqueçamos.

Viver é a sombra,
o assombro, o apenas.

Tão frágeis somos!
Frágeis e imensos.
=======================

CONTEMPLAÇÃO DA NUVEM

p/ Luis Alberto

a vida é a contemplação daquela nuvem.
E o mundo
uma forma de passar, que inventamos
para não ver que o mundo não é o mundo,
mas uma nuvem
passando.

E uma nuvem passando
ensina-nos mais coisas que cem pássaros
mil livros um milhão de homens.

A vida é a contemplação daquela nuvem.
E o mundo
uma forma de passar, que inventamos
para não ver que o mundo não é o mundo,
mas uma nuvem.
Passando.

(Cantar de amiga, 1996)

=======================

A ESPUMA DAS COISAS

A grande ilusão do insustentável.
O lama e os não-desejos.
A imensidão de um cosmos de brinquedo.
O estrelejar do hoje versus
o princípio. Ou o
precipício.

Sossega, peito meu, és só a espuma
das coisas vãs gozadas uma a uma.
=======================

MNEMÓSINE REVISITADA

A memória do homem, coisa simples.
Esquece-se de que somos esquecidos
e cheios de saudades.
Saudades do que fomos e o que somos,
já esquecido em socavões de tardes.
Como se hojes fossem inacabáveis
e não viessem cobri-los outros sonos.

Ingratidão, memória, é teu nome.

Tudo que somos vai virar saudade
(não importa o peso, a pluma, a asperidade)
de tudo que não fomos — e, eis, esplende.
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O ESTIOLAR DAS COISAS

Os sonos estão parados
no portal do amplo oceano.

Eis meus touros minotauros
envoltos em vis novelos.

E a lágrima perdida
no amplíssimo deserto?
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O OFÍCIO

No fim dos tempos,
vou estar numa casinha de palha,
uns livros, um lápis,
papel almaço, a alma pura
e uns rabiscos pra ninguém ler,

me confessar.

Ao deus dentro de mim, primeiramente.
E a quem não interessar possa.
=======================

QUADRA

Se alguém me espera?
Quem dera.

Se o bonde veio?
Mas cheio.

Se ganhei na vida?
Feridas.

Não vai dar? Deixa
estar.
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Sobre o Poeta
Pintor e poeta baiano: é assim que Antônio Brasileiro gosta de se definir. Mas não são essas poucas palavras que melhor o definem. Figura referencial entre os nomes surgidos a partir doa anos 60, Antonio Brasileiro, reconhecido nacionalmente pela sua produção poética, estreou na ficção com o romance Caronte é também figura de destaque como agitador cultural. Mente multifacetada, seu raio de ação inclui, além da literatura e das artes plásticas, um sólido estudo de filosofia. Com vinte e duas obras publicadas (poesia, ensaio, conto, romance, teatro), divide o resto do tempo entre o amor pelos livros e a música, a prática do tênis e o cultivo do ócio.

Brasileiro nasceu em 1944, em Rui Barbosa, no sertão baiano, onde viveu até 1955, quando se transferiu para Salvador. Desde 1972 vive em Feira de Santana. Tem uma fazenda de gado no Acre. É doutor em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais [1999]. Dedicado praticante de tênis. Faz ginástica e longas caminhadas diárias. “Se eu não me cuidar, quem vai cuidar de mim?” Seu cultivo do ócio inclui música, leituras filosóficas, do tao e do zen, e conversas com os amigos. Ensina Teoria da Literatura na graduação em Letras da Universidade Estadual de Feira de Santana. Mas não faz desse ensino a exposição do que é chato, porque tem os olhos e os ouvidos abertos para o que diz Goethe no Fausto: “Toda teoria é cinzenta, caro amigo. Só a verdadeira árvore da vida é verde”.

Quarenta e um anos de poesia — com incursões na ficção e no ensaio — e 43 de pintura. Dos 22 livros que publicou, considera como os mais importantes: Caronte [romance, 1995], Antologia poética [1996], A história do gato [conto, 1997], Da inutilidade da poesia [2002] e Poemas reunidos [2005].

Segundo Brasileiro “A rigor, a poesia nunca esteve “em alta”. Alguns nomes conseguem se tornar mais conhecidos, pouquíssimos ultrapassam sua própria geração. Mas quantas pessoas mesmo, dessas que você vê todos os dias trafegando por aí, sequer ouviram falar de Drummond, nosso maior poeta? E se ouviram, quantos dentre seus mil poemas conhecem? Dois? Três? Isso é conhecer um poeta? Não é só a poesia que resiste à mercantilização; há outros saberes.”

Dir-se-ia que a voz do poeta, filtrada pelo sentimento do eu lírico, amplia-se à medida em que encontra ressonância no sentimento do mundo. (…) A inquietação de estar no mundo permeia esta poesia. Uma poesia metafísica, no sentido mesmo de perplexidade frente ao mistério da existência, da inutilidade de todas as coisas diante do tempo que passa, inexorável, em seu eterno fluir. A ironia como que a mascarar a angústia de saber que o canto é tão inútil e tão necessário e que nesta festa de dançarinos entediados, somos grãos de areia na ampulheta, sozinhos, frente à eternidade das coisas tão perenes, quando a vida é apenas um susto…” (Myriam Fraga)

Convidado oficial da I Bienal Internacional de Poesia de Brasília, participa da antologia POEMÁRIO da I BIP.

Fontes:
http://www.antoniomiranda.com.br/
http://blogs.abril.com.br/lenidavid
http://www.litbr.com/entrevistas-antoniobrasileiro.htm

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Arquivado em Biografia, O poeta no papel

Nilza Fiorentina Vendrami (1949 – 2008)

Sete Filhos

Olhe lá aquela casa
A última da favela
É uma casinha pobre
Só tem uma janela

Foi lá que morou Maria
Com os sete filhos dela
O quintal era florido
Com flores de primavera

Tinha uma cachorrinha
Que alegrava a galera
E o riacho no fundo
Atrás da cerca amarela

Veja bem essa Maria
Com sonhos de cinderela
Olhe lá as sete crianças
Correndo em volta dela

Ouça a canção que ela canta
É uma canção tão singela
Que saudades de Maria
E dos sete filhos dela
————————

Brinco de princesa

Peço ajuda a minha gente
Ao santo que me proteja
Já andei de bar em bar
Conheci muitas igrejas

Sei de tudo desta vida
Da pobreza a realeza
Não sou formado doutor
E disso eu tenho tristeza

Sou forjado a ferro e fogo
Sei da vida com certeza
Dos lugares onde andei
Não levei muitas riquezas

Só carrego aqui comigo

E um brinco de princesa
Não é de ouro nem prata
Pois ganhei da natureza

Peço ajuda a minha gente
Ao santo que me proteja
————————-

Pedras

Será que as pedras choram?
Ou será que não choram não?
Esquecidas, desprezadas
Vivem presas aqui no chão

Sempre em silêncio profundo
Eterna meditação

Às vezes são alicerce
De uma grande construção.
Às vezes viram estátua
De um famoso cidadão

Eu só não tenho certeza
Se as pedras choram ou não.
=====================

Sobre a Autora

Escritora e poeta, Nilza escreveu o livro “Sete Filhos de Maria”, onde conta a história de sua mãe e dos sete irmãos. Incentivou a neta Larissa Vendrami que hoje escreve poesias e dará continuidade ao livro de contos que a avó não terminou de escrever.

