Arquivo do mês: agosto 2010

Visitas ao Blog entre Maio e Agosto de 2010

1 comentário

31 de agosto de 2010 · 22:51

Vânia Maria Souza Ennes (Trovador)

Fonte:
ENNES, Vânia Maria Souza. Chuva de trovas, junho de 2008. Biblioteca Virtual do Portal CEN (Cá Estamos Nós).
Arte de Iara Melo.

Deixe um comentário

Arquivado em Paraná em Trovas

Tristão Alencar Pereira Oleiro (Poemas Avulsos)

SAUDADE

Saudade é vento que passa
Na estrada poeirenta da vida,
Deixando lembranças gravadas
Na velocidade não percebida.
É lembrança de coisas boas,
Chegadas da estação da aurora.
É desencanto das despedidas,
É alegria dos tempos de outrora.
Saudade é ouvir as cantigas,
Do sorrir e do cantar,
Dos tempos de minha infância.
Do perfume das flores no ar.
Das brincadeiras nas calçadas,
Nas praças e jardins
Correndo pelas alamedas,
Entre rosas e jasmins.
Ah! como é bom lembrar
O conviver com inocência,
Das amizades sinceras,
Com amor em sua essência.
O tempo é o melhor amigo
Que faz a lembrança voltar
Para casar a saudade comigo
E jamais nos separar.
Saudade que fica para sempre
Assim a vida se esvai,
Trazendo muitas lembranças ,
Dos tempos que não voltam mais.
––––––––––––––––

AMANHECER

O sol desponta no horizonte amarelando areias da praia.
Alaranjadas nuvens traduzem a temperatura elevada que está por vir.
Suaves ondas desenham a orla repleta de agitadas aves em busca de alimentos.
A brisa faz farfalhar folhas dos coqueiros.
O coração do poeta segura a produção literária da madrugada, empilhada sobre a mesa para não voar ao léu.
O dia inicia e com muita nostalgia encerra-se o que passou.
Dia após dia, a sequência criadora grava no tempo a história presente.
Vida de escritor…
––––––––––––––––––––

LAGUNA AO LUAR…

Teus meus cabelos soltos
Na brisa que afaga…
Luar, trilha de prata
brilha ao teu/meu olhar…
Laguna, lagoa, mar,
Peixes (des)embainhados, reluzem…
Ondas em colares perolados
Amores ardentes, seduzem…
Praia orlada, dourada,
a sonhar, momentos
Sonhados, conduzem…
És minha lua, luar,
Claridade infinita, paixão…
Luz irradiada, clarão
A iluminar minha vida…
——

Fontes:
Antologia de Poetas Brasileiros. volume 44. março 2008.
Revista Aquilo que a gente sente. n.1. novembro 2009. Portal CEN.
Academia Virtual Sala de Poetas e Escritores 2009. A Natureza em Versos. http://www.avspe.eti.br/coutinho/poesiaamigos/narureza5.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Poemas

Tristão Alencar Pereira Oleiro (1946)

Tristão Alencar Pereira Oleiro nasceu em Valparaiso-SP a 9 de outubro de 1946.

É Contador e Servidor Público Municipal de Pelotas, onde é Diretor de Manifestações Populares da SECULT.

Ativista Cultural, Escritor e Poeta.

Tem publicado o livro “Crônicas, Contos e Poesias”, Ed. E Gráfica UFPEL, no ano de 2007. Trabalhos publicados na 44ª Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos, na Antologia de Contos Fantásticos e no Livro de Ouro da Poesia Brasileira Contemporânea ambos no RJ.

Possui contos, poesias e prosas premiadas pelo Centro Literário Pelotense (CLIPE) Pelotas/RS, Academia Sul Brasileira de Letras (ASBL) Pelotas/RS, Casa do Poeta Rio-Grandense (CAPORI) Porto Alegre/RS, Centro de Escritores Lourencianos (CEL) São Lourenço do Sul/RS, Editora PorArt (Volta Redonda-RJ) e CBJE – Câmara Brasileira de Jovens Escritores (Rio de Janeiro-RJ). Presidente da CBC – Casa Brasileira de Cultura (2008-2010) Pelotas/RS,

Membro Acadêmico Correspondente da Academia de Artes, Ciências e Letras Castro Alves Cadeira 12 (Porto Alegre/RS, 2009) e

Membro Correspondente da Academia Rio-Grandina de Letras- ARL (Rio Grande/RS, 2009).

Recebeu o Título de Cidadão Pelotense (Câmara de Vereadores e Prefeitura Municipal de Pelotas/RS, 2005), o Brasão da Academia Pelotense de Letras (APelL, 2005), a Medalha do Mérito Tradicionalista João Simões Lopes Neto (Movimento Tradicionalista Gaúcho / 2008), além de várias menções honrosas por participação em concursos literários.

Participa das coletâneas do Centro Literário Pelotense, onde participa; do Centro de Escritores Lourencianos e da Casa do Poeta Riograndense.

Recebeu Menções Honrosas no Concurso Nacional de Poesias Érico Veríssimo em 2005, no Concurso Literário de Poesias Pedro Baggio da Associação Brasileira de Letras em 2007. Recebeu o Título de Cidadão Pelotense da Câmara de Vereadores e o Brasão da Academia Pelotense de Letras, ambos em 2005, além do Troféu Obelisco em Administração Pública, em 2006.

É Diretor de Divulgação da Casa do Poeta Rio-grandense gestão 2008/2009 e Presidente da Casa Brasileira de Cultura sediada em Pelotas gestão 2008/2010. Escreve crônicas para jornais da cidade.

No Tradicionalismo, foi fundador da 10ª Região, em 1976, com sede em Santiago/RS e foi seu primeiro Secretário por dois anos.

Participou de vários Congressos Tradicionalistas, Convenções e Festas Gaúchas do MTG. Foi Posteiro Cultural do CTG Negrinho do Pastoreio em 1992, concorreu ao cargo de Coordenador da 26ª Região em 1994.

Escritor Imortal da Academia de Letras do Brasil, pelo Rio Grande do Sul.

Fontes:
http://www.artistasgauchos.com.br/portal/?id=1271
http://www.camarapel.rs.gov.br/imprensa/noticias/2008/0104/0104t.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Biografia, Rio Grande do Sul

Ialmar Pio Schneider (Baú de Trovas VII)

Alta noite, escrevo versos,
sentindo a falta de alguém;
quem me dera que dispersos,
ela os ouvisse também…

A trova que canto agora
tem sabor de nostalgia,
por alguém que foi embora
quando mais bem a queria.

De manhã cedo levanto
e ao Senhor dos Céus imploro,
que me ajude quando canto
e me console se choro.

Desejo que o nosso amor
nunca seja de mentira;
por isto sou trovador
romântico, ao som da lira.

De tudo que amo e venero,
vem em primeiro lugar,
teu beijo doce e sincero
que me faz revigorar.

Dos versos soltos que faço,
um deles tem mais calor;
porque lembra teu abraço
e nossos beijos de amor..

Este amor que não resiste
às tentações deste mundo,
se não fosse assim tão triste,
pudera ser mais profundo.

Estivemos frente a frente,
mas nenhum de nós sorriu;
parecias diferente
que me deixaste arredio.

És uma estrela tão alta,
brilhando no firmamento,
que a minha canção exalta
no calor do sentimento.

Eu caminho lentamente
pelas areias do mar,
debaixo do sol ardente
que descamba devagar…

Eu levo a vida cantando
minhas trovas e canções;
só assim vou afastando
mágoas e desilusões.

Eu te esperei tantos anos,
até não conseguir mais
agüentar os desenganos
que o teu desprezo me traz.

Faze da trova teu lema
com grande satisfação
e terás em cada tema
um motivo de emoção.

Não façamos desta vida
um motivo de revolta;
nesta estrada sem saída
é tão difícil a volta.

Não há mentira mais louca
da que sai do coração,
pois a que nasce da boca
quase sempre é pretensão.

Nesta manhã radiante
de sol claro e resplendente,
por seres tão inconstante,
me deixas tão descontente…

Nosso amor já teve fim,
pois não esteve ao alcance
o que você quis de mim
pra ter sucesso o romance.

O amor de quem não desiste,
seja forte, seja brando,
há de permanecer triste
que nem flor que vai murchando.

O amor platônico vive
em minhas trovas também;
foi um que uma vez eu tive
e não me fez muito bem.

O amor tem prazer e pranto,
também mágoas e carinhos;
pois assim sendo, portanto,
não há rosas sem espinhos!

Para esquecer-te procuro
me envolver na multidão,
mas não me sinto seguro
e retorno à solidão.

Pelo amor sempre sonhado
e nunca correspondido,
vou cantar um verso alado
pra que chegue ao teu ouvido.

Penso em ti quando a saudade
me visita de surpresa
e na minha soledade
recordo a tua beleza.

Perdido em divagações
sento à beira do caminho,
como se as recordações
não me deixassem sozinho.

Quando te vejo sorrindo,
não consigo disfarçar,
este desespero infindo
de não poder te beijar.

Se amei e fui preterido,
pouco me importa até quando,
pois não me dou por vencido
e continuo te amando.

Se tens amor não o escondas,
proclame-o para quem é;
as paixões são como as ondas
que aproveitam a maré.

Trovas de amor e saudade
trazem mil temas diversos,
mas predomina a amizade
nascendo de tantos versos…

Tu me procuras sorrindo
e te recebo contente,
como se fosse surgindo
um novo amor de repente!

Vida de amor e saudade,
que junto com nossos sonhos,
também traz a realidade
e momentos enfadonhos.

—————–

Fonte:

O Autor

Deixe um comentário

Arquivado em A escritora em xeque, Baú de Trovas, Contos, Entrevista, Entrevistas, Trovas

1ª Oficina de Redação no Ponto de Leitura de Itu

O Ponto de Leitura de Itu – Biblioteca Comunitária Prof. Waldir de Souza Lima – realizará todas as quartas-feiras, das 18h30 às 21 horas, a partir de 15 de setembro, a 1ª Oficina de Redação. O curso é gratuito e o público alvo são estudantes de Ensino Médio de escolas públicas (normal, técnico e supletivo), porém as inscrições estão abertas a toda a população.

Serão onze encontros durante os meses de setembro a dezembro, com encerramento previsto para o dia 08 de dezembro.

Durante o curso os participantes irão trabalhar com o acervo da biblioteca comunitária nos seus diversos formatos: dicionários, livros, revistas, jornais, fanzines e cordéis. Será dada ênfase à produção literária contemporânea e reflexões sobre temas do cotidiano, nas variadas formas de expressão literária: descrição, narração, dissertação e outras. Por meio de exercícios e técnicas de leitura e escrita os participantes serão estimulados a criar textos em diversos formatos, tanto individuais como coletivos.

A oficina será coordenada por José Renato Galvão, graduando em Letras pela UNIP e voluntário da biblioteca comunitária. O limite é de 30 vagas, sendo 20 para estudantes de escolas públicas e 10 para o público em geral. A idade mínima é de 14 anos. Para se inscrever é necessário informar nome, endereço e documento de identidade (RG).

As inscrições podem ser feitas pelo e-mail bibliotecacomunitariaitu@gmail.com , pelo telefone (11) 8110.3598 ou pessoalmente (apenas aos sábados) na biblioteca, que fica na rua Floriano Peixoto, 238, Centro, Itu.

SERVIÇO

1ª Oficina de Redação

ONDE: Ponto de Leitura de Itu – Biblioteca Comunitária prof. Waldir de Souza Lima – Rua Floriano Peixoto, 238, Centro, Itu.

QUANDO: A partir de 15 de setembro de 2010, às quartas-feiras, das 18h30 às 21 horas.

QUANTO: atividade gratuita.

INSCRIÇÕES: (11) 8110.3598, bibliotecacomunitariaitu@gmail.com ou pessoalmente no local (apenas aos sábados das 9 às 18 horas).

Fonte:
Biblioteca Comunitária prof. Waldir de Souza Lima

Deixe um comentário

Arquivado em Notícias Em Tempo

A. A. de Assis lança Trovia n. 129 – setembro de 2010

Você pode adquirir este número no site: https://sites.google.com/site/pavilhaoliterario/Home
ou fazer o download diretamente em
https://sites.google.com/site/pavilhaoliterario/Home/TROVIAmaring%C3%A1n129setembro2010.pdf?attredirects=0&d=1
—————-

Paraná em Trovas

Se alguém se torna importante,
por certo alguém o ajudou.
Mesmo o Amazonas, gigante,
de afluentes precisou.
A. A. de Assis

Pela ambição do poder,
até guerra o homem faz.
Traz a morte por não ver
que o poder está na paz.
Adélia Woellner

O barro de que fui feito,
em tempo que longe vai,
foi modelado com jeito
por bom oleiro: meu pai!
Alberto Paco

A vida é dura, patrão,
rarissimamente bela…
Porém não há solução
senão conviver com ela.
Antônio da Serra

Vendo o ovo da avestruz,
suspira fundo a galinha:
– ”Puxa, eu pensava que a cruz
mais pesada fosse a minha!!!
Eliana Palma

Por medo de te perder,
não errei – pobre aprendiz!
– Não soube me conceder
o risco de ser feliz…
Jeanette De Cnop

Quem tem sonhos hoje em dia
nunca perca a esperança.
Diz velha sabedoria:
Quem espera sempre alcança.
José Feldman

Tempo difícil vivemos!
Quem nele tiver firmeza
alcança dois bens extremos:
a lucidez e a grandeza.
José Marins

Primeira noite… pijama,
camisola de babado…
Ela acordada na cama,
tudo o mais… desacordado!
Lucília Decarli

Em algo simples se encerra
raro prazer e emoção:
O cheiro que exala a terra
quando a chuva cai no chão.
Olga Agulhon

E’ dia sim, dia não…
Dia anão?… Ou dia assim?…
Sei lá… mas que confusão!
O jeito é rimar com “fim”…
Osvaldo Reis

Vai trolinho carruagem…
todo mundo atrás do trem!
Vou logo comprar passagem
para encontrar o meu bem…
Renato Leite Goetten

Eu não troco o meu feitiço
por um feitiço qualquer;
meu charme eu não desperdiço:
meu feitiço é ser mulher!
Roza de Oliveira

Nos acordes da poesia,
versos de muito valor
traduzem a nostalgia
do peito de um trovador.
Sônia Ditzel Martelo

Meu tempo tornou-se esparso…
Por mais que eu tente retê-lo,
nem com tintura eu disfarço
o cinza do meu cabelo…
Vanda Alves

Nas curvas da caminhada,
tento a paisagem mudar.
Se não pode ser mudada,
mudo meu jeito de olhar!
Vanda F. Queiroz

Eu sonho no meu viver
e vivo no meu sonhar…
Na saudade o reviver,
no presente o caminhar…
Vidal Idony Stockler

———–

além destas, muitas outras de diversos estados e Portugal podem ser encontrados na Revista Virtual de Trovas Trovia n. 129, setembro de 2010 em https://sites.google.com/site/pavilhaoliterario/Home

Deixe um comentário

Arquivado em Paraná em Trovas, Revista Virtual de Trovas Trovia

Efigenia Coutinho (A Poetisa e sua Poesia)

RECOMEÇAR

Na ousadia de recomeçar a Vida
eu tentaria refazer meus sonhos
tornando-os ainda mais grandiosos!…
Embelezando ainda mais a vida!

Porque os sonhos são infindos
sem opressão, sendo mais formosos
depois que se conhece e vive o Amor
como um salmo do próprio amor!

Nada mais grandioso que um Lacre
entre duas almas solidamente selado
do mesmo ideal do sonho encantado!

Não padeças se achares meu coração
triste, mas fique triste e desolado
se não encontrares o meu coração!

TEUS AIS

Por noites de esplendor e exaltação
desfrutávamos dos sonhos o alento!
Ainda, inquietação em mim provocas
Transmutando desejos com alento!…

Ao arrebatamento íntimo a caricia
Dos teus anelos sentindo na memória
Que retorna deixando-me enleada
Somente em recordar a nossa estória:

Duas almas enamoradas juntas,
reencontros pelas escritas
Não há todavia como esquecer!

Neste tempo, magia e rituais
da paixão, na derradeira cavalgada
você vinha, com vinho e teus ais!…

TEMPESTADE

Por essa pupila luzente e molhada,
um enigma sacro soberbo de ternura,
vem pela ampla noite de gozo e loucura
estende-se, quente e perfumada.

É por onde ansioso olhar alucinado,
embebe-se da noite espessa,
rompendo dela uma voz em cruz,
chega murmurando cânticos de Luz.

Parece a voz dos Anjos, com teu olhar
falando, murmuras sonhos a completar,
contando todas as histórias de Amores.

E chegas por ela, qual divindade sorrindo,
por silfos de sonhos de volúpia, ao enredo
duma Tempestade de Risos e Lágrimas!

CORAÇÃO

Conheço um coração, onde elevado sonho,
qual filho de um rei, dono de império vasto,
entre galas se alojou. E, cercando-o risonho,
um bando de ilusões mais lhe aumentava o fasto!

Contemplando-o agora, dolorido e tristonho,
por querer palmilhar do ideal o augusto rasto
sem de todo o lograr, a animá-lo me ponho,
para que não se abata o golpe tão nefasto!

Portanto, à veemência que ele se vai despindo
de um manto santeiro, acetinado e lindo,
e enverga de vagar vestes faltas de brilho…

As minhas lágrimas de dor, eu vou contendo,
e em bom tom digo: volta ao meu coração,
dentro dele você hospedou tua canção!…

TERNURA MATINAL

Na manhã, o sonho terno
lá longe em outro mar,
alguém me causa clamor
sem contudo me alcançar.

Uma brisa de desejos
sobe mansa,vem chegando,
borrifando aroma delicado
de sonhos enamorados…

Seria comigo o sonho dele
ou eu que sonho com ele
pelas noites de luar!…

A vida pulsa ardente, longe…
chegando-me por tuas
mãos lençóis de Ternuras!

CONFIDÊNCIAS

Se existe algum segredo
sem medo ou receio dar
a cada dia novo sentido
no amor que sentimos…

Não sendo egoísta, onde
tudo arrisca ,vem até mim.
aroma delido de jasmim
pela espessa romaria…

Acolhe em teu peito
sorve os rumores que
brado, sentindo o feito!

Pode ser loucura o lume
somente desejaria
que este se consume!…

CORAÇÃO DE CRISTAL

Tenho um coração de Cristal,
minha fonte pura de magia;
rei de minhas noites de luar
aos tons suaves duma cantoria.

Fonte cristalina que vida encerra,
com sua luz engravida a terra,
de todo bem que em ti alcança
o sonho, se imortalize a senda!

Vem em mim amoroso sonho
ânsias infinitas, olor e desejo
palpitando rumores – teu beijo!…

Ó fonte cristalina que corre cheia,
que eu me desmanche alva e sonora
em teu coração, por dentro e por fora!

UM ACENO

Um aceno, e a terna recordação.
Na tua presença, sigo pela Vida
A cada segundo,tua imagem querida
Faz um ninho dentro do meu coração!

Vem um bailado por tuas mãos
Envolvendo uma suave atração
Não tem como conter o sonho
Esse murmurar cheio de afeição.

Clamo céus, que possam me dar
Tua presença eterna para sempre
Que, em minha alma vem acalentar!

Por este teu carinho resplandecente
Juntos, perpetuaremos, iremos exultar
Por infinitos reencontros premente!…

QUANDO ANOITECE

Quando anoitece gosto de te sentir
meu corpo colado ao seu,docemente
acolhemos o amor que é presente
esse contentamento que enternece

Hospedada em ti, teu corpo me aquece
sublimando, são momentos de desejos
ardentes, colados, ficam nossas peles
somos tu e eu exaltar numa prece…

Queridas são tuas mãos em mim
caricias que enaltecem o interior
amor ardente, é pecado Amar assim!

Quando me beijas e me mordes infindo,
é magia e loucura sem ter fim, extenso
é teu gemido do meu prazer sentido!

AMOR INFINITO

Dos sonhos e ilusões, os tons
mais azuis, se é verdadeiro o
Amor com que me queres, tornando-me
a primeira entre todas as Mulheres!

Eu nada mais desejo neste mundo, sendo
senhora de um afeto tão profundo,
certo suportarei as horas duras,
ditosas e altivas até nas amarguras!!!

Que na poesia fecundem todos os Mistérios
e inflame a rima clara e ardente, que
brilhem sonoramente, luminosamente…

O Amor, constelamento Puro, em suas
formas claras, fluídas e cristalina!
Amor que repurifica, canta Paz Infinita!

Fonte:
http://www.avspe.eti.br/coutinho/sonetos_efigenia.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Poemas

Efigenia Coutinho

Nascida em Petrópolis-RJ, cresceu em São Paulo-SP, e na caminhada da vida, morou no Rio e Janeiro-RJ, Florianópolis-SC e atualmente vive em Balneário Camboriu-SC.

Formada em Artes, se especializou em Tapeçaria de TEAR, buscando os seguimentos Indígenas e sua História Natural,tendo participado de várias exposições.
Em 1977 foi residir em Florianópolis SC, e há três anos mudou-se para Balneário Camboriú -SC – 1999 –

A poesia surgiu em minha vida ainda nos sonhos de adolescente, quando menos esperava , lá estava eu com o papel e a caneta na mão, extravasando a minha emoção…Com o passar dos anos, acho que fui me perdendo, esquecendo de como era gostoso embarcar nesta viagem.

Não segui carreira ligada ao mundo das letras, e pouco conhecimento tenho de Literatura. Escolhi Artes como profissão, mesmo sem haver retorno financeiro, pois nada se compara aos tesouros da alma.

Este dom maravilhoso de escrever ficou hibernado durante muitos anos, e como na vida nada acontece por acaso, foi em um desses acasos, na paixão, que ressurgiu a poetisa. Percebi que existiam em mim sentimentos que extasiavam meu coração, mas a única forma de vivenciá-los era através de palavras. Meu estilo preferido é o
lírico, onde escrevo sobre as inquietações do coração, mas também adoro o erotismo, estimula a minha libido.

O incentivo para continuar a escrever surgiu em Junho/1989, quando tive uma das minhas poesias, editada pelo grande poeta VALDEZ, para divulgar o meu trabalho em seu Site.

Fontes:
http://www.avspe.eti.br/efi/efigenia.html
http://www.nadirdonofrio.com/biografia_efigenia_coutinho/biografia_efigenia_coutinho.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Biografia, Santa Catarina

Lígia Antunes Leivas (Teia de Poemas)

QUANTAS VEZES QUIS TE DIZER…
PAIXÃO

Quantas vezes quis te dizer “Te amo!”
Não sei por que dobrei essa vontade.
Não sei por que guardei essas palavras.
Nem sei por que tanto adiei esse dizer
que tão feliz faz quem o declara calmamente!
Estranho… talvez não possas entender tão fácil
(assim também comigo acontece)
mas já naquela primeira frase
que me escreveste tão desinteressadamente
fascínio intenso assomou-me inteiramente…
o coração e todos os melhores sentimentos
(eu os senti no entusiasmo do meu viver)
Sim!… Como foi bom! Foi como pensei
devesse ser o verdadeiro amor:
contemplação, ardor, arrebatamento
carinho mel, enlevo céu, doce afeição
sentidos e aquerenciados
sem qualquer presença além da imaginação.
Sei… neste ‘ser mais ser’ vivi o pranto, a dor,
senti o coração sofrido…
transparente, porém… muito mais bonito!
Nenhum silêncio foi suficientemente forte
para constranger tão fiel amor
que a ti dediquei sem nada pedir em troca.
Sim! Este amor que hoje ainda tanto se propaga
e que não cansa de andar por todo meu ser
me faz feliz mesmo que por todo lado
com ele – tão calado – eu sempre ande!

Teu – desconhecido(?) – amor

NAMORADO

Veio chegando junto com a juventude
Veio sorrateiro, disfarçado, de mansinho
E eu cuidava nos olhos seus o sorriso
e em sua boca eu buscava todo riso

Algo invisível (não sei se era o silêncio)
dizia-me muito… tudo que meu coração queria
e eu o seguia, espreitava-o em cada canto
e nesse jeito ia encantando todo meu dia

Passou o tempo, a hora, cada momento
e no meu peito foi brotando um sentimento
que era mel (não era fel!…) era começo
de um amor que igual até hoje desconheço!

Ah! mas veio o destino, a sina e não sei mais
Ele se foi… pra onde? …não soube jamais
Voltou a vida em seus caminhos na calçada
e aqui fiquei… às lembranças abraçada.

CARÍCIA MANSA NO HORIZONTE DE MUITOS SILÊNCIOS

A tarde começa calma… uma carícia mansa diante de um horizonte
de muitos silêncios que aparentam guardar expectativas que, de verdade, estão mesmo é dentro de nós.
Me acomodo na varanda da casa (… da casa ou do mundo?)
Aqui é meu mundo, a intimidade de mim mesma e tudo mais que vive em mim.
De onde estou descortina-se um horizonte sem fim, me parece. Não faço a menor idéia se ele termina logo ali ou não: onde o fim? onde o limite? …Infinito!
Mar, areia, certa aragem. Alguma coisa de um sol tímido aparece de vez em quando pra me dizer que a luz não sumiu totalmente. De repente, uma rajada de vento atira montes de folhas da goiabeira que já pressente o ar outonal chegando.
Aqui me derramo… a mim mesma e tudo mais que existe em mim… meu próprio recolhimento, meus subterrâneos, meu sentimento. Cato
presságios que dominam o ar, este estado de ficar refletindo sobre, enfim, o que é ‘estar no mundo’. Mas não… Hoje não dá. Não me arrisco a fazer rodar a manivela da tristeza. Deixa pra lá, deixa pr’amanhã… ou sei lá pra quando, pra onde…
Afinal, é Sexta-Feira da Paixão!
ELE morreu…
Nós estamos vivos no mundo… infinito!

QUISERA SER PÁSSARO SEM TER DE DIZER ‘ADEUS’

Pelo vidro da janela, a paisagem viaja embaçada.
(- … meus olhos marejados? – ou o vidro esfumaçado?)
Afinal,em que destino embarquei ao entrar por esta porta?

Já não sei mais nada… Já faz tempo demais…

No bilhete que ficou, jaz uma única palavra.

Quisera eu que nenhuma saudade me afligisse.
Quisera ser pássaro sem ter de dizer ‘adeus’…

QUANDO O AMOR SE DESPEDE

“Adeus!”, dissemos… nunca mais nos vimos
Nem mesmo nos procuramos sequer…
Permutamos olhares… tantos mimos!!
(Ele? Garoto sem plano qualquer.)

Menina eu (quando nos despedimos),
Jamais supunha um dia ser mulher
Para ter prova do que nós sentimos,
Mesmo sabendo o que o amor requer.

Hoje sozinha aqui, vou refletindo
E concluo que mesmo ele partindo,
Foi puro o nosso amor… quase fraterno.

Pois sem a dúbia sensação carnal,
A nossa união foi divinal
E fez nosso amor tornar-se eterno.

SOB O MESMO CÉU

Por muito tempo fiquei sem prumo
perdida e só não distinguia o rumo
e sobre mim, silencioso e triste,
prostrou-se o mal, quase punhal em riste.

Jamais julguei ter a paixão assim
motivo (in)justo de impor-se um fim
eis que quem ama humanamente o faz
sem nem pensar que tudo se desfaz.

Se a distância, o não-encontro, a dor
se o calvário deste louco amor
nos impediram a vida sob um mesmo teto,

se o chão não temos, se tudo é dissabor,
(por Deus!)temos estrelas, um céu compensador
a nos cobrir com a vastidão do afeto.

Fontes:
http://www.ligia.tomarchio.nom.br/ligia_amigos_ligialeivas.htm
http://www.avspe.eti.br/sonetos/LigiaAntunesLeivas.htm

Deixe um comentário

Arquivado em A Poetisa no Papel, Poesias

Orlando Brito (1927 – 2010)

Orlando Brito era natural de Niterói-RJ, onde nasceu aos 27 de novembro de 1927, filho de Amaro Brito e de Irma Denti Brito.Residiu em Pindamonhangaba de 1966 a 1975, sendo diretor da Tribuna do Norte e do jornal Sete Dias (extinto). Foi redator do Diário de Pindamonhangaba e correspondente do jornal ‘Agora’, de São José dos Campos. Também em Pinda, foi membro do Lions Clube e exerceu grande atividade artística, participando de muitas atividades culturais da cidade.

Notabilizou-se como trovador, tendo merecido capítulo especial no livro ‘Nós os Trovadores’, do escritor e poeta Eno Teodoro Wanke, editado em 1991, no Rio de Janeiro. É citado no Dicionário de Poetas Contemporâneos, de Francisco Igreja, e em várias antologias e coletâneas de trovas. Autodidata, publicou os livros seguintes: ‘Lua de sonho’ – trovas (1958), ‘Cantigas de ninar tristezas’ – trovas (1962), ‘Viola de marinheiro’ – trovas (1991), ‘Cantigas do céu e da terra’ – trovas (1992). ‘Esta vida é uma graça’ – trovas (1994), ‘Sonetos’ (1996), ‘Ruas de São Luís’ – poesia (1998).

No estilo cordel, publicou: ‘O estranho amor de um médico por um esqueleto’ (1987), ‘Os lírios do professor’ (1988), 1ª Canção de Eleusa’ (1989), ‘Histórias de Silvestre, o pintor vaidoso’ (1991), ‘Coxinho, dono dos bois’ (1991), ‘Viola fuxiqueira’ (1994). Em 1986, uma indústria do Maranhão publicou um livro dele que foi considerado de utilidade pública: ‘Normas de Prevenção de Acidentes de Trabalho’.

Provavelmente, houve outras publicações de Orlando após 2001, data em que Francisco Piorino publicou o valioso ‘Biografias’ contendo dados de todos os membros da Academia Pindamonhangabense de Letras e os patronos de suas respectivas cadeiras. Orlando Brito era acadêmico titular da APL, ocupava a cadeira nº 9

Fonte:
http://www.tribunadonorte.net/noticias.asp?id=6097&cod=4&edi=128

Deixe um comentário

Arquivado em Biografia, Nota de Falecimento

Orlando Brito: Uma Eterna Saudade

(artigo de José Valdez de Castro Moura, para a Tribuna do Norte, seção Cultura e Lazer)

Orlando Brito, um dos maiores trovadores do Brasil, que teve marcante atuação intelectual na década de 70 aqui em Pindamonhangaba, um mestre na arte de trova, já não está entre nós. Faleceu na madrugada do dia 21 de agosto em São Luiz do Maranhão. Publicou vários livros de trovas e poesias, entretanto, um dos livros de poesias mais elogiados no meio literário nos últimos anos é uma bela obra de sua autoria, obra marcada pelo lirismo, pelo uso da linguagem simples e correta e, sobretudo, pela inspiração dos temas cujo título é “Sonetos”.

A poesia de Orlando Brito caracteriza-se, acima de tudo, por um profundo humanismo, no conteúdo e na forma, e por uma simplicidade impressionante. Ele é o artista ciente e consciente das virtualidades expressivas de seu instrumental: o verso espontâneo e o idioma pátrio, mostrando o mundo com o poder sintético das imagens, metáforas, onde o intimismo, a ternura, o amor e a nostalgia dos entes familiares e amigos queridos constituem os “leit – motivos” do seu mundo poético. E, é o que apreciamos nesse soneto simples e magistral:

MINHA MÃE

Minha mãe era quase analfabeta,
quase nada sabia de leituras,
mas tinha o instinto dessas almas puras
que sabe, entre as ações, a mais correta.

Criou dez filhos, boas criaturas,
fiéis a Deus, de educação seleta.
Sabia ser valente ou ser discreta
nos momentos de dor, nas horas duras.

Os filhos, todos eles são felizes,
pois ela, não deixando coisa alguma,
deixou, com seu exemplo, as diretrizes.

Uns herdaram seus olhos, outro, a calma,
outro, seu jeito simples, mas, em suma,
fui o mais bem- dotado- herdei-lhe a alma!

Como verdadeiro Poeta, Orlando Brito tinha consciência de que toda poesia é um ato de assombro que conduz às paragens da filosofia, espantando-se ante as belezas do universo e aterrorizando-se perante o sofrimento humano. Assim, estabelecendo a dialética: emoção diante da beleza e indignação ao conscientizar-se da dor humana, constrói o seu ato poético, conduzindo-o à altura do ato filosófico. E, o nosso poeta Orlando mostra isso, muito bem, nos sonetos : “A Última Árvore “, “A Voz da Terra” e “O Rio “. Por outro lado, os objetos que o impressionam são comuns: as gaiolas, as pombas, os amigos que foi encontrando ao longo do caminho, a montanha…

As sensações que o fazem pulsar são, portanto, as do cotidiano: “o vento que passa”, o “palhaço” que, no seu desejo,” abra, a quem chora, a porta da esperança, e não permita que a maldade apague o sorriso nos lábios de uma criança”.
Em uma análise sucinta, vamos desvelar um poeta em que o poema é a consubstanciação perfeita entre o viver e o cantar (como me confessou, certa vez, outro grande poeta, o Mestre da Trova: Waldir Neves, nosso amigo fraterno) entre sofrer vivendo e sofrer cantando.

O nosso estimado Orlando Brito teve o talento e o gênio dos grandes poetas líricos, que apresentam resistência à passagem do tempo, possuindo domínio da forma e, ao mesmo tempo, trazendo consigo uma fantástica agilidade criadora que lhe dão amplas condições de passar de um estado a outro, de uma inspiração a outra, sem afundar nos lugares comuns.

Platão, no Fedro, assim se referiu ao êxtase vivenciado pelos Aedos, poetas da antiga Grécia: “A possessão e o delírio das musas apoderam-se de uma alma sensível, despertam-na e extasiam-na em cantos”. É o que acontecia com o inesquecível Orlando Brito. Para deleite nosso e para o maior enriquecimento da poesia Brasileira!

Orlando Brito foi cantar nas paragens celestiais levando consigo as flores da nossa admiração e da nossa eterna saudade.Com a sua partida o mundo,com certeza, ficou mais pobre.

Fonte:
http://www.tribunadonorte.net/noticias.asp?id=6096&cod=4&edi=128

Deixe um comentário

Arquivado em homenagem, Sopa de Letras

Carlos Drummond de Andrade (Livro de Poemas)

AO AMOR ANTIGO

O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede. Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença.

O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.

Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
a antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.

Mais ardente, mas pobre de esperança.
Mais triste? Não. Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.

A RUA DIFERENTE

Na minha rua estão cortando árvores
botando trilhos
construindo casas.

Minha rua acordou mudada.
Os vizinhos não se conformam.
Eles não sabem que a vida
tem dessas exigências brutas.

Só minha filha goza o espetáculo
e se diverte com os andaimes,
a luz da solda autógena
e o cimento escorrendo nas formas.

A FOLHA

A natureza são duas.
Uma,
tal qual se sabe a si mesma.
Outra, a que vemos. Mas vemos?
Ou é a ilusão das coisas?

Quem sou eu para sentir
o leque de uma palmeira?
Quem sou, para ser senhor
de uma fechada, sagrada
arca de vidas autônomas?

A pretensão de ser homem
e não coisa ou caracol
esfacela-me em frente à folha
que cai, depois de viver
intensa, caladamente,
e por ordem do Prefeito
vai sumir na varredura
mas continua em outra folha
alheia a meu privilégio
de ser mais forte que as folhas.

BEIJO-FLOR

O beijo é flor no canteiro
ou desejo na boca?
Tanto beijo nascendo e colhido
na calma do jardim
nenhum beijo beijado
(como beijar o beijo?)
na boca das meninas
e é lá que eles estão
suspensos
invisíveis

CANÇÃO AMIGA

Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.
Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.
Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.
Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.
Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.

CIDADEZINHA QUALQUER

Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar…as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.

DIANTE DE UMA CRIANÇA

Como fazer feliz meu filho?
Não há receitas para tal.
Todo o saber, todo o meu brilho
de vaidoso intelectual

vacila ante a interrogação
gravada em mim, impressa no ar.
Bola, bombons, patinação
talvez bastem para encantar?

Imprevistas, fartas mesadas,
louvores, prêmios, complacências,
milhões de coisas desejadas,
concedidas sem reticências?

Liberdade alheia a limites,
perdão de erros, sem julgamento,
e dizer-lhe que estamos quites,
conforme a lei do esquecimento?

Submeter-se à sua vontade
sem ponderar, sem discutir?
Dar-lhe tudo aquilo que há
de entontecer um grão-vizir?

E se depois de tanto mimo
que o atraia, ele se sente
pobre, sem paz e sem arrimo,
alma vazia, amargamente?

Não é feliz. Mas que fazer
para consolo desta criança?
Como em seu íntimo acender
uma fagulha de confiança?

Eis que acode meu coração
e oferece, como uma flor,
a doçura desta lição:
dar a meu filho meu amor.

Pois o amor resgata a pobreza,
vence o tédio, ilumina o dia
e instaura em nossa natureza
a imperecível alegria.

“EU HOJE JOGUEI TANTA COISA FORA….”

