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Lev Tolstói (1828 – 1910)

Lev Nikolaievitch, conde de Tolstoi

Escritor soviético nascido na propriedade rural da família, em Iasnaia-Poliana, província de Tula, reconhecido como um dos maiores escritores de todos os tempos.

Tolstói, pai, morrera em 1837. Viúvo, deixara cinco filhos: Dmítri, Sérgio, Nicolau, Maria e Leon, nascido em 28 de agosto de 1828. Tia Alieksandra Osten-Sacken incumbira-se de cuidar das crianças. Naquele tempo, era moda os nobres estudarem com professores estrangeiros. Não ficava bem a um senhor de terras expressar-se em russo, como qualquer mujique (camponês russo). Tentando manter a educação aristocrática iniciada pela tia Alieksandra, foram contratados os serviços de um preceptor alemão de nome Ressel.

O professor não apreciava muito seus discípulos e deles dissera certa vez: “Sérgio quer e pode; Dmítri quer e não pode; e Leon – esse nem quer nem pode.”. Ao ler esta anotação no relatório de seus secretários, a Czarina Maria Alexándrovna sorri: andara errado esse mestre alemão, pois de todos os filhos do velho Tolstói, fora Leon o que mais se distinguira, muito prometendo na arte de escrever. Quatro anos durou o encargo de Alieksandra Osten-Sacken em Iasnaia Poliana.

Em 1841 a tia faleceu e os meninos foram entregues aos cuidados de outra irmã de seu pai, Pielagueia, que morava em Kazan. Era uma mulher severa e áspera, de rígidos princípios morais. Mal dera com os olhos em Leon, decidiu faze-lo militar; como alternativa, poderia ser diplomata.

Em 1844, o jovem viu-se estudando línguas orientais na Universidade de Kazan. Não era das mais brilhantes escolas russas, embora contasse em seu quadro docente com um homem como Nicolau Lobatchiévski (1793-1856), matemático reputado como um dos fundadores da geometria não-euclidiana.

Cada passo, Leon mais e mais decepcionava Pielagueia: nem se portava segundo o manual aristocrata das boas maneiras, nem se distinguia nos estudos. Julgando que tivesse escolhido o curso inadequado, transferiu-se para a faculdade de direito; mas foi reprovado nos primeiros
exames.

Desiludido com a escola e cansado de ouvir as recriminações da tia, em 1847 retornou a Iasnaia Poliana. Encontrou-a descuidada. Os campos, antes verdes, apresentavam tristes manchas de terra e capim seco.

Arrependeu-se do tempo passado fora, quis recuperar o antigo viço das plantações. Mas era muito jovem, o mundo lá fora muito rico em promessas. Leon apanhou a mala e foi para Moscou.

Essa cidade parecia não ter muito a oferecer-lhe; em 1849, partiu para a capital, São Petersburgo, retomando o curso de direito. Não se distinguiu como aluno, e sim como farrista de primeira classe e namorador incorrigível. No entanto, nem as noites nem as moças conseguiram retê-lo. Meses mais tarde, voltava a Iasnaia Poliana. Começou a ler a Bíblia e as obras de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). Ao terminar as leituras, sentia-se ainda mais inquieto. Despertava-lhe a consciência de que sua constante agitação provinha de um impulso interior para fugir de si mesmo e demandar respostas para as perguntas que nebulosamente se formulavam sobre o significado da vida.

Alistou-se, então, como soldado no Cáucaso (1851), juntando-se ao irmão e lutando contra tribos montanhesas. Entre contemplações e namoros, combateu com bravura e conquistou a mais profunda admiração de seus companheiros. Encorajado pelos elogios e encantado com a vida militar, prestou exame em janeiro de 1852 para ingressar no Exército e foi admitido.

É dessa época seu primeiro trabalho publicado: “Detstvo” (Infância – 1852), que denota a influência do inglês Laurence Sterne. um relato autobiográfico de sua meninice, na revista “O Contemporâneo”, de São Petersburgo, dirigida pelo crítico Niekrássov (1821-1877). Transferido, participou da guerra da Criméia, experiência descrita em “Sevastopolskiie rasskazi” (Contos de Sebastopol – 1855).

Reinava Nicolau I (1796-1855); mas o monarca despótico e mal querido, que, por sua inabilidade política, provocara o conflito. Tolstói foi designado para lutar em Sebastópol, onde compôs, os contos que tanto comoveram a rainha. Maria Alexándrovna sai em busca de seu marido, o Czar Alexandre II (1818-1881), para falar-lhe desse brilhante Tolstói. Alexandre II, sensível à literatura e à coragem, nomeia-o comandante de uma companhia na Criméia.

Com o fim da guerra, em 1856, voltou a São Petersburgo, onde foi recebido como ídolo pelos círculos literários. Irritado com o assédio, voltou a Iasnaia-Poliana. Em 1857 esteve na França, Suíça e Alemanha. As críticas às histórias baseadas nessas viagens abalaram seu interesse pela literatura. Mesmo assim, entre 1855 e 1863, escreveu contos que prenunciam suas concepções posteriores sobre os danos que uma sociedade materialista causa à pureza humana.

No final da década de 1850, preocupado com a precariedade da educação no meio rural, Tolstoi criou em lasnaia uma escola, para filhos de camponeses, cujos métodos anteciparam a educação progressiva moderna. Movido pelo novo interesse, o escritor viajou mais uma vez pela Europa, publicou uma revista sobre educação e compilou livros didáticos de grande aceitação. Em 1862, casou-se com Sônia Andreievna Bers, jovem com amplos interesses intelectuais com quem teve 13 filhos. Durante 15 anos, dedicou-se intensamente à vida familiar. Foi nessa época que Tolstoi produziu os romances que o celebrizaram – “Voina i mir” (Guerra e Paz – 1865/1869) e Anna Karenina.

O primeiro, que consumiu sete anos de trabalho, é considerado uma das maiores obras da literatura mundial. A narrativa gira em torno de cinco famílias aristocráticas durante as guerras napoleônicas. As passagens mais criticadas do romance são aquelas em que o autor expõe sua concepção determinista da história, segundo a qual as ações dos chamados “grandes homens” dependem das ações de incontáveis figuras anônimas ou menos proeminentes, o que significa que não há livre-arbítrio. O vigoroso otimismo de Guerra e Paz, fruto da convicção de que o esforço pessoal poderia levar a um modo de existência aberto tanto à natureza quanto às responsabilidades sociais, sofreu uma sensível quebra, que transparece em Anna Karenina.

A descrição de um amor adúltero, que termina em tragédia pelo peso da hipocrisia social, constitui o reflexo da profunda crise espiritual em que Tolstoi se encontrava imerso. Embora feliz no casamento e bem-sucedido como escritor, Tolstoi atormentava-se com questões sobre o sentido da vida e, após desistir de encontrar respostas na filosofia, na teologia e na ciência, deixou-se guiar pelo exemplo dos camponeses, que lhe diziam que o homem deve servir a Deus e não viver para si mesmo. Convencido de que uma força inerente ao homem lhe permite discernir o bem, formulou os princípios que doravante norteariam sua vida.

Recusou a autoridade de qualquer governo organizado e da Igreja Ortodoxa russa (que o excomungaria em 1901), o direito à propriedade privada e, inclusive, no terreno teológico, a imortalidade da alma. Para difundir suas idéias, nos anos seguintes Tolstoi dedicou-se, em panfletos, ensaios e peças teatrais, a criticar a sociedade e o intelectualismo estéril.

A crônica autobiografada “Ispoved” (Uma confissão – 1882) descreve seus tormentos naqueles anos e como os superou mediante um cristianismo evangélico e peculiar. “Tsarstvo bojiie vnutri vas” (O reino de Deus está em ti – 1891) expõe sua crença na não-resistência ao mal e conclui que os governos existem para o bem dos ricos e poderosos, que, pela força, exploram a humanidade e a matam em guerras. Em “Chto takoie iskusstvo?” (Que é a arte? – 1897), tentativa de elaborar um sistema estético consoante tais convicções religiosas e morais, Tolstoi afirma que, se não consegue “infectar” o público com o essencial da alma do artista, a obra falhou enquanto arte. Por isso, ele rejeita algumas obras de Shakespeare e Wagner, além de relegar seus próprios grandes romances à categoria de “má arte”. O texto considera a arte religiosa com a mais elevada forma artística.

O gênio de Tolstoi brilhou ainda na criação de uma série de contos, com “Smert Ivana Ilitcha” (A morte de Ivan Ilitch), “Kreitserova sonata” – 1889 e “Joziiain i rabotnik” (Amo e criado – 1895), em que suas idéias não aparecem de forma explícita, mas são sugeridas graças à maestria das análises psicológicas. Em 1889, surgiu o romance “Voskreseniie” (Ressurreição – 1900). Considerado inferior aos anteriores, é uma poética descrição da relação amorosa entre um nobre e uma jovem que, por ele seduzida, prostitui-se.

Após sua “conversão”, Tolstoi dedicou-se a uma vida de comunhão com a natureza. Deixou de beber e fumar, tornou-se vegetariano e passou a vestir-se como camponês. Convencido de que ninguém deve depender do trabalho alheio, buscou a auto-suficiência e passou a limpar seus aposentos, lavrar o campo e produzir as próprias roupas e botas.

