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Universidade Estadual de Maringá (Revista Espaço Acadêmico, nº 111, agosto de 2010)

Os artigos abaixo podem ser encontrados em http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/issue/current

FUTEBOL & POLÍTICA

Márcia Batista dos Santos
Uma leitura psicanalítica sobre as torcidas organizadas de futebol frente ao declínio da lei em tempos de violência

Nildo Viana
Notas Sobre o Significado Político do Futebol

ADMINISTRAÇÃO

Paulo Hayashi Jr.
A racionalização do mundo: se não tem remédio, remediado está?

CIÊNCIA & TECNOLOGIA

Antonio Mendes Silva Filho
Inovação requer criatividade e informação

CIÊNCIAS SOCIAIS

André Pedrolli Serretti
A religião e a ordem social – breves considerações

Marina Félix Melo
A percepção da Teoria da Dádiva em um modelo contemporâneo de fazer sociológico

DIREITO

Vanessa Batista Oliveira
A regra da proporcionalidade e sua aplicabilidade na hermenêutica constitucional

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Deinne Airles da Silva
A Educação Ambiental Popular: o ensino-aprendizagem dos alunos do Projeto Com Ciência versus o conhecimento dos alunos do PROJOVEM

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO

Renato Nunes Bittencourt
A Filosofia diante do tecnicismo da sociedade de informação

HISTÓRIA DAS RELIGIÕES

Francisco Chagas Vieira Lima Júnior
A crucificação da moral: a sedução do cristianismo na análise genealógica de Nietzsche

Lucelmo Lacerda
Medellín e Puebla: epicentros do confronto entre progressistas e conservadores na América Latina

Luiz Alberto Moniz Bandeira
Karl Kautsky e as origens do Cristianismo

IDENTIDADE

Henrique Rattner
Afeganistão – outra guerra perdida?

PSICANÁLISE & SOCIEDADE

Raymundo de Lima
Os sem-vínculos autênticos – breve ensaio sobre pessoas que não fedem nem cheiram

SOCIOLOGIA

Francisco Secundo Silva Neto
Rir e fazer rir – Alguns apontamentos teóricos

UNIVERSIDADE EM DEBATE

Paulo Roberto Almeida
A Ignorância Letrada: ensaio sobre a mediocrização do ambiente acadêmico

RESENHAS & LIVROS

Antonio Ozaí da Silva
Intelectuais, cultura e engajamento político

Clayton Mendonça Cunha Filho
Democracia e desigualdade nos Estados Unidos

Consuelo Novais Sampaio
Brasil, Argentina e Estados Unidos

Antonio Mendes da Silva Filho
Introdução a Programação orientada a objetos com C++.

Fabrício Pinto Monteiro
O Niilismo Social – Anarquistas e terroristas no século XIX.

Simone Pereira da Costa Dourado ; e Walter Lúcio de Alencar Prazedes
Teorias e pesquisas em Ciências Sociais.

Revista Espaço Acadêmico – revista multidisciplinar -ISSN 1519-6186 (on-line) – Departamento de Ciências Sociais – Universidade Estadual de Maringá (UEM) – Av. Colombo, 5790 – Campus Universitário 87020-900 – Maringá/PR – Brasil –
blog: http://espacoacademico.wordpress.com/ – Email: aosilva@uem.br

Fonte:
Colaboração de Antonio Ozaí da Silva. Revista Espaço Acadêmico.

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Bernardo Carvalho (Estante de Livros)

Os Bebados e os Sonâmbulos
Ao descobrir que tem um tumor no cérebro, que mudará progressivamente sua personalidade, fazendo-o perder a identidade e a memória, um militar homossexual decide sair em busca de sua origem. Sobrevivente, ainda criança, de um acidente aéreo em que morreram o pai e o irmão, ele parte à procura da mulher que o teria salvado e, conforme avança nessa viagem, correndo contra o tempo e também contra o avanço do tumor em sua cabeça, vai se embrenhando cada vez mais num intrigante mistério, uma história de traições e imposturas, para acabar diante de uma revelação para ele inimaginável.