Não importa onde você parou…
em que momento da vida
você cansou…
o que importa
é que sempre é possível
e necessário” recomeçar”.
Recomeçar é dar
uma nova chance a si mesmo…
é renovar as esperanças
na vida e o mais importante…
acreditar em você de novo.
Sofreu muito nesse período?
foi aprendizado…
Chorou muito?
foi limpeza da alma…
Ficou com raiva das pessoas?
foi para perdoá-las um dia…
Sentiu-se só por diversas vezes?
é por que fechaste
a porta até para os anjos…
Acreditou
que tudo estava perdido?
era o indício da tua melhora…
Pois …agora é hora de reiniciar… de pensar na luz…
de encontrar prazer
nas coisas simples de novo.
Que tal um novo emprego?
Uma nova profissão?
Um corte de cabelo
arrojado… diferente?
Um novo curso…
ou aquele velho desejo
de aprender a pintar…
desenhar…
dominar o computador…
qualquer
outra coisa…
Olha quanto desafio…
quanta coisa nova
nesse mundo de meu Deus
te esperando.
Está se sentindo sozinho? besteira…
tem tanta gente
que você afastou
com o seu período de isolamento
tem tanta gente esperando
apenas um sorriso teu
para “chegar” perto de você.
Quando nos trancamos
na tristeza…
nem nós mesmos nos suportamos…
ficamos horríveis…
o mal humor
vai comendo nosso fígado…
até a boca fica amarga.
Recomeçar…
hoje é um bom dia
para começar
novos desafios.
Onde você quer chegar?
ir alto…
sonhe alto…
queira o melhor do melhor…
queira coisas boas para a vida…
pensando assim trazemos
prá nós aquilo que desejamos…
se pensamos pequeno…
coisas pequenas teremos…
se desejarmos fortemente
o melhor e principalmente
lutarmos pelo melhor…
o melhor vai se instalar
na nossa vida.
É hoje o dia da faxina mental…
joga fora tudo
que te prende ao passado…
ao mundinho de coisas tristes… fotos…
peças de roupa…
papel de bala…
ingressos de cinema…
bilhetes de viagens…
e toda aquela tranqueira
que guardamos
quando nos julgamos apaixonados…
jogue tudo fora…
mas principalmente…
esvazie seu coração…
fique pronto para a vida…
para um novo amor…
Lembre-se somos apaixonáveis…
somos sempre capazes
de amar muitas
e muitas vezes…
afinal de contas…
Nós somos o “Amor”…
––––––––––––––––––––––––-

Mais poesias de Drummond no Blog

Livro de Poesias
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/04/carlos-drummond-de-andrade-livro-de.html
A casa do tempo perdido
A Corrente
A Lebre
Fim
Importância da escova
Lembrança do Mundo antigo
Pavão
Quero me casar
Sentimental

Antologia Poética
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/02/carlos-drummond-de-andrade-antologia.html
A Falta de Érico
A palavra mágica
A poesia (não tires poesia das coisas)

Poesias Além da Terra, Além do Céu
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/04/carlos-drummond-de-andrade-poesias-alem.html
A bruxa
A hora do cansaço
Alem da terra, além do céu
As sem razões do amor
Cantiga de Viúvo
Confidência do Itabirano
Memória
O amor bate na porta
O Tempo passa? Não passa
Poema patético

Campo de Flores – análise da poesia
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/12/carlos-drummond-de-andrade-campo-de.html

Caso Pluvioso
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/11/carlos-drummond-de-andrade-caso.html

Os Ombros Suportam o Mundo
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/02/carlos-drummond-de-andrade-poesia-os.html

José
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/02/carlos-drummond-de-andrade-poesia-jos.html

Mãos Dadas
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/05/carlos-drummond-de-andrade-mos-dadas.html

Certas Palavras
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/03/carlos-drummond-de-andrade-certas.html

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) – Biografia
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2007/12/carlos-drummond-de-andrade-1902-1987.html

Deixe um comentário

Arquivado em Livro de Poemas

Ivan Jaf (A Gata Apaixonada)

Ilustração: Andréa Ebert
Quando perguntam como é que eu consegui sair com a Carla, eu respondo que foi por causa do Aldemir Martins. O pintor famoso.

Eu estava, tranqüilo, estudando. Juro. Lá pelas 3 da tarde o telefone tocou. Era ela, a vizinha da casa 3.

A mãe morreu há uns quatro anos. O pai é superciumento, não a deixa satir de casa nunca.

– Oi, Rodrigo… Você tem um gato grande, malhado?

– Tenho. O nome dele é Sorvete.

– Sorvete?

– Quando a gente encosta a mão, ele se derrete todo.

– Ele briga com a minha gata, a Tati. Já aconteceu várias vezes. Acho que é ciúme.

– De outro gato?

– Não. De um quadro. Uma pintura. Do Aldemir Martins.

Dez minutos depois eu estava na sala da casa dela. Só nós dois.

– Você vai ver – ela disse.

– É sempre na mesma hora. Já ouviu falar do Aldemir Martins?

– Já. É um pintor famoso pra caramba. Mora aqui em São Paulo.

– Morava. Morreu há pouco tempo. Minha mãe era apaixonada pela pintura dele. Ele ilustrava livros, revistas, jornais… Pintava cangaceiros, galos, passarinhos, peixes…

– Tô sabendo. Desenhava até rótulos de maionese, de vinho…

– Minha mãe comprava tudo que podia. A gente comia em pratos desenhados por ele, tinha lençóis, tapetes, cortina de banheiro…

Carla me levou pra um canto da sala. Em cima de uma imitação de lareira, havia uma tela do Aldemir Martins, pequena, com o desenho de um gato. Um gato gordo, vermelho e azul, um focinho enorme, mostrando as garras, sedutor, os olhos verdes calmos, hipnóticos.

– Minha mãe adorava esse quadro.

Então ela me puxou pra trás de uma cortina pesada, que cobria a vidraça que dava pro jardim.

Tati entrou na sala. Pulou pro beiral da falsa lareira e parou em frente ao quadro, olhando pro gato pintado. Ficamos assim uns 20 minutos, escondidos, calados. Até que ele apareceu. O velho Sorvete. O gato mais descolado do pedaço. Veio gingando, passou entre os móveis, parou na frente da lareira, olhou pro alto e não gostou nada do que viu.

Carla segurou no meu braço.

Sorvete pulou pro beiral.

Briga de gato é mais rápido que videogame. Tati pulou, atravessou uma janela aberta e fugiu pro jardim, com o Sorvete atrás.

– Minha mãe dizia que um artista é capaz de recriar a vida. Se Deus existe, com certeza é um artista. Mas acho que você vai ter de trancar o Sorvete em casa, Rodrigo. Não gostei daquilo.

– Não, Carla. A gente encontra outro jeito. Pra mim as pessoas, os bichos, qualquer coisa que se mexa… têm de ter liberdade. Têm de ter uma janela aberta.

– Mas o Sorvete é meio selvagem…

– Isso. É assim que eu gosto dele. Eu também sou meio selvagem. Sabe o que eu faço? Eu como o tomate inteiro. Eu não fico esperando a minha mãe partir e colocar na salada!

Ela riu. Não sei de onde eu tirei essa história do tomate. Aí me empolguei, e ia dar mais exemplos de como eu era selvagem, mas a cortina se abriu de repente e o pai dela apareceu.

O cara ficou nervoso, quase chamou a polícia, mas depois a gente explicou, ele se arrependeu e acabou até deixando a filha sair comigo.

Eu e a Carla estamos namorando. Juro.
==================
Mais sobre Ivan Jaf
Biografia
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/01/ivan-jaf-1957.html
Entrevista
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/01/ivan-jaf-o-escritor-em-xeque.html
Livro: O Vampiro que Descobriu o Brasil
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/01/ivan-jaf-o-vampiro-que-descobriu-o.html

Fonte:
Revista Nova Escola. abril de 2007

Deixe um comentário

Arquivado em O Escritor com a Palavra

Ialmar Pio Schneider ( Baú de Trovas VI)

A cigarra e a formiga,
pelo destino do amor:
uma executa a cantiga,
outra executa o labor.

A manhã surge radiante,
envolvendo de esplendor,
na alegria contagiante
toda a natureza em flor.

Consegues viver sozinha,
enfrentando a solidão?!
Recorda que “uma andorinha
sozinha não faz verão…”

Deixa-me ficar sonhando
em meu mundo de ilusão,
pra que vá me acostumando
a viver na solidão.

De tudo o que já perdi,
nada me causa mais dor,
do que estar longe de ti
e viver sem teu amor!

Enfrentar alegremente
as incertezas da vida,
é a maneira inteligente
de tardar a despedida.

Entre amar e ser amado,
eu não sei o que é melhor;
porém, viver desprezado,
é, sem dúvida, o pior!

Eras bonita… Eu tão feio…
mas nos queríamos tanto,
que num mesmo devaneio
nos amamos por encanto…

Mágoas de amor não tem preço:
tudo pode acontecer;
um final sem ter começo,
impossível entender…

Mas antes que a chuva caia,
prefiro sentir o vento
levantando a tua saia
para meu contentamento.

Mistura de mágoa e tédio,
esta carência de amor;
e se tomo algum remédio
mais aumenta minha dor.

Não sei se devo olvidar-te
ou ficar nesta ansiedade;
pois te encontro em toda parte,
vivendo em minha saudade…

Não sei se foi desagrado,
ou talvez ingratidão,
este punhal afiado
ferindo meu coração…

Neruda… Grande Neruda,
da “Canção Desesperada”,
careço de tua ajuda
pra cantar a minha amada!

O amor daquele que chora
por ter sido desprezado,
não tem jeito de ir embora,
fica no peito guardado.

O amor, sem paz nem sossego,
também merece louvor;
mas se não traz aconchego,
impossível ser amor.

Pelas trovas benfazejas
que solitário componho,
peço que ditosa sejas
e concretizes teu sonho.

Pelos momentos vividos
longe de ti que me encanta,
meus soluços reprimidos
vão morrendo na garganta.

Porque já chegou o outono
e foi embora o verão,
vou ficando no abandono
e minhas folhas cairão…

Por te querer me atormento
e de te amar não desisto;
para tanto sofrimento,
antes não te houvesse visto.

Por viver apaixonado
me chamam de sonhador;
porém, se amar é pecado,
sou o maior pecador.

Quando em pensamento a beijo
não sinto felicidade,
porque, afinal, meu desejo
é beijá-la de verdade.

Quantas noites mal dormidas,
pensando em que não me quer;
são as ilusões perdidas
por causa de uma mulher!…

Quem ama por conveniência
não conhece a sensação
que causa em nossa existência
o fogo de uma paixão.

Se não puderes me amar,
eu acato teu direito,
embora fique a chorar
o coração em meu peito.

Sócia de dor é paixão,
sem ter reciprocidade,
porque nos traz ilusão
e nos deixa na orfandade.

Teu encanto me seduz
nas horas que te contemplo,
toda cercada de luz
qual uma deusa num templo.

Vai romper a madrugada
neste começo do outono,
e sem pensar mais em nada
quero me entregar ao sono…

Vou caminhando sozinho
pela estrada sem ninguém,
sinto falta do carinho
que já me fez tanto bem.

Vou fazer-lhe uma proposta,
pense bem no que lhe digo:
se disser que não me gosta,
quero ser só seu amigo!

Fonte:
O Autor

Deixe um comentário

Arquivado em A escritora em xeque, Baú de Trovas, Contos, Entrevista, Entrevistas, Trovas

O Nosso Português de Cada Dia

1 – “Custas só se usa na linguagem jurídica” para designar despesas feitas no processo. Portanto, devemos dizer: “O filho vive à custa do pai”. No singular.

2 – Não existe a expressão “à medida em que”. Ou se usa à medida que correspondente a à proporção que, ou se usa na medida em que equivalente a tendo em vista que.

3 – ‘O certo é ” a meu ver” e não ao meu ver.

4 – “A princípio” significa inicialmente, “antes de mais nada”: Ex: A princípio, gostaria de dizer que estou bem. “Em princípio” quer dizer “em tese”. Ex: Em princípio, todos concordaram com minha sugestão.

5 – “À-toa”, (com hífen), é um adjetivo e significa “inútil”, “desprezível”. Ex: Esse rapaz é um sujeito à-toa. “À toa”, (sem hífen), é uma locução adverbial e quer dizer “a esmo”, “inutilmente”. Ex: Andava à toa na vida.

6 – Com a conjunção se, deve-se utilizar acaso, e nunca caso. O certo: “Se acaso vir meu amigo por aí, diga-lhe…” Mas podemos dizer: “Caso o veja por aí…”.

7 – ‘Acerca de’ quer dizer ‘a respeito de’. Veja: Falei com ele acerca de um problema matemático. Mas há cerca de é uma expressão em que o verbo haver indica tempo transcorrido, equivalente a faz. Veja: Há cerca de um mês que não a vejo.

8 – Não esqueça: alface é substantivo feminino. A Alface está bem verdinha.

9 – Além pede sempre o hífen: ‘além-mar’, ‘além-fronteiras’, etc.

10 – Algures é um advérbio de lugar e quer dizer ‘em algum lugar’. Já alhures significa ‘em outro lugar’.

11 – Mantenha o timbre fechado do o no plural dessas palavras: ‘almoços’, ‘bolsos’, ‘estojos’, ‘esposos’, ‘sogros’, ‘polvos’, etc.

12 – O certo é ‘alto-falante’, e não auto-falante.

13 – O certo é ‘alugam-se casas’, e não aluga-se casas. Mas devemos dizer precisa-se de empregados, trata-se de problemas. Observe a presença da preposição (de) após o verbo. É a dica pra não errar.

14 – Depois de ditongo, geralmente se emprega x. Veja: ‘afrouxar’, ‘encaixe’, ‘feixe’, ‘baixa’, ‘faixa’, ‘frouxo’, ‘rouxinol’, ‘trouxa’, ‘peixe’, etc.

15 – Ancião tem três plurais: ‘anciãos’, ‘anciães’, ‘anciões’.

16 – Só use ao ‘invés de’ para significar ‘ao contrário de’, ou seja, ‘com idéia de oposição’. Veja: Ela gosta de usar preto ao invés de branco. Ao invés de chorar, ela sorriu. Em vez de quer dizer em lugar de. Não tem necessariamente a idéia de oposição. Veja: Em vez de estudar, ela foi brincar com as colegas. (Estudar não é antônimo de brincar).

17 – Ainda se vê e se ouve muito aterrisar em lugar de aterrissar, com dois s. ‘Escreva sempre com o s dobrado’.

18 – ‘Não existe preço barato ou preço caro’. Só existe preço alto ou baixo. ‘O produto, sim, é que pode ser caro ou barato’. Veja: Esse televisor é muito caro. O preço desse televisor é alto.

19 – Ainda se vê muito, principalmente na entrada das cidades, a expressão bem vindo (sem hífen) e até benvindo. As duas estão erradas. Deve-se escrever ‘bem-vindo’, sempre com hífen.

20 – Atenção: ‘nunca empregue hífen depois de bi, tri, tetra, penta, hexa, etc’. O nome fica sempre coladinho. O Sport se tornou tetracampeão no ano 2000. O Náutico foi hexacampeão em 1968. O Brasil foi bicampeão em 1962.

21 – Veja bem: ‘uma revista bimensal é publicada duas vezes ao mês’, ou seja, ‘de 15 em 15 dias’. ‘A revista bimestral só sai nas bancas de dois em dois meses’. Percebeu a diferença?

22 – Hoje, tanto se diz ‘boêmia’ como ‘boemia’. Nelson Gonçalves consagrou a segunda, com a tonacidade no mia.

23 – Cuidado: ‘Eu caibo’ dentro daquela caixa. A primeira pessoa do presente do indicativo assim se escreve porque o verbo é irregular.

24 – Preste atenção: ‘o senador Luiz Estêvão foi cassado’. Mas ‘o leão foi caçado’ e nunca foi achado. Portanto, ‘cassar’ (com dois s) quer dizer tornar nulo, sem efeito.

25 – Existem palavras que ‘só devem ser empregadas no plural’. Veja: os óculos, as núpcias, as olheiras, os parabéns, os pêsames, as primícias, os víveres, os afazeres, os anais, os arredores, os escombros, as fezes, as hemorróidas, etc.

26 – Pouca gente tem coragem de usar, mas o plural de caráter é ‘caracteres’. Então, Carlos pode ser um bom-caráter, mas os dois irmãos dele são dois maus-caracteres.

27 – ‘Cartão de crédito e cartão de visita não pedem hífen’. ‘Já cartão-postal exige o tracinho’.

28 – ‘Catequese se escreve com s’, mas ‘catequizar é com z’. Esse português…

29 – O exemplo acima foge de uma regrinha que diz o seguinte: os verbos derivados de palavras primitivas grafadas com s formam-se com o acréscimo do sufixo -ar: análise-analisar, pesquisa-pesquisar, aviso-avisar, paralisia-paralisar, etc.

30 – ‘Censo é de recenseamento’; ‘senso refere-se a juízo’. Veja: O censo deste ano deve ser feito com senso crítico.

31 – ‘Você não bebe a champanhe. Bebe o champanhe’. É, portanto, palavra masculina.

32 – ‘ Cidadão só tem um plural: cidadãos’.

33 – Cincoenta não existe. ‘Escreva sempre cinquenta’.

34 – Ainda tem gente que erra quando vai falar gratuito e dá tonicidade ao i, como de fosse gratuíto. ‘O certo é gratuito’, da mesma forma que pronunciamos intuito, circuito, fortuito, etc.

35 – E ainda tem gente que teima em dizer rúbrica, em vez de rubrica, com a sílaba bri mais forte que as outras. ‘Escreva e diga sempre rubrica’.

36 – ‘Ninguém diz eu coloro esse desenho’. Dói no ouvido. Portanto, o verbo colorir é defectivo (defeituoso) e não aceita a conjugação da primeira pessoa do singular do presente do indicativo. ‘A mesma coisa é o verbo abolir’. Ninguém é doido de dizer eu abulo. Pra dar um jeitinho, diga: Eu vou colorir esse desenho. Eu vou abolir esse preconceito.

37 – ‘Outro verbo danado é computar’. Não podemos conjugar as três primeiras pessoas: eu computo, tu computas, ele computa. A gente vai entender outra coisa, não é mesmo? Então, para evitar esses palavrões, decidiu-se pela proibição da conjugação nessas pessoas. Mas se conjugam as outras três do plural: computamos, computais, computam.

38 – Outra vez atenção: os verbos terminados em -uar fazem a segunda e a terceira pessoa do singular do presente do indicativo e a terceira pessoa do imperativo afirmativo em -e e não em -i. Observe: Eu quero que ele continue assim. Efetue essas contas, por favor. Menino, continue onde estava.

39 – A propósito do item anterior, devemos lembrar que os verbos terminados em -uir devem ser escritos naqueles tempos com -i, e não -e. Veja: Ele possui muitos bens. Ela me inclui entre seus amigos de confiança. Isso influi bastante nas minhas decisões. Aquilo não contribui em nada com o progresso.

40 – ‘Coser significa costurar’. ‘Cozer significa cozinhar’.

41 – ‘O correto é dizer deputado por São Paulo’, ‘senador por Pernambuco’, e não deputado de São Paulo e senador de Pernambuco.

42 – ‘Descriminar’ é absolver de crime, inocentar. ‘Discriminar’ é distinguir, separar. Então dizemos: Alguns políticos querem descriminar o aborto. Não devemos discriminar os pobres.

43 – ‘Dia a dia (sem hífen) é uma expressão adverbial que quer dizer todos os dias, dia após dia’. Por exemplo: Dia a dia minha saudade vai crescendo. Enquanto que ‘dia-a-dia (com hífen) é um substantivo que significa cotidiano’ e admite o artigo: O dia-a-dia dessa gente rica deve ser um tédio.

44 – ‘A pronúncia certa é disenteria’, e não desinteria.

45 – A palavra ‘dó (pena) é masculina’. Portanto, ‘Sentimos muito dó daquela moça’.

46 – ‘Nas expressões é muito, é pouco, é suficiente, o verbo ser fica sempre no singular’, sobretudo quando denota quantidade, distância, peso. Ex: Dez quilos é muito. Dez reais é pouco. Dois gramas é suficiente.

47 – ‘Há duas formas de dizer’: é proibido entrada, e é proibida a entrada. Observe a presença do artigo a na segunda locução.

48 – Já se disse muitas vezes, mas vale repetir: ‘televisão em cores’, e não a cores.

49 – Cuidado: ‘emergir é vir à tona’, vir à superfície. Por exemplo: O monstro emergiu do lago. Mas ‘imergir é o contrário’: é mergulhar, afundar. Veja o exemplo: O navio imergiu em alto-mar.

50 – A confusão é grande, mas ‘se admitem as três grafias’: ‘enfarte, enfarto e infarto’.

51 – Outra dúvida: nunca devemos dizer estadia em lugar de estada. Portanto, a minha estada em São Paulo durou dois dias. Mas a estadia do navio em Santos só demorou um dia. Portanto, ‘estada para permanência de pessoas, e estadia para navios ou veículos’.

52 – E não esqueça: ‘exceção é com ç’, mas ‘excesso é com dois ss’.

53 – Lembra-se dos ‘verbos defectivos’? Lá vai mais um: ‘falir’. No presente do indicativo só apresenta a primeira e a segunda pessoa do plural: nós falimos, vós falis. Já pensou em conjugá-lo assim: eu falo, tu fales…Horrível, não?

54 – Todas as expressões adverbiais formadas por ‘palavras repetidas dispensam a crase’: ‘frente a frente’, ‘cara a cara’, ‘gota a gota’, ‘face a face’, etc.

55 – Outra vez tome cuidado. Quando for ao supermercado, ‘peça duzentos ou trezentos gramas’ de presunto, ‘e não duzentas ou trezentas’. Quando significa unidade de massa, grama é substantivo masculino. ‘Se for a relva, aí sim, é feminino’: não pise na grama; a grama está bem crescida.

56 – É frequente se ouvir no rádio ou na TV os entrevistados dizerem: Há muitos ‘anos atrás…’ Talvez nem saibam que estão construindo uma frase redundante. Afinal, há já dá idéia de passado. Ou se diz simplesmente ‘há muito anos…’ ou ‘muitos anos atrás…’ Escolha. Mas não junte o há com atrás.

57 – Cuidado nessa arapuca do português: as palavras paroxítonas terminadas em -n recebem acento gráfico, mas as terminadas em -ns não recebem: ‘hífen’, ‘hifens’; ‘pólen’, ‘polens’.

58 – Atenção: ‘Ele interveio’ na discórdia, ‘e não interviu’. Afinal, ‘o verbo é intervir, derivado de vir’.

59 – ‘Item não leva acento’. Nem seu plural itens.

60 – O certo é ‘a libido’, feminino. Devo dizer: ‘Minha libido’ hoje não tá legal.

61 – Todo mundo gosta de dizer ‘magérrima’, ‘magríssima’, mas o superlativo de magro é ‘macérrimo’.

62 – Antes de particípios não devemos usar melhor nem pior. Portanto, devemos dizer: os alunos mais bem preparados são os do 2o grau. E nunca: os alunos melhor preparados…

63 – Essa história de ‘mal com l’, e ‘mau com u’, até já cansou: É só decorar: ‘Mal’ é antônimo de bem, e ‘mau’ é antônomo de bom. É só substituir uma por outra nas frases para tirar a dúvida.

64 – Pronuncie ‘máximo’, como se houvesse dois ss no lugar do x. (mássimo)

65 – Toda vez que disser: ‘É meio-dia e meio você estará errando. ‘O certo é: meio-dia e meia’, ou seja, meio-dia e meia hora.

66 – Não tenho ‘nada a ver’ com isso, e ‘não haver’ com isso.

67 – ‘Nem um nem outro’ leva o verbo para o singular: Nem um nem outro conseguiu cumprir o que prometeu.

68 – Toda vez que usar o ‘verbo gostar’ tenha cuidado com a ligação que ele tem com a preposição de. Ex: a coisa de que mais gosto é passear no parque. A pessoa de que mais gosto é minha mãe.

69 – Lembre-se: ‘pára’, com acento, é do verbo parar, e ‘para’, sem acento, é a preposição. Portanto: Ele não pára de repetir para o amigo que tem um carro novo.

70 – E tem mais: ‘pelo’, (sem acento), é preposição (contração da preposição por com o artigo a) e pêlo, com acento, é o cabelo.

71 – E quer mais? ‘Pêra’, a fruta, leva acento, só para diferenciar de uma antiga preposição também chamada ‘pera’. Já o plural dispensa o acento: ‘peras’. Dá pra entender? O jeito é decorar.

72 – Ainda tem mais uma palavra com acento diferencial: ‘pôde’, terceira pessoa do singular do pretérito perfeito do verbo poder. É para diferenciar de ‘pode’, a forma do presente. Então dizemos: Ele até que pôde fazer tudo aquilo, mas hoje não pode mais. Percebeu a diferença?

73 – ‘Pôr só leva acento quando é verbo’: “Quero pôr tudo no seu devido lugar”. Mas ‘se for preposição, não leva acento’: Por qualquer coisa, ele se contenta.

74 – Fique atento: nunca diga, nem escreva 1 de abril, 1 de maio. Mas sempre: ‘primeiro de abril’, ‘primeiro de maio’. Prevalece o ordinal.

75 – É chato, pedante ou parece ser errado dizer quando eu ‘vir’ Maria, darei o recado a ela. Mas esse é o emprego correto do ‘verbo ver’ no futuro do subjuntivo. Se eu o vir, quando eu o vir. Mas quando é o verbo vir que está na jogada, a coisa muda: quando eu ‘vier’, se eu ‘vier’.

76 – Só use ‘quantia’ para somas em dinheiro. Para o resto, pode usar ‘quantidade’. Veja: Recebi a quantia de 20 mil reais. Era grande a quantidade de animais no meio da pista.

77 – O prefixo ‘recém’ sempre se separa por hífen da palavra seguinte e deve ser pronunciado como oxítona: recém-chegado de Londres.

78 – Não esqueça: ‘retificar é corrigir’, e ‘ratificar é comprovar, reafirmar’: “Eu ratifico o que disse e retifico meus erros.

79 – Quando disser ‘ruim’, diga como se a sílaba mais forte fosse – im. Não tem cabimento outra pronúncia.

80 – Fique atento: só empregamos ‘São’ antes de nomes que começam por consoante: ‘São Mateus’, ‘São João’, ‘São Tomé’, etc. Se o nome começa por vogal ou h, empregamos ‘Santo: ‘Santo Antônio’, ‘Santo Henrique’, etc.

81 – E lembre-se: ‘seção, com ç’, quer dizer ‘parte de um todo, departamento’: a seção eleitoral, a seção de esportes. Já ‘sessão, com dois ss’, significa intervalo de tempo que dura uma reunião, uma assembléia, um acontecimento qualquer: ‘A sessão do cinema demorou muito tempo’.

82 – Não confunda: ‘senão’, (juntinho), quer dizer”caso contrário” e ‘se não’, (separado), equivale a “se por acaso não”. Veja: Chegue cedo, senão eu vou embora. Se não chegar cedo, eu vou embora. Percebeu a diferença?

83 – Tire esta dúvida: quando ‘só’ é adjetivo equivale a sozinho e varia em número, ou seja, pode ir para o plural. Mas ‘só’ como advérbio, quer dizer somente. Aí não se mexe. Veja: Brigaram e agora vivem sós (sozinhos). Só (somente) um bom diálogo os trará de volta.

84 – É comum vermos no rádio e na tv o entrevistado dizer: O que nos falta são ‘subzídios’. Quer dizer, fala com a pronúncia do z. Mas não é: pronuncia-se ‘ss’. Portanto, escreva ‘subsídio’ e pronuncie ‘subssídio’.

85 – ‘Taxar’ quer dizer ‘tributar’, ‘fixar preço’. ‘Tachar’ é ‘atribuir defeito’, ‘acusar.

86 – E nunca diga: ‘Eu torço para o Flamengo’. Quem torce de verdade, ‘torce pelo Flamengo’.

87 – Todo mundo tem dúvida, mas preste atenção: 50% dos estudantes passaram nos testes finais. Somente 1% terá condições de pagar a mensalidade. Acreditamos que 20% do eleitorado se abstenha de votar nas próximas eleições. Mais exemplos: 10% estão aptos a votar, mas 1% deles preferem fugir das urnas. Quer dizer, concorde com o mais próximo e saiba que essa regra é bastante flexível.

88 – ‘Um dos que’ deixa dúvidas,mas, pela norma culta, devemos pluralizar. Há gramáticos que aceitam o emprego do singular depois dessa expressão: Eu sou um dos que foram admitidos. Sandra é uma das que ouvem rádio.

89 – ‘Veado’ se escreve com e, e não com I.

90 – Esse português da gente tem cada uma: ‘tem viagem com G e viajem com J’ . Tire a dúvida: viagem é o substantivo: A viagem foi boa. Viajem é o verbo: Caso vocês viajem, levem tudo.

91 – O prefixo ‘vice’ sempre se separa por hífen da palavra seguinte: vice-prefeito, vice-governador, vice-reitor, vice-presidente, vice-diretor, etc.

92 – Geralmente, se usa o ‘x depois da sílaba inicial en’: enxaguar, enxame, enxergar, enxaqueca, enxofre, enxada, enxoval, enxugar, etc. Mas cuidado com as exceções: encher e seus derivados (enchimento, enchente, enchido, preencher, etc) e quando -en se junta a um radical iniciado por ch: encharcar (de charco), enchumaçar (de chumaço), enchiqueirar (de chiqueiro), etc.

93 – Não adianta teimar: ‘chuchu’ se escreve mesmo é com ‘ch’.

94 – ‘Ciclo vicioso’ não existe. O correto é ‘círculo vicioso’.

95 – E qual a diferença entre ‘achar’ e ‘encontrar’? Use ‘achar’ para definir aquilo que se procura, e ‘encontrar’ para aquilo que, sem intenção nenhuma, se apresenta à pessoa. Veja: Achei finalmente o que procurava. Maria encontrou uma corda debaixo da cama. Jorge achou o gato dele que fugiu na semana passada.

96 – ‘Adentro’ é uma palavra só: meteu-se porta adentro. A lua sumiu noite adentro.

97 – Não existe ‘adiar para depois’. Isso é redundante, porque adiar só pode ser para depois.

98 – ‘Afim’ (juntinho) tem relação com afinidade: gostos afins, palavras afins. ‘A fim de’ (separado) equivale a para: veio logo a fim de me ver bem vestido.

99 – Pode parecer meio estranho, mas pode conjugar o ‘verbo aguar’ normalmente: eu águo, tu águas, ele água, nós aguamos, vós aguais, eles águam.

100 – ‘Centigrama’ é uma palavra masculina: dois centigramas.

Fonte:
Colaboração de Carlos Leite Ribeiro. Portal CEN

Deixe um comentário

Arquivado em O nosso português de cada dia

Literatura na Escola (Plano de Aula – Narrativa de Dyonelio Machado)

OBJETIVOS

– Estimular o gosto pela leitura;
– desenvolver a competência leitora;
– desenvolver a sensibilidade estética, a imaginação, a criatividade e o senso crítico;
– estabelecer relações entre o lido/vivido ou conhecido (conhecimento de mundo);
– reconhecer e analisar os elementos da narrativa (narrador e seu ponto de vista, tempo);
– reconhecer e interpretar o discurso indireto livre.

CONTEÚDOS

Elementos da narrativa: narrador, tempo
discurso indireto livre

TEMPO ESTIMADO : Nove aulas

ANO : 9º ano

MATERIAL NECESSÁRIO

– Livro Os Ratos. Dyonelio Machado. São Paulo: Planeta, 2004.

DESENVOLVIMENTO

1ª etapa: Antecipação/Motivação/Sensibilização
.

LANCE A PERGUNTA À CLASSE:

Você já ouviu falar do escritor Dyonelio Machado? Conhece alguma obra que ele publicou?
Apresenta a biografia do autor.

Dyonelio Machado
Dyonelio Machado nasceu em Quarai, RS, em 21 de agosto de 1895. Além de escritor, Dyonelio foi médico psiquiatra. Aos 12 anos, já trabalhava no semanário O Quaraí, no qual teve seus primeiros contatos com a imprensa. Em 1929 formou-se médico e ingressou na psicanálise, constituindo-se num dos responsáveis pela sua divulgação no Rio Grande do Sul. Em 1934 traduziu a obra Elementos de Psicanálise, de Eduardo Weiss, livro fundamental na área. O interesse pela literatura surge por esta época, tendo seu primeiro livro de contos – Um pobre homem – publicado em 1927. Sua obra não é vasta, porém é bastante significativa: Os ratos, publicado em 1935, recebeu o prêmio Machado de Assis, depois veio O louco do Catí (1942), ambos considerados clássicos da literatura brasileira.
Faleceu em 19 de junho de 1985.
http://www.tirodeletra.com.br/biografia/DyonelioMachado.htm

Explique aos alunos que os dados biográficos interessam-nos só para conhecer um pouco da vida do autor, quantas obras escreveu, quais prêmios ganhou, a qual partido político pertencia. Deixe claro que uma análise literária que leva apenas em consideração a vida do autor tende ao equívoco, já que o escritor é decisivo só no momento da escritura. Depois de a obra estar pronta, ela fala por si só. O autor apenas cria, imagina a história, as personagens, o cenário e cria alguém responsável pelo ato de narrar: o narrador. Sendo assim, como afirma o contista Dalton Trevisan (Record, 1979), “nada tem a dizer fora dos livros. Só a obra interessa, o autor não vale o personagem. O conto é sempre melhor que o contista.”

PEÇA QUE OS ALUNOS RESPONDAM ORALMENTE:

A partir do título “Os Ratos”, o que você espera da história?

2º, 3º e 4º etapas:

Leitura compartilhada dos capítulos 1 e 2, seguida de troca de impressões gerais.

Pergunte à classe:
a- Qual é o drama vivido por Naziazeno e sua família?
b- Após o episódio do leiteiro, Naziazeno toma o bonde e segue em direção à repartição pública, da qual era funcionário. No caminho, trava conversa com um viajante, sentado ao seu lado. Veja:
” – Que horas serão?
— Sete horas passadas.
— Vou com atraso.
— A que horas você entra?
— Faltando um quarto pras oito.”

No bonde, perguntam ao viajante, companheiro de viagem de Naziazeno, o que ele levava consigo.

O moço responde: “ Leite. É o meu almoço”.

Naziazeno acha estranho e pensa:” — Como é que um homem pode se contentar apenas com um vidro de leite ao meio dia?”

– O que a fala do moço gera no íntimo de Naziazeno?

c- Ainda no bonde, Naziazeno escuta os viajantes conversando sobre os cavalos de corrida. A partir disso, Naziazeno parece sair do momento vivido e, via memória, é transportado para outro momento. Que momento é esse?

d- O narrador em 3ª pessoa parece conhecer Naziazeno a ponto de mencionar, logo após o episódio dos cavalos:“ Essa história agora lhe causou um mal-estar”. Que mal-estar é esse?

Leia o fragmento a seguir, que servirá de discussão para as questões e, f e g

“Já pôs o pé na calçada do mercado. O “café do Duque” fica na outra esquina. Toda essa calçada é uma sombra fresca e alegre, cheia de passos, de vozes.[…] Não enxerga o duque nos lugares habituais…E, entretanto, é a “ hora dele”. Vai ficar por ali, pelas portas, alguns minutos.Ele não poderá tardar. Nunca deixa de ir a esse café. Só por doença. Naziazeno bem que sentaria. Quem sabe?…talvez haja um conhecido nalguma mesa…Olha!…lá no fundo!…o Carvalho …Mas desvia vivamente a cara, faz que não vê o Carvalho.”

e- O fragmento acima é narrado em qual pessoa? Que efeito de sentido a escolha desse ponto de vista gera na narrativa?

Professor, insista com o aluno que as formas verbais “pôr” e “ enxergar” indicam ao leitor que se trata de uma 3ª pessoa. Veja: Quem pôs o pé= ele; Quem não enxerga o duque nos lugares= ele. Sendo assim, quem nos conta a história é um narrador de fora dela, não um narrador personagem.

Feito isso, lance a seguinte pergunta:

f- No trecho acima, apesar de ser contado por um narrador fora da história, em 3ª pessoa, é possível conhecer os pensamentos e sentimentos do personagem principal, Naziazeno?

É o momento de explicar/ retomar com o aluno o discurso indireto livre. Diga a ele que quando lemos uma narrativa, há um narrador, que é quem conta o fato. Esse locutor ou narrador pode introduzir outras vozes no texto. Ao modo como as falas/ vozes são introduzidas na narrativa, damos o nome de discurso. Ele pode ser classificado em: direto, indireto e indireto livre. Se considerar necessário, entregue-lhe o quadro abaixo:

Discurso direto

Reproduz fiel e literalmente algo dito por alguém.
Exemplo: Não gosto disso” – disse a menina em tom zangado.

Discurso indireto

O narrador, usando suas próprias palavras, conta o que foi dito por outra pessoa.
Exemplo: A menina disse em tom zangado que não gostava daquilo

Discurso indireto livre

Este tipo de discurso envolve a combinação de diferentes pontos de vista. O narrador insere “falas- pensamentos” das personagens no seu próprio discurso, dificultando a identificação precisa de quem seria o responsável pelo que está sendo dito (narrador ou personagem). É necessário que se tenha atenção para não confundir a fala do narrador com a fala do personagem, pois esta surge de repente em meio a fala do narrador.

Exemplo: A menina perambulava pela sala irritada e zangada. Eu não gosto disso! E parecia que ninguém a ouvia.

Agora que já explicou os tipos de discurso, pergunte ao aluno:

g- A que tipo de discurso pertence o trecho selecionado?

Fixação: o discurso indireto livre

h- Após o mal-estar, Naziazeno lamenta ter como esposa uma mulher tímida. Veja:

“ Também a sua mulher com os outros é tímida, tímida demais. Fosse a mulher do amanuense, queria ver se as coisas não marchariam doutro modo. Ela se encolhe ao primeiro revés[…] Ele precisava dum ser forte a seu lado. Toda a sua decisão se dilui quando vê junto de si, como nessa manhã, a mulher atarentar-se, perder-se empalidecer[…] Sentir-se-ia fortificado, ou ao menos” justificado”, se visse a seu lado a mulher do amanuense franzindo a cara ao leiteiro, pedindo-lhe para repetir o que houvesse dito, perguntando-lhe o que é que estaria porventura pensando deles. A sua mulher encolhida e apavorada é uma confissão pública de miséria humilhada, sem dignidade_ da sua miséria.”