Em nome da castidade, procurou dominar os desejos carnais em relação à esposa. Engajou-se em atividades filantrópicas e foi a contragosto que viu sua casa atrair visitantes interessados em suas idéias e cercada de colônias de discípulos que pretendiam viver segundo seus ensinamentos. Sua esposa conseguiu obter os direitos sobre as publicações do marido anteriores a 1880 e reeditou-as por conta própria, para manter o nível econômico da família. Por essa razão, alguns escritores notáveis dessa época só foram publicados postumamente.

Num rasgo final de independência, aos 82 anos de idade, Tolstoi abandonou a casa em companhia de Aleksandra, sua médica e filha mais nova, em busca de um lugar onde pudesse sentir-se mais próximo de Deus. Dias depois, em 20 de novembro de 1910, Tolstoi morreu devido a uma pneumonia na estação ferroviária de Astapovo, província de Riazan.

Em sua notável obra citam-se

Infância (1852)
Adolescência (1854)
Juventude (1856)
Crônicas de Sebastopol (1855-1856)
A felicidade conjugal (1858)
Cossacos (1863)
Guerra e Paz (1865-1869)
Anna Karenina (1875-1877)
Confissão (1882)
O reino de Deus está em vós (1894)
A morte de Ivan Ilitch (1889)
O que é arte? (1898)
Ressurreição (1899)
Babine, o parvo – peça de teatro infantil

Obras Pedagógicas
Não posso me calar
Contos populares
O Diabo e Outras Histórias – volume de contos

Fontes:
http://www.tchekhov.com.br/
http://gilbert.lopes.nom.br/
http://www.sobiografias.hpg.ig.com.br/
http://pt.wikipedia.org/

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Liev Tolstoi (Três Mortes)

I
Era outono. Pela estrada real duas carruagens seguiam a trote rápido. Na da frente viajavam duas mulheres. Uma, a senhora, magra e pálida. A outra, a criada, gorda e de um corado lustroso. Seus cabelos curtos e ressecados brotavam por baixo do chapéu desbotado, e a mão avermelhada, coberta por uma luva puída, ajeitava-os com gestos bruscos. O busto volumoso, envolto num lenço rústico, transpirava saúde; os olhos negros e vivazes ora espiavam pela janela os campos fugidios, ora observavam timidamente a senhora, ora lançavam olhares inquietos para os cantos da carruagem. A criada tinha bem ao nariz o chapéu da senhora pendurado no bagageiro, um cãozinho deitado nos joelhos, os pés acima dos bauzinhos dispostos no chão, tamborilando sobre eles, em sons quase abafados pelo ruído dos solavancos das molas e do tilintar dos vidros.

De mãos cruzadas sobre os joelhos e de olhos fechados, a senhora balouçava levemente nas almofadas que lhe serviam de apoio e, com um leve franzir de cenho, dava tossidelas fundas. Tinha na cabeça uma touquinha branca de dormir e um lencinho azul celeste envolto no pescoço pálido e delicado. Uma risca brotava abaixo da touquinha é repartia os cabelos ruços, excessivamente lisos e empastados; havia qualquer coisa de seco e mortiço na brancura do couro daquela vasta risca. A pele murcha, um tanto amarelada, mal conseguia modelar suas feições belas e esguias, que ganhavam um tom vermelho nas maçãs do rosto. Os lábios secos mexiam-se intranqüilos, as ralas pestanas não se encrespavam, e o sobretudo de viagem formava rugas entre os seios encovados. Mesmo de olhos fechados, o rosto da senhora expressava cansaço, irritação e um sofrimento que lhe era familiar.

Recostado em seu banco, o criado cochilava na boléia; o postilhão gritava animado e fustigava a possante quadriga suada; vez por outra espreitava o outro cocheiro, que gritava de trás, da caleça. As marcas paralelas e largas das rodas se estendiam nítidas e iguais pelo calcário lamacento da estrada. O céu estava cinzento e frio; a bruma úmida espalhava-se pelos campos e pela estrada.A carruagem estava abafada e recendia poeira e água-de-colônia. A doente inclinou a cabeça para trás e abriu devagar os olhos, grandes, brilhantes, de uma bela tonalidade escura.

“Outra vez!” — disse ela, repelindo nervosamente com a mão bonita e magra a ponta da saia da criada, que lhe roçava de leve a perna, e torceu a boca de dor. Matriocha recolheu a saia com ambas as mãos, soergueu as pernas robustas e sentou-se mais afastada. Um corado vivo cobriu-lhe o rosto viçoso. Os belos olhos escuros da doente fitavam ansiosos os movimentos da criada. A senhora apoiou as mãos no banco e quis também soerguer-se para se sentar mais alto, mas faltaram-lhe forças. A boca se contorceu e todo o rosto ficou desfigurado por uma expressão de ironia impotente e malévola. “Pelo menos você devia me ajudar… Ah, não é preciso! Eu mesma faço, só que não ponha atrás de mim essas suas sacolas, faça o favor!… É melhor mesmo que não me toque, já que não leva jeito.” A senhora fechou os olhos e mais uma vez ergueu as pálpebras, observando a criada. Matriocha mordia o lábio inferior avermelhado, olhando para ela. O peito da doente exalou um suspiro fundo que, antes de terminar, transformou-se em tosse. Ela se virou, encolheu-se e agarrou-se ao peito com ambas as mãos. Quando a tosse passou, tornou a fechar os olhos e permaneceu sentada sem se mexer. A carruagem e a caleça chegaram à aldeia. Matriocha tirou a mão roliça do lenço e se benzeu.

— O que é isso? — perguntou a senhora.

— A estação de posta, senhora.

— E por que você está se benzendo?

— Tem uma igreja, senhora.

A doente voltou-se para a janela e começou a se benzer lentamente, com os olhos bem graúdos fitos numa grande igreja de madeira que a carruagem contornava.

Os dois veículos pararam em frente à estação. O marido da doente e o médico desceram da caleça e se aproximaram da carruagem.

— Como a senhora se sente? — perguntou o médico, tomando-lhe o pulso.

— E então, como está, minha cara, não está cansada? — perguntou o marido em francês. — Não quer descer?

Matriocha juntou as trouxas e encolheu-se num canto para não atrapalhar a conversa.

— Mais ou menos… na mesma — respondeu a doente. — Não vou descer.

O marido foi para a estação, depois de ficar um pouco com a mulher. Matriocha desceu do carro e correu pela lama para a entrada do edifício, nas pontas dos pés.

— Se eu estou mal, isto não é razão para o senhor não tomar o seu café — disse a senhora, com um leve sorriso, ao médico postado à janela.

— Nenhum deles se importa comigo — disse consigo mesma, mal o médico se afastou devagarzinho e subiu correndo a escada da estação. — Eles estão bem, o resto não tem importância. Oh, meu Deus!

— E então, Edvard Ivánovitch? — disse o marido ao encontrar o médico, esfregando as mãos com um sorriso jovial. Ordenei que trouxessem alguma provisão, o que o senhor acha?

— Pode ser.

— E ela, como está? — perguntou suspiroso o marido, baixando a voz e levantando as sobrancelhas.

— Eu disse: ela não vai conseguir chegar, e não só até a Itália: queira Deus que chegue a Moscou. Ainda mais com esse tempo.

— E o que é que nós vamos fazer? Ah, meu Deus! Meu Deus! — o marido tapou os olhos com as mãos.

—Traga aqui — acrescentou ele para o homem que carregava as provisões.

— Ela deveria ter ficado — respondeu o médico, dando de ombros.

— Agora me diga, o que é que eu podia fazer? — objetou o marido. — Ora, eu fiz de tudo para detê-la, falei dos recursos, das crianças que nós teríamos de deixar, e dos meus negócios; ela não quer dar ouvidos a nada. Fica fazendo planos de vida no estrangeiro como se estivesse com saúde. E fosse eu falar do seu estado… seria o mesmo que matá-la.

— Mas ela já está morta, o senhor precisa saber disso, Vassili Dmítritch. Uma pessoa não pode viver quando não tem pulmões, e os pulmões não tornam a crescer. É triste, duro, mas o que se vai fazer? O meu e o seu problema é fazer com que o fim dela seja o mais tranqüilo possível. Nós precisamos é de um confessor.

— Ai meu Deus! Mas o senhor entenda a minha situação na hora de lembrar a ela esta sua última vontade. Aconteça o que acontecer, isso eu não vou dizer a ela. O senhor bem sabe como ela é bondosa…

— Mesmo assim tente convencê-la a ficar até o final do inverno, — disse o médico, meneando a cabeça com ar expressivo — senão pode acontecer o pior na viagem…

— Aksiucha! Ei, Aksiucha! — grunhiu a filha do chefe da estação, jogando um lenço sobre a cabeça e pisando no alpendre enlameado nos fundos da casa. — Vamos espiar a senhora de Chirkin, dizem que está doente do peito e que estão levando para o estrangeiro. Eu nunca vi como é uma tísica.

Aksiucha correu para a soleira da porta e ambas precipitaram-se portão afora de mãos dadas. Encurtando a marcha, passaram diante da carruagem e espiaram através da janela aberta.A doente voltou o rosto para elas mas, percebendo-lhes a curiosidade, franziu o cenho e virou-se para o outro lado.

— Mm-ãe-zinha! — disse a filha do chefe da posta, voltando rapidamente a cabeça. — Que encanto de beleza deve ter sido; agora vejam o que sobrou dela! Dá até medo. Viu, viu, Aksiucha?

— Sim, como está mal! — Aksiucha fez coro com a moça. — Vamos dar mais uma olhada, a gente faz que está indo para o poço.Você percebeu? Ela deu as costas, mas eu vi. Que dó, Macha.

