TROVAS
Quando, à noite, em quantidade,
voltam lembranças de outrora,
eu posso ouvir a saudade
batendo palmas lá fora!
Por natureza, enganosa;
meiga e boa, quando quer…
Fogo e gelo, espinho e rosa;
anjo e demônio: mulher!
Na vida, imensa coxilha,
zombando do meu fracasso,
felicidade é novilha
mais ligeira que o meu laço!
Tive a noção do fracasso
quando o tempo, em desvario,
encheu de ausências o espaço
que o sonho deixou vazio!
Falham medidas extremas,
mesmo calando o argumento;
porque ninguém põe algemas
nos pulsos do pensamento!
“Vá lá ver se chove ou não”
E o filho (também deitado):
“Ir lá, prá que? Chame o cão,
e vê se ele tá molhado!”
Matuto explica o defeito
da TV que teve um ‘curto’:
– Ela proseia dereito,
mas não aparece o vurto”
Chegou tarde, a vista torta
do boteco, o Zé Morais…
viu DUAS SOGRAS na porta
– e não bebeu nunca mais!
* * * * * * * * * * *
“Conheço o verdadeiro amigo pelo número de vezes que me diz: Cuidado!”
Pedreiro sem prumo, parede sem rumo.
HAICAI
Arroz cacheando
chuveirada repentina
sorrisos molhados.
S O N E T O
Lição
Tantas lições ela ensinou-me enfim
que perco a conta! E no entretanto, aquela
tão grande efeito teve sobre mim
que me enterneço quando penso nela!
Era pequeno, e olhando da janela
tive a noção real do amor sem fim
ante a beleza da visão singela:
Mamãe plantando flores no jardim.
Já não a tenho… mas evoco ainda
para conter-me, aquela imagem linda
que um pensamento ou gesto rude amansa.
E volta a cena, nítida, real,
que poderia ser talvez banal
não fosse aquele o dia da mudança!
Pedro Ornellas