Sabemos da lamentação de Naziazeno via narrador ou pela personagem. Retire fragmentos que comprovem sua resposta.

Após garantir o entendimento dos tipos de discurso, releia o fragmento da lamentação de Naziazeno sobre a mulher. Diga aos alunos que apesar de a narrativa não ser em 1ª pessoa, nós, como leitores, conhecemos os pensamentos e sentimentos de Naziazeno pelo narrador que, empregando o discurso indireto livre, dá a impressão de a fala, carregada de subjetividade, ser da personagem.

Tarefa: Peça que os alunos leiam os capítulos 3, 4 e 5.

5º etapa: Retome os capítulos lidos em casa. Peça que os alunos respondam às questões a seguir, por escrito:

a- Qual é o único interesse de Naziazeno?

b- Ao descer do bonde, Naziazeno entra em um café. Via narrador, sabemos que o fato de ele ter saído do bonde lhe proporciona uma sensação mais agradável. Leia o fragmento a seguir:

“ Sente-se outro, tem coragem, quer lutar. Longe do bonde não tem mais a ‘morrinha’ daquelas ideias…”

Interprete o fragmento. Por que sair do bonde causa bem-estar em Naziazeno?

c- Após o café, devido às horas, sente-se obrigado a se dirigir à repartição, visando por em prática o seu primeiro plano. Que plano é esse?

d- Do momento em que Naziazeno saiu de casa até a sua chegada à repartição, percebemos o transcorrer das horas, que no romance são bem marcadas. Veja:

“- Faltando um quarto pras oito”
“O relógio da Prefeitura marca pouco mais de oito horas.”
“– Este relógio ainda está marcando oito e dez”
“Os relógios não andam certos. Mas já há de ser umas oito e vinte ou oito e meia. Às nove ele se encaminhará pra repartição”
“São oito e meia quase no relógio do café.”
“9 horas! Já está arrependido daquela longa ‘folga’”
[…]

É importante retomar com o aluno o conceito de tempo narrativo. Predomina em Os ratos o tempo cronológico, mensurado precisamente pelo relógio.

Chame a atenção do aluno pelas horas bem definidas.

Depois lance a seguinte pergunta. Peça que os alunos respondam oralmente:

a- Por qual motivo há no romance a obsessão pela hora marcada? O que o passar das horas representa para Naziazeno?

Às 9 horas, Naziazeno pretende falar com o diretor, porém antes de o fazê-lo, fica imaginando o que lhe dizer e o que receberá como resposta. Veja:

“— Doutor, vejo-me outra vez forçado a recorrer…” — Não ! isto é vago, geral. Deve dizer o fato, o que se passa. “— Doutor, imagine a minha situação, o meu leiteiro…” — Não ! Não! Trivialidade…uma trivialidade… “— O meu filho, doutor…” — Outra vez o teu filho, Naziazeno…sempre o teu filho…”

b- Após refletir sobre isso, como se sente Naziazeno? Sua postura é de alguém diferente do perfil tímido e humilde da mulher?

Tarefa: Peça que os alunos leiam os capítulos 6 a 10.

6º etapa: Retome os capítulos lidos em casa. Depois, inicie uma conversa sobre a cidade.

É na cidade, locus por excelência do consumo, do aumento do nervosismo e da tensão, do domínio do exterior, das aparências e da indiferença que os indivíduos estabelecem uma relação com o dinheiro, único meio de sobrevivência. Em Os ratos, Naziazeno precisa de cinquenta e três mil réis para pagar a dívida que contraíra com o leiteiro e, por isso, sai pela cidade em busca de dinheiro. A narração segue, ao longo de 24 horas, as andanças desse funcionário público, movido por uma das mais básicas necessidades — a garantia de alimento. Ao tentar emprestar o dinheiro, Naziazeno sente a angústia de estar preso à condição urbana e sob o regime de terror imposto pelo dinheiro. Em decorrência do estado de tensão do protagonista, tudo ao seu redor lhe faz lembrar do problema que o atormenta.

Feito os comentários, pergunte aos alunos. Pode ser uma atividade escrita.

a – Como Naziazeno era recebido pelos possíveis credores?

b- Você considera Os Ratos uma crítica à maneira como o dinheiro acabou se tornando a mola propulsora das relações sociais?

Tarefa: Peça que os alunos leiam os capítulos 10 a 25. Estabeleça um cronograma de leitura, de modo a deixar para cada dia dois capítulos.

7º etapa: Retome os capítulos lidos em casa.

Peça que, oralmente, os alunos recuperem a saga de Naziazeno. O intuito é fazê-los perceber o sofrimento de um homem fadado à condição urbana: a máquina inescrupulosa das grades cidades.

Feito isso, peça que respondam por escrito:

Apesar de a trama passar em Porto Alegre, por nenhum momento o narrador afirma tratar-se desta cidade. Arrisque uma interpretação: por qual motivo não foram mencionados detalhes pelos quais pudéssemos reconhecer Porto Alegre?

8º e 9º etapas- leitura compartilhada dos capítulos 26 a 28

Lance a seguinte pergunta à classe. Pode ser uma atividade escrita:

O desfecho dado à narrativa é garantia de resolução dos problemas de Naziazeno?

AVALIAÇÃO

Com o livro em mãos, peça uma atividade escrita e individual.

1- Agora que já conhece a obra, analise o título “Os ratos”. Leve em consideração as suas inferências no início do projeto, o significado do título: suas expectativas para a história se mantiveram ou foram alteradas? Por quê?

2- O título Os Ratos é uma referência ao drama psicológico de Naziazeno Barbosa, protagonista da história, depois de ter conseguido o dinheiro para saldar a dívida com o leiteiro. Naziazeno, meio dormindo, tem o seguinte pesadelo: os ratos estão roendo o dinheiro que ele deixara à disposição do leiteiro sobre a mesa da cozinha.

Arrisque uma interpretação: qual o significado do sonho de Naziazeno?

Fonte:
Revista Nova Escola, disponível em
http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/literatura-escola-9o-ano-narrativa-dyonelio-machado-578513.shtml

Deixe um comentário

Arquivado em Literatura na Escola, Planejamento

Donzilia Martins (Fim de Tarde)

Recostada na cadeira fecho os olhos!
O mar de prata brilha, rebrilha
E traz até mim um perfume sonhador.
A brisa beija, acaricia, bafejando o meu rosto
Numa ternura eterna de um amante sedutor.

Ergue-me os cabelos, brinca com meus fios brancos
Em desalinho inebriante e descomposto, como o mar.

O mar! Fim de tarde! A cor da paleta multicor
Semeia na praia dourados pingos de luz e maresia.
A onda vai, vem, volta, some, foge e de novo em magia
Espraia, recomeça, indiferente à água que em tango dança.
E o meu olhar mergulha e jamais cansa.

Para esfriar o tempo, o banhista embarca de prancha
Agarrando o mar num frio abraço.
Para ele é vida, sal, sol, céu azul
Salpicando de chuva o dourado espaço.

Alguém o interpela:
Por que é que você vai à água?
Simpático e sonhador, sacudindo as gotas da pele bronzeada
Solta a voz do olhar num sorriso alongado pelo mar adentro.
– Venha também. Empresto-lhe a minha prancha…
A sedução! O grão de sol! A gota da vida que vale a pena agarrar
Neste fim de tarde à beira mar
E embrulhá-la na morna luz que dança.

Fonte:
Carlos Leite Ribeiro. Portal CEN.
Imagem =
http://poucoimporta.blog.terra.com.br

Deixe um comentário

Arquivado em A Poetisa no Papel, poema., Poesias

Sonhos de Encantar de Donzília Martins

Donzília Martins, natural de Murça, é uma autora cuja produção literária foi dada a público quase na totalidade na primeira década do séc. XXI. Apenas o primeiro livro, em poesia, com o título Lágrimas e Sorrisos em Sonhos de Vida, é de 1991. Os dois seguintes, Lírios Do Campo e Quando o teu Olhar, também em poesia, já são respectivamente de 2004 e de 2006.

Em 2007 publicou a sua primeira obra em prosa, com o título Um país na Janela do meu Nome, com a qual, através das histórias que conta relacionadas com momentos da sua infância passada na área geográfica de Murça, contribui para a preservação da memória cultural de Trás-os-Montes dos anos cinquenta e sessenta do século XX. Um país na Janela do meu Nome é um livro que resulta de uma memória que se vai construindo. É como uma caixinha de música que, ao abrir-se nos delicia com sons da nossa infância, só que esta caixinha é mágica e, em vez de nos dar apenas sons, dá-nos também imagens, cheiros, sabores de um tempo e de um espaço trasmontano. Nele o leitor encontra vivências que a Autora pretende fazer crer “sem utopias nem ficção”, considerando-o “um livro de memórias, de vivências”, “um livro branco onde abriu e estendeu a alma” (Martins 2007: 14), como há já algum tempo escrevemos (Monteiro 2008: 101-108).

Os dois últimos livros que Donzília Martins publicou são de literatura infanto-juvenil e têm por título História do Zé Luís, o menino petiz, de 2008, e Sonhos de Encantar, publicado em 2009. É dele que vamos falar com mais detalhe:

Donzília Martins no “Prefácio” afirma “Só há pouco tempo descobri a magia que é sonhar contos do imaginário com crianças” e essa possibilidade resulta sobretudo do fato de ser avó e de se ter aposentado. Assim, tem agora mais tempo disponível para se ver “transportada para o tempo tempo em que, à lareira, ouvia as lindas histórias de encantar”.

Antigamente, sem televisão, sem computador, sem as atividades e as condições de vida que hoje as crianças têm, o tempo em família era muitas vezes ocupado à lareira, em ambiente comunitário e de aconchego. O tempo e o espaço eram propícios ao relato de contos tradicionais e de histórias do quotidiano. Mas havia também os serões comunitários que Miguel Torga, alterónimo de Adolfo Rocha, apresenta no conto «Abre-te, Sésamo», no qual nos aparecem “as mulheres a fiar, a dobar ou a fazer meia, os homens a fumar e a conversar, e a canalhada a dormitar ou nas diabruras do costume” (Torga 1988:101). Mas, quando chegava “a hora do Raul ler as histórias do seu grande livro, todos arrebita[va]m a orelha”. As pessoas da aldeia reuniam-se numa “loja de gado, ao quente bafo animal” e “todos os moradores se cotizavam para pagar a luz do carboneto ou de petróleo e o serão começava” (Torga 1988: 102). Como escreve aquele autor trasmontano, natural de S. Martinho de Anta, “é no Inverno, nas grandes noites sem-fim, que se goza na aldeia essa fraternidade” (Torga 1988: 102). Nos anos quarenta do século passado, era assim em algumas aldeias. Hoje, no séc. XXI, os serões são bem diferentes, na maior parte das vezes mais solitários, em que cada um se ocupa a estudar, a ver televisão ou com os telemóveis, os jogos de computador, a Internet.

Em Sonhos de Encantar, Donzília Martins refere que tem a preocupação de reinventar os sonhos que os contos tradicionais faziam surgir e também a cultura popular que foi a sua escola para a vida, até porque, como escreve no mesmo “Prefácio”:

É dessa cultura popular que vim e da qual me orgulho. Foi ela a minha escola para a vida. Por isso quero dar o meu testemunho às crianças, a fim de que também elas no seu imaginário possam sonhar e serem mais felizes.” (Martins 2009: 4)

Essa escola da vida já o leitor a conhece de uma obra que a Autora escreveu anteriormente, Um País na Janela do meu Nome, e é ela que leva a que uma menina diga que vale mais estudar do que ter dinheiro. Falamos do conto «A caixinha mágica», no qual encontramos uma lição de vida que é dada pela menina, para quem estudar era mais importante do que as moedas, porque “o dinheiro gasta-se e a sabedoria fica” (Martins 2007: 25). Ao preferir a sabedoria ao dinheiro, a adolescente revela a sua prioridade, porque com sabedoria poderia ter um melhor trabalho mais tarde. Assim, o dinheiro que a avó queria deixar-lhe após a morte, foi utilizado para pagar os estudos e realizar o seu sonho. O sonho da menina do conto «A caixinha mágica» tornou-se realidade na história de Donzília Martins, mas nesse tempo nem sempre assim acontecia, como muito bem o demonstrou o escritor duriense Soeiro Pereira Gomes (cujo centenário do nascimento ocorreu em 14/04/2009 e que aqui homenageamos de forma singela). Na sua obra Esteiros, Soeiro Pereira Gomes deu a conhecer a exploração do trabalho infantil e a desigualdade de oportunidades no Portugal dos finais da década de trinta, princípios da de quarenta do séc. XX.

Em Sonhos de Encantar Donzília Martins refere que tem a preocupação de apresentar ao leitor “textos mais didácticos e reais do que lúdicos ou ficcionais” (Martins 2009: 4), contudo a fórmula encantatória com que abre as histórias “Era uma vez…” transporta logo o leitor para o mundo mágico da ficção intemporal. Existe também um apelo à imaginação de quem lê o livro, procurando-se desenvolver a criatividade infantil. E isso é feito de maneira natural, quando no fim de cada uma das histórias encontramos expressões como:

“Agora conta tu…” (Martins 2009: 9);
“Entra. Vem, para ficares a saber.” (Martins 2009: 15);
“Queres vir também? Anda. Sobe.” (Martins 2009: 22);
“Também tens uma cãozinho? Fala-nos dele. Se não tens e gostavas de ter, imagina que tens um…” (Martins 2009: 28).
.

Mas vejamos mais de perto cada uma das histórias. A primeira, «A menina que aprendeu com o olhar», estabelece um contraste entre uma menina que não gostava de comer a sopa e um menino que não tinha sopa para comer. O problema da fome e da desigualdade social é abordado com simplicidade, acabando a menina por compreender a diferença de condições de vida. E assim, a partir daí, “nunca mais deixou ficar a sopa arrefecida, ou a merenda da escola (…) na pasta esquecida” (Martins 2009: 9).

Na história «No Jardim do Alfabeto» fala-se de um jardim “muito verde, muito especial, muito engraçado” que ficava perto de uma escola. Esse jardim era especial porque em vez de flores os meninos viam nascer letras de muitas cores, tamanhos e formas. É uma história que, de forma, lúdica e divertida, pretende chamar a atenção das crianças para o fato de as letras poderem formar palavras quando bem agrupadas. Tudo é feito naturalmente:

“Um dia, andando a passear por entre elas uma abelha e uma borboleta, ambas deliciadas com tão doce perfume e tamanha beleza, pediram às letras que se juntassem no meio do jardim para fazerem um baile de roda.” (Martins 2009: 10-11)

E, ao juntarem-se, as letras formavam palavras, surgindo uma série delas com cada uma das letras do alfabeto.

A experiência docente com crianças que a Autora possui permite-lhe fazer uma espécie de aula onde, de maneira lúdica, os meninos podem ver palavras iniciadas com cada uma das letras do alfabeto. A essas, mais tarde, juntam-se outras começadas pela mesma letra e, ordenadas, acabam por viverem “felizes para sempre no DICIONÁRIO” (Martins 2009: 15). Donzília Martins, de forma alegre e divertida, usando a imaginação que lhe permite criar histórias, ensina aos meninos o abecedário e o que é um dicionário, um livro para onde “todas as letras, ordenadas, cada uma no seu lugar e a seu tempo, puderam entrar” (Martins 2009:15). No final, há um apelo ao pequeno ouvinte/leitor: “Entra. Vem, para ficares a saber” (Martins 2009:15).

Um dos temas do livro é a morte, um tema pouco usual para crianças, e que aparece tratado com alguma poesia, idealismo, apelando à imaginação, em contos como «A gatinha Kokas», «O Flash» e «A morte é uma flor (Filosofia para crianças)».

No primeiro, depois de a gata Kokas ter morrido, a Mariana, de oito anos, tem esperança de voltar a vê-la, uma vez que dizem que os gatos têm sete vidas. Então:

E como por magia, uma nuvem branca, que ia a voar nas costas do vento, acenou-lhe.
– Não me reconheces? Sou a Kokas. Vou andar sempre aqui em cima a passear. Quando te apetecer brincar comigo basta olhares e sonhar. Aqui posso transformar-me em tudo o que tu imaginares: fada, príncipe, castelo, rio, ponte, livro, amigos, escola, jardins floridos, o pôr-do-sol, comboios a correr, tudo o que quiseres. Sobe nesse raio de sol e vem brincar.
A menina, embalada, subiu por um fio de cabelo de oiro que o sol estendeu e foi brincar com a sua linda gatinha de olhos cor de mar e céu…” (Martins 2009: 22)

Sugestivamente, encontramos a pergunta: “Queres vir também? Anda. Sobe.” E é assim que termina o conto, com este apelo à imaginação das crianças, tal como sucede com a história do cão Flash, um pastor alemão que dá o título ao conto.

Em «O Flash» temos a Catarina que, “sentada no baloiço, entretanto adormecera e sonhava! Então entrámos todos no sonho dela e vimos o Flash com umas asas, que um anjo lhe emprestara, a voar, a voar, a voar, a voar…” (Martins 2009: 28).

E a história termina com um convite ao leitor para falar de um cão, seja ele real seja imaginário:

Nas asas do Flash, feito vento, todos subiram. A brisa serena beijava os rostos dos meninos que sorriam, sorriam, sorriam…
Também tens um cãozinho?
Fala-nos dele. Se não tens e gostavas de ter, imagina que tens um…” (Martins 2009: 28)

Nas páginas 29-36 temos a história «Na caixinha da Biblioteca», na qual se fala de uma “menina ‘Grande’” que entra na Biblioteca de Guimarães. É uma projeção da Autora que, com um grupo de colegas está a festejar os 44 anos do Curso do Magistério e vai ver um filme no edifício da Biblioteca de Guimarães.

A “menina ‘Grande’”, ao ver o filme, recordou-se da sua meninice, junto dos avós. “Como por magia” e atraído pelo sonho de a menina ter um exemplar da sua autoria no conjunto dos livros do Plano Nacional de Leitura, um livro poisou-lhe no colo e deu-lhe a esperança de um dia poder ver um livro seu naquele conjunto: “Ainda um dia hás-de dar-me um irmão por companhia” (Martins 2009: 33). E, mais adiante:

Também tu terás a tua fada boa a tocar com a sua varinha mágica na tua mão, porque no teu coração ela já tocou. (…) Ainda não chegou a tua hora. Não desesperes e nunca desistas. Caminha. É com pequenos passos que se fazem os caminhos.” (Martins 2009: 35)

Com esta mensagem para a personagem, Donzília Martins torna mais abrangente o conselho, fazendo com que se aplique a todos, deixando-nos um incentivo para uma caminhada gradual no sentido de alcançarmos os ideais almejados.

A história termina com a “menina ‘Grande’” a descer as escadas e então, “como por magia, transformou-se em livro!!! “Sonhos de Encantar”… com sete histórias para imaginar!…” (Martins 2009: 36). É um livro em que duas crianças querem pegar, um livro desconhecido para a bibliotecária, mas que elas dizem que fala e salta, porque o viram a descer as escadas.

Esta história e as duas seguintes «Aliz no País dos sonhos» e «A morte é uma flor» (Filosofia para crianças» são as únicas em que não existe o apelo final ao leitor.

Em «Aliz no País dos sonhos» Donzília Martins retoma o gênero de histórias de Um país na Janela do meu Nome, na medida em que evoca cenas da infância passadas na província, numa aldeia de gente “sofrida e pobre que vive escondida e perdida no meio das fragas, por entre as montanhas…” (Martins 2009: 40).

Nesta história aparece-nos a personagem Aliz, anagrama de Zila, forma abreviada de Donzília. Esta personagem, que é o alter ego da Autora, vive num meio rural, onde passam poucas pessoas, num tempo em que os colchões ainda eram de palha, numa casa em que sobressai a “lareira da cozinha, que era também sala e para a qual davam os quartos sem portas” onde ainda “brilhavam algumas brasas dos paus grossos de castanheiro que o avô colocara à noite para se aquecerem e e esquentar a pedra que serviria de botija para os pés” (Martins 2009: 38).

É neste ambiente que Aliz vive com os avós, sentindo-se muito só e desejando conhecer tudo o que a avó lhe conta nas historias. Uma das pessoas que passa na rua, uma vez por dia, é a moleira que também se sente só e se queixa do isolamento em que vive, já que o seu único companheiro é o burro, o Jeremias, com quem fala todo o caminho e a entende como ninguém. Esta situação da moleira lembra-nos a do protagonista de O Malhadinhas de Aquilino Ribeiro em que a personagem também trata o animal como um ser humano, ele que é a única companhia nas longas viagens que faz.

E, dado que estamos num conjunto de “Sete histórias para imaginar”, esta é mais uma em que se apela à imaginação e, assim, também surge uma fada. É uma fada flor de pessegueiro que consola a menina, incentivando-a a não se lamentar pela solidão:

Para se ser feliz basta olhar e ver a beleza das coisas que dançam e passam à nossa volta. Depois, beber toda a poesia que vive nelas…Um dia hei-de levar-te a viajar e a conheceres o mundo, como é teu desejo, e terás muitas escolas com meninos.” (Martins 2009: 42).

A história termina com a menina a ser acordada do sonho pelo barulho do ranger do ferrolho da porta, quando o avô chega, carregado de cogumelos. Enquanto o avô prepara uma refeição com eles, a Aliz vai à varanda e agora “ela era a fada encantada, e aquela varanda a torre do seu castelo de chuva dourado” (Martins 2009: 42).

O livro Sonhos de Encantar termina com a história «A morte é uma flor (Filosofia para crianças)», e nela se fala de uma avozinha. É um texto em que no início se fala, com alguma poesia, das avós:

“A maior parte delas tem os cabelos pintados de branco como a neve e lisos ou grifados a fazer de rios ou de pontes. Por cima das avós brilham duas estrelas que, de vez em quando, descem devagarinho e vão pousar-se-lhes nos olhos. Aí, nascem dois lagos grandes, redondos, umas vezes muito azuis, outras muito verdes, outras cinzentos, a baralharem a luz, mas neles, nas cores, brincam duas contas de azeviche, negras, fundas, onde vivem adormecidas mil histórias. É nesses olhares profundos que muitos meninos, sentados nos seus colos, gostam de mergulhar.” (Martins 2009: 43).

E Donzília Martins escreve, a propósito das lágrimas das avós, que muitas vezes também são de alegria:

“Na cara das nossas avós passam rios naturais, com leitos vincados, por onde de vez em quando correm grandes caudais em cataratas de lágrimas.”
Essas gotinhas de água transparentes são quase sempre de alegria por serem testemunhas vivas das crianças a crescerem.” (Martins 2009: 43).

Em «A morte é uma flor (Filosofia para crianças)» a Autora opta por falar livremente das avós, que são “exímias a ser ‘cadeirinhas’ de colo e que “são eternas! Nunca morrem. Ficam sempre connosco, deixando sempre um pouco delas em todos os passos do nosso caminho e, sobretudo, ficam para sempre a viver nas nossas almas.” (Martins 2009: 46). Nesta última história reflete-se claramente, por um lado, a relação afetiva muito forte que ligou Donzília Martins à sua avó e, por outro lado, a sua experiência, cheia de entusiasmo, de ser avó no momento presente.

Em conclusão, resta-nos dizer que, em Sonhos de Encantar, Donzília Martins, agora avó e a gostar de contar histórias aos netos, aproveita para nos contar pequenas histórias nas quais mostra de forma suave, idealizada e com alguma poesia, problemas com que as crianças e os adultos são confrontados no dia a dia das suas vidas. No seu livro encontramos páginas de encantar, com mensagens de amor, de fraternidade, de saudade motivada pela ausência eterna, uma saudade que pode ser colmatada ou atenuada através da imaginação.
——————-

Os outros autores e respectivos livros citados no texto acima são:
Miguel Torga. Novos Contos da Montanha e
Maria da Assunção Monteiro. Trás-os-Montes e Alto Douro em contos/memórias de Donzília Martins
————————————
Fonte:
Mª da Assunção Morais Monteiro. In Jornal dos Poetas e Trovadores, n.º 50, Outubro/Dezembro 2009, 3.ª Serie, Ano XXIX. Disponível no Grêmio Literário Vila-Realense, http://gremio.cm-vilareal.pt/

1 comentário

Arquivado em Estante de Livros, Sopa de Letras

Donzília Martins (1942)

Donzília Martins nasceu em Murça, Portugal, a 25 de Setembro de 1942.

Em 1964, conclui o curso do Magistério Primário em Vila Real. Cursa também História na Universidade do Porto, fazendo o Estágio Pedagógico em Vila Real.

Torna-se professora do quadro de nomeação definitiva e orientadora de Estágio Pedagógico na EB 2,3 de Paredes.

Pertence à Associação de Escritores, jornalistas e artistas do Vale de Sousa, desde a sua fundação em 17 de Setembro de 1994.

Em 1991, estreia como escritora com o livro de poemas Lágrimas e Sorrisos em Sonhos de Vida. Os dois seguintes, Lírios Do Campo e Quando o teu Olhar, também em poesia, já são respectivamente de 2004 e de 2006.

Colabora regularmente no semanário Progresso de Paredes.

Tem obtido alguns prêmios e menções honrosas em vários certames literários, e figura na antologia Poetas de Sempre.

Obras:

– Lágrimas e Sorrisos, (1991);
– O Mercado Feira de Lordelo – Subsídios para a sua História, (2003);
– Lírios do Campo, (2004);
– Quando O Teu Olhar, (2005).
– Um País Na Janela Do Meu Nome, (2007);

– História de Zé Luis, o menino petiz (2008)
– Sonhos de Encantar, (2009);

Fontes:
http://bmmurca.blogspot.com/2009/02/escritores-da-terra-donzilia-martins.html

Deixe um comentário

Arquivado em Biografia, Portugal

Ialmar Pio Schneider (Da Condição Humana)

Jamais eu te direi que estou feliz
e me reservo agora este direito
de sofrer por aquilo que não fiz,
pois este é o meu destino e assim o aceito.

Não quero que me julgues satisfeito
e nem tampouco um mísero infeliz,
o meu caminho embora seja estreito
tem amplitudes que sonhei e quis.

Se desejarmos merecer a vida
profundamente além da concebida
iremos naufragar em dissabores…

Por isso aonde eu for e aonde fores
não é preciso conseguir extremos:
sejamos o que somos e seremos…

Fontes:
O Autor

Deixe um comentário

Arquivado em O poeta no papel

Montes Claros (MG) Poético


Alfredo Marques Vianna de Góes

Nasceu em Montes Claros, em 23.11.1908. Terminou seus estudos de segundo grau em Curvelo (MG) , onde viveu toda a sua juventude. Mudou-se para Belo Horizonte em 1935, onde fez o curso de Direito. Cronista e poeta, foi intensa a sua colaboração na imprensa mineira. Durante mais de dez anos foi o presidente da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais.

AD IMORTALITATEM

Sinto a saudade vã de recôndita era…
De um mundo onde, talvez, eu já vivi outrora.
E sei, por intuição que a morte não supera
A vida, que transcende o espaço e o tempo em fora…
A vida é como o tempo: uma emoção de espera…
Se acaso vem, depois da noite vem a aurora.
Se um ser morre, ressurge, alhures, noutra esfera…
E assim como expirou, renasce e revigora.
Então, noutro avatar, em nova natureza
Revive, ama e, no amor, realiza a humanidade.
E a vida continua além da flama acesa
Do milagre vital, da entidade criada,
Por ser eterno o ser, essência e atividade
Do próprio Deus que anima a gênese do Nada.
================================
Cândido Canela

Nasceu em Montes Claros(MG), aos 22 de agosto de 1910. Tabelião do 1º Ofício, Vereador à Câmara Municipal de Montes Claros por vários mandatos. Humorista satírico, inspirado trovador, publicou LÍRICA E HUMOR DO SERTÃO e REBENTA BOI. Membro da Academia Montesclarense de Letras.

SAUDADE
Saudade – recordação,
de tudo quanto ficou
bem fundo, no coração
do velho que muito amou.
Saudade – sorriso e dor,
pranto dos olhos que rola,
saudade – prece de amor
passado que nos consola.
Saudade – nosso presente,
relembrando os nossos fados,
saudade – sabor ardente
de antigos beijos trocados.
Saudade – luar de prata,
festivos saraus de outrora,
saudade – mulher ingrata,
que a gente reclama e chora.
Saudade – infância passada,
juventude que se foi.
terno canto à madrugada
de um velho carro-de-boi.
Saudade – perfume estranho
de uma flor já ressequida
entre as páginas de antanho
dos livro de nossa vida.
Saudade – corpo ainda leve,
sorrisos abertos e francos,
saudade- flocos de neve
dos nossos cabelos brancos.
Saudades, enfim, são das dores
da velhice, atroz , arfante,
ouvindo trovas de amores
da mocidade distante.

===================
Corbiniano R. Aquino


Nasceu em Januária – MG, em 8.8.1915. Metade de sua infância viveu em Avaí (SP). Residiu por alguns anos em Belo Horizonte, de lá retornando à sua cidade natal. Seis anos após transferiu-se com a família para Montes Claros. Graduado em Direito, em 1964, pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Industrial e comerciante, professor de contabilidade. Em Januária, presidiu a Associação Comercial e fundou “A Tribuna de Januária” dirigindo-a por seis anos. Em Montes Claros, foi presidente da Associação Comercial e Industrial e o primeiro dirigente do Mobral, com Diploma de Reconhecimento entregue pelo ministro Mário Henrique Simonsen.

Romances publicados:
Aconteceu em Serra Azul e Aconteceu…

MÃE
Sonhei vê-la chegando
bem juntinho de mim!
Quisera não ter acordado
para este sonho não ter fim…
Colhi rosas da minha mãe
para a minha vida inteira,
hoje o que mais desejo
é rever minha roseira.
Esta roseira bem se parece
uma planta, tal e qual,
porém ela, como uma prece,
fez um ato adicional!
Mãe é um sorriso de DEUS
nos sofrimentos do mundo,
é paz nos desatinos
e nos dissabores profundos.
À minha mãe querida,
do fundo d’alma revelo,
se hoje a tivesse comigo
redobrada meu desvelo!
Sim, minha mãezinha,
só depois, reconhecemos
o que, então, nós tínhamos
e o que após nós perdemos!…
============================
Geraldo Freire

Nasceu em Montes Claros (MG), aos 4 de julho de 1910. Professor secundário e jornalista, hábil desenhista e tipógrafo. Durante muitos anos foi Inspetor do Ensino Primário Municipal. Em 1957 publicou “Fontes de Suspiros”(poesias). Foi membro da Academia Montesclarense de Letras.

RETORNO À MINHA ALEGRIA
Meus braços estão vazios do teu corpo…
Minh’alma está ausente da tua alma…
E aqui dentro tão frio,
Tão frio,
Que chego a tremer neste vazio!
Vem!
Há torrentes de lágrimas rolando
Pelos longos caminhos de minha solidão.
E há corvos grasnando
Nos misteriosos escaninhos do meu coração!
Vem ! Caminha!
E, em vindo, então,
Eu sentirei toda a pujança do meu verso…
Afastarei toda a angústia do Universo…
– No momento exato em que tu fores minha !
====================
João Valle Maurício

Nasceu em Montes Claros(MG), em 26 de abril de 1922. Diplomado em Medicina pela Faculdade de Medicina de Belo Horizonte em 1946 com especialização em Cardiologia. Reitor da Fundação Norte Mineira de Ensino Superior. Secretário de Estado da Saúde de Minas Gerais. Membro da Academia Municipalista de Minas Gerais, da Academia Mineira de Letras e ex-presidente da Academia Montesclarense de Letras. Diversos livros publicados “GROTÃÒ, TAIPOCA, PÁSSARO NA TEMPESTADE, entre muitos outros.

MUNDO VAZIO
Palavras vazias
Num mundo vazio.
Palavras
Clamando justiça,
Rogando perdão,
Chorando sem fé.
Palavras
Pedindo amor,
Esperando
Orando
Compreensão.
Palavras
Voando confusas;
Alucinadas
Em multidão.
Palavras vazias
Num mundo sem formas,
Sem perfume
Sem beleza,
Sem calor…
Mundo que segue
Sempre girando,
Sempre perdido
Eternamente envolvido,
Em nebulosa de dor.,
Palavras sem formas
Em todas as línguas
Em todas as bocas
Em todas as cores.
E os homens falando
Sempre falando.
E ninguém escutando.
O som das palavras
Não tem ressonância
É Babel de mensagens
Ganhando distância
Voando sem eco
Pelo mundo afora.
E os homens perdidos,
Sofridos,
Desesperados, angustiados,
Falando, sempre falando
E o mundo girando,
Sempre girando,
Sempre mais frio.
Palavras sem formas
Num mundo vazio!
BARRO
Eu queria ter mão imensa,
imensa de força e de amor,
mão mais forte ( com licença)
do que a mão do Criador.
Então, com esta mão,
possuída de piedade
e de puro anseio- paz,
apanharia a humanidade,
carinhosamente,
cuidadosamente,
e a tornaria
barro
novamente…
=====================================
Luiz de Paula Ferreira

Nasceu em Várzea da Palma (MG). Cursos de Contabilidade e Direito. Participou de inúmeras empresas em Montes Claros. Diretor da COTEMINAS S/A e da COTENOR S/A. Foi Vice-prefeito de Montes Claros, Deputado Federal , Governador do Distrito 452 do Rotary International.

MEUS VERSOS
Os versos que eu canto,
Essas rimas que falam de alegrias e pranto,
Eu os faço assim como quem, na viagem,
Não encara o destino, só contempla a paisagem,
Esquecido, talvez, de que pisas em espinho.
E assim vou seguindo a olhar os caminhos…
CONFORTAMENTO
Nos caminhos da vida
Há sempre uma flor, que nasce e viceja
Ao alcance da mão, mais humilde que seja,
Para ser colhida.
OLHAI OS CAMINHOS
Volvei o vosso olhar,
Não vos percais nos longes, que longe é o deserto,
O mistério, é a dúvida. Olhai manso e de perto.
A felicidade que buscais na vida
Pode estar junto a vós, nos caminhos perdida,
E esperar.
=============================
Luíza Otany Barbosa

Natural de Montes Claros (MG), onde fez cursos de Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Norte de Minas e de Literatura Francesa pela Aliança Francesa de Montes Claros. Tem também vários cursos de aperfeiçoamento em Literaturas Brasileira e Francesa. Sócia da Academia Montesclarense de Letras.

CANTIGA
Florinha mimosa,
tão linda é a mensagem
que expões !
Florinha de orvalho,
tão grande é o exemplo
que dás!
Florinha de nuvem,
tão puro é o azul
que ofereces!
Florinha de brisa,
tão grande é o perfume
que emanas!
Florinha do campo,
tão rico é o silêncio
que falas !
Florinha de tule,
tão leve é a corola
que ostentas!
Florinha de amor,
tão nada é a guerra
que enfrentas!
Florinha ditosa,
tão curta é a vida
que tens!
===========================
Maria Luíza Silveira Teles

Nasceu em Belo Horizonte (MG) a 4 de maio de 1943. Licenciada em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Norte de Minas. Diplomas de Lower Cambridge, Técnicas de Ensino, Diagnose e Prognose em Educação, Psicologia Comportamental do Adolescente. Professora da UNIMONTES. Publicou, entre muitos livros, UMA INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO, O ALFA E ÔMEGA e AS SETE PONTES.

PROMESSA
Quisera poder ficar
e repousar em ti,
pois meus pés sangram
e o cansaço me domina,
mas o mundo me chama ainda.
É preciso que eu ande
por todos os caminhos
e que derrame todo o orvalho
de meu coração.
É preciso que eu navegue
por todos os mares
e conheça todos os portos.
É preciso que eu veja
a Face de Deus
no rosto de todos os homens.
É preciso que eu vá com os ventos
e cante meu hino
por todos os cantos
se volte, dep0ois, com a chuva,
pr’a fertilizar
a terra do teu espírito!
============================
Olyntho da Silveira

Nasceu em Brejo das Almas (MG), em 25.08.1909. Foi fazendeiro, comerciante, funcionário público, delegado de polícia, vice-prefeito. Publicou: CANTOS E DESENCANTOS, MINHA TERRA E A NOSSA HISTóRIA, PORTAIS VERSIFICADOS, FRANCISCO SÁ NAS SUAS ORGIENS: O VELHO BREJO DAS ALMAS, CINQUENTÃO e, juntamente com sua esposa Yvonne de Oliveira Silveira, BREJO DAS ALMAS. Membro da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais e da Academia Montesclarense de Letras, de que foi presidente.

MARIA LUÍSA
É por você que ainda estou aqui
a padecer dos meus, incompreensões.
Antes, não a queria, e quando a vi,
Joguei por terra as minhas convicções.
Você me trouxe novas ilusões
e, no seu nome, a Mãe eu revivi.
Entre nós dois não há nenhuns senões
E, reforçado, o coração senti.
Você começa a sua Primavera,
enquanto o meu Outono está no fim
e aproveitá-la mais eu bem quisera.
Mas mesmo assim bendigo a sua vinda,
Pois que você é o Universo em mim,
na pouca vida que me resta ainda.
===========================
Patrício Guerra

Nasceu a 17 de março de 1896, no Arraial de Piedade, Licínio de Almeida (BA). Em 1917 começou a faina literária com intensa colaboração em vários jornaisx da Bahia e de Minas Gerais. Escreveu dramas, poemas, comédias, com predileção pela poesia lírica. Publicou FOLHAS DE OUTONO e FLORILÉGIO MARIANO. Foi membro ativo da Academia Montesclarense de Letras.