— É, e que lama! — respondeu Macha, e as duas correram para o portão.

— Pelo visto, estou com uma aparência horrível — pensou a doente. — Eu só preciso chegar mais rápido, mais rápido ao estrangeiro, lá eu me curo.

— E então, minha cara, como está? — disse o marido, ao se aproximar da carruagem mastigando.

— A mesma pergunta de sempre. E comendo! — pensou ela. — Mais ou menos… — falou entre dentes.

— Sabe de uma coisa, minha cara, receio que, com esse tempo, você piore no caminho; Edvard Ivanitch também acha. Não seria o caso de voltar?

Ela calava, emburrada.

— Pode ser que o tempo melhore, que a estrada fique boa e que você se recupere; e aí poderíamos ir juntos.

— Desculpe, mas se por muito tempo não tivesse lhe dado ouvidos, eu estaria agora em Berlim e totalmente curada.

— Mas o que eu podia fazer, meu anjo? Era impossível, você sabe. Mas agora, se ficasse por um mês, ao menos, iria se recuperar prontamente; eu terminaria meus negócios, levaríamos as crianças…

— As crianças estão com saúde, eu não.

— Veja se entende, minha cara, com um tempo desses, se você piorar na viagem… pelo menos você estaria em casa.

— Em casa, o quê? Pra morrer? — respondeu a doente irritada. Mas a palavra “morrer” pelo visto a assustou, e ela olhou para o marido com ar de súplica e interrogação. Ele baixou o olhar e calou. De repente, a doente fez um beicinho infantil, e lágrimas lhe saltaram dos olhos. O marido cobriu o rosto com o lenço e afastou-se da carruagem.

“Não, eu vou” — disse a doente, levantando os olhos para o céu, juntando as mãos e murmurando palavras desconexas. “Meu Deus! Por quê?” — dizia ela, e as lágrimas corriam ainda mais intensas. Rezou por muito tempo com ardor, mas no peito, a mesma dor e opressão, no céu, nos campos e na estrada, o mesmo tom cinzento e sombrio, e a mesma bruma de outono, nem mais nem menos rarefeita, derramando-se do mesmo jeito sobre a lama da estrada, os telhados, a carruagem e os tulups dos cocheiros, que discutiam em voz alta, alegres, enquanto lubrificavam e preparavam a carruagem…
II

A carruagem estava atrelada, mas o cocheiro fazia hora. Ele havia passado pela isbá dos cocheiros. A isbá estava quente, abafada, escura, com um ar pesado, um cheiro de lugar habitado, de pão assado, repolho e pele de carneiro. Havia alguns cocheiros no cômodo, uma cozinheira ocupava-se no forno e, em cima deste, um doente estava deitado, coberto por uma pele de carneiro.

— Tio Khviédor! Ô, tio Khviédor! — disse o jovem cocheiro vestido de tulup, com um chicote no cinto, entrando no cômodo e dirigindo-se ao doente.

— O que é que tu vai querer com o Fiédka, seu vadio? — perguntou um dos cocheiros. — Olha só, tão te esperando na carruagem…

— Quero pedir as botas dele; as minhas se acabaram — respondeu o rapaz, jogando os cabelos para trás e ajeitando as luvas no cinto.

— Que que é? — do forno ouviu-se uma voz fraca, e um rosto magro, de barba ruiva, espiou. A mão larga, descarnada e branca, coberta de pêlos, enfiava uma samarra nos ombros cobertos por um camisolão sujo. — Me dá alguma coisa pra beber, irmão; o que que é?

O rapaz lhe serviu uma caneca de água.

— Sabe o que é, Fédia, — disse ele, indeciso — pelo visto tu não vai precisar das botas novas agora; dá pra mim, pelo visto tu não vai andar.

O doente tombou a cabeça cansada sobre a caneca reluzente, molhou os bigodes ralos e caídos na água escura e bebeu sem forças. A barba emaranhada estava suja; os olhos fundos, embotados, levantaram-se com dificuldade para o rosto do rapaz. Depois de beber, ele afastou a água e quis levantar as mãos para enxugar os lábios úmidos, mas não conseguiu e enxugou-as na manga da samarra. Calado e respirando com dificuldade pelo nariz, olhava o rapaz direto nos olhos, reunindo forças.

— Pode ser que tu já tenha prometido a alguém — disse o rapaz. — O problema é que lá fora está úmido, e como eu tenho que ir pro trabalho, pensei com meus botões: eu pego e peço as botas do Fiédka; pelo jeito ele não vai precisar. Agora, se tu precisar, então tu diz…

No peito do doente alguma coisa começou a vibrar e roncar; ele inclinou-se e uma interminável tosse de garganta o sufocou.

— Pra que vai precisar? — trovejou de repente por toda a isbá a voz da cozinheira zangada. — Faz uns dois meses que ele não sai do forno. Tá vendo, tá se arrebentando, até as entranhas dele doem, escuta só. Como é que ele vai precisar das botas? Ninguém vai enterrá-lo com botas novas. Já não é sem tempo, Deus que me perdoe.Tá vendo, tá se arrebentando. Ou então que alguém leve ele daqui pra outra isbá ou pra outro lugar! Diz que na cidade tem esse tipo de hospital; isso é coisa que se faça, ocupar o canto todo… chega! Não se tem espaço pra nada. E ainda por cima, ficam me cobrando limpeza.
— Ei, Serioga vá para a carruagem, os senhores estão esperando — gritou da porta o chefe da estação.

Serioga queria ir sem esperar resposta, mas o doente, tossindo, deu-lhe a entender com os olhos que queria dizer alguma coisa.

— Pega as botas, Serioga — disse ele, contendo a tosse e descansando um pouco. — Só que tu me compra uma campa, porque eu tô morrendo… — acrescentou roncando.

— Obrigado, tio, então eu levo; e a campa, tá, tá, eu compro!

— Bem, meninos, vocês ouviram — ainda conseguiu dizer o doente, e tornou a se curvar sufocado.
— Tá bem, ouvimos — respondeu um dos cocheiros. — Vai, Serioga, vai pra carruagem, senão o chefe vem te chamar outra vez. A senhora de Chirkin tá lá doente.

Serioga tirou depressa as imensas botas furadas e jogou-as debaixo de um banco. As botas novas do tio Fiódor eram precisamente o seu número, e ele foi para a carruagem, admirando-as.

— Êta beleza de botas! Deixa eu engraxar — disse um cocheiro com graxa na mão, enquanto Serioga subia na boléia e tomava as rédeas. — Deu de graça?

— Ah, invejoso! — respondeu Serioga, aprumando-se e juntando as pontas do casaco junto aos pés. — Eia, vamos, belezas! — gritou para os cavalos, agitando o chicote; carruagem e caleça, com seus passageiros, malas e bagagens, saíram em disparada pela estrada molhada, sumindo na bruma cinzenta de outono.

O cocheiro doente permaneceu sobre o forno da isbá abafada e, sem conseguir escarrar, virou-se a muito custo para o outro lado e ficou quieto.

Até o cair da tarde, gente chegava, comia, saía da isbá; e não se ouvia sinal do doente. Ao anoitecer, a cozinheira subiu no forno e puxou a samarra por cima das pernas dele.

— Não fica zangada comigo, Nastácia, — disse o doente — logo vou deixar este teu canto.

— Tá bem, tá bem, deixa pra lá — murmurou Nastácia. — Onde é que dói, tio? Me diz.

— Uma dor insuportável por dentro. Só Deus sabe.

— Na certa a garganta também dói, tu tosse tanto!

— Dói tudo. Minha hora chegou, é isso. Oh, oh, oh! — gemeu o doente.

— Cobre as pernas assim — disse Nastácia, ajeitando a samarra sobre ele, ao descer do forno.

À noite, uma lamparina iluminava fracamente a isbá. Nastácia e uns dez cocheiros roncavam alto pelo chão e pelos bancos. Só o doente gemia fraquinho, tossia e revirava-se no forno. Ao amanhecer, aquietou-se de vez.

— Estranho o que eu vi esta noite em sonho — disse a cozinheira, espreguiçando-se na penumbra da manhã seguinte. — Vejo como se o tio Khviédor tivesse descendo do forno e saindo pra rachar lenha. “Nástia”, diz ele, “deixa eu te ajudar”; e eu pra ele: “Como é que tu vai rachar lenha?”, mas ele agarra o machado e tome de rachar lenha com tanta vontade, e era só lasca voando. E eu: “Como é que pode, tu não tava doente?”. “Nada”, diz ele, “eu estou bem”. E sacode o machado de um jeito que me dá medo; aí eu comecei a gritar e acordei. Será que ele já não morreu?

—Tio Khviédor! Ô, tio! Fiódor não respondia.

— É mesmo, será que ele já não morreu? Vamos ver — disse um dos cocheiros, que havia acordado.

Um braço magro, frio e céreo, coberto de pêlos ruivos, pendia do forno.

— Vamos falar com o chefe da estação, parece que tá morto — continuou o cocheiro.

Fiódor não tinha parentes. Viera de longe. No dia seguinte, foi enterrado no cemitério novo, atrás do bosque, e Nastácia passou vários dias contando a todo mundo o sonho que tivera e como tinha sido a primeira a perceber a morte do tio Fiódor.
III

Chegou a primavera. Nas ruas úmidas da cidade rumorejavam regatos velozes entre o gelo sujo de esterco; as cores dos trajes e o som das vozes dos transeuntes distinguiam-se nitidamente. Nos jardins, atrás das sebes, as árvores inchavam de botões e mal se notava o balançar dos ramos ao sopro da brisa fresca. Por todo lado gotinhas transparentes pingavam… Pardais desajeitados piavam e adejavam com suas asinhas. Nos lados ensolarados, nas sebes, nas casas e nas árvores, tudo se movia e brilhava. Reinava a alegria e o viço tanto no céu e na terra como no coração dos homens.