Escritora e poeta, Nilza Vendrami escreveu com muito carinho o livro de poesias ‘Sete Filhos de Maria’, onde conta a história de sua mãe e dos seus sete irmãos. Com sua história de vida encantou a todos e deixou na lembrança, das pessoas que tiveram a oportunidade de conhecê-la, a força de vontade e o carinho em suas palavras escritas. Tinha adoração pela sua neta Larissa Vendrami, que com o incentivo da avó, começou a escrever e seguir os seus passos.

Larissa é um orgulho para todos, aos 12 anos já é escritora, teve os seus primeiros escritos publicados na antologia Rodamundinho 2008 e pretende ir muito longe na carreira de escritora. Como a avó, ela pretende escrever o seu próprio livro e no momento declara que está continuando um livro de contos que Nilza, por força maior, não terminou de escrever. Larissa quer realizar o sonho da avó e ver mais esse livro publicado e relata que é um orgulho para ela finalizar a história que a avó iniciou.

Nilza Florentina Vendrami faleceu aos 59 anos no dia 27 de novembro de 2008.

Fontes:
http://sorocult.com
Cintian Moraes. in
http://sorocaba.com.br/acontece

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Arquivado em A Poetisa no Papel, notas biográficas

Sandra M. Julio (Quão tola fui eu … )

Quão tola fui eu…
Confiando em sonhos de um amor sem fim,
Acreditando que teus versos, eram só pra mim.
Achando-me tua estrela mais amada, quando
Na verdade fui apenas mais uma, hoje desprezada.

Quão tola fui eu…
Permitindo às entrelinhas reverberar ilusão,
Hoje, sangram elas em meu triste coração.
Bebes, pois desse amor, taça vazia,
Depois, sorri da tua hipocrisia.

Quão tola fui eu…
Fazendo-te destino de lugar nenhum,
Farta mesa num dia de jejum.
Embuça teus sorrisos e teus abraços parcos,
Depois, cala teus pobres hiatos.

Quão tola eu fui…
Hoje, a ti entrego as talas da solidão…
Sentirás a dor do flagelo pagão.
Seguirei esquecida deste passado agreste,
Mas para sempre, serei teu leste.

18/02/07
——

Fonte:

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Arquivado em A Poetisa no Papel

Victor Hugo (Catarata de Poesias)

ONTEM A NOITE

Ontem — sozinhos — eu e tu, sentados,
Nos contemplamos quando a noite veio:
Queixosa e mansa a viração dos prados
Beijava o rosto e te afagava o seio,
Que palpitava como ao longe o mar…
E lá no céu esses rubis pregados
Brilhavam menos que teu vivo olhar!

Co´a mão nas minhas, no silêncio augusto,
Tu me falavas sem mentido susto,
E nunca a virgem que a paixão revela,
Passou-me em sonhos tão formosa assim!
Vendo essa noite pura, e a ti tão bela,
Eu disse aos astros: — dai o céu a ela!
Disse a teus olhos: — dai amor p´ra mim!
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HOMEM & MULHER

O homem é a mais elevada das criaturas.
A mulher é o mais sublime dos ideais.
Deus fez para o homem um trono;
Para a mulher um altar.
O trono exalta; o altar santifica.
O homem é o cérebro; a mulher o coração, o amor.
A luz fecunda; o amor ressuscita.
O homem é o gênio; a mulher o anjo.
O gênio é imensurável; o anjo indefinível.
A aspiração do homem é a suprema glória;
A aspiração da mulher, a virtude extrema.
A glória traduz grandeza; a virtude traduz divindade.
O homem tem a supremacia; a mulher a preferência.
A supremacia representa força
A preferência representa o direito.
O homem é forte pela razão; a mulher invencível pelas lágrimas.
A razão convence; a lágrima comove.
O homem é capaz de todos os heroísmos;
A mulher de todos os martírios.
O heroísmo enobrece; os martírios sublimam.
O homem é o código; a mulher o evangelho.
O código corrige; o evangelho aperfeiçoa.
O homem é o templo; a mulher, um sacrário.
Ante o templo, nos descobrimos;
Ante o sacrário ajoelhamo-nos.
O homem pensa; a mulher sonha.
Pensar é ter cérebro;
Sonhar é ter na fronte uma auréola.
O homem é um oceano; a mulher um lago.
O oceano tem a pérola que embeleza;
O lago tem a poesia que deslumbra.
O homem é a águia que voa; a mulher o rouxinol que canta.
Voar é dominar o espaço; cantar é conquistar a alma.
O homem tem um fanal; a consciência;
A mulher tem uma estrela : a esperança.
O fanal guia, a esperança salva.
Enfim …
O homem está colocado onde termina a terra;
A mulher onde começa o céu…

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A FONTE

Da espalda de um rochedo, gota a gota
límpida fonte sobre o mar caia,
Mas, ao vê-la tombar em seu regaço:
” O que queres de mim?” O mar dizia.
“Eu sou da tempestade o antro escuro;
“Onde termina o céu aí começo;
“Eu que nos braços toda a terra espreito,
“De ti, tão pobre e vil, de ti careço?…
No tom saudoso do quebrar das águas
Ao mar, serena, a fonte assim murmura:
“A ti, que és grande e forte, a pobre fonte
Vem dar-te o que não tens, dar-te a doçura!”
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O SEPULCRO E A ROSA

O sepulcro diz à rosa
Que fazes tu flor mimosa
Do orvalho da alva manhã?
Diz a rosa à sepultura:
Que fazes feia negrura
de tanta forma louça?
Negra tumba, segue a rosa
Eu, dessa água preciosa
Faço aroma que é só meu.
Diz-lhe a tumba com afago
De cada corpo que trago
Ressurge um anjo no céu.
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APARIÇÃO

Eu vi um anjo branco que passou sob minha cabeça;
Seu vôo brilhante aliviou a tempestade,
E não disse nada sobre o mar cheio de ruídos longínquos.
– Que você vem fazer, anjo, nesta noite?
Diga me. – Ele respondeu: – Eu venho levar sua alma
– E eu tive medo, porque eu vivo para uma mulher;
E eu contei isto, tremi e lhe ofereci meus braços:
– Isso ficara para mim ? porque você partirá .
– Ele não respondeu; o céu que as trevas sitia
Morrerei … – Se você levar minha alma, eu exclamei,
Aonde você a levará ? Mostre-me em que lugar
– Ele estava sempre quieto. – Oh passageiro do céu azul,
Você é a morte? Diga me isto , ou você é vida?
– E a noite aumentou em minha alma encantada,
E o anjo ficou negro , e disse : – Eu sou o amor.
Mas sua fronte escura era mais encantadora que o dia,
E eu vi, aonde a sombra brilhava seu discípulo,
Estrelas como penas de suas asas.
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AS CONTEMPLAÇÕES

VEM ! – Uma flauta invisível

Vem ! – Uma flauta invisível
Suspire perto dos vergéis
– A canção mais tranqüila
É a canção de pastores.
O vento sopra, debaixo dos galhos ,
O espelho escuro das águas.
– A canção mais feliz
É a canção de pássaros.
Aquele cuidar atento não te atormenta.
Nos amamos ! amamos sempre!
– A canção mais encantadora
É a canção de amores.
=====================================