TRIBUTO
Dentre os muitos sonetos que hei composto
Nem um apenas trata de mulheres,
De rosas bogaris ou mal-me-queres,
De ebúrneo colo ou de moreno rosto.
Hoje, entretanto, com supremo gosto,
Na mais perfeita imitação de Ceres,
Canto as Lucys, as Sílvias, as Esteres
Na emotiva saudade de um sol posto.
Antes que chegue no meu último porto,
Com todo zelo que o amor requer,
As flores orvalhadas do meu horto
Dedicarei ao culto da mulher,
Pois não quero voltar depois de morto
A dar trabalho ao Chico Xavier
=================================
Wanderlino Arruda

Mineiro de São João do Paraíso (MG), residente em Montes Claros. Tem cursos de Contabilidade, Letras e Direito, com pós-graduação em Lingüística, Semântica e Literatura Brasileira. Em Montes Claros, foi presidente de diversas instituições: Câmara Municipal, Sindicato dos Bancários, Centro Espírita Canacy, Conselho Regional Espírita, Departamento de Letras da Unimontes, Elos Clube, Esperanto-Klubo, Academia Montesclarense de Letras e Rotary Club de Montes Claros-Norte. Foi Diretor Internacional do Elos da Comunidade Lusíada, Secretário Municipal de Cultura e governador no Rotary International. Professor de Português, Lingüística e Oratória na Unimontes. Pintor, poeta e cronista. Publicou ” Tempos de Montes Claros”, ” Jornal de Domingo” e ” O dia em Chiquinho sumiu”. É sócio de três academias: Academia de Letras dos Funcionários do Banco do Brasil (Rio de Janeiro), Municipalista de Letras de Minas Gerais (Belo Horizonte) e Montesclarense de Letras (Montes Claros). Como rotarianos é sócio honorário de diversos Rotary Clubs em Belo Horizonte e Montes Claros. Tem medalhas de “Benfeitor da Fundação Rotária” e “Companheiro Paul Harris”. Em 1995 recebeu os dois troféus do Rotary International destinados ao Brasil.

A BRISA ME TRAZ PERFUME
A brisa que passa
e envolve teu rosto,
a brisa que voa
e sorri em teus cabelos
é brisa de muito amor.
Ajuda a iluminar tua beleza,
Mais do que tudo.
Adoro o encanto da brisa
porque faz parte da vida,
é muito da minha alegria.
A brisa que passa
e que te faz carinhos
me dá lindo sentimento de amor,
me dá contentamento
de participar da Natureza.
Porque a brisa te faz mais linda,
dela não tenho ciúmes.
Porque a brisa me traz perfume,
Dela me aproximo,
Aproximando-me de ti.
Realidade do ser feliz,
ajuda-me a viver
ajuda-me a te sentir, minha querida.
================================-
Yvonne de Oliveira Silveira

Nasceu em Montes Claros em 30.12.1914. Licenciada em Letras pela UNIMONTES. Professora aposentada de Teoria da Literatura, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Norte de Minas. Publicou, em parceria com seu marido , Olyntho Silveira, o livro BREJO DAS ALMAS. E em parceria com Maria José Colares Moreira, o livro MONTES CLAROS DE ONTEM E DE HOJE. Jornalista, cronista, poetisa, pertence à Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais. É a presidente da Academia Montesclarense de Letras por sucessivos mandatos.

LINDA MENTIRA
Cristalização de sonhos
nas noites insones:
os braços vazios embalam o corpo
translúcidos e belo do meu menino.
Cresce no tempo o sonho inútil.
e cresce o menino.
Imagens passam móveis , voláteis:
um ser perfeito se desenvolvendo
nos dias falsos
da vida mítica,
alma de anjo, carne de santo.-
– Não fora de sonho o meu menino!
Amores de moças,
invejas de moços,
garbosa avança o meu rapaz,
segue o destino que eu mesma fiz,
sempre vencendo,
nunca perdendo,
Alma de anjo, carne de herói.
– Não fora de sonho o meu rapaz !
Ah, imagens que passais
pelos caminhos dos meus sonhos!
imagens do desejado
inutilmente esperado.
O tempo derrubou os meus castelos.
A árvore morre sem frutos,
vendo a fúlgida visão fugir
no quebranto da vida.
===============================
Zoraide Guerra David

Natural de Mortugaba (BA). Graduação em Geografia pela UNIMONTES. Professora por muitos anos. Diretora do Centro de Educação e Cultura Hermes de Paula, é sócia benemérita da Associação dos Repentistas do Norte de Minas. Secretária da Academia Montesclarense de Letras. Publicou 3XPESIAS e MORTUGABA.

A SERRA
Aquela serra,
verde-terra,
presença bela
com flor amarela
de vetusto ipê,,
é arte divina,
rocha cristalina,
presença galante
para o viajante
que de longe a vê.
Forte muralha,
de escarpa e falha,
e plantas teimosas
que caprichosas
insistem VIVER.
Moldura do céu,
grinalda do véu
de leve bruma,
das nuvens-espuma
do amanhecer.

Fonte:
Academia Montesclarense de Letras

Deixe um comentário

Arquivado em Jose Ouverney, Livro de Poemas, Minas Gerais, Montes Claros

Folclore Brasileiro (Curupira)

O folclore brasileiro é rico em personagens lendários e o curupira é um dos principais. De acordo com a lenda, contada principalmente no interior do Brasil, o curupira habita as matas brasileiras. De estatura baixa, possui cabelos avermelhados (cor de fogo) e seus pés são voltados para trás.

A função do curupira é proteger as árvores, plantas e animais das florestas. Seus alvos principais são os caçadores, lenhadores e pessoas que destroem as matas de forma predatória.

Para assustar os caçadores e lenhadores, o curupira emite sons e assovios agudos. Outra tática usada é a criação de imagens ilusórias e assustadoras para espantar os “inimigos da florestas”. Dificilmente é localizado pelos caçadores, pois seus pés virados para trás servem para despistar os perseguidores, deixando rastros falsos pelas matas. Além disso, sua velocidade é surpreendente, sendo quase impossível um ser humano alcançá-lo numa corrida.

Entre os mitos indígenas, o Curupira é incontestavelmente o mais antigo, companheiro inseparável das crenças populares, de onde se admite a possibilidade de ser verdadeiramente indígena, senão antes legado pela população primitiva que habitou o Brasil no período pré-colombiano e que descendia dos invasores asiáticos. Curupira, de “curu”, abreviação de “curumim” e “pora”, corpo ou corpo de menino. É a “Mãe do Mato”, o tutor da floresta, que se torna benéfico ou maléfico aos freqüentadores desta, segundo as circunstâncias e o seu procedimento. Ele possui várias formas apresentando-se através de uma figura de um menino de cabelos vermelhos, peludo, com a particularidade de ter os pés virados para trás, pode Ter os dentes azuis ou verdes e é orelhudo. Todos lhe celebraram as manifestações como guardião das florestas.

Para crença em geral, ele o Senhor, a Mãe, o Guardião das florestas e da caça, que castiga a todo aquele que a destrói, premiando a aqueles que não o contrariam no seu desejo de manter a mata viva, e também para aqueles que se mostram solícitos e obedientes. O Curupira, ora é imperioso e brutal, ora é delicado e compassivo, ora não admite desrespeito ou desobediência, ora se deixa iludir como uma criança. Segundo uma crença generalizada, é o responsável pelos estrondos da floresta. Assim, quando no meio da mata se ouve um estrondo, que não seja uma trovoada, pode estar certo que o Curupira anda por ali… Sob sua guarda direta está a caça que protege, mas entende o caçador e é sempre propício ao homem que mate de acordo com suas necessidades, ou seja, para matar a fome dos seus filhos. Mostra-se extremamente hostil ao caçador que persegue e mata as fêmeas quando prenhas ou cause danos aos filhotes. Para estes o curupira vira uma fera e um é inimigo terrível. Consegue iludi-los sob a feição de caça, levando-os longe… Também é capaz de imitar a voz humana para atrair os caçadores, fazendo-os com que se percam dentro da floresta deixando-os no mato abandonados à fome e ao desamparo. Além de ser protetor dos animais, o Curupira é considerado o Senhor das Árvores. Ele cuida de todas, protege as mudinhas, admira as grandes e bela árvores da floresta. Dizem que armado com um casco de jabuti, bate nas árvores para ver se conservam-se fortes para resistir as tempestades.

Os contadores de lendas dizem que o curupira adora pregar peças naqueles que entram na floresta. Por meio de encantamentos e ilusões, ele deixa o visitante atordoado e perdido, sem saber o caminho de volta. O curupira fica observando e seguindo a pessoa, divertindo-se com o feito.

Análise do simbolismo da lenda

Em mais uma lenda brasileira, assim como na do Saci, vamos encontrar um guardião da mata que precisa se esconder, ludibriar e enganar para fazer o bem. Essa função do oculto, do implícito, para tentar lidar com a ganância, o imediatismo e a inconseqüência dos homens, representado pelo Curupira, mostra e revela a necessidade de estarmos atentos à forma como lidamos com o que a Terra Mãe generosamente nos oferece. Neste jogo de esconde e aparece do Curupira vamos também encontrar uma associação com os próprios recursos naturais, por vezes perigosos, hostis e enganadores, mas cujos mistérios e segredos uma vez passado o susto inicial, podem revelar-se fundamentais para descobertas relacionadas à saúde, por exemplo, se pensarmos na biodiversidade e seu importante e ainda pouco conhecido papel no auxílio às doenças e disfunções do homem e da natureza.

Fonte:
Keila Macário Pavani. Lendas do Saber, Permacultura e Histórias: cuidando da Terra e das pessoas. Ed. Insular. 2008

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore Brasileiro

Folclore Brasileiro (Uma História de Curupira)

Estava o Curupira andando pela floresta, quando encontrou um índio caçador que dormia profundamente. O Curupira estava com muita fome e cismou em comer o coração do homem. Assim, fez com que ele acordasse. O caçador levou um susto, mas como ele era muito controlado, fingiu que não estava com medo. O Curupira disse-lhe:

– Quero um pedaço de seu coração!

O Caçador, que era muito esperto, lembrando-se que havia atirado num macaco, entregou ao Curupira um pedaço do coração do macaco. O Curupira provou, gostou e quis comer tudo.

– Quero mais! Quero o resto! – pediu ele. O Caçador entregou-lhe o que havia sobrado, mas, em troca, exigiu um pedaço do coração do Curupira.

– Fiz sua vontade, não fiz? Agora você deve dar-me em pagamento um pedaço de seu coração, disse ele.

O Curupira não era muito esperto e acreditou que o Caçador havia arrancado o próprio coração, sem ter sofrido nenhuma dor e sem haver morrido.

– Está certo, respondeu o Curupira, empreste-me sua faca.

O Caçador entregou-lhe a faca e afastou-se o mais que pôde, temendo levar uma facada. O Curupira, porém, estava sendo sincero. Enterrou a faca no próprio peito e tombou, sem vida. O Caçador não esperou mais, disparou pela floresta com tal velocidade que deixaria para trás os bichos mais velozes…Quando chegou à aldeia, estava com a língua de fora e prometeu a si mesmo não voltar nunca mais à floresta. Pensou: “Desta escapei. Noutra é que não caio”

Durante um ano, o índio não quis saber de entrar na mata. Quando lhe perguntavam por que não saía mais da aldeia, ele se desculpava, dizendo estar doente.

O Caçador tinha uma filha que era muito vaidosa. Como haveria uma festa dentro de poucos dias, ela pediu ao pai um colar diferente de todos os que ela já tinha visto.

O índio, pai dedicado, começou a pensar num modo de satisfazer o desejo da filha. Lembrou-se, então, dos dentes verdes do Curupira. Daria um bonito colar, sem dúvida.

Partiu para a floresta e procurou o lugar onde o gênio havia morrido. Depois de algumas voltas, deu com o esqueleto meio encoberto pelo mato. Os dentes verdes brilhavam ao sol, parecendo esmeraldas.

Conseguindo vencer o receio, apanhou o crânio do Curupira e começou a bater com ele no tronco de uma árvore, para que se despedaçasse e soltasse os dentes.

Imaginem a sua surpresa quando, de repente, viu o Curupira voltar à vida! Ali estava ele, exatamente como antes, parecendo que nada havia acontecido!

Por sorte, o Curupira acreditou que o Caçador o ressuscitara de propósito e ficou todo contente:
– Muito obrigado! Você devolveu-me a vida e não sei como agradecer-lhe!

O índio percebeu que estava salvo e respondeu que o Curupira não tinha nada que agradecer, mas ele insistia em demonstrar sua gratidão. Pensou um pouco e disse:

– Tome este arco e esta flecha. São mágicos. Basta que você olhe para a ave ou animal que deseja caçar e atire. A flecha não errará o alvo. Nunca mais lhe faltará caça. Mas, agora, ouça bem: jamais aponte para uma ave ou animal que esteja em bando, pois você seria atacado e despedaçado pelos companheiros dele. Entendeu?

O índio disse que sim e desde aquele momento não mais lhe faltou caça. Era só atirar a flecha e zás! O bicho caía. Tornou-se o maior caçador de sua tribo. Por onde passava, era olhado com respeito e admiração.

Um dia, ele estava caçando com outros companheiros que não tinham mais palavras para elogiá-lo. O índio sentiu-se tão importante que, ao ver um bando de pássaros que se aproximava, esqueceu-se da recomendação do Curupira e atirou…

Matou somente um pássaro e, como o Curupira avisara, foi atacado pelo bando enlouquecido pela perda do companheiro.

De seus amigos, não ficou um: dispararam pela floresta, deixando-o entregue à própria sorte.

O pobre índio foi estraçalhado pelos pássaros. A cabeça estava num lugar, um braço no outro, uma perna aqui, outra longe… O Curupira ficou com pena dele. Arranjou cera e acendeu um fogo para derretê-la. Depois recolheu os pedaços do Caçador e colou-os com a cera. O índio voltou à vida e levantou-se:

– Muito obrigado! Não sei como agradecer-lhe!

– Não tem o que agradecer, respondeu o Curupira, mas preste atenção. Esta foi a primeira e ú1tima vez que pude salvá-lo! Não beba, nem coma nada que esteja quente! Se o fizer, a cera se derreterá e você também!

Durante muito tempo, o índio levou uma vida normal. Ninguém sabia do acontecido. Um dia, porém, sua mulher lhe serviu uma comida quente e apetitosa, tão apetitosa que o índio nem se lembrou que a cera poderia derreter-se. Engoliu a comida e pronto! Não só a cera se derreteu, mas também o próprio índio.

Fonte:
Histórias e Lendas do Brasil (adaptação do texto original de Gonçalves Ribeiro). São Paulo: APEL Editora.

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore Brasileiro

Gonçalo Ferreira da Silva (Lenda do Caipora)

A humana criatura
se pergunta insatisfeita:
_Como uma coisa existe
sem nunca ter sido feita? –
Quem prega não prova nada
quem escuta não aceita.

Diz a gênese mosaica
que Deus Pai Onipotente
disse: “Faça-se a luz”
e a luz obediente
do atro abismo do nada
surgiu repentinamente.

Assim também são as lendas
as vezes surgem do nada
ou como remanescência
duma cultura importada
que sempre sensibilizam
gente não civilizada.

De acordo com tais lendas
há o regente do mar,
o deus dos mananciais,
o gênio que rege o ar,
e é de um desses gênios
que nós queremos falar.

Vivendo na intimidade
da aconchegante flora
como um guardião que zela
a quem mais ama e adora
é o protetor da fauna
o lendário caipora.

E o caçador prudente
ao conduzir o seu cão
antes de entrar na mata
deve, por obrigação
ao caipora pedir
a sua autorização.

Senão estará sujeito
a ser desafortunado
ou inexplicavelmente
ficar desorientado
andando em círculo na mata
por tempo indeterminado.

Outras vezes algo estranho
fica o cachorro sentindo
andando em torno do dono
se lastimando e ganindo
sem que o dono perceba
quem o está perseguindo.

Outro artifício que é
pelo caipora usado
é reter o cão esperto
infantilmente acuado
latindo muito diante
dum toco designado.

“Hoje não é o meu dia”
pensa imediatamente
o caçador convidando
o cão desobediente
que abana o rabo, entretanto,
volta a latir novamente.

Agora o caçador sente
um inexplicável frio
tenta dominar o medo
porém sente um arrepio
algo como um mudo aviso,
um sentimento sombrio.

Pedras à feição de trempes
bota na mata fechada
acende fogo dizendo:
_Vamos parar a jornada
só depois da hora-grande
reinicia a caçada.

Mas depois da hora-grande
incompreensivelmente
ouve o caçador um longo
assovio à sua frente
o caçador intrigado
escuta detidamente.

Gira sobre os calcanhares
segue oposta direção
mas não percorre uma jarda
tem ele a decepção
de saber que o assovio
já mudou de posição.

E assim pra todo lado
em que o caçador for
segue o assovio como
se o assoviador
se entretenha mangando
da cara do caçador.

Um caçador nos contou
um curioso ocorrido
um caso igualmente aquele
nunca tinha acontecido
dessa vez o caipora
se deixou ser percebido.

Quando entrou na mata virgem
repentinamente viu
três porcos-do-mato que
quando ele os pressentiu
os alvejou um por um
até que o último caiu.

Quando ia dirigir-se
aos porcos mortos no chão
um moleque apareceu
com um enorme ferrão
montado num porco-espinho
na densa vegetação.

E enfiando o ferrão
nos flancos dum animal
mandou-o se levantar
que o tiro não foi mortal
o porco saiu correndo
por dentro do matagal.

Repetiu com o segundo
essa mesma operação
e no terceiro também
ele enfiou o ferrão
os animais dispararam
sem vestígios de lesão.

A seguir o caipora
dirigiu-se a um ribeiro
simulando raiva disse:
_Vou amanhã ao ferreiro
consertar este ferrão
pra ele ficar linheiro.

Logo o caçador pensou:
“Amanhã eu vou ficar
na porta da oficina
ver se alguém vai chegar
com um ferrão como este
para mandar consertar”.

Chegando em casa, sequer
colocou da porta a tranca
num dos cantos da latada
colocou sua alavanca
e depois da sua esposa
acariciou a anca.

E foi dormir levemente
para acordar muito cedo
para saber se o ferreiro
conhecia algum segredo
porque durante a caçada
pra ser franco, teve medo.

O sol já estava alto…
o caçador conversando
com seu amigo ferreiro
sobre negócios tratando
quando avistaram um vaqueiro
que vinha se aproximando.

Quando o vaqueiro apeou
foi exibindo um ferrão
dizendo para o ferreiro:
_Tenho muita precisão
que conserte este instrumento
com a maior perfeição.

Sem querer teve o ferreiro
um leve estremecimento
mas consertou o ferrão
naquele mesmo momento
e disse para o vaqueiro:
_Eis aí seu instrumento.

Disse o vaqueiro: _ O ferrão
está como me convém
fitando o caçador disse:
_Preste atenção muito bem
o que você viu de noite
não conte nunca a ninguém

Fonte:
Academia Brasileira de Literatura de Cordel

Deixe um comentário

Arquivado em Literatura de Cordel, O poeta no papel

Literatura de Cordel (11 Maneiras Diferentes de Escrever um Cordel)

Estas e outras informações sobre as métricas do cordel podem ser encontradas no livro Vertentes e Evolução da Literatura de Cordel.

01 – O INÍCIO

A evolução da literatura de cordel no Brasil não ocorreu de maneira harmoniosa. A oral, precursora da escrita, engatinhou penosamente em busca de forma estrutural. Os primeiros repentistas não tinham qualquer compromisso com a métrica e muito menos com o número de versos para compor as estrofes. Alguns versos alongavam-se inaceitavelmente, outros, demasiado breves. Todavia, o interlocutor respondia rimando a última palavra do seu verso com a última do parceiro, mais ou menos assim:

Repentista A – O cantor que pegá-lo de revés
Com o talento que tenho no meu braço…
Repentista B – Dou-lhe tanto que deixo num bagaço
Só de murro, de soco e ponta-pés.

02 – PARCELA OU VERSO DE QUATRO SÍLABAS

A parcela ou verso de quatro sílabas é o mais curto conhecido na literatura de cordel. A própria palavra não pode ser longa do contrário ela sozinha ultrapassaria os limites da métrica e o verso sairia de pé quebrado. A literatura de cordel por ser lida e ou cantada é muito exigente com questão da métrica. Vejamos uma estrofe de versos de quatro sílabas, ou parcela.

Eu sou judeu
para o duelo
cantar martelo
queria eu
o pau bateu
subiu poeira
aqui na feira
não fica gente
queimo a semente
da bananeira.

Quando os repentistas cantavam parcela (sim, cantavam, porque esta modalidade caiu em desuso), os versos brotavam numa seqüência alucinante, cada um querendo confundir mais rapida mente o oponente. Esta modalidade é pre-galdiniana, não se conhecendo seu autor.

03 – VERSO DE CINCO SÍLABAS

Já a parcela de cinco sílabas é mais recente, e não há registro de sua presença antes de Firmino Teixeira do Amaral, cunhado de Aderaldo Ferreira de Araújo, o Cego Aderaldo. A parcela de cinco sílabas era cantada também em ritmo acelerado, exigindo do repentista, grande rapidez de raciocínio. Na peleja do Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum, da autoria de Firmino Teixeira do Amaral, encontramos estas estrofes:

Pretinho:
no sertão eu peguei
um cego malcriado
danei-lhe o machado
caiu, eu sangrei
o couro tirei
em regra de escala
espichei numa sala
puxei para um beco
depois dele seco
fiz dele uma mala

Cego:
Negro, és monturo
Molambo rasgado
Cachimbo apagado
Recanto de muro
Negro sem futuro
Perna de tição
Boca de porão
Beiço de gamela
Venta de moela
Moleque ladrão

Estas modalidades, entretanto, não foram as primeiras na literatura de cordel. Ao contrário, ela vieram quase um século depois das primeiras manifestações mais rudimentares que permitiram, inicialmente, as estrofes de quatro versos de sete sílabas.

04 – ESTROFES DE QUATRO VERSOS DE SETE SÍLABAS

O Mergulhão quando canta
Incha a veia do pescoço
Parece um cachorro velho
Quando está roendo osso.

Não tenho medo do homem
Nem do ronco que ele tem
Um besouro também ronca
Vou olhar não é ninguém

A evolução desta modalidade se deu naturalmente. Vejamos a última estrofe de quatro versos acrescida de mais dois, formando a nossa atual e definitiva sextilha:

Meu avô tinha um ditado
meu pai dizia também:
não tenho medo do homem
nem do ronco que ele tem
um besouro também ronca
vou olhar não é ninguém.

05 – SEXTILHAS

Agora, de posse da técnica de fazer sextilhas, e uma vez consagradas pelos autores, esta modalidade passou a ser a mais indicada para os longos poemas romanceados, principalmente a do exemplo acima, com o segundo, o quarto e o sexto versos rimando entre si, deixando órfãos o primeiro, terceiro e quinto versos. É a modalidade mais rica, obrigatória no início de qualquer combate poético, nas longas narrativas e nos folhetos de época. Também muito usadas nas sátiras políticas e sociais. É uma modalidade que apresenta nada menos de cinco estilos: aberto, fechado, solto, corrido e desencontrado. Vamos, pois, aos cinco exemplos:

Aberto:

Felicidade, és um sol
dourando a manhã da vida,
és como um pingo de orvalho
molhando a flor ressequida
és a esperança fagueira
da mocidade florida.

Fechado:

Da inspiração mais pura,
no mais luminoso dia,
porque cordel é cultura
nasceu nossa Academia
o céu da literatura,
a casa da poesia.

Solto:

Não sou rico nem sou pobre
não sou velho nem sou moço
não sou ouro nem sou cobre
sou feito de carne e osso
sou ligeiro como o gato
corro mais do que o vento.

Corrido:

Sou poeta repentista
Foi Deus quem me fez artista
Ninguém toma o meu fadário
O meu valor é antigo
Morrendo eu levo comigo
E ninguém faz inventário

Desencontrado:

Meu pai foi homem de bem
Honesto e trabalhador
Nunca negou um favor
Ao semelhante, também
Nunca falou de ninguém
Era um homem de valor.

06 – SETILHAS

Uma prova de que as setilhas são uma modalidade relativamente recente está na ausência quase completa delas na grande produção de Leandro Gomes de Barros. Sim, porque pela beleza rítmica que essas estrofes oferecem ao declamador, os grandes poetas não conseguiram fugir à tentação de produzi-las. Para alguns, as setilhas, estrofes de sete versos de sete sílabas, foram criadas por José Galdino da Silva Duda, 1866 – 1931. A verdade é que o autor mais rico nessas composições, talvez por se tratar do maior humorista da literatura, de cordel, foi José Pacheco da Rocha, 1890 – 1954. No poema A CHEGADA DE LAMPIÃO NO INFERNO, do inventivo poeta pernambucano, encontram estas estrofes:

Vamos tratar da chegada
quando Lampião bateu
um moleque ainda moço
no portão apareceu.
– Quem é você, Cavalheiro –
– Moleque, sou cangaceiro –
Lampião lhe respondeu.

– Não senhor – Satanás, disse
vá dizer que vá embora
só me chega gente ruim
eu ando muito caipora
e já estou com vontade
de mandar mais da metade
dos que tem aqui pra fora.

Moleque não, sou vigia
e não sou o seu parceiro
e você aqui não entra
sem dizer quem é primeiro
– Moleque, abra o portão
saiba que sou Lampião
assombro do mundo inteiro.

Excelente para ser cantada nas reuniões festivas ou nas feiras, esta modalidade é, ainda hoje, muito usada pelos cordelistas. Esta modalidade é, também, usada em vários estilos de mourão, que pode ser cantado em seis, sete, oito e dez versos de sete sílabas. Exemplos:

Cantador A
– Eu sou maior do que Deus
maior do que Deus eu sou

Cantador B
– Você diz que não se engana
mas agora se enganou

Cantador A
– Eu não estou enganado
eu sou maior no pecado
porque Deus nunca pecou.

Ou com todos os versos rimados, a exemplo das sextilhas explicadas antes:

Cantador A –
Este verso não é seu
você tomou emprestado

Cantador B –
Não reclame o verso meu
que é certo e metrificado

Cantador A –
Esse verso é de Noberto
Se fosse seu estava certo
como não é está errado.

07 – OITO PÉS DE QUADRÃO OU OITAVAS

Os oito pés de quadrão, ou simplesmente oitavas, são estrofes de oito versos de sete sílabas. A diferença dessas estrofes de cunho popular para as de linha clássica é apenas a disposição das rimas. Vejam como o primeiro e o quinto versos desta oitava de Casimiro de Abreu (1837 – 1860) são órfãos:

Como são belos os dias
Do despontar da existência
– Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar – é lago sereno,
O Céu – Um manto azulado,
O mundo – um sonho dourado,
A vida um hino de amor.

Na estrofe popular aparecem os primeiros três versos rimados entre si; também o quinto, o sexto e o sétimo, e finalmente o quarto com o último, não havendo, portanto um único verso órfão. Assim:

Diga Deus Onipotente
Se é você, realmente
Que autoriza, que consente
No meu sertão tanta dor
Se o povo imerso no lodo
apregoa com denodo
que seu coração é todo
De luz, de paz e de amor.

08 – DÉCIMAS

As décimas, dez versos de sete sílabas, são, desde sua criação no limiar do nosso século, as mais usadas pelos poetas de bancada e pelos repentistas. Excelentes para glosar motes, esta modalidade só perde para as sextilhas, especialmente escolhidas para narrativas de longo fôlego. Ainda assim, entre muitos exemplos, as décimas foram escolhidas por Leandro Gomes de Barros para compor o longo poema épico de cavalaria A BATALHA DE OLIVEIROS COM FERRABRAZ, baseado na obra do imperador francês Carlos Magno:

Eram doze cavalheiros
Homens muito valorosos
Destemidos, corajosos
Entre todos os Guerreiros
Como bem fosse Oliveiros
um dos pares de fiança
Que sua perseverança
Venceu todos os infiéis
Eram uns leões cruéis
Os doze pares de França.

09 – MARTELO AGALOPADO

O Martelo agalopado, estrofe dez versos de dez sílabas, é uma das modalidades mais antigas na literatura de cordel. Criada pelo professor Jaime Pedro Martelo (1665 – 1727), as martelianas não tinham, como o nosso martelo agalopado, compromisso com o número de versos para a composição das estrofes. Alongava-se com rimas pares, até completar o sentido desejado. Como exem plo, vejamos estes alexandrinos

“Visitando Deus a Adão no Paraíso
achou-o triste por viver no abandono,
fê-lo dormir logo um pesado sono
e lhe arrancou uma costela, de improviso
estando fresca ficou Deus indeciso
e a pôs ao Sol para secar um momento
mas por causa, talvez dum esquecimento
chegou um cachorro e a carregou,
nessa hora furioso Deus ficou
com a grande ousadia do animal
que lhe furtara o bom material
feito para a construção da mulher,
estou certo, acredite quem quiser
eu não sou mentiroso nem vilão,
nessa hora correu Deus atrás do cão
e não podendo alcançar-lhe e dá-lhe cabo
cortou-lhe simplesmente o meio rabo
e enquanto Adão estava na trevas
Deus pegou o rabo do cão e fez a Eva.”

Com tamanha irresponsabilidade, totalmente inaceitável na literatura de cordel, o estilo mergulhou, desde o desaparecimento do professor Jaime Pedro Martelo em 1727, em completo esquecimento, até que em 1898, José Galdino da Silva Duda dava à luz feição definitiva ao nosso atual martelo agalopado, tão querido quanto lindo. Pedro Bandeira não nos deixa mentir:

Admiro demais o ser humano
que é gerado num ventre feminino
envolvido nas dobras do destino
e calibrado nas leis do Soberano
quando faltam três meses para um ano
a mãe pega a sentir uma moleza
entre gritos lamúrias e esperteza
nasce o homem e aos poucos vai crescendo
e quando aprende a falar já é dizendo:
quanto é grande o poder da Natureza.

Há, também, o martelo de seis versos, como sempre, refinado, conforme veremos nesta estrofe:

Tenho agora um martelo de dez quinas
fabricado por mãos misteriosas
enfeitado de pedras cristalinas
das mais raras, bastante preciosas,
foi achado nas águas saturninas
pelas musas do céu, filhas ditosas.

10 – GALOPE À BEIRA MAR

Com versos de onze sílabas, portanto mais longos do que os de martelo agalopado, são os de galope à beira mar, como estes da autoria de Joaquim Filho:

Falei do sopapo das águas barrentas
de uma cigana de corpo bem feito
da Lua, bonita brilhando no leito
da escuridão das nuvens cinzentas
do eco do grande furor das tormentas
da água da chuva que vem pra molhar
do baile das ondas, que lindo bailar
da areia branca, da cor de cambraia
da bela paisagem na beira da praia
assim é galope na beira do mar.

Logicamente que há o galope alagoano, à feição de martelo agalopado, com dez versos de dez sílabas cuja diferença única é a obrigatoriedade do mote: “Nos dez pés de galope alagoano”.

11 – MEIA QUADRA

Outra interessante modalidade é a Meia Quadra ou versos de quinze sílabas. Não sabemos porque se convencionou chamar de meia quadra, quando poderia, muito bem, se chamar de quadra e meia ou até de quadra dupla. As rimas são emparelhadas e os versos, assim compostos:

Quando eu disser dado é dedo você diga dedo é dado
Quando eu disser gado é boi você diga boi é gado
Quando eu disser lado é banda você diga banda é lado
Quando eu disser pão é massa você diga massa é pão

Quando eu disser não é sim você diga sim é não
Quando eu disser veia é sangue você diga sangue é veia
Quando eu disser meia quadra você diga quadra e meia
Quando eu disser quadra e meia você diga meio quadrão.

A classificação da literatura de cordel há sido objeto da preocupação dos chamados iniciados, pesquisadores e estudiosos. As classificações mais conhecidas são a francesa de Robert Mandrou, a espanhola de Julio Caro Baroja, as brasileiras de Ariano Suassuna, Cavalcanti Proença, Orígenes Lessa, Roberto Câmara Benjamin e Carlos Alberto Azevedo. Mas a classificação autenticamente popular nasceu da boca dos próprios poetas.

No limiar do presente século, quando já brilhava intensamente à luz de Leandro Gomes de Barros, fluía abundante o estro de Silvino Pirauá e jorrava preciosa a veia poética de José Galdino da Silva Duda. Esses enviados especiais passaram a dominar com facilidade a rima escorregadia, amoldando, também, no corpo da estrofe o verso rebelde. Era o início de uma literatura tipicamente nordestina e por extensão, brasileira, não havendo mais, nos nossos dias, qualquer vestígio da herança peninsular.

Atualmente a literatura de cordel é escrita em composições que vão desde os versos de quatro ou cinco sílabas ao grande alexandrino. Até mes mo os princípios conservadores defendidos pelos nossos autores ortodoxos referem-se a uma tradição brasileira e não portuguesa ou espanhola. Os textos dos autores contemporâneos, apresentam um cuidado especial com a uniformização ortográfica, com o primor das rimas, com a beleza rítmica e com a preciosidade sonora.

Fonte:
Academia Brasileira de Literatura de Cordel

Deixe um comentário

Arquivado em Literatura de Cordel

Erasmo Pilotto: o Educador Paranaense

artigo de Denise Grein Santos

Se você sorri quando digo uma coisa sagrada, eu não me irrito, passa a ser um problema saber como fazer você chorar diante das coisas sagradas.
Graal

As palavras são do próprio Erasmo e praticamente resumem sua vida. A de um professor imerso na missão de educar, consciente de sua ação, vendo cada aluno em sua individualidade, destacando os aspectos a serem desenvolvidos.

Os que tiveram o privilégio de tê-lo como professor perceberam logo o caráter incomum do Mestre e sua dedicação constante. Ele comentou, certa vez, que após um dia de aula costumava, à noite, meditar e avaliar o trabalho do dia, detendo-se em cada aluno, questionando-se como contribuir para seu desenvolvimento. Para ele a educação era integral. Não se restringia a conteúdos programáticos e horários escolares, abrangia tudo que se referisse à formação do homem.

Uma de suas ex-alunas, Aliete Pina de Oliveira, tentando defini-lo disse: “Erasmo é inteiro; porta o discernimento do filósofo puro, a sensibilidade do artista, a humanidade do bom, o serviço do cidadão prestante e a alegria de criar e conduzir um adolescente. E, como, estes, é capaz de sonhar e maravilhar-se”.

É essa inteireza que o faz procurado diariamente por professores de diversos níveis, artistas, músicos, estudiosos de todas as áreas. A todos atende, ouve, ajuda. Discorre sobre o assunto solicitado. Apresenta os pressupostos básicos, a fundamentação teórica, aprofunda o tema, critica, anota e emite sugestões práticas. Implícita à informação, há uma pedagogia subjacente a de melhor entender o outro.

A pessoa sai com uma orientação sólida e bem estruturada e ele retorna aos estudos que generosamente abandonara para auxiliar quem o procurara.

Quando se fala de sua imensa biblioteca, que ocupa 75% de sua casa, conta que leu tudo. Tudo lido, meditado e comentado. O quadro-negro registra alguns tópicos dessa reflexão constante. Pensamentos de Goethe, Nietzche, Tolstoi, Tagore, Schiller, Spinoza, ou de outro pensador em estudo no momento, juntamente com os livros espalhados pelo chão, são evidências de aprimoramento permanente.

Aos dezesseis anos decidiu ser professor. Opção séria e aprofundada. Empenhou-se na tarefa e a praticou a vida inteira, tendo presente o ideal de Spinoza e Goethe definido no misto de alegria e perfeição. Eis a síntese de Erasmo: tudo por inteiro, com perfeição, imerso no sentido puro da alegria.

Palmilhemos sua vida e iremos encontrar sempre essas qualidades. Primeiro, professor de classe. Lecionou na Escola Normal de Paranaguá, no Grupo Escolar Professor Brandão, na Escola de Professores de Curitiba; como “Assistente Técnico” sua participação foi marcante. Pregou a escola viva e conseguiu fazer com que os alunos vivessem a escola, desenvolvendo neles o gosto pelas artes, poesia e música. É a época áurea da Escola de Professores. Seu espírito de liderança contagiou os colegas que se entusiasmaram pelo ato de educar. Conquanto não se falasse em educação para superdotados ele já há exercia há quarenta anos. Dispôs-se a despertar em cada aluno o que tivesse de seu, a levá-lo a estruturar “seu plano pessoal de vida, a liberdade de escolha, a vida inventada” (Obras). Incentivou a criatividade de seus discípulos, preparando-os para levar aos bairros operários espetáculos de alto nível, ampliando a função da escola, colocando-a a serviço da comunidade.

Entretanto sua ação não pára aí. Funda o Instituto Pestalozzi, a Associação de Estudos Pedagógicos, onde edita excelente revista, com sugestões para o enriquecimento da prática educacional. Participou da criação da Escola de Música e Belas Artes do Paraná e do Salão Paranaense. Secretário de Educação e Cultura percorreu o estado propondo soluções diversificadas e compatíveis com a realidade de cada situação.

Foi co-fundador de “Joaquim”, revista mensal de artes, dedicado ao homem, mais especificamente “a todos os joaquins do Brasil”. Aí igualmente valoriza o talento local, entrevistando e enaltecendo o trabalho dos artistas paranaenses.

Na plenitude de seu trabalho cabe por em relevo a manifestação de seu pensamento eclético e profundo contido em seus artigos e observações sobre o ensino no Paraná, na criação de um método de alfabetização para suprir a escassa escolaridade das professoras de escolas isoladas e na mais alta filosofia educacional, exposta nos minuciosos e notáveis estudos sobre diversos pensadores em sua estreita correlação com a educação. Além disso, escreveu sobre Turin, de Bona, Emiliano e Mallarmé, evidenciando sua preocupação de vincular a vida à arte e à educação.