Em uma das ruas principais, palha fresca se estendia no chão diante de uma grande casa senhorial; na casa estava aquela mesma doente moribunda que tinha pressa em chegar ao exterior.

À porta fechada do quarto, o marido da doente e uma senhora idosa. Num divã, um sacerdote, vista baixa, segurando alguma coisa enrolada na estola de seus paramentos.A um canto, uma velha, mãe da doente, chorava com amargura numa poltrona Voltaire. A seu lado, uma criada segurava um lenço, esperando que a velha o pedisse; outra lhe friccionava alguma coisa nas têmporas e soprava por baixo da toquinha a cabeça grisalha.

— Vá com Cristo, minha amiga, — disse o marido à mulher idosa ao seu lado — ela confia tanto na senhora… a senhora é tão jeitosa com ela, procure convencê-la direitinho, minha querida; vá, vá. — Ele já queria abrir a porta, mas a prima o deteve, passou o lenço algumas vezes nos olhos e sacudiu a cabeça.

— Agora não parece mais que chorei — disse ela, e abriu a porta, entrando no quarto.

O marido estava agitadíssimo e parecia completamente perdido. Ia caminhando em direção à velha, mal deu alguns passos, voltou-se, andou pela sala e aproximou-se do sacerdote. Este olhou para ele, levantou os olhos para o céu e suspirou. A barba cerrada, tingida de fios grisalhos, também se ergueu e baixou.

— Meu Deus, meu Deus! — disse o marido.

— O que é que se vai fazer? — retrucou suspiroso o padre, e mais uma vez sobrancelhas e barba se ergueram e baixaram.

— E a mãe dela está aqui! — disse o marido quase em desespero. — Ela não vai suportar isso tudo. Porque amar como ela a ama… não sei, não. Reverendo, se pelo menos o senhor tentasse tranqüilizá-la e fazer com que ela saísse daqui…

O sacerdote levantou-se e aproximou-se da velha.

— É isso, ninguém pode avaliar um coração de mãe, — disse ele — mas Deus é misericordioso.

De repente o rosto da velha começou a se contrair cada vez mais e um soluço histérico a sacudiu.

— Deus é misericordioso — continuou o sacerdote, quando ela se acalmou um pouco. — Em minha paróquia havia um doente muito mais grave que Mária Dmítrievna; e veja o que aconteceu, foi completamente curado com ervas por um homem simples, em pouco tempo. E além do mais, esse mesmo homem está agora em Moscou. Eu disse a Vassili Dmítrievitch que dava para se tentar. Ao menos serviria de consolo para a doente. A Deus nada é impossível.

— Não, ela não tem mais jeito, — pronunciou a velha — em vez de me levar, é a ela que Deus leva. — E os soluços histéricos tornaram-se tão fortes que ela perdeu os sentidos.

O marido da enferma cobriu o rosto com as mãos e correu para fora do quarto.

No corredor, a primeira pessoa que encontrou foi um menino de seis anos, que tentava alcançar a todo custo uma menina menor.

— E as crianças, não permite que eu as leve para perto da mãe? — perguntou a babá.

— Não, ela não quer vê-las. Isto a deixaria transtornada. O menino parou um minutinho e examinou atento o rosto do pai; mas, num repente, deu um chute no ar e, com um grito de alegria, continuou a correr.

— Faz de conta que ela é o cavalo murzelo, papai! — berrou o garoto, apontando para a irmã.

Enquanto isso, no outro quarto, a prima sentava-se ao lado da doente e conduzia habilmente a conversa, tentando prepará-la para a idéia da morte. Na outra janela, o médico mexia a tisana.

Metida num roupão branco, cercada de almofadas na cama, a doente olhava calada para a prima.

— Ah, minha amiga, — disse, interrompendo-a inesperadamente — não precisa me preparar. Não me trate como criança. Eu sou cristã. Eu sei de tudo. Eu sei que minha vida está por um fio; eu sei que se meu marido tivesse me escutado antes, eu estaria na Itália agora e, quem sabe, podia até ser verdade, eu estaria curada. Todos lhe diziam isso. Mas o que se há de fazer? Pelo visto, foi assim que Deus quis. Todos nós temos muitos pecados, eu sei disso; mas espero a graça de Deus, que a tudo perdoa, a tudo perdoa. Eu me esforço para entender, mas tenho muitos pecados, querida. Por outro lado, já sofri bastante. Esforcei-me para suportar com paciência meu sofrimento…

— Chamo então o padre, querida? Você vai se sentir mais leve comungando — disse a prima.

A doente baixou a cabeça em sinal de consentimento.

— Deus, perdoa essa pecadora! — sussurrou. A prima saiu e fez sinal para o padre.

— É um anjo! — disse ela ao marido, com lágrimas nos olhos.

O marido começou a chorar; o sacerdote entrou na sala; a velha permanecia desacordada; no quarto principal reinava um silêncio absoluto. Uns cinco minutos depois, o padre saiu do quarto da doente, tirou a estola e ajeitou os cabelos.

— Graças a Deus, está mais calma agora — disse ele. — Quer vê-los.

A prima e o marido entraram. A doente fitava um ícone e chorava baixinho.

— Eu a felicito, minha amiga — disse o marido.

— Deus seja louvado! Como me sinto bem, agora; uma doçura inexplicável — disse a doente, e um leve sorriso brincou em seus lábios finos. — Como Deus é misericordioso! Não é verdade que ele é misericordioso e onipotente? — E mais uma vez olhou para o ícone com olhos marejados e ávida súplica.

De repente, pareceu lembrar-se de algo. Fez um sinal para que o marido se aproximasse.

— Você nunca faz o que eu peço — disse ela com uma voz fraca e descontente.

O marido esticava o pescoço e escutava-a submisso.

— O que foi, minha querida?

— Quantas vezes eu disse que esses médicos não sabem de nada; existem remédios caseiros que curam tudo… Escuta o que o padre disse… o homem simples… Mande buscá-lo.

— Pra quê, minha querida?

— Meu Deus, ninguém quer entender!… — E a doente franziu o cenho e fechou os olhos.

O médico chegou-se a ela e tomou-lhe o pulso. Batia cada vez mais fraco. Ele lançou um olhar para o marido. A senhora percebeu o gesto e olhou à volta assustada.A prima deu-lhe as costas e começou a chorar.

— Não chore, não aflija a você e a mim — disse a doente. — Assim você tira este meu último sossego.

— Você é um anjo! — disse a prima, beijando-lhe a mão. — Não, beije aqui, só se beija a mão dos mortos. Meu Deus, meu Deus!

Na mesma noite, a doente era só corpo, e este corpo jazia no caixão, na sala do casarão. No cômodo espaçoso, a portas fechadas, um sacristão lia salmos de Davi com voz fanhosa e ritmada. A luz viva das velas caía dos altos candelabros de prata sobre a fronte cérea da morta, suas pesadas mãos de cera, sobre as pregas da coberta que delineavam espantosamente os joelhos e os dedos dos pés. Sem entender o que dizia, o sacristão lia de maneira compassada e, no silêncio da sala, as palavras ecoavam estranhas e morriam. De quando em quando, de algum quarto distante chegavam vozes infantis e o barulho do sapateado das crianças.

“Se ocultas o rosto, eles se perturbam” — anunciou o livro dos Salmos. “Se lhes cortas a respiração, morrem e voltam ao seu pó. Envias o teu Espírito, eles são criados e, assim, renovas a face da terra. A glória do Senhor seja para sempre!”

O rosto da morta estava severo, calmo, majestoso. Nada se movia, nem na fronte limpa e fria, nem nos lábios cerrados e enrijecidos. Ela era toda atenção. E será que ao menos agora ela compreendia essas grandes palavras?
IV

Um mês depois erigiu-se um jazigo de pedra sobre a sepultura da morta. Sobre a do cocheiro ainda não havia nenhuma campa, apenas uma relva verde-clara brotava do montículo de terra, único vestígio de um homem que havia passado pela existência.

— Serioga, tu vai cometer um pecado se não comprar a campa para o Khviédor — disse a cozinheira da estação de posta. — Tu dizia assim: é inverno, é inverno. Mas agora, por que não mantém a palavra? Foi na minha frente que tu prometeu. Ele já veio pedir uma vez, e se tu não compra, ele volta e dessa vez é pra te estrangular.

— Que nada! Por acaso eu estou recusando?! — respondeu Serioga. — Eu vou comprar a campa; já disse que vou comprar; vou comprar por um rublo e meio. Não me esqueci, mas é que precisa trazer. É só ir na cidade que eu compro.

— Devia pelo menos colocar uma cruz lá, é isso que você tinha que fazer, — retrucou um velho cocheiro — senão isso vai é acabar mal. As botas tu tá usando, né?

— E essa cruz, onde é que se vai arranjar? Não dá pra fazer de lenha, né?

— Isso lá é coisa que se diga? Claro que de lenha não dá pra fazer; tu pega o machado e vai mais cedo pro bosque, e então tu faz. Tu pega e corta um freixo. Ou então tu vai ter que dar vodca ao guarda florestal. Pra toda essa canalha não há bebida que chegue. Faz pouco eu quebrei a trave da carruagem e cortei uma senhora tora e ninguém deu um pio.