Ao dar voz a um narrador cuja identidade é mutante, esse livro transforma a investigação e a busca de si mesmo num enigma policial, perseguindo, numa prosa perturbada e inquieta, sempre a um passo de perder a cabeça, uma brecha, um outro caminho para a narrativa hoje: uma prosa que se arrisca até os limites onde possam se esboçar as centelhas de um novo texto de ficção.

As Iniciais
Doze pessoas que sofreram (ou estão para sofrer) uma experiência muito próxima da morte se reúnem para jantar no antigo mosteiro abandonado de uma ilha, durante as férias de verão. Ao longo da noite cada um conta a sua história. A certa altura, o narrador recebe de outro convidado uma caixinha de madeira com quatro letras entalhadas na tampa, como um código, e dali em diante passa a viver a obsessão de decifrá-las.

Dez anos depois, do outro lado do Atlântico, durante um almoço na sede de uma fazenda, ele encontra um misterioso pintor ali exilado para se recuperar de uma crise psíquica. Esse homem, em quem ele supõe reconhecer um dos convidados do jantar no mosteiro, teria a chave do significado das iniciais. Ao tentar descobrir se o pintor é de fato quem ele imagina, o narrador se vê enredado num jogo labiríntico de identidades, no qual a própria realidade do mundo que o cerca será posta à prova.

Narrada em primeira pessoa por um escritor que é também jornalista, essa história ganha desde o início um ritmo intenso, o que se deve em parte à estranha congruência das situações descritas. Elas têm a verossimilhança do que chamamos de inacreditável na vida real (por oposição à vida representada literariamente) e com isso abrem no leitor uma curiosidade irresistível sobre os efeitos que produziram. Lemos essa história pelo mais simples dos motivos: o desejo de saber o que aconteceu.

Com sua oralidade culta, o narrador dissemina pelo texto traços de personalidade e estados de espírito. Sou ingênuo, ele nos diz, sou crédulo, não vejo o óbvio, me espanto com o mundo, me sinto desamparado, fico perplexo, não sei como agir. Mas ele diz também: não tenho mais ilusões. (Embora conte com a escrita para pôr um ponto final no tempo que passou.)

Nove Noites
Na noite de 2 de agosto de 1939, um jovem e promissor antropólogo americano, Buell Quain, se matou, aos 27 anos, de forma violenta, enquanto tentava voltar para a civilização, vindo de uma aldeia indígena no interior do Brasil. O caso se tornou um tabu para a antropologia brasileira, foi logo esquecido e permaneceu em grande parte desconhecido do público.

Sessenta e dois anos depois, ao tomar conhecimento da história por acaso, num artigo de jornal, o narrador deste livro é levado a investigar de maneira obsessiva e inexplicada as razões do suicídio do antropólogo. Em sua busca obstinada pelas cartas do morto ou pelo testamento de um engenheiro que ficara amigo do antropólogo nos seus últimos meses de vida, o narrador é guiado por razões pessoais que não serão reveladas até o final do romance, mas que dizem respeito à sua experiência de criança na selva, à história e à morte de seu próprio pai.

Nove noites narra a descida ao coração das trevas empreendida pelo jovem expoente da antropologia americana, colega de Lévi-Strauss e aluno dileto de Ruth Benedict, às vésperas da Segunda Guerra. A história é contada em dois tempos, na tribo dos índios krahô (interior do sertão brasileiro) e na combinação progressiva entre a busca pelo testamento do engenheiro e a pesquisa que o narrador vai fazendo em arquivos, atrás das cartas do antropólogo e dos que o conheceram na época.

Para escrever o livro, Bernardo Carvalho travou contato com os Krahô, no Estado do Tocantins, e foi aos Estados Unidos em busca de documentos e pessoas que pudessem saber algo sobre o antropólogo.

A história de Buell Quain revela as contradições e os desejos de um homem sozinho numa terra estranha, confrontado com os seus próprios limites e com a alteridade mais absoluta, numa narrativa que faz referências aos romances de Joseph Conrad e aos relatos do escritor inglês Bruce Chatwin.