Por sua inteireza é o grande educador paranaense. Rousseau, Montaigne, Pestalozzi e outros não alcançaram, em vida, a justa valorização. Erasmo também. Embora reverenciado em nossos círculos intelectuais não teve, ainda, bem como sua obra, a divulgação e o reconhecimento que merece. É inegável que ele próprio, por seu modo de vida, contribui para isso. Não obstante sempre pronto a receber e ajudar quem o procura mostra-se avesso às homenagens e honrarias. Recusa, sistematicamente, convites, esquivando-se de comparecer a eventos culturais que visam promovê-lo. Prefere a privacidade de sua casa, com seus livros, suas telas e sua música.

Orgulhoso de sua origem, escolheu dedicar sua vida, ação e obra à terra natal, com o sentido da perfeição definido por Goethe e por ele praticado: “se queres atingir o infinito, busca o finito em todas as suas direções”.
—————–

Artigo publicado na Gazeta do Povo – 24/ 05/ 1989 – 9a p.

Fontes:
http://www.artes.ufpr.br/erasmopilotto/depoimentos.htm
Foto = http:// www.ieppepoficial.kit.net/erasmopilotto.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Sopa de Letras

Erasmo Pilotto (1910 – 1992)

Erasmo Pilotto nasceu em Rebouças, no Paraná no dia 21 de outubro de 1910. Seu pai era telegrafista e sua mãe, professora primária. Fez o curso primário em várias escolas públicas de Curitiba, como: Grupo Escolar Xavier da Silva, Grupo 19 de dezembro, e na Escola de Júlio Teodorico Guimarães instalada onde hoje funciona a escola de Belas Artes, na rua Emiliano Perneta. Fez o Curso secundário no Ginásio Paranaense . O ginásio oferecia excelentes oportunidades para o aprimoramento cultural. Não havia promoções por média. Na época das provas, eram examinados dez alunos diariamente: prova escrita pela manhã e oral à tarde, sob a fiscalização de três examinadores.

Erasmo considerava-se um aluno médio. Criou um sistema próprio de estudo: antes da aula estudava a matéria a ser prelecionada, para melhor compreender e aprender. Concluído o curso ginasial, pensava em cursar Engenharia. Menino ainda, embarca, sozinho para o Rio e Janeiro, arranja emprego para manter-se e na época de matricular-se na Escola Politécnica, se depara com sua primeira grande frustração: para o ingresso na Faculdade de engenharia passara-se a exigir latim, até então só exigido no Curso de Direito. Não estudara essa matéria e volta à Curitiba, considerando esse tempo, de ter de viver e agir sozinho na cidade grande uma valiosa experiência para sua vida. Ao tempo de seu curso ginasial, com mais três colegas forma uma patrulha de escoteiros isolados, onde estudam e praticam o que lêem e aprendem sobre escotismo. Considera esse período importante na sua formação moral.

Seu pai deixara uma série de livros mas dois foram marcantes em sua formação: O Petit Larousse e uma Bíblia onde em sua última página havia registrado a hora e o dia de seu nascimento.

Perdeu o pai ainda bem pequeno . Foi criado pela mãe que soube enaltecer a imagem do pai, comunicar-lhe o amor e o devotamento ao estudo e à Escola.

Em 1927 matriculou-se na Escola Normal de Curitiba. Esta por sua vez, não se coadunava com os anseios das modernas técnicas pedagógicas da época, tornando o padrão de ensino da Escola Normal, praticamente nulo, principalmente se comparado com o que lhe oferecera o ginásio. Funda o Centro de Cultura Filosófica e com os colegas de normal, o Centro de Cultura Pedagógica.

Caíram-lhes nas mãos, nesse tempo, os primeiros livros sobre a Escola Nova. Iniciou, um movimento de rebeldia, pregando a Escola Nova, fundamentada em obras pedagógicas que eram avidamente “devoradas” pelo grupo.Concluindo a escola Normal submeteu-se a concurso para ingressar na carreira de Professor Primário do Estado. Ao finalizar a prova foi imediatamente convidado para lecionar a cadeira de Português na Escola Normal de Paranaguá. Tinha então dezessete anos. De volta a Curitiba permaneceu algum tempo como Diretor do Grupo Brandão. Nessa época conheceu Anita Camargo que exercia as funções de professora, com que veio a se casar no dia 22 de abril de 1933. Em Ponta Grossa exerceu o cargo de Diretor da Escola Normal e continuou lecionando Português.

Posteriormente prestou concurso para a cadeira de Pedagogia e logo após transferiu-se para Curitiba para lecionar essa matéria na Escola Normal. Em 1934 é nomeado para reger, em comissão a cadeira de Psicologia, Biológica Aplicada à Educação e História da Educação Normal secundária de Curitiba. Catedrático das referidas cadeiras, concursado em primeiro lugar.

Nomeado Assistente Técnico da Escola Normal de Curitiba, imprimiu ao ensino orientação segura, tornando-a bastante dinâmica. Estabeleceu para as cadeiras do currículo escolar um rodízio semestral dos professores, objetivando a sua evolução cultural em todas as áreas. Ao mesmo tempo que orientava e incentivava os professores, procurava estimular os alunos com os quais, vencendo inúmeras dificuldades fundou a “VOZ DA ESCOLA”, jornal escolar .Sua popularidade entre os alunos e a admiração que estes lhe devotavam podem ser evidenciados pelo carinho com que anos consecutivos foi convidado para paraninfar as turmas que concluíam o curso de professores.

Em abril de 1943 cria o Instituto Pestalozzi, a primeira escola que o Paraná teve, dentro de normas metodológicas avançadas e modernas… Foi sua primeira sede a casa, ainda hoje existente na Rua comendador Araújo ao lado do templo protestante. O emblema da escola, executado por Guido Viaro, mostra uma criança brincando e construindo figuras com cubos… No segundo plano erguiam-se suntuosas catedrais… “Ad templa erigenda exeo” (Eu saio para construir catedrais) lia-se no dístico aos pés da figura.

À tarde no mesmo instituto funcionava um curso de extensão cultural para as alunas do Curso Normal. Manoel Ribas, governador do estado, entusiasmado com o Instituto cedeu uma propriedade na rua visconde de Guarapuava, para onde foi transferida a Escola ao mesmo tempo que se criava ali a primeira escola de Surdos Mudos do Paraná.

Lamentavelmente, com mudanças verificadas no governo e a morte de Manoel Ribas, não podendo superar uma série de dificuldades, a escola encerrou definitivamente suas atividades. Do Instituto Pestalozzi Erasmo só guardou, o “Dunga”, doado, entre outros de seus pertences ao Museu Paranaense, após a sua morte, para o espaço, que recebeu o nome do mestre. Em “Prática da Escola Serena”, obra de notável atualidade, embora publicada há 40 anos, o Professor Erasmo nos dá os fundamentos filosóficos e metodológicos do Intituto Pestalozzi.

Em 1944 ajuda o professor Raul Rodrigues Gomes a fundar o Grupo Editorial Renascimento do Paraná (GERPA), publicando no ano seguinte, Emiliano.Em 1946 ajuda Dalton Trevisan a fundar a revista Joaquim.Em 1949, assumiu a Secretaria de Educação e Cultura. Como Secretário de Educação, visitou várias escolas em todo o Paraná, inclusive escolas isoladas, ouvindo e orientando professores. O trabalho nessa época desenvolvido está contido em seu livro ” Educação é Direito de Todos”. Alguns anos mais tarde reuniu sobre sua orientação um grupo de professores e criou a “Associação Paranaense de Estudos Pedagógicos” que realizou pesquisas educacionais em diversas áreas. Inúmeros e valiosos trabalhos foram produzidos nessa época. A maioria deles pode ser encontrada em várias monografias e em diversos números da “Revista de Pedagogia”, publicados por aquela Associação.

Aposentado de suas atividades públicas, nunca deixou de exercer atividades no magistério; na escola de Surdos e Mudos, no Centro Israelita, na Escola Normal do Colégio Novo Ateneu etc, de pesquisar e estudar incessantemente.

Esteve por duas vezes na Europa, principalmente na França, com objetivos exclusivamente culturais.

Devotado inteiramente à cultura, sempre disposto a ajudar, respondia pequenas consultas sobre os mais diversos assuntos com verdadeiras aulas, cedendo livros de sua volumosa biblioteca, sua casa na Rua Ângelo Sampaio, se transformou na Meca da cultura paranaense.

Em 1973 no dia do professor, recebeu homenagem em sua residência, sendo saudado pelo Secretário de Educação em nome do Governo do Estado por ter sido o seu nome escolhido “para simbolizar o mestre paranaense”, em agradecimento por tudo o que fez pela causa educacional do Paraná.

Em 1982 recebe da Universidade Federal do Paraná o título de Professor Honoris Causa como reconhecimento de sua importância e de sua valiosa contribuição na educação do Paraná.

Além das obras já citadas, escreveu: João Turin -1953, A Educação no Paraná-1954, Problemas abertos no Estudo dos Sistemas Escolares para o Brasil – 1958, Situações do Desenvolvimento Brasileiro e Educação -1959, Organização e Metodologia do Ensino na Primeira Série Primária nos países em desenvolvimento -1964, Graal, Fatos e Expectativas na Educação na América Latina -1965, Problemas de Educação 1966, Que se exalte em cada Mestre um Sonho! 1967, Para um Humanismo Individualista, Theodoro De Bona-1968, Dario Vellozo -1969, Mallarmé, Obras -V.1-1973, Obras -V.2 – 1976, Informe sobre Treinamento de Mestres e Alfabetização -1980, O Mural Redondo, 1987.

Faleceu em maio de 1992. Sua Biblioteca foi doada inteiramente à Universidade Federal do Paraná.

Modesto, tímido, extremamente sensível, era uma sinceridade a toda prova.

Em que pese sua sobriedade aparente, aqueles que o conheceram mais de perto e gozaram de sua afabilidade natural, sabem-no uma criatura extremamente alegre, com notável senso de humor, que amava intensamente a vida e respeitava profundamente o sentimento e a personalidade dos outros, o que demonstrava sempre, através da filosofia humanística que adotava , pregava e vivenciava em todas as oportunidades que a vida lhe ofereceu.

No dia 10 de novembro de 2004, por iniciativa de Anita Pilotto e um grupo de ex alunas, com o apoio das Secretarias de Educação do Estado e do Município, referendada pela Universidade Federal do Paraná, é realizado o lançamento do livro: “Autobiografia” de Erasmo Pilotto, o último presente deixado por ele , como contribuição à cultura e à educação do Paraná.

FONTE:
www.ieppepoficial.kit.net/erasmopilotto.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Biografia

Anair Weirich (Album de Poemas)

Pintura de Hans Arp (1886 – 1966)
PACIÊNCIA

Quem já viu algo funcionar
aos tapas e empurrões?
Nada mesmo dá certo,
quando é feito aos trambolhões!

Mas, se formos com jeitinho,
(como diz sempre a ciência…)
com amor e com carinho
tudo conseguiremos!

– Isso se chama PACIENCIA!

(do livro infantil Doce Jeito de Ser Criança)

A EMOÇÃO DE LER

– Passarinho, passarinho!
Eu também queria voar
E conhecer outros mundos…
Mas não tenho asas, nem dinheiro.

-Menininho, menininho!
Você deixe de bobagem.
Quem lê viaja ao mundo inteiro,
Sem ter que pagar passagem.

AMIGOS

Amigos vêm e vão.
Amigos são uma nação
de corações leais.
Amigos são demais!
Amigos são trigos ao sol.
São cama e lençol
para deitar-se tranqüilo.
Amigos são aquilo
de tudo o que contas.
Amigos são contas
de um colar de diamantes.
São vogais e consoantes
do alfabeto do amor.
Amigos são abrigos
da maldade e da dor.
São a segurança das pontes,
e a água das fontes!
Amigos são artigos de luxo.
Amigos são bruxos
da distância e do tempo.
Amigos são o elemento
que conta na hora H…
Amigos são maná!
São faróis no nevoeiro.
São arco e arqueiro
na precisão do alvo.
Amigos estão a salvo
das tempestades da vida.
Amigos são guarida
nas horas incautas.
Amigos são flautas
que anunciam companheirismo.
Amigos são o muro seguro
que nos protege do abismo.

(Do livro Melodias do Coração 2008)

LIMIAR DO TEMPO

Amar é…
Te encontrar,
como agora!
Só que na velhice,
de bengala,
e ainda assim
sentir a mesma emoção
que estou sentindo
nesta hora!

(Do livro Poesias do Cotidiano – 1997)

O EXEMPLO DO PIÃO

Se há uma coisa que fascina e encanta,
É ver um pião enquanto dança!
E quando estamos no nosso limite,
Olhemos o pião que rodopia,
Como se fosse um convite!

Sejamos inimigos da ociosidade.
Façamos tudo com entusiasmo
E até estardalhaço..
Viva a escandalosidade
Para sair do marasmo
E não perder o compasso.

O pião tem uma dança
Que assusta e que fascina,
Pelo espetáculo que ensina
A nos mantermos em pé
Pelo impulso.
Para o pião é insulto
Entregar-se antes
Do tempo determinado.

Mas quando fica cansado,
Nos mostra algo assustador:
Traça um círculo ao seu redor
E dentro do próprio círculo
Então cai.
Fim! Nada mais resta.
Tudo aquilo que era festa
Agora é gota que se esvai.

Tal qual o pião,
Estamos em pé,
Se estamos em movimento.
Nossa base é nossa fé,
Nossa força é o sentimento!

Tomara que na dança da vida
Haja sempre uma base plana
Para nosso pião interior girar,
Impulsionado pela força do trabalho
E pelo poder de sonhar!

(Do livro Melodias do Coração 2008)

INCÓGNITA

Moro numa rua sem saída.
A única medida para sair dela
é dando meia-volta
até chegar na esquina.
Nesta rua tem menina
brincando de sol.
Tem até bicicleta
que passeia sozinha.
Tem Luluzinha de estimação,
tem bola, tem boneca, tem canção.

Tem gato que passeia no muro
e toma sol no telhado.
Minha rua é um achado!

Tem noite de luar
e tem verso com rima.
Quem disse que quero
chegar na esquina?

Moro numa rua sem saída
que tem porta e tem janela.
Mas… quem disse
que quero sair dela?

Minha rua tem até Mercearia.
Tem linda pradaria
e tem jardim.
Quem quer sair
de uma rua assim?

(Do livro Melodias do Coração 2008)

EMBEVECIMENTO
(Homenagem a Chapecó – SC)

Sinto que conheço cada grão
da terra que compõe este chão.
Adivinho a bala do papel
que o vento leva,
e sinto que conheço seu sabor.
Conheço e sinto o perfume
de cada pétala de flor
que brota nos canteiros.
E de cada caminheiro
conheço seu sorriso
e seu semblante.
De cada margarida,
sua labuta constante.
De cada sabiá
saltitando na praça,
eu bebo seu momento.
E de cada turista
seu encantamento.
Em cada badalada
dos sinos na catedral,
é entoado um hino sem igual.
Cada canto da minha cidade
encanta de lirismo meu viver,
enternece e aquece todo meu ser.
Luzes noturnas estribilham canções
e da torre da igreja emanam orações!
Com a fronte erguida
vejo esperança e vejo vida.
Dos desenganos quase esqueço,
pois em cada melodia
que roda nas estações,
eu sinto que amo e que conheço
(Do livro Melodias do Coração 2008, homenagem a Chapecó – SC
——————————-

Nota sobre o pintor:
Hans Arp (1886 – 1966)
Hans Peter Wilhem Arp (Estrasburgo, 16 de Setembro de 1886 — 7 de Junho de 1966) foi um pintor e poeta alemão, naturalizado francês. Nasceu na Alsácia quando esta estava sobre domínio alemão. Em 1926 adquiriu a nacionalidade francesa e passou a usar o nome Jean Arp.
O pai de Arp era um empresário de origem alemã, dono de uma fábrica de cigarros e a sua mãe era de origem francesa, motivo pelo qual ele, desde muito cedo, falava fluentemente as duas línguas.
Em 1900 inscreveu-se na Escola de Artes e Ofícios em Estrasburgo, onde nunca chegou a ser bom aluno, pois não se interessava pelas matérias curriculares. Durante o ano de 1901 teve aulas de desenho com Georges Ritleng. Arp que era um admirador da poesia alemã, em 1903 publicou algumas obras literárias.
Em 1907 inscreveu-se na Academia Julian. Em 1911, juntamente com Oscar Lüthy e Walter Helbig, foi o fundador do grupo de artistas suiços, designado por Der Moderne Bund. Em 1912 conhece Kandinsky em Munique, e em 1914 dá-se com August Macke e Max Ernst, em Colónia.
Em 1915, durante a Primeira Guerra Mundial, foi viver para Zurique, em virtude de possuir nacionalidade alemã. Nesse ano casou com Sophie Taeuber, que veio a falecer, em 1943, enquanto ocorria a Segunda Guerra Mundial. No ano de 1920, Arp participa numa exposição dadaístita, em Colónia, com Baargeld e Max Ernst. Conhece Breton, e colabora em diversas publicações de conteúdo vanguardista, com poemas e collages. Em 1925, Arp junta-se a um grupo de surrealistas saídos do movimento dada, e expõe em Paris.
Versátil na sua obra, a década de 1930 é dedicada a trabalhos na perspectiva da abstracção geométrica, collages e grafismos com relevo. Na década seguinte, Arp, sempre em mudança, centra o seu trabalho na escultura.
Em 1959, casou em segundas núpcias com Marguerite Hagenbach. A sua obra atinge a fama nos anos 1950 e 60, quando expõe em Nova Iorque (1958) e Paris (1962).

Fontes:
http://anairweirich.blogspot.com/
http://antologiamomentoliterocultural.blogspot.com/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Hans_Arp

Deixe um comentário

Arquivado em A Poetisa no Papel, Biografia, Pintor, Poemas, Poesias

Anair Weirich (A Escritora em Xeque)

Anair Weirich é uma guerreira. Há mais de quinze anos na estrada, ela tornou-se bastante conhecida em Santa Catarina pela sua incansável rotina de viagens pelo estado comercializando livros – tanto seus quanto de colegas escritores. Participante de inúmeras feiras, divulgadora da cultura literária catarinense, Anair, abaixo, fala um pouco sobre sua vida, suas estratégias para venda de suas obras, suas dívidas nas gráficas, suas andanças e histórias….

*Nome:

Anair Weirich

*Data e local de nascimento:

02-11-51 – Chapecó – SC

*Fale um pouco de sua vida e carreira.

A poesia é a grande paixão da minha vida. Prosa é complemento, mensagem é complemento… E a única coisa que nunca deixo de pedir a Deus todas as noites, é saúde, por que sem ela eu não poderia andar tudo que ando o dia todo, visitando escolas, empresas e livrarias, vendendo meus livros, e quando estou de carro com meu marido, vendendo os livros de autores da terra também…

*Como é ser uma escritora praticamente independente hoje no sul do Brasil?

É viver endividada em gráficas. Estou sempre devendo, mas estou sempre mandando fazer. E ver um olhar brilhando quando alguém ouve ou lê minha poesia, para mim, é mais pagamento do que o dinheiro que me dão pelo livro. Mas acabo de passar pela experiencia de ter um livro saído por editora. Gostei porque meu nome foi pra mais de 8.000 endereços, junto com o convite. E gostei porque a Hemisfério Sul é um nome respeitável, e porque minha amiga Urda, sua proprietária, – ela é a autora mais conhecida de SC- é uma pessoa maravilhosa e fizemos uma ótima parceria.

*O que lhe levou a viajar tanto para vender seus livros?

Depois de nove anos, meu primeiro livro saiu – 1995 – e o que poderia vender na minha cidade, já tinha vendido. O que faria com o resto? Meu marido, – grande incentivador do meu trabalho – sugeriu viajar e vender, dando palestras em escolas e eventos. E deu certo, mais do que certo. Cada carta que recebo dos meus leitores, é um incentivo para continuar. Tudo tem sido muito incentivador.

*Conte algumas histórias marcantes que você já viveu na estrada ou em cidades que esteve?

Foram tantas… tantas. Bom, numa viagem de volta de Laranjeiras do Sul PR, para Chapecó, eu vi que o cobrardor olhava muito para mim, mas esqueci disso e adormeci. Quando cheguei, ele disse: Moça… a renda preta da tua calcinha vermelha está aparecendo….e não é que meu zíper estava aberto o tempo todo, enquanto eu dormia?

*Como é a recepção das pessoas em geral? Já ouvi pessoas falando mal e considerando “coitados” aqueles que vendem livros porta a porta. O que acha disso?

Os cultos, me recebem bem, e me incentivam e compram. Os que não tem cultura, me recebem com a cara amarrada e eu quebro o gelo. Esse é o desafio que mais gosto. Eu recito uma poesia, derreto o gelo e geralmente compram. E nunca enfiei um livro goela abaixo nesses 14 anos.

*Como você vê a literatura hoje aqui no sul?

É difícil, mas quanto mais difícil, mais gosto. Tudo que é fácil não tem graça.

*Você tem estratégias especiais para vender seus livros. Marcadores ecológicos, por exemplo. Fale um pouco sobre isso.

De novo meu marido entra na história. Ele tira o invólucro das sementes das árvores de Jacarandá Mimoso, lixa, fura, pinta e monta marcadores ecológicos que viram colar de pescoço. E também ele perfuma meus livros com óleo puro de rosas, que custa quatrocentos reais o litro. Ele pega um conta gostas e perfuma de um em um. Quero que cada um, ao ver meu nome nos livros, lembrem do cheiro de rosas…

*Você vende livros de outros escritores também? Como isso funciona? Eles lhe procuram e lhe dão seus livros para que você faça as vendas? Qual a sua percentagem de ganho por livro vendido?

Bom, só levo autores da terra, quando vou em algum evento ou estou de carro, com meu marido. Quando estou de onibus, não dá… Mas é um acervo flutuante, um dia acaba um, outro dia nasce outro. Alguém tem que se doer pelos autores regionais. Tem muito café no bule escondido em armários e gavetas.

*Você tem um sebo também? Tem funcionários trabalhando pra você ou você consegue trabalhar nele de vez em quando, já que muito viaja?

Não, o Sebo meu marido e eu demos pra nossa filha de 21 anos, estudante de biologia. A família toda é apaixonada por livros. E quando eu não aguentar mais viajar, quero o meu Sebo, pra estar no meu habitat natural.

*Quantos livros em media você vende de cada novo livro que publica?

O “Mensagens para um dia melhor”, vendi em torno de duzentos mil de 1999 pra cá, e o Livro Ludico das cores, por se tratar de um livro diferente, vai ser minha aposentadoria, nunca mais posso ficar sem ele. O meu primeiro de poesia, vendi oito mil, mil ex. cada edição. Alguns outros, eu fiz menos. E amo criança e poesia infantil, amo meeeesmo!

*200.000 (duzentos mil) livros em 11 anos? Isso é possível para um autor independente? Calculando por cima, para que isso aconteça, (4015 dias em 11 anos) é necessário que você tenha vendido 50 livros por dia aproximadamente, o que também lhe daria muito dinheiro, a ponto de poder viver só de literatura – o que você diz nesta mesma entrevista que não dá. Seu cálculo está realmente certo? Em que você se baseia para dar este número?

Tá, vamos lá: É que quando ele nasceu, – o Mensagens para um dia melhor, – em 99, foi no auge da venda desse estilo de livrinhos. Hoje já não se vende tanto. Tinha escolas e prefeituras, nos primeiros anos, que eu vendia 200, 300 ou até mais por dia, para o dia do Professor, para festas de final de ano, para escolas que davam presentes nos aniversários, e assim, na quantia, eu ganhava na média de um real cada livro. Quando vendia avulso, em eventos tipo feira de livros e palestras, minha margem era maior. Foi quando uma gráfica, de Erechim, me passou a perna. Eles me convenceram a passar a imprimir com eles, e então, em vez de executar a minha edição de 10.000 ex., eles executaram muuuuuuuuuuito mais e ficaram com os livros. E de lá pra cá a venda foi caindo, caindo, por causa da competitividade que a própria gráfica criou, coletando material da internet ou editando material sem pagar direitos autoriais de outros autores. Enfim, é um número estimativo, o que nos deu, nesses anos de boas vendas, um carro, – que hoje está bem judiadinho, pois fomos trocando, na medida em que fomos nos apertando. e também móveis novos e outras coisas mais. E depois, eu ganhava bem, mas gastava bem. Nunca liguei pra luxo, mas conforto, nas minhas viagens, é fundamental, pra que no outro dia esteja disposta para andar o dia todo ou fazer palestras o dia todo. Há também os hotéis, as passagens de ônibus, e eu, por mais que coma pouco, gosto de comer bem, sou um pouco chata. E tenho mania de comprar presentes pra todo mundo, sou muito perdulária – rss. Mas mesmo assim, garanto pra você, a gente se aperta e muito. Vivo atolada na gráfica, pois cada livro que executam, fico devendo em média de sete a dez mil exemplares, e eles me dão pouco prazo. E de uns anos pra cá, sempre tenho comigo de tres a cinco títulos diferentes. Enfim, pode colocar aí uma quantia bem menor, se quiser, pois mais que um já me questionou, e embora o número seja mais ou menos isso, não quero encrencas com o leão.

*Usa o dinheiro que consegue ganhar para investir num próximo e em alguma outra coisa ou sobra suficiente para que consiga fazer boas economias?

Autor independente nunca tem dinheiro sobrando, tá sempre devendo. Mas temos nossa casa e nosso carrinho. E trabalho há quatorze anos em um livro que é minha auto biografia, desde que comecei a viajar, vivendo de livros na região Sul. Tive que trocar o titulo, porque qualquer coisa que lembre motivação é malhado pela crítica… se bem que que críticos não são críticos, são só cretinos.

*De tudo que já escreveu, o que você gosta mais? Qual seu livro ou texto melhor na sua opinião, que sempre gosta de vender e até oferece com mais brilho nos olhos?

É o que citei antes, o Livro ludico das cores. Tem que entrar no meu site pra conhecer. http://www.literaturacatarinense.com.br/anair

Você é uma escritora ativa, feliz e bastante apaixonada pelo que faz. Você se preocupa com o reconhecimento ou busca sucesso nacional? Se sim, acha que isso é possível?

Nem tô com fama, isso é vaidade, só quero fazer o que gosto e pronto.

*Deseja dizer mais alguma coisa ou deixar alguma mensagem?

Que adoro ler e leio de tudo. Acabo de ler o livro de Fernando Morais, O Mago. Cara… mago é – o Fernando – ele, que conseguiu contar com elegancia todas as barbaridades do Paulo Coelho. Eu jamais imaginaria que foi o Paulo que meteu o Raul Seixas nas drogas.
E baseada na minha experiencia pessoal de luta, quero deixar um recado bem meu:
É DO QUERER ARDENTE QUE NASCE A CONQUISTA DA VITÓRIA.

Fonte:
Escritores do Sul

Deixe um comentário

Arquivado em A escritora em xeque, Contos, Entrevista, Entrevistas, Trovas

21º Concurso de Contos Paulo Leminski – 2010

O evento é uma atividade em parceria entre UNIOESTE/CAMPUS DE TOLEDO e PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE TOLEDO através BIBLIOTECA PÚBLICA MUNICIPAL DE TOLEDO – CENTRO

CRONOGRAMA

Inscrição: 14 de maio a 30 de agosto de 2010

Comissão Julgadora: 20 a 28 de setembro de 2010

Premiação: 23 de outubro de 2010

INFORMAÇÕES

Unioeste – Campus de Toledo – PR – Telefone: (45) 3379.7091
Biblioteca Pública Municipal – Telefones: (45) 3252.6225 e (45) 3055.8790
biblioteca@toledo.pr.gov.br
concursopauloleminski@toledo.pr.gov.br

Regulamento do Concurso

1.O Concurso destina-se a todas as pessoas interessadas e cada concorrente poderá participar com apenas um trabalho que ainda não tenha sido premiado em outro concurso. O tema é livre e a inscrição é gratuita.

2.Consideram-se inscritas as obras entregues sob protocolo ou enviadas pelos correios (com registro A.R.), endereçadas à Unioeste/Campus de Toledo ou à Biblioteca Pública Municipal de Toledo, Paraná.

2.1- Unioeste – Campus de Toledo – Fone: (045) 3379.7000; r. 3379-7091 – Rua da Faculdade, 645 CEP: 85903-000 Caixa Postal 320 – Toledo – PR.

2.2- Biblioteca Pública Municipal de Toledo – Av. Tiradentes, 1165 CEP: 85900-230 – Toledo – PR.

3. O conto deverá ser apresentado em 02 (duas) vias, escrito em língua portuguesa ou espanhola, digitado em espaço 1,5 (um e meio), com fonte Arial, tamanho 12 (doze), de um só lado do papel, e obedecer um limite máximo de 20 (vinte) páginas.

4.Deverá constar, no interior do envelope que contém o trabalho, um outro envelope menor, contendo em seu interior uma folha na qual constem o título do conto, pseudônimo, nome completo do autor, seu endereço, telefone, R.G., e-mail e grau de instrução. E, na parte externa desse pequeno envelope, deverão constar apenas o pseudônimo do autor e o título do conto a ser inscrito no concurso.

5. A comissão julgadora será composta por sete membros de reconhecido nível intelectual e acadêmico, sendo sua decisão soberana e irrecorrível.

6. Premiação:
Primeiro prêmio: R$ 1.800,00 – (Hum mil e oitocentos reais);
Segundo prêmio: R$ 1.350,00 – (Hum mil e trezentos e cinquenta reais)
Terceiro prêmio: R$ 1.000,00 – (Hum mil reais)
Quarto prêmio: (Melhor Conto Toledano): R$ 850,00 – (Oitocentos e cinquenta reais)

NOTA: A eventual premiação de trabalho que já tenha sido premiado em outro concurso implicará na obrigatoriedade de devolução do prêmio pelo respectivo candidato.

7. A relação dos contos classificados para premiação e os indicados com menções honrosas será publicada nos órgãos de imprensa da região e nos portais web das instituições promotoras do concurso. Posteriormente, a cada período de cinco anos, os contos serão publicados sob forma de coletânea, reunindo os contos premiados e os que tenham recebido menção honrosa. Por ocasião de seu lançamento, os respectivos autores receberão um determinado número de volumes em seu domicílio, no endereço por eles fornecido.

7.1 Os contos premiados consideram-se propriedade da Unioeste e Prefeitura Municipal de Toledo – Biblioteca Pública Municipal, entidades realizadoras do Concurso de Contos Paulo Leminski, para finalidade de publicação da Coletânea de Contos; e aqueles que tenham recebido menções honrosas serão incluídos nessa coletânea mediante cessão de direitos por seus respectivos autores, por meio de documento legal, no caso de que se viabilize uma edição com finalidade de venda para subsídio e auto-sustentação do próprio concurso.

7.2 O produto da potencial venda das coletâneas será depositado na conta da Fundação Universitária – Unioeste ou da conta da Associação dos Amigos da Biblioteca Pública Municipal de Toledo PR – CNPJ 08.774.965/0001-43 – cujo fundo se destina exclusivamente para cobertura dos custos de divulgação, comissão julgadora e premiação das subseqüentes edições do Concurso de Contos Paulo Leminski.
.

8.O resultado do concurso será divulgado na imprensa e na Internet, nos seguintes portais das instituições promotoras do evento: http://www.unioeste.br/leminski e http://www.toledo.pr.gov.br

9. Para a devolução dos contos, as despesas de postagem serão de responsabilidade do solicitante, devendo para tanto enviar envelope já selado, constando nele os dados do destinatário. O conto estará à disposição de seu autor após a divulgação do resultado do concurso por um período de 30 (trinta) dias. Após este prazo, eles serão incinerados.

10. O encaminhamento dos trabalhos na forma prevista neste regulamento implica na concordância com as disposições nele consignadas.

APOIO
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
FRIGOBRÁS SADIA
UNIMED COSTA-OESTE (TOLEDO – PR)

Fonte:
Escritores do Sul.

Deixe um comentário

Arquivado em Concursos em Andamento

XVII Concurso Literário Internacional “Prêmio Cidade de Conselheiro Lafaiete”

A ACADEMIA DE CIÊNCIAS E LETRAS DE CONSELHEIRO LAFAYETTE torna pública as normas para o XVII Concurso Literário Internacional “Prêmio Cidade de Conselheiro Lafaiete”, que será regido pelas seguintes disposições:

DOS OBJETIVOS

Art. 1º. O “Prêmio Cidade de Conselheiro Lafaiete” foi instituído em 1994 pela Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette – ACLCL – e vem sendo concedido anualmente, ininterruptamente, com o objetivo de incentivar e divulgar a cultura literária, tanto em prosa como em verso, e estimular a produção e a divulgação das obras de poetas e prosadores em língua portuguesa.

DA ABRANGÊNCIA

Art. 2º. Poderão participar do concurso quaisquer escritores em língua portuguesa, que possuam maioridade civil na data da inscrição, observada a legislação dos países de origem.

DAS CATEGORIAS

Art. 3º. Os trabalhos poderão ser inscritos nas categorias abaixo discriminadas e deverão obedecer às características a elas pertinentes:

a) Conto;
b) Crônica;
c) Poema (exceto soneto);
d) Soneto.

Art. 4º. Os trabalhos deverão ser inéditos, inclusive em meio eletrônico.

Parágrafo único – Caso seja detectada a participação de trabalho que não seja inédito, se a detecção for feita antes da premiação, o trabalho será desclassificado; se for feita depois, o prêmio será cassado, sem prejuízo das ações judiciais cabíveis.

DA INSCRIÇÃO

Art. 5º. A inscrição dar-se-á com o envio dos trabalhos e da documentação exigida para: Concurso Literário Internacional “Prêmio Cidade de Conselheiro Lafaiete”, Caixa Postal 111, Conselheiro Lafaiete – MG, CEP.: 36.400-000.

Art. 6º. O prazo de inscrição é de 1º. (primeiro) de junho a 30 (trinta) de setembro de 2010 (dois mil e dez).

§ 1º. Para a inscrição de trabalhos será considerada a data da postagem.
§ 2º. Os trabalhos inscritos fora do prazo estarão automaticamente desclassificados.
§ 3º. Deverá constar como remetente o mesmo endereço do destinatário, ou seja, Caixa Postal 111, 36.400-000, Conselheiro Lafaiete, MG, para que não haja identificação.

Art. 7º. Os trabalhos deverão ser enviados em 3 (três) vias, impressos em um só lado do papel, e deverão conter, no cabeçalho da primeira folha, nesta ordem: a categoria em que concorrem, o pseudônimo do autor e o título do trabalho.

Parágrafo único – Qualquer informação, no trabalho ou em seu teor, ou em qualquer parte do envelope externo, que identifique o autor, tornará o trabalho, automaticamente, desclassificado.

Art. 8º. Juntamente com o(s) trabalho(s), deverá ser enviado um envelope lacrado, identificado externamente apenas com o pseudônimo do autor e o nome das obras com as quais concorre, e dentro do qual deverão estar:

a) O nome completo do autor e o seu pseudônimo;
b) As categorias e os nomes dos trabalhos com os quais concorre;
c) O endereço convencional completo do autor e o número de ao menos um telefone para contato;
d) Endereço eletrônico (e-mail) para contato, se possível, podendo ser de uma pessoa conhecida;
e) Cópia legível do documento de identidade do autor;
f) Comprovante de depósito da taxa de inscrição. Parágrafo único – Será automaticamente desclassificado o concorrente que usar o mesmo pseudônimo com que concorreu na versão 2009 deste concurso.

Art. 9º. A taxa de inscrição é de R$10,00 (dez reais) por trabalho inscrito.

§ 1º. – Cada autor poderá concorrer com até 3 (três) trabalhos por categoria.
§ 2º. – O depósito deverá ser feito na conta corrente n. 11229-3 da agência n. 1429 do Banco Itaú S.A, em favor da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette, CNPJ n. 73.716.680/0001-18.
§ 3º. – As inscrições que partirem de fora do território brasileiro ficarão isentas do pagamento da taxa de inscrição que, sendo simbólica, ocasionará mais ônus com o envio do dinheiro do que com a própria taxa de inscrição, ficando substituída pelas majoradas despesas de postagens internacionais.

DO JULGAMENTO

Art. 10. O julgamento dos trabalhos será feito por uma junta de 3 (três) julgadores para cada categoria. Parágrafo único – Os nomes dos 12 (doze) julgadores, de ilibada reputação e de reconhecida capacidade lingüística e literária, serão indicados pela Comissão Organizadora e aprovados pela Assembleia Geral Ordinária da ACLCL.

Art. 11. O julgador atribuirá a cada trabalho, individualmente, nota de 5 (cinco) a 10 (dez), admitidas três casas decimais.

Art. 12. Não será admitido empate em uma mesma categoria, nas 5 (cinco) primeiras colocações. Havendo notas coincidentes, o desempate será feito pelo critério idade, saindo vencedor o concorrente mais novo, com o objetivo de incentivo.

DA DIVULGAÇÃO DO RESULTADO

Art. 13. O resultado estará disponível no site da ACLCL (www.aclcl.org.br) a partir do dia 30.10.2010 (trinta de outubro de dois mil e dez). Parágrafo único – A ACLCL enviará comunicado aos classificados até o 5º. (quinto) lugar em cada categoria.

DA PREMIAÇÃO

Art. 14. Serão concedidos, aos autores dos trabalhos que obtiverem as 5 (cinco) primeiras colocações em cada categoria, os seguintes prêmios:
1º. lugar – troféu, certificado e publicação, sem ônus para o autor, em antologia;
2º. e 3º. lugares – medalha, certificado e publicação, sem ônus para o autor, em antologia;
4º e 5º. lugares – certificado.

Parágrafo único – As publicações em antologia dependerão de autorização prévia, por escrito, do autor, que, autorizando, receberá 1 (um) exemplar da publicação.

Art. 15. Independente da classificação anterior, a mesma premiação será concedida, sob as mesmas condições, como prêmio especial, aos trabalhos que versarem sobre a cidade de Conselheiro Lafaiete.