De manhã bem cedo, mal começou a clarear, Serioga pegou o machado e foi para o bosque. Por toda parte estendia-se um manto de orvalho frio e fosco que caía insistente e que o sol não iluminava. O nascente mal começava a clarear, fazendo sua frágil luz refletir no firmamento encoberto por nuvens ralas. Não se mexia um só talo de capim e uma única folha nas copas. Só de quando em quando uns ruídos de asas entre as árvores compactas ou um leve farfalhar pelo chão quebravam o silêncio da mata. De repente, um som estranho, desconhecido da natureza, espalhou-se e congelou na orla do bosque. E de novo ouviu-se o mesmo som que passou a se repetir de forma regular, embaixo, junto ao tronco de uma árvore imóvel. A copa de uma árvore estremeceu de forma incomum; suas folhas viçosas sussurraram algo; uma toutinegra pousada em um galho esvoaçou duas vezes, piando, e pousou em outra árvore, remexendo a caudinha.

Embaixo, o machado ressoava cada vez mais e mais surdo; as lascas brancas e molhadas de seiva voavam sobre o capim orvalhado, ouvindo-se um leve rangido após os golpes. A árvore estremeceu por inteiro, inclinou-se e aprumou-se rapidamente, vacilando assustada sobre sua raiz. Por um instante, tudo ficou em silêncio; mas a árvore tornou a se inclinar e ouviu-se mais uma vez o rangido de seu tronco; e ela despencou de copa na terra úmida, quebrando e soltando os ramos. Cessaram os sons do machado e dos passos. A toutinegra piou e voou para mais alto. O ramo em que ela roçou suas asas balançou por algum tempo e estacou, como os outros, com todas as suas folhas.

As árvores, ainda mais alegres, pavoneavam seus galhos imóveis no espaço aberto há pouco.

Os primeiros raios de sol infiltraram-se por entre as nuvens, brilharam lá no alto e correram a terra e o céu. A neblina derramou-se em ondas pelos vales; o orvalho começou a brincar na relva; nuvenzinhas brancas e transparentes dispersavam-se apressadas pelo firmamento azulado. Os pássaros revoavam sobre a mata espessa e, sem rumo, gorjeavam felizes; folhas viçosas sussurravam radiantes e tranqüilas nas copas, e os ramos das árvores vivas mexeram-se lentos, majestosos, sobre a árvore tombada e morta.

Fonte:

Texto acima, escrito em 1858, extraído do livro “O Diabo e Outras Histórias”, Cosac & Naify Edições — São Paulo, 2.000, pág. 29, tradução de Beatriz Morabito e Beatriz P. Ricci, há um narrador exuberante que — num clima de impressionante beleza poética ditada pela natureza — conta a história de três mortes: de uma senhora nobre, de um cocheiro e de uma árvore. Disponível em http://www.releituras.com/lievtolstoi_menu.asp

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Literatura Russa

Literatura dos povos eslavos do Leste, escrita em língua russa.

PERÍODO DE KIEV

O início da expressão literária na Rússia pode ser situado em torno do século IX, quando os missionários e eruditos bizantinos Cirilo e Metódio escreveram em dialeto eslavo-macedônio que, mais tarde, passaria a se chamar eslavo-litúrgico. A primeira grande época da civilização russa desenvolveu-se em Kiev e o eslavo-eclesiástico antigo foi usado durante vários séculos como língua literária para a qual se traduziram textos de caráter religioso e semi-religiosos escritos em grego.

Os monges chegaram a dominar estas formas literárias importadas e produziram uma literatura própria: Sermão sobre a lei e a graça (c. 1050), do religioso Hilarion, e o mais conhecido, Profissão de fé, que, talvez, seja texto de um monge e esboça uma história dos povos eslavos. Uma das obras mais extraordinárias deste período, o Cantar das hostes de Igor (1185), aborda uma comovedora epopéia anônima, apelando para a unidade dos eslavos contra os invasores nômades asiáticos.

PERÍODO MOSCOVITA

Após a expulsão dos invasores tártaros, no século XV, Moscou tornou-se a nova capital da Rússia. A chegada das idéias renascentistas refletiu-se na autobiografia do religioso Avvakum, A vida do arcebispo Avvakum (1672-1675).

PERÍODO PETERSBURGUÊS

Durante o reinado do czar Pedro I que, em 1713, mudara a capital de Moscou para San Petersburgo, o isolamento cultural da Rússia chegou ao fim. Os escritores russos, então, adaptaram as influências ocidentais, como o neoclassicismo francês, ao âmbito russo. Dois escritores do final do século XVIII constituem um exemplo claro da crescente independência da literatura russa em relação aos modelos estrangeiros: o autor teatral Denis Fonvizin e o poeta Gavriil Romanovich Derzhavin. O Iluminismo teve um de seus principais defensores na figura do cientista e poeta Mikhail Vassilievitch Lomonossov. Destacam-se, além deste, o jornalista satírico Nikolai Ivanovich Novikov e Alexandr Nikolaievich Radishchev.

SÉCULO XIX

A Idade de Ouro da literatura russa surge com o poeta e prosista Aleksandr Sergeievitch Puchkin que aderiu, com entusiasmo, ao Romantismo. Em seus últimos anos tendeu para o nascente Realismo.

Entre os mais destacados escritores encontram-se o brilhante fabulista Ivan Yrievich Krilov, o dramaturgo Alexandr Sergeievich Griboiedov e o poeta e romancista Mikhail Iurievitch Lermontov. Nesta crescente preferência russa pela prosa, em detrimento da poesia, existem duas exceções: os poetas Afanasi Afanasievich Fet e Fiodor Ivanovich Tiutchev.

O romance, o conto e o teatro foram as formas preferidas durante este fértil período. O termo Realismo foi constantemente utilizado para descrever estas obras por críticos literários radicais como Vissarion Grigorievich Belinski, Nikolai Gravilovitch Tchernichevski e Nikolai Alexandrovich Dobroliubov que apoiavam urgentes programas de reforma social. Desta forma, o romancista e dramaturgo Nikolai Vasilievitch Gogol, primeiro escritor em prosa realmente destacável da literatura russa, sucumbiu ao apelo messiânico em prol da melhora das condições de vida de seu povo. A figura do romancista e contista Ivan Sergeievitch Turgueniev ascende como figura literária central desta época.

O romancista e filósofo Lev Tolstoi esforçou-se para descobrir e propagar verdades essenciais sobre a natureza da existência humana. Em contraste com esta atitude, a obra do grande romancista Fiodor Mikhailovitch Dostoievski discorreu pelos terrenos do irracional, explorou as profundidades das experiências mais díspares e encontrou suas situações dramáticas nos extremos do comportamento humano, como o assassinato, a rebelião e a blasfêmia.

À mesma época pertencem outros autores como o romancista Ivan Aleksandrovitch Goncharov, N. Shchedrin – que descreveu a sociedade russa de maneira satírica e mordaz – Serguei Timofeievich Axakov que expressou, com grande sensibilidade, a vida familiar da alta burguesia russa, estilo que influenciou muitos autores posteriores. O romancista Nikolai Semionovich Leskov e o autor de relatos curtos Alexandr Nikolaievich Ostrovski contribuíram, de maneira decisiva, para a criação de um repertório teatral russo com obras centradas na vida da classe média.

Na obra do dramaturgo e contista Anton Pavlovich Tchekhov, o realismo em prosa alcançou grande refinamento.

Outros escritores russos do final do século XIX agruparam-se em movimentos complexos, cuja característica foi a recusa dos valores estéticos e da prática literária da época imediatamente anterior. Este movimento inspirou o Ressurgimento, em torno da metade do século, de idéias e atitudes românticas e do Simbolismo francês em toda a Europa Ocidental.

SÉCULO XX

No início do século XX, um considerável número de escritores russos – entre os quais, Aleksandr Aleksandrovitch Blok, Valeri Yakovlevich Briusov, Konstantin Dmitrievich Balmont, Boris Nikolaievich Bugaiev e Zinaida Nikolaievna Gippius – dedicou-se à poesia.

Enquanto isto, os escritores simbolistas insistiam em alterar as propriedades tradicionais do romance. O poeta, romancista e crítico literário Dimitri Sergeievich Merezhkovski empenhou-se em escrever estudos históricos, enquanto Fiodor Sologub descrevia fatos fantásticos ocorridos, paralelamente, aos acontecimentos da existência doutrinária.

Numerosos escritores trabalharam independentes de qualquer escola ou movimento. O dramaturgo e contista Leonid Nikolaievich Yreyev, o romancista Alexandr Ivanovich Kuprin e o poeta e romancista Ivan Alekseievitch Bunin – primeiro escritor russo que recebeu o Prêmio Nobel (1933) – enriqueceram a prosa russa com obras bastante pessoais.

O romancista, dramaturgo e ensaísta Maksim Gorki realizou uma síntese literária pessoal a partir de suas experiências e é considerado o fundador do movimento denominado Realismo Socialista.

Durante o período de relativa calma que se seguiu à fundação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, surgiu uma nova escola de pensamento, segundo a qual a cultura proletária substituiria as formas herdadas do passado. Segundo esta escola, a literatura seria a ferramenta de conscientização e transformação da sociedade. Os escritores Futuristas, encabeçados pelo poeta Vladimir Vladimirovitch Maiakovski, propuseram uma drástica mudança nas formas, nas imagens literárias e na textura da linguagem. Outro grupo mais conservador, conhecidos como os Irmãos Serapion, preferiu manter-se fiel às tradições clássicas russas.