OS CANTOS DO CREPÚSCULO

Desde que eu meu lábio levei ao copo plenamente cheio ,
Desde que eu minhas mãos coloquei em minha fronte pálida,
Desde que eu respirei às vezes o sopro suave
De tua alma , perfume de tua sombra enterrada,
Desde que me era dado ouvir um ao outro me chamar
As palavras que se derramam no coração misterioso,
Desde que eu vi chorar , desde que eu vi sorrir
Sua boca em minha boca e seus olhos em meus olhos;
Desde que eu vi brilhar em minha cabeça encantada
Um raio de tua estrela, ai! sempre escondida ,
Desde que eu vi desabar nas ondas de minha vida
Uma folha de rosa arrancou os teus dias,
Eu me coloco agora a contar os rápidos anos :
– Passam! Passam sempre! Eu não tenho mais a idade !
Vou partir para que tuas flores desbotem todas;
Eu tenho na alma uma flor que ninguém pode colher!
Suas asas batendo não farão que nada se derrame
Do vaso d’água que bebo e que eu bem enchi
Minha alma não tem mais fogo do que vós possuis em cinzas!
Meu coração não tem mais amor do que vós possuis esquecimento!
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” O AMOR “

Pois que a beber me deste em taça transbordante,
e a fronte no teu colo eu tenho reclinado,
e respirei da tu’alma o hábito inebriante,
– Misterioso perfume à sombra derramado;

visto que te escutei tanto segredo, tanto!
Que vem do coração, dos íntimos refolhos,
e tive o teu sorriso e enxuguei o teu pranto,
– A boca em minha boca e os olhos nos meus olhos;

pois que um raio senti do teu astro, querida,
dissipar-me da fronte as densas brumas frias,
desde que vi cair na onda da minha vida
a pétala de rosa arrancada aos teus dias…

Possa agora dizer ao tempo em seus rigores:
– Não envelheço, não! podeis correr, sem calma,
levando na torrente as vossas murchas flores;
ninguém há de colher a flor que eu tenha n’alma!

Podeis com a asa bater, tentando, sem efeito,
a taça derramar em que me dessedento:
Do que cinzas em vós há mais fogo em meu peito;
e, em mim, há mais amor que em vós esquecimento!
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PALAVRAS SOBRE A DUNA

Agora que meu tempo encurta como um facho,
Que meus labores terminei,
Agora, quase assim do sepulcro debaixo,
Pelo que vivi e o que chorei.
Quando, ao fundo do céu pelo meu vôo sonhado
Vejo fugir na escuridão
Tal como um vendaval arrastando o passado,
As horas boas de então
Agora, que já digo, – um dia o sol inunda,
Mas amanhã chega a descrença!
Sinto-me triste e vou junto a água profunda,
Curvado como alguém que pensa.
Olho, para além do monte e do vale, na extensão,
E dos mares que atiram espumas
Erguer vôo e fugir do abutre aquilão
Toda a cabeleira das nuvens;
Ouço, o vento no ar, o mar sobre o recife,
Homens, na seara madura,
E escuto, ao confrontar na mente pensativa,
O que fala e o que murmura,
E às vezes, sobre a duna, eu fico meditando
Por entre a erva rala e nua,
Até a hora em que vejo aparecerem sonhando
Os olhos sinistros da lua
Ela ascende e projeta um longo raio dormente
Do abismo, no insondável poço;
E olharmo-nos então, nós os dois, fixamente,
Ela que brilha e eu que sofro.
Onde iriam assim meus dias dissipados?
Sabe alguém quem eu sou?
Tenho ainda o clarão, nos olhos deslumbrados,
Da juventude que passou?
Então tudo se foi? Estou cansado e sozinho,
Clamo, sem que ninguém responda;
Vento e vagas! Dizei serei brisa, ai de mim!
Serei um espectro e és uma tumba?
Tudo esgotei, amor, vida, alegria, esperança?
Espero, desejo, suplico,
Minhas urnas inclino, a ver se alguma lança
Um derradeiro salpico.
Como a saudade é pois vizinha do remorso!
Como o chorar tudo nos clama!
E como tu és fria, em te tocando, ó morte,
Negro ferrolho da porta humana!
E medito, ao sentir o amargo vento uivar,
E a onda enorme que se arqueia,
O verão sorri, e pode ver-se a beira mar
Florir o cardo azul da areia.
======================

MÃE E FILHO

Mãe ! A teu filho muitas vezes dissestes
Que o céu tem anjos e o há
Só alegrias no viver celeste
E que é melhor viver por lá;
Que é um zimbório de pilastras belas,
Tenda de ricas cores;
Jardim de anil e lúcido de estrelas
Que se abrem como flores;
Que é o mundo dos seres invisíveis
Do qual Deus é o autor,
De místico azul, de inexauríveis
Gozos, do eterno amor;
Que é doce lá, num êxtase que encanta,
Sentir que a alma se abrasa,
E viver com Jesus e a Virgem Santa
Numa tão linda casa…
Mas nunca lhe disseste, inconsolável
Mãe, chorosa mulher,
Que ele, o pequeno, te era indispensável,
Que ele te era necessário;
Que pelos filhos, quando são pequenos,
Muito as mães se consomem,
Mas que a mãe com seu filho conta ao menos
Quando for velha, e ele homem.
Nunca disseste que no escuro trilho
Da vida, Deus, que é pai
Quer que o filho a mãe guie, e a mãe ao filho,
Pois um sem o outro cai…
Nunca disseste! e agora, morto, apertar
Nos braços teu filhinho!
Deixaste as portas da gaiola aberta,
Voou o passarinho…
——

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Victor Hugo (1802 – 1885)

Victor Marie Hugo nasce a 26 de Fevereiro de 1802, em Besançon, terceiro filho do general napoleonico Léopoldo Hugo e de Sophie Trébuchet.

Em 1811, a família reencontra-se com o seu pai em Madrid onde vive durante um ano. Victor faz os seus primeiros estudos, como interno, no Seminário de Los Nobles, na companhia do seu irmão Eugène.

Em 1812, os dois regressam a França ao mesmo tempo que os seus pais se separam.

Em 1815, Eugène e Victor vão viver com a sua mãe no bairro parisiense Val de Grâce.

. Muito jovem, ainda, compôs numerosos poemas. Aos quinze anos recebeu um prêmio em um concurso de poesia da Academia Francesa. A partir desse momento resolveu dedicar-se à carreira literária: “serei um Chateaubrian ou não serei nada “. Apaixonado, generoso e dotado de uma extraordinária capacidade de trabalho, Hugo escreveu uma obra colossal e variada.

Em 1819 fica noivo de Adèle Foucher, uma amiga de infância, apesar dos ciúmes do seu irmão Eugène e contra os conselhos da sua mãe.

Em 1820 publica a novela “Bug-Jargal” ao mesmo tempo que recebe uma pensão de dois mil francos do rei Luís XVIII pela sua Ode sobre a Morte do Duque de Berry

En1821, Sophie Hugo, a mãe do romancista, falece a 27 de Junho. A 20 de Julho o seu pai volta a casar-se cm Catherine Thomas.

Em 1822 As suas primeiras “Odes” vêm a lume no ano em que casa com Adèle Foucher, integrando-se ao romantismo e em breve se transformou no porta-voz desse movimento.

Em 1823, escreve “Hans de Islandia”.