Art. 16. Os originais não serão devolvidos sob nenhuma hipótese e, após divulgados os resultados, serão incinerados.

Art. 17. A solenidade de premiação será realizada na festividade de fim de ano da ACLCL, no Município de Conselheiro Lafaiete, em data, local e horário a serem divulgados juntamente com o resultado do concurso.

Parágrafo único – Caso não possa comparecer à solenidade de premiação, é facultado ao ganhador fazer-se representar.

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 18. A ACLCL não remeterá os prêmios, por qualquer meio, aos ganhadores. Parágrafo único – Os prêmios dos que não comparecerem e não se fizerem representar, ficarão à disposição na sede da ACLCL, mediante contato prévio, até 90 (noventa) dias após a solenidade de premiação, quando serão inutilizados.

Art. 19. Os inscritos, pelo simples ato de inscrição, declaram concordar com todas as disposições do presente edital.

Parágrafo único – O não cumprimento, por qualquer inscrito, das disposições deste edital,tornará a inscrição sem efeito.

Art. 20. Os casos omissos serão resolvidos pela Comissão Organizadora, cuja
decisão será irrecorrível, respeitadas as leis maiores.

Conselheiro Lafaiete, 29 de maio de 2010.
Douglas de Carvalho Henriques
Presidente

Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette – Caixa Postal 111 – Conselheiro Lafaiete – MG – CEP.: 36.400-000 – aclclafayette@gmail.com

Deixe um comentário

Arquivado em Concursos em Andamento

Aparecido Raimundo de Souza (História que a Vida Escreveu)

Fazem exatamente dois anos que nenhuma pessoa de minha família aparece aqui. Estou num asilo para velhos desamparados desde que completei setenta e um anos. Sou pai de quatro filhos. Um rapaz com a primeira esposa, uma mocinha com a segunda e duas com a terceira. Por circunstâncias outras, não pude criar meu primogênito, como pretendia, desde que nasceu. De igual forma, o destino foi demasiadamente cruel também com a menina.

Depois desses casamentos fracassados, uma dezena de jovens passaram pela minha vida, mas por convicção própria achei por bem não alimentar a idéia de começar tudo outra vez. Assim, os anos correram. O tempo, bem sei, não retroage. Meus cabelos brancos refletem a velhice que pesa de maneira latente por sobre os costados. Não sou mais aquele homem cheio de forças e vitalidade, de mãos firmes, braços fortes e cabeça erguida. Meus pés quedaram-se num cansaço embaraçoso. As vistas perderam o brilho. O pouco que consigo enxergar são imagens difusas, povoadas por brancas nuvens, manchadas, porém, de um escuro estranho que fazem-me tremer de medo e pavor. A cabeça gira e mistura-se num redemoinho de coisas e fatos passados. Sofro. O coração bate, às vezes, devagar, outras descompassado. Na verdade, o coitado pulsa como se não tivesse vontade de fazê-lo. As horas arrastam-se. Os dias estendem-se pela ampla janela debruçados sobre o peitoril e desperdiçam-se numa lentidão massacrante, atormentando e ferindo a alma combalida, moída, sofrida, morta.

Ontem – Meu Deus! – ontem minha garotinha completou quinze anos!…

Por um instante fecho os olhos e viajo. Estou em sua festa de “debut”. Vejo, então, a pequena, cercada por dezenas de coleguinhas. Como ficou linda!

Não é que lhe caiu como em uma princesa o vestido branco? Tanta gente ao redor, o bolo, as velinhas, os presentes amontoados no sofá, balões de gás colorindo, bandeirinhas espalhadas por todos os cantos da sala…

Será que ela pensa em mim?

As minhas reflexões correm mais longe. Na verdade galopam. Voam. Agora chegam ao Rio de Janeiro. Vejo-me de mãos dadas com um menino. Calças curtas, pezinhos no chão, suplica-me colo. Quer um doce. Prometo comprar. E asseguro não afastar-me jamais do seu lado…

De repente minha cabeça embaralha. E quem aparece? Minha filha numero três. Pobrezinha! Essa pequena veio ao mundo marcada. Logo, ao nascer, um balde de água fria gelou minha emoção ao final dos nove meses de espera. Lábios leporinos. O rostinho, lindo, sem igual, mas um cortezinho na boquinha deformava tudo. A vida é cruel, e por vezes, quebra as certezas que carregamos. Costuma, o destino, transformar nossos sonhos em trágicas realidades. Vontades retalham-se Despedaçam em nada os caminhos mais seguros e alguém, com mão forte, alguém escondido, afasta para além dos limites do superável tudo e todos que nos são caro.

Alguns dias atrás, um companheiro de quarto (está com câncer), vendo meu semblante aflito e os olhos chorosos, sentou-se a meu lado e com a voz embargada tentou reanimar-me:

Coragem, meu amigo, coragem. Seu barco é o mesmo que o meu. Nosso rumo é lugar nenhum. O destino, idem! Mas não esqueça nunca de uma coisa: estamos aqui, unidos para o que der e vier…e como vier…

Se fosse dado a mim, neste momento, exatamente neste ponto do caminho em que suplico à Deus que me tire o ar que respiro, a vida, se nesta hora amarga caísse dos céus a chance de pedir alguma coisa, uma apenas que fosse, rogaria somente que uma boa alma colocasse no aparelho de som o Cd com a musica que fiz para minha filha de número dois, logo que nasceu. Falha-me um pouco a memória, mas a letra da canção diz mais ou menos assim:

“…Você chegou pisando de mansinho
e pela porta entreaberta vi entrar
um vendaval de flores vivas em carinho
com certeza só o amor pode nos dar
Qual borboleta flutuando pelo ar
lança as asas no azul e se agita
mostra aos raios do sol da primavera
os seus encantos de menina tão bonita”…

Fonte:
http://www.paralerepensar.com.br/aparecidoraimundo.htm

3 Comentários

Arquivado em O Escritor com a Palavra

Simões Lopes Neto (A Mboitatá)

A Andrade Neves Neto

Foi assim:

Num tempo muito antigo, muito, houve uma noite tão comprida que pareceu que nunca mais haveria luz do dia.

Noite escura como breu, sem lume no céu, sem vento, sem serenada e sem rumores, sem cheiro dos pastos maduros nem das flores da mataria.

Os homens viveram abichornados, na tristeza dura; e porque churrasco não havia, não mais sopravam labaredas nos fogões e passavam comendo canjica insossa; os borralhos estavam se apagando e era preciso poupar os tições…

Os olhos andavam tão enfarados da noite, que ficavam parados, horas e horas, olhando, sem ver as brasas vermelhas do nhanduvai… as brasas somente, porque as faíscas, que alegram, não saltavam, por falta do sopro forte de bocas contentes.

Naquela escuridão fechada nenhum tapejara seria capaz de cruzar pelos trilhos do campo, nenhum flete crioulo teria faro nem ouvido nem vista para bater na querência; até nem sorro daria no seu próprio rastro!

E a noite velha ia andando… ia andando…

Minto:

no meio do escuro e do silêncio morto, de vez em quando, ora duma banda ora doutra, de vez em quando uma cantiga forte, de bicho vivente, furava o ar: era o téu-téu ativo, que não dormia desde o entrar do último sol e que vigiava sempre, esperando a volta do sol novo, que devia vir e que tardava tanto já…

Só o téu-téu de vez em quando cantava; o seu – quero-quero! – tão claro, vindo de lá do fundo da escuridão, ia aguentando a esperança dos homens, amontoados no redor avermelhado das brasas.

Fora disto, tudo o mais era silêncio; e de movimento, então, nem nada.

Minto:

na última tarde em que houve sol, quando o sol ia descambando para o outro lado das coxilhas, rumo do minuano, e de onde sobe a estrela-d’alva, nessa última tarde também desabou uma chuvarada tremenda; foi uma manga d’água que levou um tempão a cair, e durou… e durou…

Os campos foram inundados; as lagoas subiram e se largaram em fitas coleando pelos tacuruzais e banhados, que se juntaram, todos, num: os passos cresceram e todo aquele peso d’água correu para as sangas e das sangas para os arroios, que ficaram bufando, campo fora, campo fora, afogando as canhadas, batendo no lombo das coxilhas. E nessas coroas é que ficou sendo o paradouro da animalada, tudo misturado, no assombro. E era terneiros e pumas, tourada e potrilhos, perdizes e guaraxains, tudo amigo, de puro medo. E então!…

Nas copas dos butiás vinham encostar-se bolos de formigas; as cobras se enroscavam na enrediça dos aguapés; e nas estivas do santa-fé e das tiriricas boiavam os ratões e outros miúdos.

E, como a água encheu todas as tocas, entrou também na cobra-grande, a – boi guaçu – que, havia já muitas mãos de luas, dormia quieta, entanguida. Ela então acordou-se e saiu, rabeando.

Começou depois a mortandade dos bichos e a boi guaçu pegou a comer as carniças. Mas só comia os olhos e nada, nada mais.

A água foi baixando, a carniça foi cada vez engrossando, e a cada hora mais olhos a cobra-grande comia.

Cada bicho guarda no corpo o sumo do que comeu.

A tambeira que só come trevo maduro, dá no leite o cheiro doce do milho verde; o cerdo que come carne de bagual nem vinte alqueires de mandioca o limpam bem; e o socó tristonho e o biguá matreiro até no sangue tem cheiro de pescado. Assim também, nos homens, que até sem comer nada, dão nos olhos a cor de seus arrancos. O homem de olhos limpos é guapo e mão-aberta; cuidado com os vermelhos; mais cuidado com os amarelos; e, toma tenência doble com os raiados e baços!…

Assim foi também, mas doutro jeito, com a boiguaçu, que tantos olhos comeu.

Todos – tantos, tantos! que a cobra-grande comeu -, guardavam, entranhado e luzindo, um rastilho da última luz que eles viram do último sol, antes da noite grande que caiu… E os olhos – tantos, tantos! – com um pingo de luz cada um, foram sendo devorados; no princípio um punhado, ao depois uma porção, depois um bocadão, depois, como uma braçada.

E vai, como a boi guaçu não tinha pêlos como o boi, nem escamas como o dourado, nem penas como o avestruz, nem casca como o tatu, nem couro grosso como a anta, vai, o seu corpo foi ficando transparente, transparente, clareado pelos miles de luzezinhas, dos tantos olhos que foram esmagados dentro dele, deixando cada qual sua pequena réstia de luz. E vai, afinal, a boi guaçu toda já era uma luzerna,um clarão sem chamas, já era um fogaréu azulado, de luz amarela e triste e fria, saída dos olhos, que fora guardada neles, quando ainda estavam vivos…

Foi assim e foi por isso que os homens, quando pela vez primeira viram a boi guaçu tão demudada, não a conheceram mais. Não conheceram e julgando que era outra, muito outra, chamam-na desde então, de boitatá, cobra de fogo, boitatá, aboitatá!

E muitas vezes a boitatá rondou as rancheiras, faminta, sempre que nem chimarrão. Era então que o téu-téu cantava, como bombeiro.

E os homens, por curiosos, olhavam pasmados, para aquele grande corpo de serpente, transparente – tatá, de fogo – que media mais braças que três laços de conta e ia alumiando baçamente as carquejas… E depois, choravam. Choravam, desatinados do perigo, pois as suas lágrimas também guardavam tanta ou mais luz que só os olhos e a boitatá ainda cobiçava os olhos vivos dos homens, que já os das carniças a enfaravam…

Mas, como dizia:

na escuridão só avultava o clarão baço do corpo da boitatá, e era por ela que o téu-téu cantava de vigia, em todos os flancos da noite.

Passado um tempo, a boitatá morreu; de pura fraqueza morreu, porque os olhos comidos encheram-lhe o corpo mas lhe não deram substância, pois que sustância não tem a luz que os olhos em si entranhada tiveram quando vivos… Depois derebolar-se rabiosa nos montes de carniça, sobre os couros pelados, sobre as carnes desfeitas, sobre as cabelamas soltas, sobre as ossamentas desparramadas, o corpo dela desmanchou-se, também como cousa da terra, que se estraga de vez.

E foi então, que a luz que estava presa se desatou por aí.

E até pareceu cousa mandada: o sol apareceu de novo!

Minto:

apareceu sim, mas não veio de supetão. Primeiro foi-se adelgaçando o negrume, foram despontando as estrelas; e estas se foram sumindo no coloreado do céu; depois foi sendo mais claro, mais claro, e logo, na lonjura, começou a subir uma lista de luz… depois a metade de uma cambota de fogo… e já foi o sol que subiu, subiu, subiu, até vir a pino e descambar, como dantes, e desta feita, para igualar o dia e a noite, em metades, para sempre.

Tudo o que morre no mundo se junta à semente de onde nasceu, para nascer de novo: só a luz da boitatá ficou sozinha, nunca mais se juntou com a outra luz de que saiu.

Anda sempre arisca e só, nos lugares onde quanta mais carniça houve, mais se infesta. E no inverno, de entanguida, não aparece e dorme, talvez entocada.

Mas de verão, depois da quentura dos mormaços, começa então o seu fadário.

A boitatá, toda enroscada, como uma bola – tatá, de fogo! – empeça a correr o campo, coxilha abaixo, lomba acima, até que horas da noite!…

É um fogo amarelo e azulado, que não queima a macega seca nem aquenta a água dos manantiais; e rola, gira, corre, corcoveia e se despenca e arrebenta-se, apagado… e quando um menos espera, aparece, outra vez, do mesmo jeito!

Maldito! Tesconjuro!

Quem encontra a boitatá pode até ficar cego… Quando alguém topa com ela só tem dois meios de se livrar: ou ficar parado, muito quieto, de olhos fechados apertados e sem respirar, até ir-se ela embora, ou, se anda a cavalo, desenrodilhar o laço, fazer uma armada grande e atirar-lhe em cima, e tocar a galope, trazendo o laço de arrasto, todo solto, até a ilhapa!

A boitatá vem acompanhando o ferro da argola… mas de repente, batendo numa macega, toda se desmancha, e vai esfarinhando a luz, para emutilar-se de novo, com vagar, na aragem que ajuda.
Campeiro precatado! reponte o seu gado da querência da boitatá: o pastiçal, aí faz peste….

Tenho visto!

Fonte:
http://www.lendas-gauchas.radar-rs.com.br/boitata.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Rio Grande do Sul, O Escritor com a Palavra

Ialmar Pio Schneider (Soneto II)

Eu te recordo em minha fantasia
plena do belo sobrenatural,
pois hoje representas a magia
dentro do meu viver sentimental.

Após a noite insone, surge o dia
primaveril e sempre tão banal,
quando me abate a triste nostalgia
de tua ausência, oh! mulher fatal.

Fora melhor, talvez, não ter amado
quem tanto quis, sem ser correspondido,
num momento qualquer do meu passado…

E quando me reporto à juventude,
lamento em vão o tempo despendido
em ter amado alguém mais do que pude.

CANOAS (RS) – 28./09./93

Fonte:
O Autor

Deixe um comentário

Arquivado em Soneto.

Revista Veja Digitalizada (Leia Grátis!)

Link de acesso a todas as revistas Veja, editadas pela Abril nesses últimos 40 anos.

Da capa a contra-capa, incluindo todas as páginas.

É um trabalho impressionante e servirá como fonte de consulta e garimpagem de dados para efetivação de eventuais trabalhos de pesquisa.

A revista VEJA abre todo o seu acervo de 40 anos de existência na internet.

Todas as edições poderão ser consultadas na íntegra em formato digital no endereço:

http://veja.abril.com.br/acervodigital/

A revista liberou o acervo em comemoração ao seu aniversário de 40 anos.

A primeira edição de VEJA foi publicada em 11 de setembro de 1968.

O sistema de navegação é similar ao da revista em papel: o usuário vai folheando as páginas digitais com os cliques do mouse.

O acervo apresenta as edições em ordem cronológica, além de contar com um sistema de buscas, que permite cruzar informações e realizar filtros por período e editorias.

Também é possível acessar um conjunto de pesquisas previamente elaborado pela redação do site da revista, com temas da atualidade e fatos históricos.

Com investimento de R$ 3 milhões, o projeto é resultado de uma parceria entre a Editora Abril e a Digital Pages e levou 12 meses para ficar pronto.

Mais de 2 mil edições impressas foram digitalizadas por uma equipe de 30 pessoas.

O banco Bradesco patrocinou a iniciativa.

Fonte:
Carlos Leite Ribeiro. Portal CEN.

Deixe um comentário

Arquivado em Notícias Em Tempo

Semana Literária SESC : Leitura e Cotidiano (Programação de Cascavel/PR)

A Semana Literária consolida-se como um grande evento do Sesc Pr e acontece em todas as suas Unidades de Serviço. Este ano o tema do evento é Leitura e Cotidiano, e a escritora homenageada é Raquel de Queiroz, no centenário de seu nascimento. Convidamos a todos a participar desta intensa programação.

No Sesc Cascavel teremos uma série de atividades: mesas-redondas, contação de histórias, Estandes de Livrarias, Mostra de Cinema e inúmeros convidados.

Confira abaixo a programação:

PROGRAMAÇÃO SEMANA LITERÁRIA – SESC CASCAVEL

De 13 a 17 de setembro

Dia 13 (Segunda-Feira)

15h00 – A Letra de Raquel – Espetáculo Teatral sobre a vida e obra da escritora Raquel de Queiroz.
Élcio Di Trento.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-alvo: Estudantes, professores e público em geral.

19h30 – Palestra sobre a obra O Quinze – de Raquel de Queiroz.
Prof. Dr. Mauricio Menon – Campo Mourão.
Mauricio Menon é graduado em Letras, pela Unioeste em Cascavel, especialista em Literatura Brasileira pela Unicentro, Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Londrina e doutor em Letras pela Uel. Atualmente é professor de Língua Portuguesa e Literatura no Ensino Médio, graduação e pós graduação da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-alvo: Estudantes, professores e público em geral.

Dia 14 (Terça-Feira)

10h00 e 14h00 – A Letra de Raquel – Espetáculo Teatral.
Élcio Di Trento.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-alvo: Estudantes, professores e público em geral.

17h00 – Lançamento do Livro Aprendizagem e Ação Docente . Organizadora: Profª Maria Lídia Sica Szymanski – Unioeste.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público –alvo: Estudantes, professores e público em geral.

19h30 – Mostra: Leituras Poéticas no Cinema.
Exibição dos filmes:
Vale dos Poetas (dir.: Marcílio Brandão , BRA, 2002, 21 min.)
Wenceslau e a Árvore do Gramofone (dir.: Adalberto Muller , BRA, 2008, 15 min.)
Litania da Velha (dir.: Frederico Machado , BRA, 1997, 16 min.)
Infernos (dir.: Frederico Machado , BRA, 2006, 13 min.)
Esta mostra é uma rica experiência para a reflexão sobre poesia e adaptação para o cinema. O valor poético presente nos filmes dialoga com o valor poético dos próprios poemas, mas qual o lugar de cada um enquanto meios distintos? Os quatro filmes propostos vão fomentar essa reflexão e abrir possibilidades para muitas outras idéias.
Debate sobre os filmes após a mostra.
Mediador – Vander Colombo.
Local : Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-alvo: Estudantes, comerciários e público em geral.

Dia 15 (Quarta-Feira)

15h00 – O Mundo Encantado das Letras – Bate-papo com crianças.
Luiz Andrioli

O escritor fala para as crianças sobre as possibilidades do universo da leitura.
Divide com os espectadores a sua experiência de leitor e compartilha as emoções de criar histórias a partir de detalhes do nosso cotidiano. Ler é escrever a própria história, é o que se propõe neste encontro.

Luiz Andrioli é escritor e jornalista. Trabalha atualmente como apresentador, locutor e editor-chefe de TV. É cronista do telejornalismo da RICTV, Rede Record. Atuou oito anos como repórter de televisão. Pós-graduado em Cinema e mestre em Literatura com a dissertação sobre Dalton Trevisan, “O Silêncio do Vampiro” (2010). Professor universitário e ator profissional. Como escritor, teve várias peças encenadas por grupos de teatro de Curitiba, dentre elas, “Não só as Balas Matam” (2001). Autor da biografia “O Circo e a Cidade – histórias do grupo circense Queirolo em Curitiba” (2007). Para crianças, escreveu “A menina do Circo” (2009).
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-Alvo: Estudantes, professores e público em geral.

19h30 – Palestra: Raquel de Queiroz e o cotidiano na Literatura.
Profª Drª. Valdeci Batista de Melo Oliveira – Unioeste.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-alvo: Estudantes, professores e público em geral.

Dia 16 (Quinta-Feira)

10h00 e 15h00 – Um Fio de Histórias. Contação de Histórias.
Rosângela Janea Rauen.
Rosângela Rauen é professora de língua portuguesa em escolas da rede pública e particular e assessora pedagógica. É também contadora de histórias com atuação nas Casas da Leitura da Fundação Cultural de Curitiba, em escolas da rede pública e particular, no Programa de Leitura da Petrobrás/Leia Brasil e em eventos universitários.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-alvo: Estudantes, professores, comerciários e público em geral.

19h30 – Performance Alfabeto Móvel .
Ricardo Corona e Eliana Borges.
Ricardo Corona e Eliana Borges desde os anos 1990 fazem apresentações ao vivo de poesia e performances. Criaram duas revistas: Medusa e Oroboro. Livros: Amphibia (Portugal, Cosmorama, 2009). Cinemaginário (1999); Tortografia (2003); Corpo Sutil (2005) e Sonorizador (Livrodisco), pela editora Iluminuras. E Ladrão de Fogo, disco de poesia (2001, Medusa). Organizou a ontologia Outras Praias (bilíngüe, Iluminuras, 1998) e traduziu Joça Wolff os livros Momento de simetria (Medusa, 2005) e Máscara âmbar (Lumme, 2008), de Arturo Carrera.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-Alvo: Escritores, estudantes, professores, comerciários e público em geral.

Dia 17 (Sexta-Feira)

15h00 – Maria de uma rima só – Espetáculo de Contação de Histórias.
Hérica Veryano – atriz, pedagoga, arte-educadora e contadora de histórias.
O espetáculo Infantil “Maria de uma rima só” conta a história de Maria, uma menina que está sempre atrasada e nunca consegue pegar o trem. Enquanto aguarda na estação, com sua mala de viagem, Maria conta outras histórias, navegando pela cultura popular, lendas e jogos infantis. O espetáculo também traz elementos da dança e malabares, tendo como inspiração o jogo das Cinco Marias. Repleto de poesia e musicalidade, “Maria de uma rima só” consegue capturar o interesse de crianças e adultos abordando temas universais como os conflitos, perdas, esperança e superação.
Local: Sesc Cascavel – Salão Social.
Público-Alvo: Estudantes, professores, comerciários e público em geral.

*PARTICIPAÇÃO GRATUITA EM TODA A PROGRAMAÇÃO DO EVENTO*

Mais informações: 45 3225-3828

Sesc Cascavel: Rua Carlos de Carvalho, 3367.

Coordenação Geral do Evento: Simone Moura (Técnica de Atividades) e Lysiane Baldo (Técnica de Atividades).

Fonte:
SESC PR/ Cascavel

Deixe um comentário

Arquivado em Cascavel, Notícias Em Tempo, Semana Literária

Laé de Souza (Palestra: Publiquei o meu livro! E agora?)

Palestra na 6ª Semana do Escritor e do Livro de Sorocaba: Publiquei o meu livro! E agora?

No dia 26 de agosto (quinta-feira), às 19h, como parte da programação da 6ª Semana do Escritor e do Livro de Sorocaba, o escritor e produtor cultural Laé de Souza irá ministrar uma palestra no Auditório da FUNDEC, dirigida a escritores e produtores culturais.

Na palestra com o título “Publiquei o meu livro! E agora?”, Laé de Souza falará sobre as dificuldades do escritor na divulgação do seu trabalho, a experiência em doze anos de projetos de incentivo à leitura e diversos aspectos práticos e legais para execução de projetos culturais subsidiados por leis de incentivo à cultura. Ao final abrirá espaço para perguntas da platéia.

Laé de Souza é coordenador do Grupo Projetos de Leitura, que atua em todo território desde 1998, e autor de vários projetos de incentivo à leitura aprovados pelo Ministério da Cultura e Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, dirigidos a diversos públicos. Só o projeto “Ler é Bom, Experimente!”, contou neste ano com mais de cem mil alunos participantes, de varias regiões do país.

Além de projetos em escolas, outros são desenvolvidos pelo grupo “Projetos de Leitura” em hospitais, grupos de terceira idade, parques, ônibus, metrô e praças públicas. O escritor é autor de obras infantis, juvenis e adultos, entre elas, Acontece…, Coisas de Homem & Coisas de Mulher, Quinho e o seu cãozinho – um cãozinho especial, Nos Bastidores do Cotidiano. São de sua autoria os projetos “Lendo na Escola”, “Leitura no Parque”, Viajando na Leitura”, “Caravana da Leitura”, “Minha Escola Lê”, Dose de Leitura”, entre outros.

A FUNDEC fica na Rua Brigadeiro Tobias, 73, Centro, Sorocaba. A palestra é gratuita, está aberta ao público e a inscrição será realizada no próprio local.

Mais informações podem ser obtidas nos telefones (15) 3228-6209 e 8119-2476, com Sonia ou Cintian Moraes.

A programação da 6ª Semana do Escritor e do Livro de Sorocaba está no site: www.semanadoescritor.com.br .

Fonte:
Projetos de Leitura

Deixe um comentário

Arquivado em Notícias Em Tempo, Palestras

Antonio Cândido (Literatura e Sociedade: A Literatura na Evolução de uma Comunidade) Parte 6, final

5 — O grupo se desprende da comunidade

Esta incorporação da literatura à comunidade — que noutras partes do Brasil já se havia dado antes — e a maneira por que se processou, explicam muitos aspectos do quinto e, para este estudo, último momento, que agora vamos considerar. Trata-se do Movimento Modernista, que nesta cidade se desenvolveu e teve as suas manifestações mais características de 1922 a 1935. Foi uma profunda renovação literária, estreitamente ligada à constituição de um agrupamento criador, como era o dos estudantes românticos; não mais justaposto à comunidade, todavia, mas formado a partir dela, oriundo da sua própria dinâmica, diferenciando-se de dentro para fora — por assim dizer. No plano funcional, diríamos que corresponde à necessidade de reajustar a expressão literária às novas aspirações intelectuais e às solicitações da mudança artística em todo o Ocidente. No plano da estrutura, diríamos que foi um esforço — em parte vitorioso — para substituir a uma expressão nitidamente de classe (como a dos anos 1890-1920) por uma outra, cuja fonte inspiradora e cujos limites de ação fossem a sociedade total.

Nesta parte, estamos ao alcance da memória de gente viva, e não há necessidade, como para os períodos anteriores, de aduzir documentos e provas. Todos sabem, por exemplo, que este movimento é o único, na literatura em São Paulo, cujo início pode ser precisamente datado: começa na famosa Semana de Arte Moderna, realizada em 1922 no Teatro Municipal. Espanemos mais uma vez a imagem cediça, para dizer que o Brasil teve, ali, a sua “noite do Ernâni”… Com efeito, ali se defrontaram duas facções, uma lutando por renovar a literatura de acordo com o espírito do tempo; outra, defendendo indignada uma tradição que, em São Paulo, correspondia a algo enraizado na sensibilidade. De ambos os lados, boa-fé e energia. Do lado dos conservadores, a aprovação tácita da comunidade; mas os renovadores tinham por si a premonição dos tempos novos e (tocamos no ponto que nos concerne sobretudo) formavam um agrupamento capaz de provocar o seu advento.

No seu estudo clássico sobre SUPERORDENAÇÃO E SUBORDINAÇÃO, procurando explicar o motivo pelo qual o tirano — que é um só — pode manter submisso o povo, — que são todos, — argumenta Simmel que todos apenas de passagem se aplicam a pensar ou agir contra a opressão, e ainda assim com uma parte mínima das suas energias, empenhadas nos interesses vários da vida; portanto, exercem uma reação desconexa e parcial. O tirano, pelo contrário, põe no ato de mandar toda a sua personalidade em todos os momentos da sua vida, de tal forma que as reações parciais encontram sempre de volta a ação total da sua energia, expressa na inteireza do sistema repressivo.

Podemos aproveitar esta explicação para dizer que, ao passo que as tendências conservadoras se ocupavam apenas eventualmente em defender o seu ponto de vista, houve em São Paulo, durante anos, um grupo que punha na ação renovadora toda a sua capacidade de criação e agressão. De tal modo, que se as suas opiniões não chegaram a substituir a literatura dominante, elas exerceram atração poderosa sobre as forças criadoras, sobretudo o que havia de vivo e promissor. Com isso, encurralaram a literatura oficial no academismo mais estéril, e abriram caminho para a literatura nova, que dominaria completamente em nossos dias.

A ação de grupo foi, portanto, decisiva. Não só da parte do bloco inicial dos modernistas, que se manteve coeso durante algum tempo, como dos subgrupos que dele se originaram, decantando os vários aspectos contidos no movimento: Verdeamarelismo, Anta, Antropofagia, grupo do Diário Nacional, da Revista Nova etc.

No começo, o referido bloco abrangia os modernistas do Rio, dos quais Graça Aranha desejava passar por chefe. Os principais dentre os paulistas eram Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo, A. Couto de Barros, Guilherme de Almeida, Rubens Borba de Morais, Sérgio Milliet — mais tarde Antônio de Alcântara Machado. O grupo desenvolveu uma linguagem própria, e muito do que se tornou expressão oficial do movimento, e pareceu ao público hermetismo voluntariamente perverso, se explica no fundo por certas formas de intercomunicação dos seus membros. Os modismos, o estritamente pessoal de cada um, passaram ao verso e à prosa, suscitando, para os não iniciados, problemas angustiosos de exegese, como certos versos de Mário de Andrade:

E os goianos governados por meu avô,
ou
A Flandres inimaginável
E a decadência dos Almeidas.

Ou ainda certo final de capítulo do Serafim Ponte Grande, jovial e realista, carregado de sentido para os que conheciam os motivos do autor.

Além desse esoterismo que reforça a coesão interna, opondo o grupo aos outros, e à sociedade geral, os modernistas desenvolveram as famosas atitudes “futuristas”: interpelações públicas, protestos, intimidação, confusão do adversário. Estabeleceram uma desnorteante mistura de valores, como a citação do Guaraná Zanotta ao lado de referências a Bilac ou Fídias. Organizaram tertúlias famosas, espécies de cerimônias confirmatórias, em fazendas e salões de amigos, em excursões distantes, — a Ouro Preto, à Amazônia.

Passaram no crivo a tradição clássica, afetando total indiferença pelos seus valores. Todavia, este aparato esotérico e exotérico não passava de blindagem do grupo para a luta, cuja finalidade real foi o trabalho aturado e profundo de revisão literária. Pode-se reconhecer a autenticidade de um escritor dessa fase pela sua identificação com a vida aparente e a vida profunda do movimento. Os que dele participaram como quem tem catapora, e os que se realizaram nele, como obra e personalidade.

Na constituição desse, ou desses agrupamentos de campanha literária, deve-se apontar a relação que mantiveram com os salões burgueses, alguns oriundos da fase anterior e que, tendo constituído atmosfera estimulante para os efeitos convencionais do Parnasianismo, forneceram também, em certos casos, ambiente para os modernos. Algumas casas da classe dominante em São Paulo os acolheram, dando-lhes deste modo não apenas amparo e reconhecimento em face da tradição, mas reforçando os vínculos entre eles, confirmando-os na sua sociabilidade própria. Houve mesmo tensões e rupturas na base do apoio ou fidelidade aos vários mecenas. Dentre tais salões deve-se mencionar a famosa Vila Kyrial, onde “Freitas Vale o magnífico”, — o poeta simbolista Jacques D’Avray, — congregou sucessivamente, por mais de um quarto de século, simbolistas, parnasianos, modernistas, estabelecendo um elo profundo entre estas diversas tendências. A circunstância dos modernistas se ligarem a formas tradicionais de sociabilidade literária mostra que a estrutura social da cidade, bastante rica a esta altura, já se encontrava aparelhada para assimilar as formações divergentes, originadas pela dinâmica do seu desenvolvimento.

Esta observação nos leva a outra, de natureza comparativa. Enquanto na São Paulo romântica a literatura surgiu e encorpou como expressão de um grupo, que não encontrava manifestação possível da sua integridade no quadro das atividades sociais disponíveis; na São Paulo pós-parnasiana o grupo modernista surgiu (isto é, constituiu-se enquanto grupo) como veículo de tendências intelectuais que não podiam manifestar-se através dos grupos literários (efetivos ou virtuais) então existentes.

Prossigamos na linha comparativa. Em 1922, como em 1845, o grupo literário se constituiu em oposição consciente à comunidade, na afirmação de uma existência própria. Em 1845, porém, a oposição era entre duas visões do mundo, e por assim dizer entre duas idades — adolescência e maturidade. Em 1922, era, além disso, de uma literatura a outra — pois o que se desejava era destruir um sistema literário solidamente constituído, coisa inexistente em São Paulo ao tempo do Romantismo.

Daí o estabelecimento, no plano literário, de uma competição com os grupos que representavam o sistema oficial: jornais, salões, academias, correntes de opinião. Foi nitidamente (e isto é o seu caráter diferencial do ponto de vista sociológico) uma porfia em torno da liderança intelectual em São Paulo. Foi uma concorrência em que se empenharam os defensores de uma literatura ajustada à ordem burguesa tradicional, implicando um “gosto de classe” (dominante), fielmente servido por escritores providos de beneplácito, difundindo-se pelo exemplo por toda a pirâmide social; e os renovadores, procurando exprimir valores mais profundos, aspirações e estilos recalcados na literatura popular pelo oficialismo burguês.

Por isso, embora os escritores de 1922 não manifestassem a princípio nenhum caráter revolucionário, no sentido político, e não pusessem em dúvida os fundamentos da ordem vigente, a sua atitude, analisada em profundidade, representa um esforço para retirar à literatura o caráter de classe, transformando-a em bem comum a todos. Daí o seu populismo — que foi a maneira por que retomaram o nacionalismo dos românticos. Mergulharam no folclore, na herança africana e ameríndia, na arte popular, no caboclo, no proletário. Um veemente desrecalque, por meio do qual as componentes cuidadosamente abafadas, ou laboriosamente deformadas (é o caso de “literatura sertaneja”) pela ideologia tradicional, foram trazidas à tona da consciência artística. O admirável TUPI OR NOT TUPI, do Manifesto Antropófago de Oswald de Andrade — mestre incomparável das fórmulas lapidares —, resume todo este processo, de decidida incorporação da riqueza profunda do povo, da herança total do país, na estilização erudita da literatura. Sob este ponto de vista, as intuições da Antropofagia, a ele devidas, representam o momento mais denso da dialética modernista, em contraposição ao superficial “dinamismo cósmico” de Graça Aranha.

Outro traço, que reforça a semelhança geral do Romantismo com o Modernismo, é a atitude de negação, que lá foi satanismo e aqui troça, piada. O humor e a chacota pertencem também à atitude romântica, e uma das suas manifestações mais típicas, A ORGIA DOS DUENDES, de Bernardo Guimarães, é um xadrez de brincadeira, melancolia e perversidade, com predomínio das duas últimas. Já o Modernismo é o movimento mais alegre e jovial da nossa literatura, — manifestado no próprio comportamento dos seus protagonistas, na sua furiosa ânsia de diversão. Lembremos O CLARO RISO DOS MODERNOS, de Ronald de Carvalho, para sugerir que a alegria foi dogma equivalente à tristeza romântica e, por isso mesmo, não raro artificial, como esta. Ambas foram norma e expressão de grupo, a que se conformavam os seus membros respectivos. Macunaíma, de Mário de Andrade, a maior obra do movimento, reflete bem esta condição; mas termina num quebranto de melancolia, que revela as correntes profundas da atitude modernista.

E agora, terminando, lembremos a analogia derradeira: como o Romantismo, o Modernismo é, de todas as nossas correntes literárias, a que adquiriu tonalidades especificamente paulistanas. Se em São Paulo não tivesse havido os escritores que houve no período clássico, no Naturalismo, no Parnasianismo e no Simbolismo, a literatura brasileira teria perdido um ou outro bom escritor, mas nada de irremediável. Se tal acontecesse no Romantismo e no Modernismo, o Brasil ficaria mutilado de algumas das suas mais altas realizações artísticas, como são a tonalidade noturna do Macário e a explosão rabelaisiana de Macunaíma, com tudo o que se organizou de fecundo em volta dessas obras culminantes. Dois momentos paulistanos, portanto; dois momentos em que a cidade se projeta sobre o país e procura dar estilo às aspirações do país todo:

Dançamos juntos no Carnaval das gentes,
Bloco pachola do “Custa mas vai!”
Mário de Andrade

* * *

Se as considerações anteriores alcançaram o objetivo, o leitor terá obtido uma rápida visão da literatura nas suas relações com a comunidade paulistana. Terá visto que ambas se explicam e se complementam, se as quisermos ver solidariamente.

Com efeito, os cinco momentos mostram cinco maneiras diversas de associação dos escritores, de participação dos mesmos na vida social, de ajuste da expressão à dinâmica dessas relações e sua influência nelas.

A princípio, uma cidade em que não há condições para a vida organizada da inteligência, mas onde há alguns indivíduos animados do desejo de exprimir os valores locais. É o primeiro e vago esboço de uma literatura paulistana, definida pelo encontro de poucos intelectuais com os valores tradicionais da comunidade, já socialmente amadurecidos, mas ainda não simbólica e intelectualmente elaborados.

Decênios mais tarde, vemos desenvolver-se um agrupamento que permite a atividade literária permanente. Ele pertence à cidade, está demograficamente integrado nela, mas lhe é espiritualmente alheio. Não possui forças para elaborar uma expressão original, mas dá lugar a certas tendências que floresceriam mais tarde.