Boris Leonidovitch Pasternak tornou-se uma das vozes poéticas mais individualizadas de nossa época. Pasternak realizou, através de seus poemas líricos e narrativos, amplas explorações em torno da percepção. Por outro lado, Anna Akhmatova e Osip Emilievitch Mandelstam – associados ao grupo Acmeísta surgido no período pré-revolucionário – também alcançaram certa celebridade.

A narrativa desta época gravita em torno da doutrina oficial do Realismo Socialista e caracterizou-se pela grande dificuldade que encontraram os escritores da época em descrever a revolução e a guerra civil que a seguiu. Um dos romances mais populares deste período, Chapaiev (1932), de Dimitri Furmanov, oferece uma transcrição de acontecimentos pessoais e históricos. No outro extremo, situam-se as histórias breves de Isaac Babel nas quais os acontecimentos extraídos do diário do autor falam de irônicas discrepâncias e surpreendentes analogias entre fatos e pessoas nos anos da guerra civil. Nesta linha, destacam-se os romances de Konstantin Alexandrovich Fedin, Leonid Maximovich Leonov e Alexandr Alexandrovich Fadeiev.

No período imediatamente posterior à guerra, a curiosa combinação entre o ardor revolucionário e o afã comercial aparecem refletidos na narrativa de Valentin Petrovich Kataiev, nos ácidos relatos curtos e apontamentos de Mikail Zoshchenko e nas sátiras de Ilia Arnoldovich Ilf e Yevgeni Petrovich Petrov.

Os melhores escritores deste momento adaptaram-se às fórmulas políticas do Realismo Socialista, entre eles Leonov, o dramaturgo e romancista Konstantin Simonov e Mikhail Aleksandrovitch Cholokhov.

Com a morte de Josef Stalin, em 1953, os escritores começaram a se questionar sobre a vida na União Soviética, ao mesmo tempo em que dirigiam seus olhares para as viviam nos lugares mais distantes do país. O renomado poeta Ievgueni Aleksandrovitch Ievtuchenko voltou a injetar paixão em uma moribunda tradição poética e seu contemporâneo, Yrey Voznesenski, contribuiu para vitalizar a linguagem da poesia.

Doutor Jivago (1957), de Boris Pasternak, não pode ser lido em russo até 1987. Em 1958 foi concedido o Prêmio Nobel de Literatura a seu autor. Pasternak, submetido à poderosas pressões oficiais, não o aceitou.

No começo da década de 1960, o crítico e erudito Yrey Siniavski publicou várias obras sob o pseudônimo de Abram Tertz. Entre elas encontrava-se um artigo em tom irônico, O que é o Realismo Socialista?, no qual atacava os fundamentos intelectuais desta doutrina. Em 1966, sob a acusação de difamar a União Soviética, Yrey Siniavski foi condenado, junto com o também escritor Yuli Markovich Daniel, a trabalhos forçados.

O renomado romancista Aleksandr Isaievitch Soljenitsin ultrapassou, constantemente, a linha que separava o permitido do proibido, não conseguindo livrar-se da censura. Em 1970, Solzhenitsin recebeu o Prêmio Nobel de Literatura. Seu gesto foi duramente condenado pelo governo e pela União dos Escritores Soviéticos.

Durante o período pós-stalinista, o termo “literatura ilegal” (samizdat) foi usado, repetidas vezes, para qualificar as obras de Mikail Bulgakov, do poeta Joseph Brodsky, Prêmio Nobel de Literatura em 1987, além de muitos outros escritores e pensadores, entre eles, Valerii Tarsis. Após o colapso da União Soviética, em 1991, iniciou-se uma nova era na literatura russa.

Fonte:
http://www.historiadomundo.com.br/russa/literatura-russa/

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Anton Pavlovitch Tchékhov (1860 – 1904)

Anton Pavlovitch Tchékhov, em alfabeto cirílico Анто´н Па´влович Че´хов, (Taganrog, 29 de Janeiro de 1860 — Badenweiler, 14 de Julho ou 15 de Julho de 1904) foi um importante escritor e dramaturgo russo, considerado um dos mestres do conto moderno. Era também médico, exercendo a Medicina durante o dia e frequentemente escrevendo à noite.

Era filho de Pavel Egorovic Tchékhov e de Evgenija Jakovlevna. Teve quatro irmãos, Aleksandr (1855), Nikolaj (1858), mais velhos, Ivan (1861), Michail (1865) e uma irmã, Marija (1863). Uma segunda irmã nascida em 1869, Evgenija morreu com dois anos de idade.

As origens da família são humildes. O avô de Tchékhov, Egor Tchékhov, foi um servo que comprou a sua liberdade do Kreopostnoje Pravo. Pavel tinha então dezesseis anos.

Pavel Tchékhov fez um estágio de três anos num comerciante. Tornou-se depois servente e contabilista. Em 1857 tornou-se dono de uma mercearia. Comprou por um bom preço mas num momento inoportuno. A Guerra da Criméia tinha sido perdida e como consequência tinha sido imposta a desmilitarização do Mar Negro, pelo que os marinheiros e militares que tinham sido os principais clientes até então, tinham deixado estas paragens.

A mercearia do pai tinha um pequeno bar, tolerado pelas autoridades.

Numa carta de 1889 ao seu irmão Aleksandr, Anton Tchékhov resume a sua infância na seguinte frase, plena de ironia: “Filho de um servo, … servente de loja, cantor na igreja, estudante do liceu e da Universidade, educado para a reverência de superiores e para beijos de mão, para se curvar perante os pensamentos alheios, para a gratidão por qualquer pequeno pedaço de pão, muitas vezes sovado, indo à escola sem galochas“.

O pai, marcado pelo estigma de um ex-servo, educou os filhos de forma autocrática, habituando-os a obedecer. Deu-lhes no entanto o acesso à educação. Possibilitou aos filhos a frequência de um dos melhores liceus da cidade. Tiveram aulas de música e francês.

Anton foi acólito. No entanto, pouco lhe ficou da inspiração religiosa (que a propósito era muito marcante no pai, dirigente do coro da Igreja). Como Anton disse a este respeito: “o coração está como que varrido“.

Na escola, Anton não foi um bom aluno. Chegou a reprovar. Um padre que lhe deu aulas de religião chamava-o com menosprezo de “Cech” onte (cech significa servo). A mensagem: tu não passas de filho de servo. Mais tarde, quando publicava os primeiros contos em jornais, Tchékhov usou o pseudônimo “Antosa Cechonte” com ironia.

A partir dos seus treze anos, ficou fascinado pelo teatro da cidade, que dado o pouco dinheiro que tinha não frequentava tantas vezes como queria. Como era proibida a entrada a crianças não acompanhadas de adultos e sem a autorização do liceu, chegou a “disfarçar-se” de adulto, usando uma barba postiça.

Em 1874, Pavel, o pai de Anton, decide comprar uma casa maior. Ao mesmo tempo alugou uma segunda loja. O seu desejo de ascensão social suplantou a sua prudência económica. Suas dívidas cresceram e em breve ficou incapaz de as pagar. Em Abril de 1877 esteve quase a ser preso. Pavel fugiu ilegalmente para Moscovo, onde os filhos Aleksandr e Nikolaj estudavam. A esposa ficou para vender a casa e pagar as dívidas. Depois juntou-se ao marido em Moscovo. Anton (17 anos de idade) e Michail (16) ficaram em Taganrog, para acabar o liceu. Michail foi depois para Moscovo, enquanto que Anton ficou em Taganrog, onde deu aulas particulares para ganhar dinheiro (o que ele relatou depois num conto). Passou dois anos e meio, sozinho em Taganrog. A mãe escreveu-lhe de Moscovo: “vende a cómoda e as coisas, depressa, não nos deixes morrer de angústia!”. Suas leituras nesta fase da sua vida eram Shakespeare, Cervantes, Victor Hugo, Ivan Turgeniev, Goncarov, Harriet Beecher Stowe, Friedrich Spielhagen e Leon Tolstoi. Em 1876, tinha sido inaugurada a primeira biblioteca pública em Taganrog. As notas de Anton no liceu melhoraram nos anos em que viveu sozinho. A 27 de Junho de 1879 concluiu o liceu.

Em Agosto de 1879, beneficiando de um subsídio de 25 rublos mensais da cidade de Taganrog, Anton vai para Moscovo, onde reencontra a família. A família encontra-se numa situação financeira precária. O pai está desempregado há meses, a família tem sempre dificuldades em pagar a a renda da casa e foi forçada a mudar de casa 12 vezes entre 1876 e 1879. Meses depois da chegada de Anton, o pai encontra um emprego nos arredores de Moscovo e para a sua felicidade é-lhe dada a oportunidade de dormir no local de trabalho, o que alivia a casa onde a família vive, absolutamente a abarrotar. O pai vem apenas aos fins de semana visitar a família. Anton partilha durante os seus estudos, o seu quarto de dormir com os irmãos Nicolai e Michail.

Em 1880, Tchekov envia um drama, escrito nos últimos tempos em Taganrog, com o título “os sem-pai“, também conhecido como o “Platonov” (nome da figura central) a uma famosa actriz de teatro em Moscovo, Marija Ermolova, que o devolveu sem comentários. Depois disso, Tchekov desistiu de tentar trazer uma encenação do drama para o palco.