Em 1825 é nomeado Cavaleiro da Legião de Honra ao mesmo tempo que se torna líder de um grupo de jovens escritores criando o Cenáculo.

Em 1826 nasce o seu segundo filho, Charles. O prefácio do seu drama “Cromwell” é considerado o manifesto do Romantismo contra o Classicismo.

Em1828 morre o seu pai. A 24 de Outubro nasce François-Victor.

Em 1929 em agosto, a sua peça “Marion de Lorme” é censurada.

Em 1830 nasce a sua filha Adèle.

Nos seus escritos reserva lugar preponderante aos estados de alma. Demonstra uma forte tendência ao estranho, ao maravilhoso, ao exótico e ao pitoresco. Neste ano estréia Hernani obra teatral que representa o fim do classicismo, e desencadeia uma polêmica apaixonada.Essa obra expressa novas aspirações da juventude. para Hugo começa então um período de fecundidade. Rival de Lamartine, deseja se afirmar como o único e maior poeta lírico da França.

Em 1831 consegue a sua consagração graças à publicação de “Notre-Dame de Paris”, o seu primeiro romance histórico. A sua mulher inicia uma relação com o célebre crítico Sainte-Beuve.

Em 1832 publica a peça teatral “O Rei se diverte”.

Em 1833 estréia dos dramas “Lucrécia” e “Maria Tudor”. Hugo e a atriz protagonista destas peças, Juliette Drouet, começam uma relação amorosa.

Em1834 edita “Littérature et Philosophie Mêlées”, em homenagem ao descobridor da América e a novela “Claude Gueux”. Um ano mais tarde é a vez de “Cantos do Crepúsculo”.

A partir de 1835, empreende várias viagens pela Europa. Ao mesmo tempo escreve ainda numerosas obras de teatro.

Sua glória de poeta é finamente consagrada em 1841, com a sua eleição para a Academia Francesa. No mesmo ano Luís Felipe o nomeia par de França. A essa altura, Victor Hugo é um homem bem sucedido, leva uma vida burguesa e dedica-se muito pouco a toda criação verdadeiramente nova.

Em 1837 é nomeado Oficial da Legião de Honra.

Em 1840, “O Retorno do Imperador” é editado.

Em 1841 depois de quatro tentativas, ingressa na Academia Francesa no mesmo ano em que sai a lume o seu livro de viagens “O Reno”.

Em 1843 a sua filha Léopoldine casa-se em fevereiro. Em setembro, o casal morre afogado no Sena. Victor Hugo estará três anos sem escrever.

Em 1845 começa a esboçar “Os Miseráveis” que começou por chamar-se “As Misérias”.

Mas ao ser deflagrada a revolução se 1848, se entusiasma com os valores revolucionários das camadas miseráveis e rompe-se com o partido da situação. Torna-se deputado, e se destaca por sua eloquência e por sua radical oposição a Luís Napoleão Bonaparte.

Em 1849 a 13 de maio é eleito deputado conservador na Assembleia Legislativa. Em agosto preside ao Congresso Internacional da Paz.

Em 1851 Declara-se inimigo acérrimo de Luis Bonaparte acusando-o de tirano. Os seus filhos são presos. Depois de organizar a resistência ao golpe de Estado, sai de Paris. Bonaparte assina o decreto de expulsão de Hugo que responde com o manifesto “Pequeno Napoleão”.

Refugiado em Guernesey, Hugo redige ferozes panfletos contra o regime imperial. Mas também escreve grandes “painéis” novelescos e poéticos, em particular A Lenda dos Séculos (1859-1883). Esta obra épica evoca a história do mundo e mistura constantemente a lenda com a realidade. Para ele, o mundo é o terreno onde se defrontam os mitos, o bem e o mal, a bondade e a crueldade.

Do mesmo modo, escreve alguns romances,entre eles Os Miseráveis ( 1862). Quando explode a guerra de 1870 e o Império se desmorona, Hugo regressa à França: é um símbolo da resistência republicana. Sua atividade literária se reduz então consideravelmente.

Em 1871 é eleito deputado, como cabeça de lista dos republicanos por Paris. Morre o seu filho Charles e dois anos depois François.

Em1876 é eleito senador por Paris.

Em 1878 sofre uma congestão cerebral.

Em 1881 milhares de pessoas enchem as ruas de Paris por ocasião do seu 80º aniversário.

Em 1883 morre Juliette Drouet e em junho é publicado o último volume de “Lendas dos Séculos”.

Em 1885, a 13 de Maio sofre uma congestão pulmonar e morre oito dias depois. O Governo decreta luto nacional. O corpo é sepultado no Panteon dos Homens Ilustres. A república lhe presta homenagens fúnebres nacionais. Com ele desaparece um dos grandes gênios da língua francesa. Victor Hugo despertou imenso entusiasmo e fervor popular e deixou sua marca na literatura de todo o século XIX, e ainda em boa parte do século XX.
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Suas obras e suas datas