Em seguida, encontramos o corpo estudantino já estruturado e solidamente justaposto à cidade. A sua duração, a evolução das formas de sociabilidade, que lhe são próprias, deram lugar a uma atmosfera espiritual altamente condutora, que o segrega da comunidade. Os aspectos satânicos do Romantismo se casam admiravelmente a estas condições, e surge pela primeira vez uma literatura de tonalidade paulistana — expressão de um grupo que é corpo estranho na pequena cidade.

Mas esta cresce, e a moda romântica passa. O aumento de densidade demográfica e social abre novas possibilidades de ajuste dos moços, e deste modo rompe a sua sociabilidade hermética. As novas tendências literárias acentuam o caráter comunicativo da palavra, surgem escritores que não dependem da Faculdade de Direito. A literatura e os escritores se integram na comunidade. Como a sociedade é de classes, constitui-se uma literatura convencional, ajustada aos padrões de refinamento e inteligibilidade da classe dominante, cujo prestígio garante a sua difusão pelas outras camadas.

Ora, nessas condições, a literatura passa de tal modo a ser um elemento da ordem social, que não se sente nela a vibração e a receptividade em face das novas sugestões da vida, em constante fluxo. Daí um novo movimento, para lhe dar amplitude ainda maior, fundando-a, não no gosto e no interesse de um limitado setor da sociedade, mas na vida profunda de toda esta, na sua totalidade. O Modernismo completa o processo iniciado na segunda metade do século XVIII, quando os seus grupos revolucionários procuram alargar o âmbito da criação artística, englobando os aspectos recalcados da sociedade e da cultura nacional. É o segundo momento em que a cidade de São Paulo contribui com algo próprio ao patrimônio comum do país.

Um grupo virtual, bruxuleando na cidade indiferente; um grupo ordenado, estabelecendo a tradição literária; um grupo ordenado e vivo, criando uma expressão à margem da cidade; a cidade absorvendo este grupo e chamando a si a atividade literária, que se ordena pelos padrões eruditos da burguesia culta; da cidade surgindo um grupo que rompe esta dependência de classe e, quebrando as barreiras acadêmicas, faz da literatura um bem de todos. Há uma história da literatura que se projeta na cidade de São Paulo; e há uma história da cidade de São Paulo que se projeta na literatura.
–––––––––––––––-
Fonte:
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. 9. ed. RJ: Ouro Sobre Azul, 2006.

Deixe um comentário

Arquivado em O Escritor com a Palavra, Sopa de Letras

22 de Agosto (Dia do Folclore)

Deixe um comentário

22 de agosto de 2010 · 12:52

O Folclore Brasileiro

Imagem = Neli Neto
O folclore brasileiro é um conjunto de mitos, lendas, usos e costumes transmitidos em geral oralmente através das gerações com a finalidade de ensinar algo, ou meramente nascido da imaginação do povo. Por ser o Brasil um país de dimensões continentais, possui um folclore bastante rico e diversificado e suas histórias enaltecem o conhecimento popular e encantam os que as escutam.

O folclore brasileiro, apesar de ter raízes imemoriais, só começou a receber a atenção da elite nacional em meados do século XIX, durante o Romantismo. Naquele momento, acompanhando uma onda de interesse pela cultura popular que crescia na Europa e nos Estados Unidos, alguns estudiosos brasileiros como Celso de Magalhães e Sílvio Romero passaram a pesquisar as manifestações folclóricas nativas e publicar estudos sistemáticos [1]. Ao mesmo tempo, diversos artistas cultos passaram a empregar elementos da cultura popular na criação de obras destinadas aos círculos ilustrados, como parte de um projeto, estimulado e desenvolvido pelo governo de Dom Pedro II, de construção de um corpo de símbolos nacionalistas que poderia contribuir para a afirmação do Brasil entre as nações civilizadas. As classes superiores nunca foram inteiramente livres da influência da cultura popular, mas obras como por exemplo I-Juca-Pirama, de Gonçalves Dias, e a música de Luciano Gallet e Alexandre Levy deram a temas do folclore brasileiro um papel de destaque na arte culta, e desde então o interesse pelo assunto só cresceu, e em várias frentes, dando origem a numerosas obras de arte, estudos literários e pesquisas científicas, com vasta bibliografia local e atraindo também a atenção internacional.

O resultado disso é que atualmente o folclore brasileiro se encontra em uma posição privilegiada. Além de ser a base alimentadora de boa parte do turismo cultural do país, se tornou instrumento de educação nas escolas e está protegido por lei, sendo considerado um bem do patrimônio histórico e cultural do Brasil. A Constituição protege o folclore através dos artigos 215 e 216, que tratam da proteção do patrimônio cultural brasileiro, ou seja, “os bens materiais e imateriais, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”. Os órgãos estatais responsáveis pelo estudo, proteção e divulgação do folclore nacional são a Comissão Nacional de Folclore, ligada à UNESCO e ao Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura, e responsável pela elaboração da Carta do Folclore Brasileiro, e o Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, ligado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Por outro lado, como se observa em outras partes do mundo, o folclore brasileiro está experimentando modificações importantes em virtude do apelo turístico, e da influência dos novos meios de comunicação de massa e das novas tecnologias de registro e difusão de informações, ocasionando a descaracterização de muitos fatos folclóricos e sua transformação em espetáculos de massa. Essa transformação cultural está obrigando os pesquisadores a rever seus conceitos e métodos de estudo dentro de uma perspectiva interdisciplinar mais ampla e mais livre de preconceitos etnocêntricos, incorporando os avanços recentes da ciência e da tecnologia.

Enlogação folclórica

Esta página ou secção não cita nenhuma fonte ou referência (desde Dezembro de 2008).
Por favor, melhore este artigo providenciando fontes fiáveis e independentes, inserindo-as no corpo do texto por meio de notas de rodapé. Encontre fontes: Google — notícias, livros, acadêmico — Scirus

Música

Caracteriza-se pela simplicidade, monotonia e lentidão. Sua origem pode estar ligada a uma música popular cujo autor foi esquecido ou pode ter sido criada espontaneamente pelo povo. Observa-se a música folclórica sobretudo em brincadeiras infantis, cantos religiosos, ritos, danças e festas.

São exemplos:

cantigas de roda;
acalantos;
modinhas;
cantigas de trabalho;
serenatas;
cantos de velório;
cantos de cemitério.

Danças e festas

As danças acompanham as músicas em vários rituais folclóricos, sendo as principais danças folclóricas brasileiras samba, baião, frevo, xaxado, maracatu, tirana, catira, quadrilha.

As principais festas são Carnaval, Festas juninas, Festa do Rosário, Festa do Divino, Congado e as Cavalhadas.

Linguagem

As principais manifestações do folclore na linguagem popular são as seguintes:

Adivinhações: também chamados de adivinhas. Consistem em perguntas com conteúdo dúbio ou desafiador.
Exemplo:

O que é o que é?

Está no meio do começo, está no começo do meio, estando em ambos assim, está na ponta do fim?

Branquinho, brancão, não tem porta, nem portão?

Uma árvore com doze galhos, cada galho com trinta frutas, cada fruta com vinte e quatro sementes?

Uma casa tem quatro cantos, cada canto tem um gato, cada gato vê três gatos, quantos gatos têm na casa?

Altas varandas, formosas janelas, que abrem e fecham, sem ninguém tocar nelas?

Respostas:
A letra M
Ovo
Ano, mês, dia, hora
Quatro
Olhos

Parlenda: são palavras ordenadas de forma a ritmar, com ou sem rima.

Provérbios: ditos que contém ensinamentos.
“Dinheiro compra pão, mas não compra gratidão.”
“A fome é o melhor tempero.”
“Ladrão que rouba a ladrão tem cem anos de perdão.”
“Pagar e morrer é a última coisa a fazer.”

Quadrinhas: estrofes de quatro versos sobre o amor, um desafio ou saudação.

Piadas: Piada ou Anedota é uma história curta de final geralmente surpreendente e engraçado com o objetivo de causar risos ou gargalhadas (ou sensação de) no leitor ou ouvinte. É um tipo específico de humor que, apesar de diversos estilos, possui características que a diferenciam de outras formas de comédia.

Literatura de Cordel: livrinhos escritos em versos, no nordeste brasileiro, e pendurados num barbante (daí a origem de cordel), sobre assuntos que vão desde mitos sertanejos às situações social, política e econômica atuais.

Frases prontas: frases consagradas de poucas palavras com significado direto e claro.

Frase de pára-choque: Trabalho com minha família para servir a suaFrases de para-choque de caminhão: frases humorísticas ou religiosas que caminhoneiros pintam em seus pára-choques.

Trava-Língua: É um pequeno texto, rimado ou não, de pronunciação difícil. Podemos definir os trava línguas como frases folclóricas criadas pelo povo com objetivo lúdico (brincadeira). Apresentam-se como um desafio de pronúncia, ou seja, uma pessoa passa uma frase difícil para um outro indivíduo falar. Estas frases tornam-se difíceis, pois possuem muitas sílabas parecidas (exigem movimentos repetidos da língua) e devem ser faladas rapidamente. Estes trava línguas já fazem parte do folclore brasileiro, porém estão presentes mais nas regiões do interior brasileiro.

Usos e costumes

Neste campo inclui-se itens a respeito da alimentação, cultivo, vestuário, comportamento, etc, de um povo de uma região, que tem costumes de ir a vários lugares.

Brinquedos e brincadeiras

Os brinquedos são artefatos para serem utilizados sozinho, como a boneca de pano, o papagaio (pipa), estilingue (bodoque), pião , arapuca , pandorga, etc.

As brincadeiras envolvem disputa de algum tipo, seja de grupos ou individual, como o pega-pega, bolinha-de-gude, esconde-esconde, resgate, nunca 3, pique-bandeira, etc.

As brincadeiras se modificam de acordo com sua região, pode ser mudar o nome ou então a forma de brincar.

Algumas lendas, mitos e contos folclóricos do Brasil:

Boitatá – Representada por uma cobra de fogo que protege as matas e os animais e tem a capacidade de perseguir e matar aqueles que desrespeitam a natureza. Acredita-se que este mito é de origem indígena e que seja um dos primeiros do folclore brasileiro. Foram encontrados relatos do boitatá em cartas do padre jesuíta José de Anchieta, em 1560. Na região nordeste, o boitatá é conhecido como “fogo que corre”.

Boto – Acredita-se que a lenda do boto tenha surgido na região amazônica. Ele é representado por um homem jovem, bonito e charmoso que encanta mulheres em bailes e festas. Após a conquista, leva as jovens para a beira de um rio e as engravida. Antes de a madrugada chegar, ele mergulha nas águas do rio para transformar-se em um boto.

Caipora – uma entidade da mitologia tupi-guarani. É representada como um pequeno índio de pele escura, ágil, nu, que fuma um cachimbo e gosta de cachaça.

Chupa-cabra – é, supostamente, um animal desconhecido para a zoologia que mata sistematicamente animais rurais em regiões da América, como Porto Rico, Flórida (Estados Unidos), Nicarágua, Chile, México e Brasil. O nome da criatura deve-se à descoberta de várias cabras mortas em Porto Rico com marcas de dentadas no pescoço e o seu sangue alegadamente drenado. Esta lenda moderna não é autóctone do Brasil e sim uma assimilação de lendas hispânicas divulgadas com fervor até pela mídia norte-americana.

Cuca – um dos principais seres mitológicos do folclore brasileiro. Diz a lenda que era uma velha feia na forma de jacaré que rouba as crianças desobedientes.

Curupira – Assim como o boitatá, o curupira também é um protetor das matas e dos animais silvestres. Representado por um anão de cabelos compridos e com os pés virados para trás. Persegue e mata todos que desrespeitam a natureza. Quando alguém desaparece nas matas, muitos habitantes do interior acreditam que é obra do curupira.

Lobisomem – Este mito aparece em várias regiões do mundo. Diz o mito que um homem foi atacado por um lobo numa noite de lua cheia e não morreu, porém desenvolveu a capacidade de transforma-se em lobo nas noites de lua cheia. Nestas noites, o lobisomem ataca todos aqueles que encontra pela frente. Somente um tiro de bala de prata em seu coração seria capaz de matá-lo.

Iara – Encontramos na mitologia universal um personagem muito parecido com a mãe-d’água : a sereia. Este personagem tem o corpo metade de mulher e metade de peixe. Com seu canto atraente, consegue encantar os homens e levá-los para o fundo das águas.

Mula-sem-cabeça – uma mulher, virgem ou não, que tivesse coito com um padre católico, se transformaria em Mula-sem Cabeça. Outra versão é que, se um padre engravidasse uma mulher e a criança fosse do sexo feminino viraria mula-sem cabeça e se fosse menino seria um lobisomem.

Negrinho do Pastoreio – lenda meio africana meio cristã, contada por defensores do fim da escravidão. A virgem Maria aparece para um menino escravo que é espancado pelo dono por ter perdido um cavalo baio. Com ela, o cavalo volta e o negrinho foge com toda a tropa do dono.

Corpo-seco – É uma espécie de assombração que fica assustando as pessoas nas estradas. Em vida, era um homem que foi muito malvado e só pensava em fazer coisas ruins, chegando a prejudicar e maltratar a própria mãe. Após sua morte, foi rejeitado pela terra e teve que viver como uma alma penada.

Pisadeira – É uma velha de chinelos que aparece nas madrugadas para pisar na barriga das pessoas, provocando a falta de ar. Dizem que costuma aparecer quando as pessoas vão dormir de estômago muito cheio.

Mapinguari – Seria uma criatura coberta de um longo pelo vermelho vivendo na Floresta Amazônica. Segundo povos nativos, quando ele percebe a presença humana, fica de pé e alcança facilmente dois metros de altura. Seus pés seriam virados ao contrário, suas mãos possuiriam longas garras e a criatura evitaria a água, tendo uma pele semelhante a de um jacaré.

Mãe-de-ouro – Representada por uma bola de fogo que indica os locais onde se encontra jazidas de ouro. Também aparece em alguns mitos como sendo uma mulher luminosa que voa pelos ares. Em alguns locais do Brasil, toma a forma de uma mulher bonita que habita cavernas e após atrair homens casados, os faz largar suas famílias.

Saci Pererê – O Saci-Pererê é representado por um menino negro, que tem apenas uma perna. Está sempre com seu cachimbo, e com um gorro vermelho que lhe dá poderes mágicos. Vive aprontando travessuras e se diverte muito com isso. Adora espantar cavalos, queimar comida e acordar pessoas com gargalhadas. A lenda também diz, que o Saci tem o poder de andar dentro de redemoinhos de vento, e folhas secas.

Vitória Régia – Uma índia que queria tanto encontrar Jaci (a lua) se engana com seu reflexo e se afoga no rio. Compadecida, Jaci a transforma na vitória-régia, a estrela das águas.

CRENÇAS E SUPERSTIÇÕES

SABENÇA: sabedoria popular utilizada na cura de doenças e solução de problemas pessoais através de benzeduras.
CRENDICE: crença absurda, também chamada de ablusão.
SUPERSTIÇÃO: explicações de fatos naturais como consequências de acontecimentos sobrenaturais.

ARTE E ARTESANATO

Compreende uma ampla área, que se estende desde a culinária até o artesanato propriamente dito. Baseiam-se em técnicas rudimentares de produção e utilizam-se de matéria-prima natural como madeira, ossos, couro, tecido, pedras, sementes, entre outros.

Fonte:
Wikipedia

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore Brasileiro

Ialmar Pio Schneider (O Folclore Gaúcho)

Imagem por Lucia Aragão
Aqui no Rio Grande do Sul, o folclore, considerado como ciência do povo, termo que foi pela primeira vez empregado pelo arqueólogo inglês G. J. Thoms, originando-se de Folk, povo, e lore, ciência, em 22 de agosto de 1846, portanto, há cento e cinqüenta e dois anos passados, é sobremaneira cultuado, notadamente nos Centros de Tradições Gaúchas, já difundidos, segundo me consta, por vários estados do país e até no exterior. O que mais impressiona é o amor ao torrão natal, ao pingo, à china, que o gaúcho demonstra onde quer que se encontre, e deixa extravasar através de versos e toadas nas tertúlias e fandangos galponeiros. Seja no pontear de um violão, cantando uma milonga, ou no toque de uma cordeona ou bandônio, num xote bem largado, é que o gaudério se diverte e procura esquecer os reveses da vida nos braços de uma chinoca querendona. Também mostra sua destreza na dança da chula.

Mas o folclore gaúcho é deveras portentoso e abrange, além do lazer, os costumes, crendices populares, superstições e até práticas médicas de curandeiros, velhos pajés, parteiras de campanha, benzedeiras de cobreiros, costura de rendidura (hérnia), etc. São herança dos nativos, e povoadores açorianos e castelhanos que se mesclaram para formar a estirpe gaúcha.

Bem acentuados e conhecidos temos os mitos e lendas, tais como as do Negrinho do Pastoreio, A Salamanca do Jarau e A Mboitatá e muitos outros. Discorrendo sobre as Lendas do Sul, assim registra o ínclito mestre folclorista gaúcho Augusto Meyer, que foi membro da Academia Brasileira de Letras, em seu livro GUIA DO FOLCLORE GAÚCHO – Gráfica Editora Aurora, Ltda – RIO – 1951, pág. 96: “O único mito realmente popular, com raízes profundas na tradição gaúcha, é o do Negrinho do Pastoreio; é também o único de pura cepa rio-grandense, livre de qualquer influência gringa.” Mais recentemente, o erudito folclorista gaúcho Antonio Augusto Fagundes, em seu livro MITOS E LENDAS DO RIO GRANDE DO SUL – Martins Livreiro-Editor – Porto Alegre – 1992, num trabalho muito bem elaborado, desenvolveu o assunto, abrangendo nosso Estado, externando de modo cabal o seu conhecimento e assim se expressando, magistralmente, no final do prefácio: “Há muito amor nestes estudos, amor pelo povo, que é uma forma de amarmos a nós mesmos. O Folclore é a ciência do amor, por isso eu me fiz folclorista.”

Muito expressiva é a colaboração afro-brasileira para com o folclore gaúcho, representada, principalmente, pelas Congadas que se realizavam próximo ao litoral, em Santo Antônio da Patrulha, abrangendo Conceição do Arroio (hoje Osório), Palmares e Morro Alto, como bem explica Augusto Meyer, em seu livro acima citado, à pág. 60.

Resta acrescentar as contribuições dos imigrantes ao folclore gaúcho e que não foram poucas. Os alemães trouxeram o Kerb, o jogo de bolão, as “bandinhas” e os italianos com as festas paroquiais nas igrejas católicas, a vindima, o jogo da móra, da bocha, e as suas maravilhosas melodias.

É oportuno lembrar que a riqueza de um povo também se mede pela cultura de suas tradições.

(Publicado no Diário de Canoas em 19-08-1998)

Fontes:
O Autor

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Rio Grande do Sul

Folclore do Rio Grande do Sul

São Sepé
SÃO SEPÉ

Sepé era um índio valente e bom, que lutou contra os estrangeiros para defender a terra das missões. Ele era predestinado por Deus e São Miguel: tinha nascido com um lunar na testa. Nas noites escuras ou em pleno combate, o lunar de Sepé brilhava, guiando seus soldados missioneiros. Quando ele morreu, vencido pelas armas e o número de portugueses e espanhóis, Deus retirou de sua testa o lunar, que colocou no céu do pampa para ser o guia de todos os gaúchos – é o Cruzeiro do Sul.

CASA DE MBORORÉ (Missões)

No tempo dos Sete Povos das Missões, havia um índio velho muito fiel aos padres jesuítas, chamado MBororé. Com a chegada dos invasores portugueses e espanhóis, os padres precisaram fugir levando em carretas os tesouros e bens que pudessem carregar. Assim, amontoaram o muito que não podiam levar consigo – ouro, prata, alfaias, jóias, tudo!- e construíram ao redor uma casa branca, sem porta e sem janela. Para evitar a descoberta da casa pelo inimigo e o conseqüente saqueio, deixaram o velho índio fiel MBororé cuidando, com ordens severas de só entregar o tesouro quando os jesuítas voltassem às Missões.

Mas os jesuítas nunca mais voltaram. Com o passar dos anos, o velho índio morreu e o tempo foi marcando tudo, deixando as ruínas de pé como as cicatrizes de um sonho que acabou. Acabou? Não. A Casa de MBororé continua lá num mato das Missões, imaculadamente branca, cuidada pela alma do índio fiel que ainda espera a volta dos jesuítas.

Às vezes, algum mateiro –lenhador ou caçador- dá com ela, de repente, num campestre qualquer. Imediatamente dá-se conta de que é a Casa de MBororé, cheia de tesouros. Resolve então marcar bem o local para voltar com ferramentas e abrir a força a casa que não tem porta nem janela. Guarda bem o lugar na memória pelas árvores tais e tais, pela direção do sol e coisas assim. Sai, volta com ferramentas, só que nunca mais acha de novo a Casa Branca de MBororé, sem porta e sem janela.

CAVERÁ

O Caverá é uma região na fronteira-oeste do Rio Grande do Sul, ouriçada de cerros, que se estende entre Rosário do Sul e Alegrete. Na Revolução de 1923, entre os maragatos (os revolucionários) e os chimangos (os legalistas) o Caverá foi o santuário do caudilho maragato Honório Lemes, justamente apelidado “O Leão do Caverá”.

Diz a lenda que a região, no passado, era território de uma tribo dos Minuanos, índios bravios dos campos, ao contrário dos Tapes e Guaranis gente mais do mato. Entre esses Minuanos, destacava-se a figura de Camaco, guerreiro forte e altivo, mas vivendo uma paixão não correspondida por Ponaim, a princesinha da tribo, que só amava a própria beleza…

Os melhores frutos de suas caçadas, os mais valiosos troféus de seus combates, Camaco vinha depositar aos pés de Ponaim, sem conseguir dela qualquer demonstração de amor.

Um dia, achando que lhe dava uma tarefa impossível, Ponaim disse que só se casaria com Camaco se ele trouxesse a pele do Cervo Berá para forrar o leito do casamento. O Cervo Berá era um bicho encantado, com o pelo brilhante – daí o seu nome. O mato era dele: Caa-Berá, Caaverá, Caverá, finalmente.

Então Camaco resolveu caçar o cervo encantado. Montando o seu melhor cavalo, armado com vários pares de boleadeiras, saiu a rastrear, dizendo que só voltaria depois de caçar e courear o Cervo Berá.

Depois de muitas luas, num fim de tarde ele avistou a caça tão procurada na aba do cerro. O cervo estava parado, cabeça erguida, desafiador, brilhando contra a luz do sol morrente. Sem medo, Camaco taloneou o cavalo, desprendeu da cintura um par de boleadeiras e fez as pedras zunirem, arrodeando por cima da cabeça. Então, no justo momento em que o Cervo Berá deu um salto para a frente quando o guerreiro atirou as Três Marias, houve um grande estouro no cerro e uma cerração muito forte tapou tudo. Durante três dias e três noites os outros índios campearam Camaco e seu cavalo, mas só acharam uma grande caverna que tina se rasgado na pedra dura do cerro e por onde, quem sabe, Camaco e seu cavalo tinham entrado a galope atrás do Cervo Berá para nunca mais voltar.

A PANELINHA

Na bela cidade de Cruz Alta, nos começos deste século, havia uma grande fonte em forma de poço, de onde partia uma sanga, hoje tudo urbanizado no cruzamento das ruas Andrade Neves e General Portinho, quase no centro da cidade.

Essa fonte, pela sua forma de poço, recebeu o nome de Fonte da Panelinha e ali muita gente boa, praticamente toda a zona nobre da cidade, abastecia-se de água. E era crença geral a de que beber água da Panelinha era amarrar-se definitivamente a Cruz Alta. Quem bebesse dessa água, mesmo que partisse, logo dava um jeito de voltar.

Muitas moças cruzaltenses, namoradas de oficiais do Exército de outras plagas ou de viajantes que eventualmente passavam por Cruz Alta, sempre davam um jeito de lhes servir um copo d´água da Fonte da Panelinha.

A LENDA DE ANGOÉRA

Nos sete povos das Missões, no Pirapó, ainda no tempo dos padres jesuítas, vivia um índio muito triste, que se escondia de tudo e de todos pelos matos e peraus. Era um verdadeiro fantasma e por isso era chamado de Angoéra (fantasma, em guarani). E fugia da igreja
como o diabo da cruz!

Mas um dia a paciência dos padres valeu mais e o Angoéra foi batizado, convertendo-se à fé cristã e deixando de vagar pelos rincões escondidos. Recebeu o nome de Generoso e tornou-se alegre e bom, mui amigo de festas e alegrias. E um dia morreu, mas sua alma alegre e festeira continuou por aí, até hoje, campeando diversão. Onde tenha um fandango, lá anda rondando a alma do Generoso. Se rufa uma viola sozinha, é a mão dele. Se houve uma risada galponeira ou se levanta de repente a saia de alguma moça, todos sabem – é ele.

Quando isto acontece, o tocador que está animando a festa deve cantar em sua homenagem:

“Eu me chamo Generoso, morador de Pirapó. Gosto muito de dançar com as moças, de paletó”.

A LENDA DA LAGOA VERMELHA

A primeira tentativa dos padres jesuítas, que resultou na fundação de 18 Povos Missioneiros no Rio Grande do Sul, deu em nada. Os bandeirantes de Piratininga, que haviam arrasado as reduções do Guairá caçando e escravizando índios para a escravidão das lavouras de cana-de-açúcar de São Paulo e Rio de Janeiro, quando souberam que os padres tinham vindo mais para o sul e erguido suas aldeias no Tape, vieram aqui fazer o que sabiam fazer. Assim e aos poucos, os padres tiveram que refluir para o oeste, fazendo agora na volta o mesmo caminho que tinham feito na vinda.

E nessa fuga tratavam de levar consigo tudo o que podiam carregar. O que não podiam, queimavam ou enterravam. Casas, plantações, até igrejas foram incendiadas, para que nada ficasse aos bandeirantes.
Pois diz que numa dessas avançadas pelo Planalto, no rumo da Serra, uma carreta carregada de ouro e prata, fugindo das Missões.

Ali vinha a alfaia das igrejas, candelabros, castiçais, moedas, ouro em pó, um verdadeiro tesouro cujo peso faziam os bois peludearem. Com a carreta, alguns índios e padres jesuítas e atrás deles, sedentos de sangue e ouro, os bandeirantes.

Ao chegarem às margens de uma lagoa, não puderam mais.

Desuniram os bois e atiraram a carreta com toda a sua preciosa carga na lagoa, muito profunda. E aí então os padres mataram os índios carreteiros e atiraram os corpos n’água, para que não contassem a ninguém onde estava o tesouro. Com o sangue dos mortos, a lagoa ficou vermelha.

E lá está, até hoje. Ao seu redor, cresceu uma bela cidade, que tomou seu nome – Lagoa Vermelha. E cada um dos seus moradores que passa na beira das águas coloradas, lembra que ali ninguém se banha, nem pesca, e segundo a tradição, a lagoa não tem fundo. E nas secas mais fortes e nas chuvaradas mais bravas, o nível da lagoa é sempre o mesmo.

Fontes:
http://www.lendas-gauchas.radar-rs.com.br/
Imagem = São Sepé por Azuir Filho

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Rio Grande do Sul

Folclore do Paraná

O Paraná é rico em tradições folclóricas, assim como os demais estados brasileiros. Os costumes indígenas, podemos afirmar, são os mais antigos hábitos da terra e muitas influências legaram à nossa cultura. A língua portuguesa, por exemplo, de onde parte e retorna nosso mundo real e imaginário, recebeu inúmeras influências do tupi. Além disso, a imaginação do europeu, que aqui aportou na aurora da conquista, se redimensionou com os mitos e costumes indígenas. Por exemplo, em todo o Paraná, assim como em quase toda a América, o milho é parte integrante da culinária; a nossa pamonha, nosso bolo de milho ou o curau estão presentes em qualquer festa junina, ou festa de roça na época da colheita. Esse hábito herdamos dos índios e até hoje os guaranis ainda fazem o batismo do seu milho, confeccionando seus Mbojape, nossa pamonha ancestral.

No litoral, as tradições se encontram no cotidiano; em muitas localidades ainda se pratica o artesanato tradicional. Os potes de barro, os trançados, as pinturas com traços europeus e índios, podem ser encontrados em lugares recônditos das baías do litoral paranaense. Os “caiçaras” confeccionavam, até bem pouco tempo, as canoas de um pau só, com a árvore do guapuruvu, que, quase extinta, obriga a busca de outras soluções. O fandango, bailado tradicional do litoral, possui um aparato impressionante que envolve as comunidades em todo o seu processo. As violas, as rabecas, os tamancos são feitos pela comunidade; as danças, os cantos e modo de executar os instrumentos e bailar as modas são transmitidos espontaneamente; o fandango de um lugar traz sua marca, sua identidade própria, diferenciando-se de outros. É um arcabouço pertencente a uma comunidade, que identifica suas tradições, mentalidade e valores.

A professora Roselys Veloso Roderjan, musicista e grande pesquisadora da história e do folclore paranaense, realizou importante pesquisa, recolhendo junto a essas comunidades canções tradicionais do fandango, inclusive cifrando as letras para partituras, dando uma contribuição importante para a preservação da memória dessa nossa tradição.

As Folias de Reis ocorrem em quase todo o país. No norte e noroeste do Paraná são ainda uma tradição significativa. No processo de colonização do Paraná, migrou para o Estado com os paulistas e mineiros que colonizaram estas regiões. Assim como no fandango, os pontos de viola, os cantos, o conhecimento das alegorias são passados oralmente e intuitivamente de geração a geração. A memória dos velhos, dos cantadores, ou dos rezadores antigos, é o eixo principal da tradição: sem estes personagens a corrente se quebra e as tradições podem desaparecer. As bandeiras do divino são uma rica tradição ainda encontrada. Em Guaratuba celebra-se uma festa tradicional do divino, com duas bandeiras bem caracterizadas em procissão. As festas, rodas, danças ou terços de São Gonçalo do Amarante praticamente desapareceram – infelizmente – do Paraná (existe uma comemoração magnífica em Pernambuco, no município de Igarassu, localidade de Itapissuma). Santo que, em suas peregrinações no século XII, levava uma viola e unia o povo em torno dos seus cantos e em meio à roda de danças, São Gonçalo é, para os fiéis, detentor de grandes poderes.

As cavalhadas e as congadas são festas riquíssimas, de longa tradição. Guarapuava e Palmas realizavam suas cavalhadas. Na Lapa realiza-se uma congada de São Benedito; a festa que tem como principal elemento o simbolismo da coroação de um rei do Congo é realizada por ocasião da comemoração de São Benedito. As cavalhadas no Paraná, parece-nos, foram mais largamente praticadas pelo povo sertanejo no princípio do século XX. Estes, abandonados nos sertões do sul do Paraná e norte de Santa Catarina, pela república que nascia, promoveram uma das maiores revoluções camponesas da história do Brasil: a Guerra do Contestado (1912-1916). Liderados pelo monge João Maria praticavam a cavalhada, como forma de combate. Elementos medievais das cruzadas foram incorporados pelo Exército Encantado de São Sebastião, criado pelos revolucionários. Se as cavalhadas eram praticadas nos redutos dos camponeses, bem pode ser que tenham contribuído para a difusão e a permanência, até os dias de hoje, deste costume entre o povo da região de Palmas e Guarapuava.

Os imigrantes, radicados principalmente no sul, trouxeram manifestações próprias, incorporaram-nas ao nosso acervo popular. Tradições polonesas, alemãs, ucranianas, japonesas e tantas outras, somaram-se a essas manifestações antigas de origens índias, africanas, portuguesas e espanholas, tornando o Paraná moderno ainda mais complexo e rico.

Durante todo o ano ocorrem festas populares e celebrações sacras em todo o Estado. A maioria dessas celebrações homenageia santos ou santas padroeiras dos municípios, outras são antigas tradições praticadas por devotos, ou manifestações populares muito ricas, nas quais a arte popular e a religião se misturam ao longo do tempo. Grande parte é oriunda de antigas tradições, herdadas da Europa medieval; várias celebrações e festejos praticados no Brasil ocorriam, ou ainda ocorrem, também em Portugal, ou na Península Ibérica, demonstrando as influências culturais que possuímos da colonização portuguesa e espanhola.

Nas festas populares encontramos raramente as antigas manifestações folclóricas paranaenses: as cavalhadas ainda são praticadas, porém já desfiguradas de suas características originais; o fandango do litoral, com todos os costumes que o envolvem, ainda ocorre, porém somente em algumas localidades das baías de nosso litoral.

Estado com grande diversidade cultural, o Paraná recebeu também imigrantes de diversas partes do mundo e migrantes de inúmeros outros estados do Brasil. Deste modo, existe uma grande variedade de festas regionais, que são heranças da história local e, muitas vezes, devido a estas características singulares de ocupação e colonização, somente se apresentam naquela região. Em Siqueira Campos, por exemplo, ocorre há mais de setenta anos a festa do Senhor Bom Jesus da Cana Verde, em honra a quem foi edificado um santuário com a vinda da imagem do santo, provavelmente de Minas Gerais. A região recebeu no início do século XX um grande número de migrantes mineiros, que estabeleceram um dos primeiros núcleos coloniais do norte pioneiro, então denominado Colônia Mineira.

Celebrações como as festas de São Benedito, santo negro protetor dos escravos, são encontradas em vários municípios. Em alguns municípios que margeiam rios, como o Paraná e o Iguaçu, se realiza a festa de Nossa Senhora dos Navegantes, celebração muito popular no Brasil, ocorrendo também na região norte e no sul do país. As celebrações de Folia de Reis, que contam a história da visita dos três reis magos à manjedoura de Jesus Cristo recém-nascido, são realizadas em muitos municípios; em alguns deles ocorrendo, inclusive, concursos para premiar as melhores folias. As folias, muito comuns em todo o país, também foram trazidas por paulistas e mineiros para o Paraná.

Em Antonio Olinto, tem-se a romaria de Nossa Senhora dos Corais, inclusive com missa dita em ucraniano. Os ucranianos são um dos mais significativos grupos de imigrantes que aportaram nestas terras, no início do século XX. A festa para a Virgem de Caacupê, em Guaíra, de origem paraguaia, homenageia a santa com procissões e, inclusive, missa em língua guarani. Os índios guaranis, por seu turno, ainda realizam seu ritual vespertino da Casa de Reza, talvez uma das mais antigas celebrações religiosas do Paraná, já que os guaranis, autóctones habitantes da terra, conviveram com as reduções jesuíticas há mais de quatrocentos anos.

Nos Campos Gerais, região de influência tropeira, grande parte das tradições são heranças desse ciclo econômico e cultural, um dos mais importantes ocorridos nas regiões meridionais do Brasil. Em Piraí do Sul, homenageia-se o senhor Menino Deus, festa que remonta a esses tempos do tropeirismo e cuja imagem original, estima-se, tenha sido trazida no século XVIII por tropeiros das ruínas das missões jesuíticas de Sete Povos, no Rio Grande do Sul, para a primeira capela surgida em Piraí do Sul, então local de passagem das tropas.

Inúmeras tradições populares, porém, estão em vias de desaparecer ou desapareceram no Paraná, como as festas de São Gonçalo, o Boi de Mamão, o Pau-de-Fita etc. As Folias de Reis são um bom exemplo desse fenômeno; outrora comuns em quase todo o Brasil – não diferentemente no Paraná – são hoje pequenas reminiscências praticadas pelos antigos em alguns municípios, com o singelo desinteresse das gerações mais novas. Os novos tempos se impõem, as tradições tendem a se transformar e, algumas vezes, infelizmente, são esquecidas e abandonadas.

… as flores que nunca morrem,
são essas que em ti se movem.
Árvore do Mundo, Carlos Nejar

Quem vai podar o homem dos sonhos, das suas ilusões, da imaginação fértil e livre que constrói os básicos sentidos para o mundo e a vida. Isso, até hoje, não pode, e não deve ser contido. Os símbolos e a linguagem (outro símbolo) planam soltos. Vêm, de onde ninguém sabe. E são eles que identificam uma sociedade, um povo, dando-lhe uma identidade singular, onde quer que ele esteja.

Os mitos e as lendas são fenômenos da psique, dos dados individuais e coletivos, da trajetória épica, trágica ou cômica, dos seres humanos. Através dos mitos e das lendas pode-se penetrar nos meandros psicológicos dos homens, investigar seus desejos e suas leituras da terra e de si mesmos; o que é, num certo sentido, conhecer a própria história. Só que em uma visão mais ampla do que a análise fatual. É uma tarefa árdua tentar divisar nas mitologias seus possíveis adventos fatuais. Mitos de criação do mundo, com seus heróis épicos em luta com a natureza e os deuses, são comuns nas sociedades antigas.

Essas histórias estão recheadas de eventos naturais catastróficos e monstros transumanos, contra os quais os heróis e heroínas se põem em luta bravia, para redimir a sociedade, de uma falta, uma culpa, ou um desvio impensado das conveniências divinas. Muitos desses eventos parecem ter sido ocorrências físicas, ou geológicas, reais. Mas, como o homem podia explicar o inexplicável? Os rituais de nascimento, morte e de passagens, as viagens fantásticas, são procedimentos necessários de expiação, busca da paz, da superação, da transposição para uma nova posição individual e social; são caminhos para o apaziguamento da alma. E, assim, os mitos e as lendas se fizeram e se fazem.

Como para a poesia está o poema. Ou seja, a antiga discussão entre forma e conteúdo. Sendo o poema a forma, as vestes da poesia, que se vela muito mais além e guarda os sentidos mais próprios. Muitas vezes está a lenda para o mito. O mito é fundante, mais profundo, uma matriz originária; as lendas e contos populares contam os mitos, de diversas maneiras, sendo que esses relatos vão se metamorfoseando, conforme o tempo passa, a natureza e a sociedade mudam.