Anton estudou Medicina, tendo-se licenciado em Maio de 1884. Já mesmo durante os seus estudos (que duraram 4 anos e meio) publicou centenas de artigos em vários jornais e revistas das metrópoles russas (Moscovo e São Petersburgo). Ele dependia desta fonte de receitas para se sustentar a si e a sua família. Entre os jornais e revistas onde publicou encontram-se o Budilnik, Strekoza, Zritel, Svet i teni, Svertcok ou o Sputnik. A partir de 1882 publicou também no Oskolski.

Em Março de 1888 surge publicado na revista Severnyi vestnik o seu romance A estepe.

Em 1889, os sintomas da tuberculose agravaram-se, fazendo-o mais pessimista sobre o seu estado de saúde. Em junho desse ano morre o seu irmão Nikolaj, vítima de tifo e tuberculose, possivelmente infectado pelo irmão. Anton sentiu remorsos por não ter estado presente nos últimos dias de vida do irmão. Em Junho, o irmão Aleksandr chegou e rendeu-o na vigília ao irmão, tendo Anton decidido fazer uma viagem com os amigos até Poltava. Fugiu da mesma morte que o esperava, assim o descreveu.

Após o enterro do irmão, (“a nossa família viu um caixão pela primeira vez“) decidiu iniciar uma viagem sem rumo. Vive em viagem permanente nos meses seguintes. Em janeiro de 1890 escreve à família que tenciona viajar até à distante Sacalina, a ilha do desterro, no longínquo leste da Rússia. A família fica estupefacta.

Após meses de preparação, Tchékhov partiu em 21 de Abril de 1890 para a longa viagem. Suvorin deu-lhe um “avanço” de 1500 rublos para a viagem. A 11 de Julho de 1890 chega finalmente a Fort Aleksandrovsk, na Ilha Sacalina. Passou dois meses no norte da ilha e três meses no sul da mesma. Quis conhecer as gentes da ilha, fez quase mesmo um levantamento das visitas que fazia, escrevendo notas em cerca de 10.000 cartões individuais, um trabalho exaustivo. A ilha Sacalina era usada como zona de desterro, tal como muitos territórios na Sibéria. A partir de 1860, o número de “criminosos” (incluindo por “delitos” políticos) enviados para a Sibéria era de cerca de 20.000 por ano. Entre os desterrados inclui-se o amigo de Tchékhov, Vladimir Korolenko, um escritor, que foi enviado para a Sibéria pela polícia, sem qualquer julgamento. A 13 de Outubro parte para Vladivostok. Um mês depois, chega à ilha de Ceilão. A 1 de Novembro chega a Odessa. A 8 de Dezembro está de regresso a Moscovo. Traz dois mangustos na bagagem.

Em 1891, escreve O duelo, que é publicado no “Novo tempo” de Suvorin, por capítulos. Neste livro, fluíram as impressões que Tchékhov teve das conversas que teve com um zoólogo nas férias de Verão desse ano em Bogimovo, perto de Aleksin. Vladimir Vagner, recém-licenciado em zoologia, e um defensor do social-Darwinismo, do direito dos mais fortes, da seleção social.

O Verão de 1891 foi particularmente seco no leste da Rússia, contribuindo para uma onda de fome. Tchecov mobilizou-se pessoalmente para combater a catástrofe, contribuindo directamente com os honorários do conto “A minha mulher“, participando nas campanhas de recolha de fundos. Em Janeiro de 1892, viajou até Niznij Novgorov, uma cidade afectada. Relatou as suas vivências na imprensa, contribuindo para o debate sobre a catástrofe e a necessidade de reunir fundos para as vítimas.

Em 1892, Tchekhov decidiu instalar-se com parte da família numa quinta em Melichovo, 60 kms a sul de Moscovo. A ideia já era um sonho desde a década de 1880, mas em 1892 Tchekhov dispunha do dinheiro necessário, que resultava em parte das primeiras encenações. O acesso à quinta a partir de Moscovo era razoável: uma hora e meia de viagem em combóio até Lopasnja e uma hora de carroça a partir dali.

A compra da quinta foi um mau negócio, gastou 13 000 rublos, mais do dobro do que pretendia gastar inicialmente. O anterior dono, um pintor, aproveitou-se da ocasião. Tchecov passa a ter agora uma casa, 60 cerejeiras e 80 macieiras e pode saborear aquilo que desejava: a vida no campo. Tornou-se um elemento bem-vindo na comunidade dos lavradores das redondezas, em especial por ser médico e praticar a profissão sem exigir pagamento.

Entre as muitas visitas na nova casa conta-se Lidija Mizinova com quem Tchecov teve uma relação afetiva mais ou menos íntima e mais ou menos passageira. Foi uma figura inspiradora de personagens de suas obras.

No Verão de 1892 grassa agora uma epidemia de cólera na Rússia. Como no passado, Tchecov mobiliza-se para angariar fundos (“mostrei-me um bom mendigo“), participa na construção de barracas para a quarentena, trabalhou na administração local. Felizmente, porém, Melichovo não foi afetada pela cólera.

Em 1893 volta a surgir a cólera. Tchecov volta a mobilizar-se, participando em campanhas de informação sanitária e trabalhando como médico. Foi membro da zemstvo local.

Em 1894 faz uma viagem pela Europa ocidental.

A partir de 1895 Tchecov comprou livros para oferecer à biblioteca de sua terra natal, Taganrog. Uma prática que ele manterá nos próximos anos. Mesmo em viagem pela Europa lembrou-se de comprar livros para a bibliioteca da sua terra.

O seu envolvimento na comunidade local mantém-se muito ativo nos anos seguintes. Em 1894 torna-se membro da zemstvo de Serpuchov. Em Dezembro desse ano torna-se curador de uma escola em Talez. Em 1896 financia pelos seus próprios meios a construção de uma nova escola em Talez. Em 1897 é a vez de financiar a construção da escola numa aldeia chamada Novoselki. Apoia também uma sociedade de beneficência que trata de pacientes que receberam alta dos hospitais. Ainda em 1897 torna-se também curador da escola da aldeia de Cirkovskoje.

Em 1896 surge o romance “a minha vida“, em 1897 “os camponeses“. São obras que testemunham a ruptura com as visões utópicas e românticas tão comuns nestes anos na Rússia: o ideal da vida no campo faz alguns intelectuais russos, os Narodniks, premonitores da revolução soviética, sonhar com uma saída para todos os problemas: o regresso ao passado, o regresso à agricultura. Tchecov, que vive ele próprio no campo e assiste à vida rural in loco, tem acesso a uma perspectiva que a elite intelectual das cidades não adivinha: alcoolismo, ignorância, brutalidade, maldade. Para Tchechov os homens do campo não são nenhum modelo, ao contrário do que um Leon Tolstoi possa pensar.

Esta visão, contrária aos ideais da maioria da “intelectualidade” russa, espelhada naquelas obras, irá tornar Tchecov impopular. Michajlovski acusa Tchecov de falsificar a (gloriosa) vida dos camponeses devido à sua ignorância.

Após a produção com êxito de “A Gaivota” pelo teatro de arte de Moscou, escreveu três outras peças para a mesma companhia: “O Tio Vânia“, “As três irmãs“, e “O pomar de cerejas” (traduzido em Portugal como “O Ginjal”).

Em 1901, casou com Olga Leonardovna Knipper (1870-1959), uma atriz que foi intérprete nas suas peças.

A influência do naturalismo no teatro que se fazia sentir por toda a Europa atingiu o seu expoente artístico na Rússia em 1898 com a formação do Teatro Artístico de Moscou (mais tarde chamado de Teatro da Academia das Artes de Moscou). O seu nome tornou-se um sinónimo de Tchekhov, cujas peças acerca da vida quotidiana da aristocracia possuidora de terras adquiriram um delicado realismo poético que estava anos à frente do seu tempo. Konstantin Stanislavsky, o diretor do teatro, tornou-se porventura o mais importante teórico da arte de representar do século XX.

Tchékhov visitou a Europa Ocidental na companhia de A.S. Suvorin, um rico proprietário de um jornal e o editor de muitos dos trabalhos de Tchékhov. A sua longa e íntima amizade foi motivo de alguma impopularidade para Tchékhov, uma vez que o jornal de Suvorin, Novoye vremya (O novo tempo) era tido por muitos dos russos como de carácter conservador e reaccionário. Anton acabou por cortar relações com Suvorin por causa da posição do jornal em relação ao Caso Alfred Dreyfus em França, tendo Tchékhov sido um defensor de Dreyfus.

Anton morreu vítima da tuberculose em Badenweiler, 14 de Julho ou 15 de Julho de 1904. Foi sepultado no cemitério Novodevichy.

Obras
Seus livros mais conhecidos são: Contos e narrativas, Um duelo, A Estepe, A Minha Vida, A sala número seis, Uma história sem importância. Escreveu para o teatro, primeiramente a farsa, depois o drama. Entre as suas peças, destacam-se: A Gaivota, Tio Vânia, As três irmãs, O canto do cisne, Um trágico à força, Ivanov, etc.

Fonte:
http://pt.wikipedia.org

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Anton Pavlovitch Tchekhov (O Caçador)

Um meio-dia quente e sufocante. No céu, nem uma única nuvem… As ervas, queimadas pelo sol, apresentam um aspecto triste e desolado: já não recuperarão mais o seu viço, mesmo que chova… A floresta queda-se muda, imóvel, parecendo que as copas das árvores observam qualquer coisa ao longe e esperam.