1822 Odes e Vários Poemas. Poesia ainda prematura.
1823 “Hans de Islândia”. Romance histórico, Hugo está apenas começando.
1826 “Bug-Jargal”. Uma novela esquecida sobre uma revolta escrava em Santo Domingo. Hugo escreveu a primeira edição quando ele tinha 16 anos.
1827 Cromwell. Esta poesia é muito longa para o palco. Seu prefácio, entretanto, fez Victor Hugo famoso. Nele, ele debate por um renascimento romântico do drama.
1829 “Marion de Lorme”. Censores ultrajados baniram este drama chocante. O personagem principal é uma mulher “livre”. O papel do Rei Louis XIII é rude e ofensivo.
O último dia de um condenado à morte. Uma novela contra a pena de morte. Primeiro romance maduro de Victor Hugo.
1829 Poemas Orientais. Ecos da era de temas românticos populares.
1830 Hernani. A instituição literária é escandalizada por este descarado romantismo da obra. Na noite de abertura o público se dividiu entre fãs ardentes e violentos detratores. Brigas apareceram inesperadas. Mas quando a poeira abaixou, a idéia romântica de Hugo dominou o teatro francês.
1831 O Corcunda de Notre Dame (Notre Dame de Paris). A arte da novela nunca mais foi a mesma depois arrojado esforço. O livro resulta na restauração da catedral de Notre Dame de Paris.
1832 “O Rei se Diverte”. Uma obra sobre o efeminando Rei Francis I e seu nobre bobo da corte. Banido pelas autoridades. Guiseppe Verdi usou a trama para sua ópera, RIGOLETTO.
1833 Lucrácia Borgia e Maria Tudor. Hugo escreveu esses dois dramas para a atriz Juliette Drouet.
1834 “Literature and Philosophy Mingled”. Ensaios.
1834 Claude Gueux. Outra novela denunciando a pena de morte
1835 “Canções na Alvorada”. Poesia política. Cada vez mais, Hugo envolve-se em disputas partidárias.
1835 Angelo. Um drama de paixão e vingança no século XVI
1837 Vozes Interiores. Vívido verso.
1838 Ruy Blas. Uma obra sobre uma princesa amada por um pobre poeta. Quase um apelo por reforma política.
1840 Raios de Sol e Trevas. Ambiciosa poesia sobre religião, problemas sociais, políticos e filosóficos.
1842 “O Reno”. Um livro de viagem.
1843 “The Burgraves”. Um melodrama que se passa na Alemanha medieval. Fracassou.
1848 “O Evento”. Um jornal iniciado por Hugo para melhorar suas perspectivas políticas. Em três anos, ele é forçado para o exílio.
1852 Napoleon o Pequeno. Comparação sátira entre Napoleon III e Napoleon I.
1853 Punições. Sátira política em forma poética. Aqui, Hugo completamente abandona padrões clássicos e descobre uma voz poética mais livre.
1856 Contemplações. Comovente poesia inspirada na morte da filha de Hugo, Leopoldine.
1859 A Lenda dos Séculos. Em verso, Hugo desenvolve uma complexa visão de um universo moldado pela imperfeição do homem. Ele vai lutar com este tema durante todo o resto de sua vida.
1862 Os Miseráveis. Um ótimo sucesso internacional. Um romance descomunal, elaborado como uma história de detetive, com memoráveis descrições da vida em Paris. Finalmente, é uma obra que detalha a busca do homem pela verdadeira justiça.
1864 William Shakespeare. Uma comemoração da poética imaginação e do gênio humano
1865 Songs of Lane and Wood. Poesia lírica, leve e pastoral.
1866 Os Trabalhadores do Mar. Um romance dedicado aos marinheiros de Guernsey, a ilha onde Hugo sofre seus 19 anos de exílio da França.
1869 O Homem que Sorri. Um romance anti-feudalismo ambientado na Inglaterra do século 17. A face deformada do herói é um permanente sorriso.
1872 O Ano Terrível. Um relato do cerco a Paris e da ascensão da Comuna durante a Guerra Franco-Prussiana de 1870.
1873 “1793.” Um romance sobre a Revolução Francesa.
1875 Antes do Exílio e Depois do Exílio. Coleção dos ensaios e discursos políticos de Hugo.
1876 Desde o Exílio. Mais material político.
1877 A Arte de Ser um Avô. Versos leves inspirados nos netos Georges e Jeanne.
1877 A Lenda dos Séculos – Segunda Série. Mais poesia fantasmagórica explorando os segredos da criação.
1877 História de um Crime. Escrito no exílio, este reconta o golpe que colocou Napoleão III no trono da França.
1879 A Suprema Misericórdia. Um longo poema demonstrando que um criminoso merece piedade pois sua primeira vítima é si mesmo.
1880 O asno. Um idiota narra este poema sobre o pensamento humano.
1880 Religião e Religiões. Um ataque poético sobre o materialismo e seitas estabelecidas.
1881 Os Quatro Ventos do Espírito. Poesia dramática, épica, lírica e satírica.
1882 Torquemada. Uma severa peça sobre o inquisidor geral da Espanha.
1883 A Lenda dos Séculos. Novamente Hugo usa versos para meditar sobre a humanidade e metafísica.
1886 O Fim de Satanás. Um poema do céu e da terra, da luz e da sombra.
1886 Peças Livres. Obra dramática de 1854 em diante.
1888 A Lira Toda, parte um. Mais poesia.
1891 Deus. Outro poema teológico. hugo resume sua própria religião em uma palavra– Amor.
1893 A Lira Toda, parte dois. Ainda mais poesia.
1898 Os Anos Fatais. Política poética.
1902 Os ùltimos Respingos. Fragmentos de poesias juntadas pelo testamenteiro literário de Hugo.
1942 Oceano e Pilhas de Pedras. Fragmentos colhidos de todos os estágios da carreira de Hugo.

Fontes:
http://victorhugo200anos.vilabol.uol.com.br/victor_hugo.htm
http://pt.wikipedia.org

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Victor Hugo (Os Miseráveis – O Corcunda de Notre Dame)

Os Miseráveis
Um fato histórico…

Durante 73 dias, a cidade sitiada, dominada pela Comuna mobilizada para a guerra, enfrentou o exército. Brigadas de operários e suas mulheres, as petroleuses, numa resistência desesperada, deslocavam-se pelas avenidas e ruas incendiando os prédios públicos. Num repente, os miseráveis que Victor Hugo imortalizara no seu gigantesco romance (Les misèrables, 3 volumes com 2.800 páginas, que, desde 1862, vendera sete milhões de exemplares!), rebelados, tentavam “tomar o céu de assalto”. Milhares de Jeans Valjeans, na companhia das Fantines e das pequenas Cosettes, assistidas pelo moleque Gavroche, um minúsculo herói das barricadas – personagens da grande epopéia literária do proletariado francês -, haviam ocupado as ruas de Paris preparando-se para o embate final. O poeta, ainda na Bélgica, impotente, deprimiu-se. Logo ele que tanto apostara nos Estados Unidos da Europa. Não só alemães lutaram contra franceses, como esses, agora, brigavam entre si.

Glória imorredoura

Por essas e outras é que 700 mil pessoas desfilaram em frente a sua residência na avenida Eylau (hoje Victor Hugo) ao ele completar 80 anos, em 26 de fevereiro de 1881. Nem Napoleão vira tanto povo assim do seu palanque. A sua casa tornou-se local de romaria de gente do mundo inteiro. Até um poema sobre o Brasil ele compôs para o imperador D. Pedro II. Nada em matéria de multidão equiparou-se ao seu enterro quando, no dia 31 de maio de 1885 (ele falecera no dia 22), partindo do Arco do Triunfo onde seu modesto ataúde estava exposto, um milhão de franceses se irmanaram pelos Campos Elísios para levar o féretro de Père Hugo até o Panteão. Nos seus 70 anos de atividade ele fizera de tudo: foi par da França, membro da Academia de Letras, deputado, exilado político, militante anti-bonapartista, integrante do senado e o escritor mais famoso e mais popular das letras francesas em todos os tempos. Além de célebre defensor da abolição da pena capital e emérito ativista das causas populares. Dizem que no delírio que antecedeu a morte, ele gritou “esta é a luta entre o dia e a noite”. Pode ter sido a chegada da noite para ele, mas para a França, que agora celebra o bicentenário do nascimento do seu maior poeta, ocorrido em Besançon em 26 de fevereiro de 1802, Victor Hugo vai ser sempre a luz do dia.

O clássico Os miseráveis, do escritor francês Victor Hugo, foi chamado de “um dos maiores best-sellers de todos os tempos”. Em 1862, nas 24 horas seguintes à publicação da primeira edição de Paris, as 7 mil cópias foram todas vendidas. O livro foi publicado simultaneamente em Bruxelas, Budapeste, Leipzig (na Alemanha), Madri, Rio de Janeiro, Rotterdam e Varsóvia. Depois, a obra foi traduzida para quase todas as línguas do mundo. No século XX, Os miseráveis se tornou filme e musical da Broadway.