O tempo e a imaginação popular se encarregam de rebuscá-los, continuamente. Como uma pintura que jamais é finalizada, interminável; pois, a cada dia o artista, ou os artistas, lhe altera as cores, os tons, as formas. E assim infinitamente.

As lendas e os contos populares, porém, estão libertos. Não estão presos ao destino de serem cantores dos mitos. Soltos, criam suas próprias histórias. Sua base fundamental é a oralidade. A fala do povo. É na conversa do povo, nos sotaques, feitos e jeitos, na produção artística e no trabalho, nos acontecimentos que “ninguém” viu, mas ouviu dizer, que os contos florescem. Férteis, sólidas crenças e crendices, pois bem arraigados na liberta imaginação.

Fonte:
SEEC – Paraná da Gente

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Paraná, Sopa de Letras

Folclore da Lapa/Paraná (João Maria, o Monge da Lapa)

Entre fins do século XIX e a primeira década do XX, o campo brasileiro viu-se sacudido por alguns movimentos populares. De norte a sul surgiram manifestações de cunho religioso, como se o país despertasse de uma enorme letargia.

Conselheiros no nordeste brasileiro (como Antônio Conselheiro, de Canudos, na Bahia) e monges nos sertões meridionais, vários personagens cruzavam os campos de lado a lado, medicando e aconselhando os caboclos, granjeando fama de milagrosos e poderosos. No interior do Paraná, uma figura que aparecia envolta em mistério, antes e durante os conflitos pela posse da terra na região sul do estado, na divisa contestada por Santa Catarina, foi um andarilho conhecido como o Monge da Lapa. Na verdade, foram três os monges que freqüentaram a região, em momentos críticos da história de nosso país.

O primeiro surgiu em meados do século XIX, na década de 40, pouco depois das revoltas liberais que sacudiram o Brasil e pouco antes do término da Guerra dos Farrapos. O segundo marcou sua presença nos anos próximos à abolição da escravidão e do advento da República; em meio à Revolução Federalista temos o seu primeiro registro concreto. Finalmente, José Maria, o terceiro monge, surgiu em 1912, quando a Primeira República incentivava largamente a imigração e a construção de estradas de ferro, com contratos altamente vantajosos para as construtoras.

Entre os dois primeiros existia uma forte semelhança no proceder, a ponto de serem considerados uma só pessoa. “Num dos retratos que corre como sendo do ‘santo’, estampa-se a legenda: ‘João Maria de Jesus, profeta com 188 anos’ – como que a afirmar que os dois foram um só” [2].

As explicações de ambos terem utilizado o mesmo nome aparecem na obra de Oswaldo Cabral, quando o autor aponta as razões de tal procedimento. “O povo chamava todos os monges de João Maria. Não sendo João Maria não seria monge”[3].

Ao assumir o nome de seu predecessor, João Maria de Jesus não forçava, ao ver de Cabral, uma impostura, mas assumia para si a memória de santidade do primeiro monge. Místico também, ele encontrava assim uma melhor forma de penetração junto às populações interioranas. A mudança do nome marca o início de uma transformação na vida.

Apesar de utilizar os dois primeiros nomes de João Maria de Agostini, nunca tomou o último nome deste, do mesmo modo que nunca afirmou ser o mesmo que percorreu os sertões em meados do século XIX. Afinal, o santo dos sertanejos não era de Agostini ou de Jesus, “… há apenas um João Maria, e não só o João Maria do Contestado, mas o querido João Maria da devoção popular” [4].

Várias são as lendas que permanecem na memória de moradores do interior paranaense e que acabaram por conquistar as cidades, localizando-se em diversas camadas da população, trazidas pelo êxodo rural. Muitas das localidades de Santa Catarina, apontadas a seguir, pertenciam ao território do Paraná e foram repassadas ao estado vizinho após acordo que ratificou a divisão da região contestada, à época do presidente Wenceslau Braz, em 1916.

São lendas que dizem respeito à origem dos monges, lendas sobre profecias, punições, milagres e prodígios e finalmente lendas relativas ao fim dos monges. Estas lendas confundem os monges que as praticaram ou sofreram, sendo atribuídas ao monge simplesmente. Este caráter dúbio é parte da própria estrutura das lendas.

Sobre a origem do monge, do porquê de sua peregrinação pelo sertão, a mais rica lenda que encontramos é a de que sendo cristão, abandonou a religião para se casar com uma moura e combateu o exército expedicionário francês. Sendo feito prisioneiro, após a morte de sua esposa, conseguiu fugir e no Egito teve a visão do apóstolo Paulo, que o mandou peregrinar 14 anos (ou 40 em outra versão) pelo mundo, reconvertendo-se assim ao cristianismo. Sua cidade de origem seria, neste caso, Belém, na Galiléia.

Outras lendas davam conta de ser o monge um criminoso, não se dizendo o crime, ou que tivesse seduzido uma religiosa, que teria falecido na viagem para a América. Sua penitência seria vagar solitário pelos sertões. Existe também aquela que dizia ser o monge um apátrida, nascido no mar, de pais franceses, tendo sido criado no Uruguai.

As lendas sobre profecias são também bastante extensas, a começar de seu próprio desaparecimento, quando terminasse sua missão, no morro do Taió, hoje território de Santa Catarina. Previu o aparecimento de uma cidade no local em que estava, o que efetivamente se deu após a definição do litígio sobre a fronteira; seu nome, segundo o monge, seria Santa Cruz, e a cidade chamou-se Cruzeiro e hoje é o município de Joaçaba, SC.

Teria previsto o advento da República alguns anos antes. Previu também os trens e os aviões, no estilo dos antigos profetas. “Linhas de burros pretos, de ferro, carregarão o pessoal”. Depois deles, as guerras com as derrotas sucessivas dos sertanejos e “gafanhotos de asas de ferro, e estes seriam os mais perigosos porque deitariam as cidades por terra”.

Chegando a uma casa onde uma mãe acabara de dar à luz, reclamou o batismo da criança recém-nascida e somente depois lhe foi contado que a parturiente havia feito promessa de dar o nome de João Maria e convidar o monge para padrinho, se fosse feliz na hora do nascimento.
O primeiro monge teria previsto que outros o seguiriam, enquanto o segundo teria indicado a guerra que se avizinhava (a guerra do Contestado), onde os seus seriam dizimados.

As lendas de caráter punitivo são muitas, que contrastam com a imagem bondosa do monge. De modo geral, são castigos para aqueles que, desdenhando de sua santidade, não respeitaram regras estabelecidas por ele.

Existem as histórias relativas ao queijo. Conta-se que pedindo um pedaço de queijo em uma fazenda, este lhe foi negado, tendo então repetido a profecia feita para Canoinhas, anunciando o fim da prosperidade da fazenda.

Conta-se que uma senhora querendo dar ao monge um queijo, tendo falado a este respeito com seu marido, ordenou-lhe este que lhe fosse dado um outro menor (outra versão diz menor e podre). Segundo uma narrativa teria o monge aceitado apenas um pequeno pedaço do queijo, jogado fora mais da metade, por adivinhar a má vontade do dono. Outros comentam que sendo podre o queijo, João Maria o levou e escondeu sob uma pedra, ou o esmigalhou no pasto, ainda dentro da propriedade do tal fazendeiro. Em todos os casos, a prosperidade da fazenda desandou, chegando, em uma das versões, toda a família à loucura, ou morrendo o fazendeiro na mais miserável pobreza.

Às regiões de pouca fé do povo, predisse pragas, dizendo que aqueles que quisessem salvar suas roças deveriam plantar aquilo que desse sob a terra (tubérculos) – o que realmente aconteceu em Taquara Verde, município de Porto União, SC. Predisse que a localidade de Vila Nova do Timbó, por seu povo ateu, se transformaria num porungal, ou seja, suas terras perderiam a fertilidade. O lugarejo teria realmente regredido.

Ao ser preso na Lapa, predisse castigos dos céus e um violento temporal sobre a cidade. Em duas cidades diferentes, Hamburgo Velho (RS) e outra do Paraná, ao ser apedrejado por crianças que o tomavam por mendigo, perdoou às crianças, mas disse, serenamente, que as cidades seriam apedrejadas como ele. Em ambos os casos, dias depois, uma chuva de granizo arrasou as plantações, castigando a cidade. Tal evento teria também acontecido na Lapa.

Com relação às fontes, contam-se duas lendas de caráter punitivo. Uma seria uma água abençoada por ele, com a previsão de que não se entrasse na fonte para se banhar. Duas prostitutas, tendo ignorado o aviso, banharam-se para curar algumas feridas, o que provocou o ressecamento imediato da fonte.

Nas proximidades da Lapa, uma família tendo comprado uma propriedade, que tinha em suas terras uma fonte benzida, e não crendo no poder da água santa, cercou a área, proibindo a entrada de intrusos. Ao mesmo tempo, ateou fogo ao cruzeiro e ao pinheiro que havia no pouso. Como resultado, perdeu todas as suas posses e ficou louca.
As lendas sobre milagres e prodígios fazem parte do maior grupo conhecido. Existia a crença de que em meio às tempestades, o monge permanecia sentado ao relento, mas que não se molhava, bem como nos lugares de determinadas cruzes.

Conta-se também que podia estar em dois lugares diferentes, orando em sua gruta e ao lado de uma doente que invocava por ele. Conta-se que podia ficar invisível aos seus perseguidores, atravessar a pé sobre as águas dos rios, e que suas cruzes cresciam – não só o corpo, como também os braços – ou brotavam 40 dias após o monge tê-las levantado.
Bastões, com a “medida do monge”, fincados em cada extremo de uma fazenda protegiam o gado contra doenças. As velas, feitas na medida do palmo do monge, afugentavam os maus espíritos e acalmavam as tempestades.

Conta-se que o monge era imune aos índios e às feras, não sendo jamais atacado por elas. Diz-se também que fazia surgir olhos d’água nos lugares onde pousava. Da mesma maneira, podia se fazer transportar no ar ou desaparecer quando a multidão que o cercava crescia em demasia.

As curas são constantes em suas lendas. Teria curado adultos e crianças já à morte com infusões de uma planta chamada vassourinha e rezas. Em Mangueirinha e na Lapa, se contam casos de curas milagrosas de dores de dentes.

As lendas referentes a galinhas são bastante difundidas. Conta-se que uma senhora ofereceu uma galinha ao monge, que não aceitou o presente por ele ter sido dado antes ao diabo. A mulher teria se referido à ave como “galinha do diabo” ao ter esta sujado seu vestido no caminho para a pousada de João Maria, ou praguejado dizendo “que o diabo a carregue”, por não ter conseguido pegar no terreiro, só o fazendo horas depois. É interessante notar, como o faz Oswaldo Cabral, que essa lenda já teria se referido anteriormente a outras pessoas.

Igualmente se conta a lenda da batata. João Maria teria sido convidado a comer batata-doce com leite com uma família, a qual havia incumbido uma escrava de colhê-las. A escrava teria dito que a maior seria dela e não do velho mendigo. Na hora do jantar, todas as batatas da mesa, o monge se recusou a comer a melhor das batatas-doces, por já possuir dono.

Pernoitando na dita fazenda, pediu ao amanhecer um cavalo ou burrico, para atender ao chamado de um doente distante. Pedindo um animal manso, foi lhe dado um manco, o qual na volta da jornada não portava nenhuma deficiência no andar. João Maria teria debelado, ainda, uma epidemia de varíola em Rio Negro, afastando a peste com rezas e com 14 cruzes plantadas como Via Sacra na cidade. Ainda hoje existe uma das cruzes na cidade: chama-se cruz de Mafra.

As lendas relativas ao desaparecimento ou morte do monge dão conta que ele teria dito que ao final de sua peregrinação iria para o morro do Taió, região que se sabia habitada por índios hostis, os botocudos. Após a sua morte, seu espírito teria aconselhado um viajante de Guarapuava que foi à sua procura no morro.

Outra tradição diz que morreu de velhice em Araraquara (SP), ou que foi encontrado agonizante próximo aos trilhos da estrada de ferro perto de Ponta Grossa. A crença mais difundida é, no entanto, que não teria morrido. Após jejuar por 48 horas no Taió, o monge teria sido levado por dois anjos para o céu. Em outra hipótese, seu corpo teria se envolvido em luz tão forte que o fez desaparecer, deixando uma marca vermelha no chão, que os incrédulos confundiam com sangue.

Criações do povo, estas lendas formam um conjunto de crenças que demonstram o caráter mágico de sua apreensão da realidade, indubitavelmente belas como demonstração de mentes criadoras. Vejamos algumas que permanecem na tradição de alguns outros municípios paranaenses.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––-
Notas
[1].Parte deste texto foi publicado como integrante da monografia para conclusão do curso de especialização Metodologia do Ensino Superior. CARNEIRO JR., Renato Carneiro. O Monge da Lapa: um estudo da religiosidade popular no Paraná. Curitiba: Faculdades Positivo, 1996.
[2].CABRAL, Oswaldo R. João Maria. Interpretação da Campanha do Contestado. São Paulo: Comp. Editora Nacional, 1960.
[3]. Idem.
[4]. Idem.
__________________________
Fontes:
SEEC – Paraná da Gente
Imagem do Acervo de Orty de Magalhães

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Paraná

Folclore do Ceará (A Princesa Encantada de Jericoacoara)

Na cidade de Jericoacoara, no Ceará, diz a lenda que, debaixo do morro do farol local, existe uma linda princesa encantada, morando numa gruta, cheia de riquezas. Só se desencantará se alguém for sacrificado. A Princesa está transformada numa serpente, com a cabeça e os pés femininos. Faz-se uma cruz com o sangue humano no dorso da cobra. E ela voltará a forma humana para sempre.

Perto da praia, quando a maré está baixa, há uma furna onde só se pode entrar agachado. Esta furna de fato existe. Só se pode entrar pela boca da caverna, mas não se pode percorrê-la, porque, está bloqueada por um enorme portão de ferro.

A cidade encantada e a princesa estariam além daquele portão. A encantadora princesa está transformada, por magia, numa serpente de escamas de ouro, só tendo a cabeça e os pés de mulher.

De acordo com a lenda, ela só pode ser desencantada com sangue humano. Assim, no dia em que alguém for sacrificado junto do portão, abrir-se-á a entrada para um reino maravilhoso. Com o sangue será feita uma cruz no dorso da serpente, e então surgirá a princesa com toda sua beleza, cercada de tesouros inimagináveis, e a cidade com suas torres douradas, finalmente poderá ser vista. Então, o felizardo responsável pelo desencantamento, poderá casar com a princesa cuja beleza é sem igual nesse mundo.

Mas, como até hoje não apareceu ninguém disposto a quebrar esse encanto, a princesa, metade mulher, metade serpente, com seus tesouros e sua cidade encantada, continuam na gruta a espera desse “heróí”.

Essas princesas-serpentinas são comuns no folclore nortista. Mário Melo fala da furna da Serra Talhada, em Vila Bela, Pernambuco, morada duma princesa, semelhante a esta.

Princesas tornadas serpentes são vestígios do ciclo das Mouras na península ibérica. Em Portugal quase a totalidade das Mouras Encantadas vive sob a forma de serpentes. Nas noites de São João ou Natal, antes da meia-noite, voltam à forma humana, tornadas mulheres lindas, cantam, penteando-se com pentes de ouro. Ao seu lado pode-se ver a pele de serpente à espera do corpo para a continuação da maldição. O ferimento, mesmo diminuto, bastando apenas que derrame sangue, quebra o encanto. Aqui a lenda se assemelha com o mito da Cobra Norato, do Pará.

Informações Complementares:

Nomes comuns: Cidade encantada de Jericoacoara, A Princesa encantada do mesmo nome, O Reino Encantado, O Reino de Pedra Bonita.

Origem Provável: A tradição de Jericoacoara é legitimamente portuguesa e a princesa enfeitiçada é uma “moura”, esquecida em seu castelo obscuro, guardando ouro, joias, pedrarias, barras de prata, montões de moedas, para o heroi audacioso que resolva lhe “quebrar” o encanto. Em toda a Europa e Ásia, existem relatos muito antigos de vários povos que falam de cidades encantadas, onde moram reis e princesas, outras vezes raças de inteligência superior.

Vinda da Europa, pelos espanhóis, havia a lenda que falava de um lugar maravilhoso que poderia estar oculto nas florestas virgens da América do Sul, onde as pessoas viviam eternamente. Se alimentariam da água da Fonte da Juventude eterna. Também os espanhóis acreditavam existir uma fenomenal cidade subterrânea com tesouros fabulosos, nas montanhas dos Andes, seu nome seria Cibola.

No estado de Pernambuco, na cidade de Serra Talhada, antiga Vila Bela, existe uma lenda parecida que também fala de uma gruta encantada onde mora uma princesa serpente. Outros afirmam que esta gruta, seria na verdade o Reino de Pedra Bonita, que ficava no sítio de Pedra Bonita, na mesma cidade, e onde viveu um povo muito místico e cruel.

Conta a lenda que para manter o reino encantado e oculto das vistas de curiosos, os habitantes locais sacrificavam crianças cujo sangue puro, mantinha sua invisibilidade. Se isto não fosse feito, o reino se desencataria e se tornaria visível. Naquele reino existiria uma fabulosa mina encantada de diamantes.

A Serpente, o animal sem idade, o animal sábio, é a forma preferida pela alta e velha magia árabe. As tradições orientais estão repletas de rainhas e princesas que vivem como grandes cobras, sujeitas a uma penitência cujo fim depende dum gesto humano e cavalheiresco.

Toda Europa conhece a tradição de Melusina, a fada amorosa da casa dos Lusignan. Filha da fada Pressina, Melusina se tornava serpente todos os sábados. Durante uma caçada, Raimondin, filho do conde de Forez, encontrou-a numa floresta do Poitou. Apaixonaram-se e se casaram. Melusina construiu milagrosamente o castelo de Lusignan. Viviam amorosamente. Nasceram oito filhos, fortes e belos mas portadores de anomalias.

Vriam, o primogênito, tinha a face mais larga do que longa e um olho era vermelho e o outro azul. Odon, o segundo, possuía orelhas enormes. Guion, o terceiro, apresentava os olhos colocados desigualmente. A face do quarto filho, Antônio, era marcada por uma garra de leão. Renault, o quinto, parecia um Ciclops, com seu único olho mas enxergava numa distância de vinte e uma léguas. Godofredo, o sexto, orgulhava-se de ter apenas um dente que lhe saía da boca mais de uma polegada. O sétimo tinha um nariz peludo como se fosse uma toupeira. O oitavo, não se sabe o nome, se tornou monge. Este possuía três olhos.

Melusina fizera o marido jurar que não a procuraria ver durante os sábados. Anos depois, tomado pela curiosidade, o fidalgo abriu um furo com a espada na porta do aposento onde a esposa se banhava. Viu-a como uma enorme e horrenda serpente. Gemendo de dor, Melusina desapareceu por uma janela. Nunca mais o marido tornou a vê-la. Fiel ao seu amor, cada vez que o castelo de Lusignan mudava de senhor, ou um dos chefes da família ia morrer, Melusina aparecia no alto das torres do castelo, chorando. Três dias depois voltava para anunciar a visita do anjo da morte.

Vê-se claramente, pelo exposto, porque a princesa de Jericoacoara ainda espera pelo seu Salvador, um homem sem medo e sem mácula, armado apenas de coragem e transbordando de amor.

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br/folk20.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Ceará

Folclore do Pernambuco (A Lenda do Papa Figo)

O Papa Figo, ao contrário dos outros mitos, não tem aparência extraordinária. Parece mais com uma pessoa comum. Outras vezes, pode parecer como um velho esquisito que carrega um grande saco às costas.

Na verdade, ele mesmo pouco aparece. Prefere mandar seus ajudantes em busca de suas vítimas. Os ajudantes por sua vez, usam de todos os artifícios para atrair as vítimas, todas crianças. Para isso vale distribuir presentes, doces, moedas ou cédulas de dinheiro, brincar fazendo caretas, brinquedos ou comida. Eles agem em qualquer lugar público ou em portas de escolas, parques, ou locais com pouco movimento.

Depois de atrair as vítimas, estas são levadas para o verdadeiro Papa-Figo, um sujeito estranho, rico, que sofre de uma doença rara e sem cura. Alguns sintomas dessa doença seriam o crescimento anormal de suas orelhas ou o corpo leproso.

Diz a lenda, que para aliviar os sintomas dessa terrivel doença ou maldição, o Papa-Figo, precisa se alimentar do Fígado de uma criança. Feito a extração do fígado, eles costumam deixar junto com a vítima, uma grande quantia em dinheiro, que é para o enterro e também para compensar a perda junto a família.

O Papa-Figo é uma espécie de Lobisomem da cidade. Nunca muda a forma. É um homem velho, sujo, vestindo farrapos, com ou sem um saco às costas, ocupando-se em raptar crianças para comer-lhes o fígado ou vendê-lo aos leprosos ricos. É alto e magro. Conforme a região é pálido, sórdido, com barba sempre por fazer. Sai à noite, às tardes, ao por do sol. Aproveita a saída das escolas, os parques onde as babás se distraem com os namorados, as praças ensombradas.

Nesses ambientes atrai as crianças com gestos engraçados, ou mostrando brinquedos, dando falsos recados ou prometendo levá-las para um local onde há muita coisa bonita.

Informações Complementares:

Nomes comuns: Negro Velho, Velho do Saco, etc.

Origem Provável: Mito universal, muito comum em todo meio rural. Acredita-se que a intenção do conto era um alerta às crianças sobre o contato com estranhos. Nesse ponto se assemelha ao conto original de Chapeuzinho Vermelho, cuja ideia por trás da estória, era simplesmente alertar sobre o perigo do contato com os viajantes, os forasteiros, que, não raramente, costumavam raptar crianças em suas andanças pelas aldeias medievais.

Em abril de 1938 foram presos na cidade de Natal dois indivíduos de cor que iam levando crianças. Eram pretos de meia idade, doentes, palúdicos, visivelmente dementes. A polícia resgatou as crianças e mandou-os embora.

Fatos semelhantes se repetiram em Ceará e Pernambuco. No interior dos Estados corre a mesma estória, irradiando pavores idênticos em todos.

Dizia Gilberto Freire (Casa Grande & Senzala, 1933, p. 368): “E havia ainda o Papa-Figo – homem que comia fígado de menino. Ainda hoje se afirma em Pernambuco que certo ricaço do Recife, não podendo se alimentar senão de fígados de crianças, tinha seus negros por toda parte pegando menino num saco de estopa.”

Na terapêutica contra a Lepra, o banho do sangue humano e a degustação do fígado, especialmente das crianças, são remédios tradicionais. Hermeto Lima conta a horripilante estória da Onça, uma velha leprosa que, a consellho dos ciganos, furtava as crianças da “Roda dos Enjeitados”, para banhar-se no seu sangue. Só depois de morta a polícia soube das monstruosidades que cometera. (A Onça se chamava Bárbara dos Prazeres e morreu no Rio de Janeiro em 1835. Hermeto Lima narra em detalhes o episódio em Os Crimes célebres do Rio de Janeiro, 1820-1860, Ed. da Empresa de Romances Populares, 1921)

De depoimentos dos leprosos da época, entre todos, era corrente a ideia de que a Lepra não era doença da pele. Era crença firme entre todos que a Lepra era doença do sangue, o sangue está impuro. E muitas doenças ainda conservam nomes decorrentes dessa crença: Sangue Novo (urticária), Calor do Sangue (tinha), Calor do Figo, etc.

Assim, depurar, reforçar o sangue era a única terapêutica que lhes assegurava a tradição secular. Como o sangue vem do fígado, tratar, melhorar o fígado, era o único meio de cura, o resto, para eles, era perda de tempo. “Um fígado doente trata-se com um fígado sadio”, era a firme convicção, o coro, daqueles infelizes acometidos pelo mal.

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br/folk04.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Pernambuco

Folclore de Minas Gerais (Chibamba)

Fantasma do ciclo das assombrações criadas para assustar crianças, para fazer parte dos seus pesadelos noturnos. É do sul de Minas Gerais. Amedronta as crianças que choram, as teimosas e as malcriadas. Anda envolto em longa esteira de folhas de bananeira, ronca como se fosse um porco e dança de forma compassada enquanto caminha; às vezes gira.

O nome é um vocábulo africano, Bantu na verdade, e teria como significado uma espécie de canto ou dança africana à exemplo do Lundu [Espécie de dança nativa africana].

Há uma quadrinha que diz:
Ê vém o Chibamba, nêném, ele papa minino, cala a boca!…

O Chibamba vestido de folhas de bananeira e dançando, lembra a África de onde o nome é originário. Em Angola e Congo ainda os negros, em suas tradições festivas e folclóricas, dançam vestindo elaboradas roupas feitas de folhas, ramos e galhinhos de plantas locais.

Na Ásia, entre os antepassados dos Laos, da indochina francesa, chamados de Pu Nhiê, há uma dança. Os Pu Nhiê, em certa época, vestindo folhas e peles, surgem com máscaras de monstros excêntricos. E Dançam lentos, compassados, dando giros misteriosos, ao som de tambores.

A dança grave, em giro, é bem africana e de finalidade religiosa. As outras, coletivas, festivas, em ritmo mais agitado, são rituais de pesca e caça.

O Chibamba é um remanescente dos rituais negros da África, que se transformou em Cuca, ou Negro Velho, e se tornou encarregado de fazer dormir à força as crianças. O fato de “roncar como um porco” é uma adaptação brasileira.

Chibamba, pelo nome e maior influência negra que indígena em Minas Gerais, é africano. Ali ele vive, fazendo as crianças dormirem, mesmo quando não estão com vontade.

Notas complementares:

Nomes comuns: Chibamba.

Origem: Africana.

De fato, os nativos africanos se vestiam com folhas e usavam máscaras assustadoras nos seus rituais de pesca, caça e mesmo religiosos. Sua chegada ao Brasil mineiro, em seus terreiros festivos, onde as amas pretas de leite cuidavam dos seus bebês e também das crianças brancas, explica o surgimento do Chibamba como criatura assustadora.

Era uma oportunidade e tanto mostrar às crianças, aqueles figurantes caracterizados como monstros cobertos de folhas e mascarados, como uma entidade que viria atormentar crianças que não queriam dormir.

Na tradição africana, os figurantes cobertos de folhas e mascarados, simbolizavam a reencarnação dos seus antepassados, que ora os visitavam, para abençoar suas festas, caçadas, colheitas, guerras e rituais de casamento.

Também os nossos índios dançavam envoltos em folhas e tecidos vegetais. Não é uma tradição dos Tupis, mas entre os pajés do Brasil colônia. Estes dançavam, nas horas dos rituais religiosos, disfarçados, cobertos de folhas e pintados com corantes vegetais. A dança lenta, rodada, com os figurantes cobertos com vestimentas ornamentadas, era tradição entre os Gês, Nu-aruacos e Caraíbas. Mas a influência para a existência do Chibamba mineiro é mesmo africana.

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br/cfolc.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Uncategorized

Folclore do Amazonas (A Lenda do Mapinguari)

O Mapinguari é o mais popular dos monstros da Amazônia. Seu domínio estende-se pelo Pará, Amazonas, Acre, vivificado pelo medo de uma população meio nômade que mora nas matas, subindo os rios, acampando nas margens desertas dos grandes lagos e lagoas sem nome.

Caçadores e trabalhadores de todos os ofícios citam o Mapinguari como um verdadeiro demônio do Mal. Não tem utilidades ou vícios cuja satisfação determine aliança momentânea com os religiosos cristãos. Mata sempre, infalivelmente, obstinadamente, quem encontra pela frente. Mata para comer. Descrevem-no como um homem agigantado, negro pelos cabelos longos que recobrem seu corpo como um manto, de mãos compridas, unhas em garra, fome insaciável, ou “canina” como é conhecida uma fome de tamanha envergadura.

Só é vulnerável no umbigo. É crença universal a existência da vulnerabilidade umbilical dos monstros. Indica também que um dia nasceu de outro nascido, que é um ser vivente como todos os outros que habitam a terra, apenas pertencente a uma linhagem pouco compreendida.

Em algumas regiões, também o Lobisomem, pode ser abatido pelo umbigo. O Mapinguari, ao contrário de outras entidades fabulosas, não anda durante a noite. Durante a noite, dorme. O perigo é de dia, a penumbra no meio das florestas fechadas que mal deixam passar a luz do Sol. Na obscuridade dos troncos de muitas formas o Mapinguari se destaca, surge bruscamente, para atacar e ferir. Mas não avança silencioso como seria a lógica. Vem berrando alto, gritos soltos, curtos, horríveis, que deixam suas vítimas atordoadas, sem ação.

De longe os homens ouvem seus apelos terríveis. E fogem, sem olhar para trás. É como se o Mapinguari estivesse desafiando os carajosos para um encontro supremo, face a face. Esses gritos roucos e contínuos explicam os rumores naturais que a floresta produz e não se consegue de forma sensata explicá-los. Assim, sem uma explicação lógica para os muitos e difusos barulhos e murmúrios da densa e misteriosa mata, os homens logo atribuem ao Mapinguari tal repertório sonoro.

Qual seria a origem do Mapinguari? Não parece muito antiga porque seu nome não está presente na lista dos cronistas coloniais. Aparece já nos tempos modernos, mais comumente nas narrativas dos seringueiros, nas lembranças dos récem-vindos da Amazônia. Cronistas famosos como o minucioso Stradelli, ou Tastevin, não registram sua existência nos vocabulários.

Seu físico é quase uma descrição literal do Caapora, assim desenhado por Couto Magalhães: “Um grande homem coberto de pelos negros por todo corpo e cara, montando sempre um grande porco de dimensões exageradas, tristonho, taciturno, e dando vez por outra um grito para impelir a vara.”

Essa é a descrição do Caapora, onde o porco é o elemento não concordante com o Mapinguari.

Já o Caapora de Gonçalves Dias era um índio anão. O Mapinguari é, evidentemente, um Caapora desfigurado, sem alguns elementos que no passado autenticavam sua origem e atividade dentro das florestas. Guarda a estrutura, o grito, o corpo vestido de pelos. Também o seu habitat florestal, continuando a ser um mito das matas, conhecido especialmente por aqueles que nela vivem.

Resumo:
Mapinguari é um animal fabuloso, semelhante ao homem, mas todo cabeludo.
Os seus grandes pelos o tornam invulnerável à bala de qualquer calibre, exceção da parte do umbigo.
Segundo a lenda é ele um terrível inimigo do homem, a quem devora e despreza. Mas devora apenas a cabeça.
Acreditam alguns índios Tuixauas que se trata da reencarnação viva de um antigo rei de sua etnia, que no passado habitava aquelas regiões.

Como o Quibungo africano, o Mapinguari tem a posição anômala da boca, rasgada do nariz ao estômago, num corte vertical, cujos lábios estão sempre sujos de sangue. Depoimentos atestam que seus pés em forma de casco, são virados ao avesso, como o Curupira.

Informações Complementares:

Nomes comuns: Mapinguari.

Origem Provável: É de origem recente e possivelmente uma variante do Curupira. Nenhum cronista do Brasil colônia ou império citam seu nome. Entre os seringueiros e moradores da floresta Amazônica é quase uma unanimidade. Alguns elementos de sua fisiologia e costumes foram com certeza tirados do Caipora ou Curupira. Mas não é de origem indígena, uma vez que há nele uma espécie de caráter punitivo de cunho religioso, coisa alheia aos aborígenes.

O nome Mapinguari possivelmente se trata de uma contração de mbaé-pi-guari, a cousa que tem o pé torto, retorcido, ao avesso. O início da surpresa seria o rastro de forma estranha, circular, indicando justamente a direção oposta ao verdadeiro rumo. Posteriormente é que a imaginação criou a figura material, semelhante aos outros monstros.

Quando ele apanha um caçador, mete-o debaixo do grande braço forte como aço, mergulha-lhe a cabeça na imensa bocarra e masca-o, isto é, come-o aos poucos, mastigando lentamente, remoendo.

Em um ponto distancia-se do Lobisomem. Não há notícia de alguém poder se tornar Mapinguari. O Sr. Mário Guedes[3], pesquisador de mitos, informa que é crença entre alguns índios Tuixauas, escutou isso de um chefe indígena dessa etnia, que o Mapinguari era o “antigo rei da região”. Mas se há essa lenda, o Tuixaua só tomou a nova encarnação depois de morto. Mas, o Mapinguari é uma forma definitiva.

Um dos traços visíveis da catequese católica é a intercorrência do resguardo aos dias santos e domingos. O Mapinguari escolhe quase sempre esses dias para suas aventuras predatórias. Caçador que encontrar matando caça nesses dias proibidos e de preceito, é homem morto.

É opinião concreta entre os compiladores folcloristas, que nessa insinuação está a antiga influência da catequese de tentar incutir entre os selvagens obediência a uma das leis da Igreja, sob o jugo do medo.

Documentário:

J. da silva Campos, em seu livro de contos tradicionais, relata o seguinte episódio.

O Mapinguari (Rio Purus, Amazonas).

Dois seringueiros moravam na mesma barraca, em um “centro” muito afastado, lá naqueles fins de mundo. Um deles tinha por costume sair todos os domingos para caçar. O companheiro sempre lhe dizia:
“Olha, fulano, Deus deixou os domingos para a gente descansar”.
Ao que ele retrucava:
“Ora, no domingo também se come”.

E lá se ia para o mato, onde ficava o dia inteiro.
Por muita insistência sua, o companheiro resolveu-se a ir fazer uma caçada com ele, certo domingo. Foram e perderam-se um do outro. O que não estava habituado a tais empreitadas andou muito tempo à toa, sem acertar o caminho e já não sabia mais onde tinha a cabeça, de atarantado. Foi quando ouviu uns berros medonhos e estranhos, que o encheram de pavor. Subiu mais que depressa numa árvore bem alta e ficou lá em cima, quieto, imóvel, para ver o que era aquilo.

Os berros foram se fazendo ouvir cada vez mais perto, até que ele pôde testemunhar um espetáculo horrendo, que quase o põe louco de terror. Um Mapinguari, aquele macacão enorme, peludo que nem um coatá, de pés de burro, virados para trás, trazia debaixo do braço o seu pobre companheiro de barraca, morto, esfrangalhado, gotejando sangue. O monstro, com as unhas que pareciam de uma onça, começou a arrancar pedaços do infeliz e metia-os na boca, grande como uma solapa, rasgada à altura do estômago, dizendo em altas e terríveis vozes:
“No domingo também se come!”

Assim, o seringueiro viu a estraha fera engolir o infeliz caçador. E lá foi a besta horrenda pela mata, urrando num tom de voz que fazia estremecer até as próprias árvores:
“No domingo também se come!”

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br/folclore_mapinguari.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Amazonas

Folclore do Alagoas (A Cabra Cabriola)

A Cabra Cabriola, era uma espécie de Cabra, meio bicho, meio monstro. Sua lenda em Pernambuco, é do fim do século XIX e início do seculo XX. Ocorre também outros estados.

Era um Bicho que deixava qualquer menino arrepiado só de ouvir falar. Soltava fogo e fumaça pelos olhos, nariz e boca. Atacava quem andasse pelas ruas desertas nas noites de sexta. Mas, o pior era que a Cabriola entrava nas casas, pelo telhado ou porta, à procura de meninos malcriados e travessos, e cantava mais ou menos assim, quando ia chegando:

Eu sou a Cabra Cabriola
Que como meninos aos pares
Também comerei a vós
Uns carochinhos de nada…

As crianças não podiam sair de perto das mães, ao escutarem qualquer ruído estranho perto da casa. Podia ser qualquer outro bicho, ou então a Cabriola, assim era bom não arriscar. Astuta como uma Raposa e fétida como um bode, assim era ela.

Em casa de menino obediente, bom para a mãe, que não mijasse na cama e não fosse traquino, a Cabra Cabriola não passava nem perto.

Quando no silêncio da noite, alguma criança chorava, diziam que a Cabriola estava devorando algum malcriado. O melhor nessa hora era rezar o Padre Nosso e fazer o Sinal da Cruz.

Considerada mais temida que o Lobisomem e a Mula-sem-Cabeça, que são mitos vindos de fora há muito mais tempo, a Cabra Cabriola, logo se tornaria o consolo das mães, já que não precisavam se esforçar muito para fazerem seus filhos a irem para cama cedo. Para os pequenos era o maior pesadelo.

São muitos e coisa regular os contos populares em que figura a Cabra Cabriola em ação. Os testemunhos de época logo se tornavam valiosos meios para as mães colocarem na linha seus filhos travessos.

Notas complementares:

Nomes comuns: Cabra Cabriola, Cabriola, Papão de Meninos, Bicho Papão, etc.

Origem Provável: O mito do Bicho papão que ataca as crianças travessas, é bem antigo e remonta ao tempo da Idade Média na Europa. É uma assombração portuguesa que se tornou parte do nosso fabulário. Na América Central, o Gulén-Gulén-Bo, é um negro que também assusta e come as crianças mal comportadas, e tem as mesmas características da nossa Cabriola.

No Brasil, deriva-se de um mito afro-brasileiro, onde acreditava-se tratar-se de um duende maligno que tomava a forma de uma cabra. Costumava atacar as mães quando estavam amamentando. Bebiam seu leite direto nos seus seios, e depois devoravam as crianças. Além de Pernambuco, há versões deste mito nos estados do Ceará, Bahia, Alagoas, Sergipe e Pará.

A figura da Cabra Cabriola, também é mencionada na Espanha e Portugal. Chegou ao Brasil durante o período da colonização portuguesa.

Fonte:
http://sitededicas.uol.com.br/cfolc.htm

Deixe um comentário

Arquivado em Folclore do Alagoas