Pela orla do bosque caminha, preguiçoso e gingão , um homem de uns quarenta anos, alto, de ombros estreitos, camisa vermelha, botas altas e calças herdadas do patrão, já cobertas de remendos. Arrasta-se ao longo da estrada. À direita, verdeja a moita; à esquerda, ocupando todo o espaço até ao horizonte, estende-se um mar dourado de centeio maduro… O homem está vermelho e transpira. Na sua cabeça bonita, de cabelos louros, leva um boné posto à banda, branco e de pala direita, de jóquei, provavelmente oferecido por algum jovem ricaço num arroubo de generosidade. Ao ombro leva um bornal, com um tetraz aí metido às três pancadas. Nas mãos, uma espingarda de dois canos, engatilhada, e não desprende o olhar do velho e escanzelado cão que corre à frente, farejando arbustos. Em volta, apenas o silêncio… Todos os seres vivos fugiram do calor para os esconderijos.

– Egor Vlassitch – ouve subitamente pronunciar, em voz baixa.

Sobressaltado, olha à roda e fica de cenho carregado. Tem diante de si, como que caída do céu, uma camponesa dos seus trinta anos, de tez pálida e com uma foice na mão, que lhe procura ver o rosto e sorri timidamente.

– Ah, es tu, Pelagueia! – diz o caçador, detendo-se e desengatilhando a arma. – Hum!… O que andas a fazer por aqui?

– Estou aqui a ceifar com as da nossa aldeia… Andamos à jorna.

– Pois é… – resmunga Egor, e põe-se de novo a andar com lentidão.

Pelagueia segue-o. Dão, em silêncio, uns vinte passos.

-Há já muito que não o vejo, Egor Vlassitch… – diz Pelagueia, acompanhando com um olhar afetuoso os movimentos dos ombros e das costas do homem. – Desde aquele dia, na Semana Santa, que foi à nossa casa pedir um copo de água, nunca mais lhe pusemos os olhos em cima. Entrou só e saiu, e ainda assim… muito borracho… Armou uma bulha, deu-me uma sova e foi-se embora… E eu que o esperei tanto, a olhar a todo o instante para a janela, a ver se aparecia… Ai, Egor Vlassitch, Egor Vlassitch! Por que não quer dar um salto a casa?

-Para fazer o quê?

– Nada, é claro, mas aquilo sempre é propriedade sua… Podia dar uma olhadela, ver como é que andam as coisas. O dono é você… Ena! Matou um tetraz! Por que não se senta e descansa um bocado?

Ao dizer isto, Pelagueia ri, feita uma parva, erguendo os olhos para o rosto de Egor Vlassitch. A sua cara respira felicidade.

– Pois bem, descansemos… – anuiu o caçador em tom indiferente e escolhendo um lugar entre dois abetos. – Por que estás aí de pé? Senta-te também.

Pelagueia senta-se um pouco afastada ao sol, e, envergonhada da sua alegria, tapa com a mão a boca sorridente.

– Se ao menos passasse um dia pela casa – diz em voz baixa.

-Para quê? – Egor suspira, descobrindo-se e limpando a testa vermelha a uma manga. – Não há necessidade. Se fico uma hora ou duas, .é perder tempo e desarranjar-te, e quanto a fixar-me para sempre na aldeia, isso é-me insuportável. Sabes que sou um homem mimado. Quero ter cama, bom chá, trato delicado e tudo o mais, e lá na tua aldeia só há miséria, imundície…

Não agüento ali nem um só dia. Se me obrigassem, pela força, a viver contigo, ou pegava fogo à casa ou suicidava-me. Sou assim de pequeno, buliçoso. Não tem cura.

– E onde é que mora agora?

– Em casa do patrão, Dmitri Ivanitch, como caçador. Levo caça para a cozinha dele… Mas é antes por prazer que me mantém.

– Não é séria a sua ocupação, Egor Vlassitch… Para os outros, é um divertimento, para ti, é como um ofício… um verdadeiro emprego…

– Não compreendes nada, pateta – diz Egor, fixando no céu um olhar sonhador. – Nunca compreendeste e nunca compreenderás que espécie de homem sou eu… Na tua opinião, sou um estróina, um desatinado, mas, para quem sabe, sou o maior atirador de todo o concelho. Os senhores que me conhecem sentem-no, e até referiram o meu nome numa revista. Não há quem se compare comigo na arte da caça… Se não aceito a vossa labuta de campo, não é por leviandade, nem por orgulho. Sabes, desde criança que não conheço outra coisa além da espingarda e dos cães. Se me tiravam a espingarda, pegava na cana de pesca, se me tiravam a cana, servia-me das mãos. Quando tinha “massa”, também me metia em negócios de cavalos, corria as feiras. Sabes, o camponês que se dedicar ao ofício de caçador ou se ocupar de cavalos já não pega mais no arado. Se um homem ganhou o gosto pela liberdade, já ninguém lho tira. Assim como o senhor que envereda pela carreira de ator ou artista, sei lá, nunca mais será funcionário ou rendeiro. E tu, que és uma pacóvia, não tens cabeça para compreender estas coisas.

– Eu compreendo, Egor Vlassitch.

– Se compreendesses, não estavas agora quase a chorar.

– Não, não choro – retorquiu Pelagueia, voltando a cabeça. – Mas assim não dá, Egor Vlassitch. Se ficasses comigo pelo menos um dia… Há já doze anos que nos casamos e ainda nem uma só vez fizemos amor… Não, não, estou a chorar.

– Qual amor! – resmunga Egor, coçando uma mão. – Não pode haver amor nenhum entre nós. Somos um casal só no papel, mas corresponde isso à realidade? Tu achas-me um selvagem, e eu acho-te uma simplória sem entendimentos. Como podemos dar-nos? Sou um homem livre, mimado, folgazão, e tu és uma jornaleira, uma campônia, vives na lama, trabalhas de sol a sol. Considero-me um caçador sem igual, e tu lastima-me… Diz-me, que raio de casal é o nosso?

– Mas sempre estamos unidos pelo casamento!… – contrapõe Pelagueia num soluço.

– Não por nossa vontade… Ou já te esqueceste? A culpa foi tua e do conde Serguei Pavlovitch. O conde, que tinha inveja de não saber atirar tão bem como eu, andou um mês a encher-me de vinho, e a um bêbado é fácil casá-lo, ou até convertê-lo a outra fé. Pois então desforrou-se, casando-me contigo… Um caçador com uma ordenhadora! Ora, se vias perfeitamente que eu estava bêbado, por que não te opuseste? Não és serva nenhuma, ninguém te podia forçar! É claro que, para uma ordenhadora, casar com um caçador é a sorte grande, mas também, é preciso pôr a cabeça a trabalhar. Agora estás aqui a sofrer as conseqüências, a verter lágrimas. O conde ri-se e tu choras, martirizas-te…

Silêncio. Três patos bravos aparecem e sobrevoam a moita. Egor segue-os com o olhar até que eles se transformam em três pontos quase invisíveis e pousam muito para além da floresta.

– De que vives?-pergunta ele, passando os olhos dos patos para Pelagueia.

– Agora, ando à jorna, no inverno costumo ir ao orfanato buscar um bebê e criá-lo em casa a biberão. Pagam um rublo e meio por mês.

-Pois…

Outra pausa. Do campo de centeio chegam sons duma canção, que logo se interrompe. O calor não deixa cantar.

– Ouvi dizer que construiu para Akulina uma casa nova -diz Pelagueia.

Egor não responde.

– Sendo assim, gosta dela…

– Bom, é assim a tua sina! Paciência, órfã – diz o caçador, espreguiçando-se.. – Pronto, já me demoraste muito na cavaqueira. Antes que anoiteça, tenho que estar em Boltovo…

Egor ergue-se, espreguiça-se e põe a arma ao ombro. Pelagueia levanta-se também.

– Quando passa então pela aldeia? – pergunta baixinho.

– Para quê? Se não estiver com pinga, nunca lá vou, e bêbado em nada te serei útil. A bebida torna-me raivoso. Adeus!

– Adeus, Egor Vlassitch…

Egor enfia o boné na cabeça e, assobiando ao cão, põe-se novamente a caminho. Pelagueia fica no mesmo sítio, a observá-lo pelas costas. Enquanto contempla os ombros e o pescoço forte de Egor, que se afasta num passo preguiçoso e lasso, os seus olhos irradiam tristeza e carinho. O seu olhar acaricia, afaga toda a figura do marido, alto e magro. Ele parece sentir esse olhar, pois detém-se e volta a cabeça…

Embora continue calado, vê-se pela sua cara e ombros alteados que quer dizer alguma coisa. Pelagueia aproxima-se timidamente e fita-o com um olhar implorador.

– Toma! – diz Egor, sem olhar para ela e estendendo uma nota de um rublo, muito usada. E, afasta-se a passo rápido.

– Adeus, Egor Vlassitch! -diz ela, aceitando maquinalmente a nota. Ele vai caminhando pela estrada comprida e reta como um cinturão. Pálida e imóvel como um monumento, Pelagueia acompanha com o olhar os passos dele. Por fim, o vermelho da camisa de Egor acaba por fundir-se com o cinzento das calças, os passos tornam-se imperceptíveis e é já impossível distinguir o cão das botas. Vê-se apenas o boné. De repente, Egor volta à direita, mete pela moita dentro e o boné desaparece entre a verdura.

– Adeus, Egor Vlassitch! – murmura Pelagueia, pondo-se nos bicos dos pés e procurando avistar, ainda uma vez mais, o boné branco.

Fonte:
http://www.gargantadaserpente.com/coral/contos/at_cacador.shtml

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