Trecho da obra de Victor Hugo:
(…)
Jean Valjean achava-se pois no esgoto de Paris.
Outra semelhança de Paris com o mar. Como no oceano, o mergulhador pode nele desaparecer.
A transição era inaudita. Jean Valjean saíra da cidade mesmo no meio dela e, num abrir e fechar de olhos, no tempo de levantar e abaixar uma tampa, passara da luz do dia para a completa escuridão, do meio-dia para a meia-noite, do tumulto para o silêncio, do turbilhão dos trovões para a estagnação do túmulo; e, por uma peripécia muito mais prodigiosa ainda do que a da rua de Polonceau, do extremo perigo para a segurança absoluta.
Permaneceu alguns segundos como atordoado, estupefato. A bondade celeste tinha-o, de certo modo, surpreendido por traição. Adoráveis emboscadas da Providência!
Mas o ferido não fazia o mínimo movimento, e Jean Valjean não sabia se o que então levava às costas era Mário ou um cadáver.
A sua primeira sensação foi a cegueira. Repentinamente, deixou de ver. Pareceu-lhe que num minuto ensurdecera. Não ouvir já coisa alguma. A frenética e homicida tempestade que se desencadeava alguns metros acima dele não lhe chegava, como já dissemos, ao ouvido, senão muito confusamente, e como um rumor saído de uma profundidade graças à espessura de terra que o separava dela. Adiantou com precaução um pé, temendo que se lhe deparasse um buraco, desaguadouro ou um abismo; e convenceu-se de que o lajedo se prolongava.
Contudo, podia-se penetrar naquela muralha de nevoeiro, e forçoso era fazê-lo. Jean Valjean lembrou-se de que a grade, descoberta por ele debaixo das pedras, podia-o ser também pelos soldados e que tudo dependia de um tal acaso. Podiam também descer ao cano e revistá-lo. Não havia um minuto a perder. Depusera Mário no chão, tornou a pô-lo às costas e meteu-se ao caminho. Entrou resolutamente naquela escuridão.
(…)

G G G G G G G G G G G G G
O Corcunda de Notre-Dame
(Notre-Dame de Paris)

Victor Hugo tinha a reputação principalmente como poeta, mas a fama bem maior lhe veio com a publicação do romance Notre-Dame de Paris, também intitulado O Corcunda de Notre-Dame em diversas traduções. O Misterioso tema do livro tocava profundamente os leitores, em particular dura crítica de uma sociedade que, nas pessoas de Frollo, o arcebispo, e de Phoebus, o soldado, condenava à infelicidade o corcunda Quasímodo e a cigana Esmeralda. Enquanto este romance estava sendo escrito, Luís Felipe , um rei constitucional , havia sido elevado ao poder pelos estudantes e pela burguesia liberal, nos três dias da chamada Revolução de Julho (1830). Hugo compôs um poema em honra ao acontecimento, que seria precursor de muita poesia política. O autor não se contentava, com os seus versos, em exprimir emoções pessoais : pretendia ser o “eco sonoro” do seu tempo, e assim, desempenhar a verdadeira função do poeta, tal como a entendia. Problemas filosóficos e políticos se misturavam à inquietação religiosa e social do período. Um poema tratava da miséria dos trabalhadores, outro proclamava a eficiência das orações .

Algumas versões da obra de Victor Hugo já são bem conhecidas, filmes ou desenhos com adaptações diferenciadas já foram produzidos, para alguns casos, como a Disney por exemplo, o enfoque principal cai sobre a personagem Quasímodo. Na França, um grande musical vem sendo encenado sob o título de Notre Dame de Paris, que é também o título original da obra, que, quando da tradução para português, recebeu o nome de “O CORCUNDA DE NOTRE DAME”, daí talvez algumas leituras caiam sobre esta personagem

Notre-Dame é um livro com o porte de um monumento. Como a igreja que o inspira, é uma obra de transição, exibindo a majestade de um clássico e a decadência do folhetim. Suas personagens expressam a diversidade e se identificam com cada um dos elementos da sua estrutura múltipla e complexa: o padre santo e sábio transformado em vilão ao longo da narrativa e que abriga e alimenta, sem saber, a figura que sintetiza sua própria decadência; o poeta dividido entre a cultura vazia do poder e a presença viva do povo nas ruas; a dançarina que encarna a beleza e a graça do movimento em confronto com uma espiritualidade rígida fundada no medo. Assim, a trama que enreda o leitor revela a solidez acumulada pela História em queda livre para o abismo.

Em oposição a esta imagem do escritor no século 19 – que Victor Hugo denuncia ambientado no século 15 – um livro feito de pedra como Notre-Dame de Paris instaura uma postura intelectual sólida. A obra literária opõe-se à decadência, resgatando a grandeza perdida da arte. Em Gringoire, as palavras são como a caiação deformando antigos monumentos. Em Victor Hugo, elas funcionam como uma orquestra e assumem a força de uma tempestade.

(crítica de Nei Duclós em artigo “Um livro feito de pedra”)
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Sobre Nei Duclós
Nei Carvalho Duclós (Uruguaiana, 29 de outubro de 1948) é jornalista, poeta e escritor brasileiro. Tem quatro livros lançados e inúmeros textos publicados na imprensa brasileira.
Aos 17 anos se mudou para Porto Alegre e se matriculou no curso de engenharia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o qual abandonaria logo depois em favor da faculdade de Jornalismo. Envolveu-se no movimento estudantil brasileiro após o golpe militar de 1964. Trabalhou no jornal gaúcho Folha da Manhã e publicou seu primeiro livro, Outubro, em 1975. Mudou-se para São Paulo, onde desenvolveu longa carreira como jornalista, tendo trabalhado no jornal Folha de S. Paulo, revistas Brasil 21, Senhor, e IstoÉ. Publicou textos também em O Estado de S. Paulo, Veja e Jornal do Brasil. Publicou Outubro e No Meio da Rua, ambos pela editora LP&M, em 1980, e No Mar, Veremos, pela editora Globo, em 2001, todos de poesia. Em 2004 publicou seu primeiro romance, Universo Baldio, pela W11 Editores. É bacharel em História pela Universidade de São Paulo. Trabalha na revista Empreendedor e publica coluna no Diário Catarinense.
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Fontes:

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Edgar Allan Poe (A Máscara da Morte Escarlate)

A “Morte Escarlate” havia muito devastava o país. Jamais se viu peste tão fatal ou tão hedionda. O sangue era sua revelação e sua marca a cor vermelha e o horror do sangue. Surgia com dores agudas e súbita tontura, seguidas de profuso sangramento pelos poros, e então a morte. As manchas rubras no corpo e principalmente no rosto da vítima eram o estigma da peste que a privava da ajuda e compaixão dos semelhantes. E entre o aparecimento, a evolução e o fim da doença não se passava mais de meia hora.

Mas o príncipe Próspero era feliz, destemido e astuto. Quando a população de seus domínios se reduziu à metade, mandou vir à sua presença um milhar de amigos sadios e divertidos dentre os cavalheiros e damas da corte e com eles retirou-se, em total reclusão, para um dos seus mosteiros encastelados. Era uma construção imensa e magnífica, criação do gosto excêntrico, mas grandioso do próprio príncipe. Circundava-a a muralha forte e muito alta, com portas de ferro. Depois de entrarem, os cortesãos trouxeram fornalhas e grandes martelos para soldar os ferrolhos. Resolveram não permitir qualquer meio de entrada ou saída aos súbitos impulsos de desespero do que estavam fora ou aos furores do que estavam dentro. O mosteiro dispunha de amplas provisões. Com essas precauções, os cortesãos podiam desafiar o contágio. O mundo externo que cuidasse de si mesmo. Nesse meio-tempo era tolice atormentar-se ou pensar nisso. O príncipe havia providenciado toda a espécie de divertimentos. Havia bufões, improvisadores, dançarinos, músicos, Beleza, vinho. Lá dentro, tudo isso mais segurança. Lá fora, a “Morte Escarlate”.

Lá pelo final do quinto ou sexto mês de reclusão, enquanto a peste grassava mais furiosamente lá fora, o príncipe Próspero brindou os mil amigos com um magnífico baile de máscaras.

Era um espetáculo voluptuoso, aquela mascarada. Mas antes vou descrever onde ela aconteceu. Eram sete ? um suíte imperial. Em muitos palácios, porém, essas suítes formam uma perspectiva longa e reta, quando as portas se abrem até se encostarem nas paredes de ambos os lados, de tal modo que a vista de toda essa sucessão é quase desimpedida. Ali, a situação era muito diferente, como se devia esperar da paixão do duque pelo fantástico. Os salões estavam dispostos de maneira tão irregular que os olhos só podiam abarcar pouco mais de cada um por vez. Havia um desvio abrupto a cada vinte ou trinta metros e, a cada desvio, um efeito novo. À direita e à esquerda, no meio de cada parede, uma alta e estreita janela gótica dava para um corredor fechado que acompanhava as curvas da suíte. A cor dos vitrais dessas janelas variava de acordo com a tonalidade dominante na decoração do salão para o qual se abriam. O da extremidade leste, por exemplo, era azul ? e de um azul intenso eram suas janelas. No segundo salão os ornamentos e tapeçarias, assim como as vidraças, eram cor de púrpura. O Terceiro era inteiramente verde, e verdes também os caixilhos das janelas. O quarto estava mobiliado e iluminado com cor alaranjada ? o quinto era branco, e o sexto, roxo. O sétimo salão estava todo coberto por tapeçarias de veludo negro, que pendiam do teto e pelas paredes, caindo em pesadas dobras sobre um tapete do mesmo material e tonalidade. Apenas nesse salão, porém, a cor das janelas deixava de corresponder à das decorações. As vidraças, ali, eram escarlates ? Uma violenta cor de sangue.

Ora, em nenhum dos sete salões havia qualquer lâmpada ou candelabro, em meio à profusão de ornamentos de ouro espalhados por todos os cantos ou dependurados do teto. Nenhuma lâmpada ou vela iluminava o interior da seqüência de salões. Mas nos corredores que circundavam a suíte havia, diante de cada janela, um pesado tripé com um braseiro, que projetava seus raios pelos vitrais coloridos e, assim, iluminava brilhantemente a sala, produzindo grande número de efeitos vistosos e fantásticos. Mas no salão oeste, ou negro, o efeito do clarão de luz que jorrava sobre as cortinas escuras através das vidraças da cor do sangue era desagradável ao extremo e produzia uma expressão tão desvairada no semblante do que entravam que poucos no grupo sentiam ousadia bastante para ali penetrar.

Era também nesse apartamento que se achava, encostado à parede oeste, um gigantesco relógio de ébano. Seu pêndulo oscilava de um lado para o outro com um bater surdo, pesado, monótono; quando o ponteiro dos minutos completava o circuito do mostrador e o relógio ia dar as horas, de seus pulmões de bronze brotava um som claro e alto e grave e extremamente musical, mas em tom tão enfático e peculiar que, ao final de cada hora, os músicos da orquestra se viam obrigados a interromper momentaneamente a apresentação para escutar-lhe o som; com isso os dançarinos forçosamente tinham de parar as evoluções da valsa e, por um breve instante, todo o alegre grupo mostrava-se perturbado; enquanto ainda soavam os carrilhões do relógio, observava-se que os mais frívolos empalideciam e os mais velhos e serenos passavam a mão pela teste, como se estivessem num confuso devaneio ou meditação. Mas, assim que os ecos desapareciam interiormente, risinhos levianos logo se riam do próprio nervosismo e insensatez e, em sussurros, diziam uns aos outros que o próximo soar de horas não produziria neles a mesma emoção; mas, após um lapso de sessenta minutos (que abrangem três mil e seiscentos segundos do Tempo que voa), quando o relógio dava novamente as horas, acontecia a mesma perturbação e idênticos tremores e gestos de meditação de antes.

Apesar disso tudo, que festa alegre e magnífica! Os gostos do duque eram estranhos. Sabia combinar cores e efeitos. Menosprezando a mera decoração da moda, seus arranjos mostravam-se ousados e veementes, e suas idéias brilhavam com um esplendor bárbaro. Alguns podiam considerá-lo louco, sendo desmentidos por seus seguidores. Mas era preciso ouvi-lo, vê-lo e tocá-lo para convencer-se disso.

Para essa grande festa, ele próprio dirigiu, em grande parte, a ornamentação cambiante dos sete salões, e foi seu próprio gosto que inspirou as fantasias dos foliões. Claro que eram grotescas. Havia muito brilho, resplendor, malícia e fantasia? Muito daquilo que foi visto depois no Hernani. Havia figuras fantásticas com membros e adornos que não combinavam. Havia caprichos delirantes como se tivessem sido modelados por um louco. Havia muito de beleza, muito de libertinagem e de extravagância, algo de terrível e um tanto daquilo que poderia despertar repulsa. De um ao outro, pelos sete salões, desfilava majestosamente, na verdade, uma multidão de sonhos. E eles? Os sonhos ? Giravam sem parar, assumindo a cor de cada salão e fazendo com que a impetuosa música da orquestra parecesse o eco de seus passos. Daí a pouco soa o relógio de ébano colocado no salão de veludo. Então, por um momento, tudo se imobiliza e é tudo silêncio, menos a voz do relógio. Os sonhos se congelam como estão. Mas os ecos das batidas extinguem-se ? Duraram apenas um instante? E risos levianos, mal reprimidos, flutuam atrás dos ecos, à medida que vão morrendo. E logo a música cresce de novo, e os sonhos revivem e rodopiam mais alegremente que nunca, assumindo as cores das muitas janelas multicoloridas, através das quais fluem os raios luminosos dos tripés. Ao salão que fica a mais oeste de todos os sete, porém, nenhum dos mascarados se aventura agora; pois a noite está se aproximando do fim: ali flui uma luz mais vermelha pelos vitrais cor de sangue e o negror das cortinas escuras apavora; para aquele que pousa o pé no tapete negro, do relógio de ébano ali perto chega um clangor ensurdecido mais solene e enfático que aquele que atinge os ouvidos dos que se entregam às alegrias nos salões mais afastados.

Mas nesses outros salões cheios de gente batia febril o coração da vida. E o festim continuou em remoinhos até que, afinal, começou a soar meia-noite no relógio. Então a música cessou, como contei, as evoluções dos dançarinos se aquietaram, e, como antes, tudo ficou intranqüilamente imobilizado. Mas agora iriam ser doze as badaladas do relógio; e desse modo mais pensamentos talvez tenham se infiltrado, por mais tempo, nas meditações dos mais pensativos, entre aqueles que se divertiam. E assim também aconteceu, talvez, que, antes de os últimos ecos da última badalada terem mergulhado inteiramente no silêncio, muitos indivíduos na multidão puderam perceber a presença de uma figura mascarada que antes não chamara a atenção de ninguém. E, ao se espalhar em sussurros o rumor dessa nova presença, elevou-se aos poucos de todo o grupo um zumbido ou murmúrio que expressava a reprovação e surpresa ? e, finalmente, terror, horror e repulsa.

Numa reunião de fantasmas como esta que pintei, pode-se muito bem supor que nenhuma aparência comum poderia causar tal sensação. Na verdade, a liberdade da mascarada dessa noite era praticamente ilimitada; mas a figura em questão ultrapassava o próprio Herodes, indo além dos limites até do indefinido decoro do príncipe. Existem cordas, nos corações dos mais indiferentes, que não podem ser tocadas sem emoção. Até para os totalmente insensíveis, para quem a vida e morte são alvo de igual gracejo, existem assuntos com os quais não se pode brincar. Na verdade, todo o grupo parecia agora sentir profundamente que na fantasia e no rosto do estranho não existia graça nem decoro. A figura era alta e esquálida, envolta dos pés a cabeça em veste mortuárias. A máscara que escondia o rosto procurava assemelhar-se de tal forma com a expressão enrijecida de um cadáver que até mesmo o exame mais atento teria dificuldade em descobrir o engano. Tudo isso poderia ter sido tolerado, e até aprovado, pelos loucos participantes da festa, se o mascarado não tivesse ousado encarnar o tipo da Morte Escarlate. Seu vestuário estava borrifado de sangue? e sua alta testa, assim como o restante do rosto, salpicada com o horror escarlate.

Quando os olhos do príncipe Próspero pousaram nessa imagem espectral (que andava entre os convivas com movimentos lentos e solenes, como se quisesse manter-se à altura do papel), todos perceberam que ele foi assaltado por um forte estremecimento de terror ou repulsa, num primeiro momento, mas logo o seu semblante tornou-se vermelho de raiva.

– Quem ousa… ? perguntou com voz rouca aos convivas que estavam perto ? quem ousa nos insultar com essa caçoada blasfema? Peguem esse homem e tirem sua máscara, para sabermos quem será enforcado no alto dos muros, ao amanhecer!

O príncipe Próspero estava na sala leste, ou azul, ao dizer essas palavras. Elas ressoaram pelos sete salões, altas e claras, pois o príncipe era um homem ousado e robusto e a música se calara com um sinal de sua mão.

O príncipe achava-se no salão azul com um grupo de pálidos convivas ao seu lado. Assim que falou, houve um ligeiro movimento dessas pessoas na direção do intruso, que, naquele momento, estava bem ao alcance das mãos, e agora, com passos decididos e firmes, se aproximava do homem que tinha falado. Mas por causa de certo temor sem nome, que a louca arrogância do mascarado havia inspirado em toda a multidão, não houve ninguém que estendesse a mão para detê-lo; de forma que, desimpedido, passou a um metro do príncipe e, enquanto a vasta multidão, como por um único impulso, se retraía do centro das salas para as paredes, ele continuou seu caminho sem deter-se, no mesmo passo solene e medido que o distinguira desde o inicio, passando do salão azul para o púrpura ? do púrpura para o verde ? do verde para o alaranjado ? e desse ainda para o branco ? e daí para o roxo, antes que se fizesse qualquer movimento decisivo para detê-lo. Foi então que o príncipe Próspero, louco de raiva e vergonha por sua momentânea covardia, correu apressadamente pelos seis salões, sem que ninguém o seguisse por causa do terror mortal que tomara conta de todos. Segurando bem alto um punhal desembainhado, aproximou-se, impetuosamente, até cerca de um metro do vulto que se afastava, quando este, ao atingir a extremidade do salão de veludo, virou-se subitamente e enfrentou seu perseguidor. Ouviu-se um grito agudo ? e o punhal caiu cintilando no tapete negro, sobre o qual, no instante seguinte, tombou prostrado de morte o príncipe Próspero. Então, reunindo a coragem selvagem do desespero, um bando de convivas lançou-se imediatamente no apartamento negro e, agarrando o mascarado, cuja alta figura permanecia ereta e imóvel à sombra do relógio de ébano, soltou um grito de pavor indescritível, ao descobrir que, sob a mortalha e a máscara cadavérica, que agarravam com tamanha violência e grosseria, não havia qualquer forma palpável.

E então reconheceu-se a presença da Morte Escarlate. Viera como um ladrão na noite. E um a um foram caindo os foliões pelas salas orvalhadas de sangue, e cada um morreu na mesma posição de desespero em que tombou no chão. E a vida do relógio de Ébano dissolveu-se junto com a vida do último dos dissolutos. E as chamas dos braseiros extinguiram-se. E o domínio ilimitado das Trevas, da Podridão e da Morte Escarlate estendeu-se sobre tudo.

Fontes:
POE, Edgar Allan. Histórias Extraordinárias. SP: Nova Cultural, 1993.
Imagem = http://vulcanus.multiply.com/

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Eliana Palma (Habeas-Pinho)

Em 1955, em Campina Grande, na Paraíba, um grupo de boêmios fazia serenata numa madrugada do mês de junho, quando chegou a polícia e apreendeu o violão.

Decepcionado, o grupo recorreu aos serviços do advogado Ronaldo Cunha Lima, então recentemente saído da Faculdade e que também apreciava uma boa seresta. Ele peticionou em Juízo para que fosse liberado o violão.

Aquele pedido ficou conhecido como “Habeas-Pinho” e enfeita as paredes de escritórios de muitos advogados e bares de praias no Nordeste.

Mais tarde, Ronaldo Cunha Lima foi eleito Deputado Estadual, Prefeito de Campina Grande, Senador da República, Governador do Estado e Deputado Federal.

Eis a famosa petição:

HABEAS-PINHO

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara desta Comarca:

O instrumento do crime que se arrola
Neste processo de contravenção
Não é faca, revólver nem pistola,
É simplesmente, doutor, um violão.

Um violão, doutor, que na verdade,
Não matou nem feriu um cidadão,
Feriu, sim, a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.

O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade,
Ao crime ele nunca se mistura,
Inexiste entre eles afinidade.

O violão é próprio dos cantores,
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam as mágoas e que povoam a vida
Sufocando suas próprias dores.

O violão é música e é canção,
É sentimento de vida e alegria,
É pureza e néctar que extasia,
É adorno espiritual do coração.

Seu viver, como o nosso, é transitório,
Porém seu destino se perpetua,
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.

Mande soltá-lo pelo Amor da noite,
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas leves e sonoras.

Libere o violão, Dr. Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito,
É crime, porventura, o infeliz
cantar as mágoas que lhe enchem o peito?

Será crime, e, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
perambular na rua um desgraçado
derramando ali as suas dores?

É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento,
Juntando esta petição aos autos nós pedimos
e pedimos também DEFERIMENTO.

Ronaldo Cunha Lima, advogado.

O juiz Arthur Moura, sem perder o ponto, deu a sentença no mesmo tom:
“Para que eu não carregue remorso no coração,
Determino que seja entregue ao seu dono,
Desde logo, O malfadado violão! “

Recebo a Petição escrita em verso
E, despachando-a sem autuação,
Verbero o ato vil, rude e perverso,
Que prende, no cartório, um violão.

Emudecer a prima e o bordão,
Nos confins de um arquivo em sombra imerso
È desumana e vil destruição
De tudo, que há de belo no universo.

Que seja Sol, ainda que a desoras,
E volte à rua, em vida transviada
Num esbanjar de lágrimas sonoras.

Se grato for, acaso ao que lhe fiz,
Noite de lua, plena madrugada,
Venha tocar à porta do Juiz.

Fontes:
http://blogdodepaula.blogspot.com/
Pintura = http://imagecache2.allposters.com

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