O Sol se Põe em São Paulo
No Japão da Segunda Guerra, um triângulo amoroso envolve Michiyo, Jokichi e Masukichi – uma moça de boa família, um filho de industrial e um ator de kyogen, o teatro cômico japonês. À primeira vista, isso é tudo que Setsuko, a dona do restaurante japonês, tem a contar ao narrador de O sol se põe em São Paulo, novo romance de Bernardo Carvalho. Mas logo a trama se complica e se desdobra em outras mais, passadas e presentes, que desnorteiam o narrador involuntário, agora compelido a um verdadeiro trabalho de detetive para completar a história em que se viu enredado.

Pois o relato de Setsuko aponta para além do desejo, da humilhação e do ressentimento amorosos, e se vincula aos momentos mais terríveis da História contemporânea – tanto do Japão como do Brasil. Romance sem fronteiras, que une a Osaka de outrora à São Paulo de hoje, e esta à Tóquio do século XXI, o romance de Bernardo Carvalho entrelaça tempos e espaços que o leitor julgaria essencialmente separados – e nos quais a prosa de ficção brasileira não costuma se arriscar.

Caberá ao narrador de O sol se põe em São Paulo transitar de um pavilhão japonês no bairro do Paraíso a um cybercafé na Tóquio pós-moderna, das fazendas do interior de São Paulo aos campos de batalha da guerra no Pacífico. Tudo a fim de deslindar uma trama tortuosa, que envolve ainda um soldado raso, um primo do imperador e um escritor famoso (o romancista Junichiro Tanizaki) – também sua própria pessoa, sua própria identidade: pária ou escritor?

Fonte:
http://www.companhiadasletras.com.br/

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Joaquim Manuel de Macedo (A Moreninha)

A moreninha é um romance do escritor brasileiro Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882), publicado em 1844. Esse livro faz parte da fase do romantismo no Brasil, e tem grande sucesso ainda nos dias de hoje.

Teve duas adaptações para o cinema e duas para telenovela.

Resumo

Augusto, Leopoldo e Fabrício estavam conversando, quando Filipe chegou e os convidou para passar um fim de semana na casa de sua avó que ficava na Ilha de Paquetá. Todos ficaram empolgados, menos Augusto. Filipe comentou a respeito de suas primas e de sua irmã, que provavelmente estariam na ilha. Foi quando surgiu uma discussão que deu origem a um aposta; Filipe desafiou Augusto dizendo que se ele não se apaixonasse por uma das moças ali presentes, no prazo de um mês, seria obrigado a escrever um romance sobre sua história. Passaram-se quatro dias, Augusto recebeu uma carta, que lhe foi entregue por seu empregado Rafael, a mando de Fabrício. A carta dizia que o namoro de Fabrício com D.Joaninha não estava indo muito bem, pois ela era muito exigente. Ela fazia-lhe pedidos absurdos como escrever quatro cartas por semana , passar quatro vazes ao dia em frente à sua casa e nos bailes ele teria que usar um lenço amarrado em seu pescoço , da mesma cor da fita rosa presa a seus cabelos.

Terminando a leitura, Augusto começou a rir porque era ele quem sempre aconselhava Fabrício em seus namoros. Na manhã de sábado, chegou à ilha e encontrou seus amigos, que estavam a sua espera. Entrando na casa, se dirigiu à sala e se apresentou, em seguida foi procurar um lugar para sentar-se perto das moças. Foi então que ele se deparou com D.Violante, que lhe ofereceu um assento. Ela falou por várias horas sobre suas doenças, e perguntou o que ele achava. Augusto já irritado de ouvir tantas reclamações, disse que ela sofria apenas de hemorróidas. D.Violante se irritou, afirmando que os médicos da atualidade não sabem o que falam. Fabrício chegou interrompendo a conversa e chamou Augusto para um diálogo em particular. Os dois começaram a discutir sobre a carta, pois Augusto disse que não pretendia ajudá-lo em seu namoro com D.Joaninha. Fabrício então declarou guerra a Augusto. Logo após a discussão, chegou Filipe chamando-os para o jantar.

Na mesa, após todos terem se servido, Fabrício começou a falar em tom alto, dizendo que Augusto era inconstante no amor. Ele, por sua vez, não respondeu as provocações, mas, na tentativa de se defender, acabou agravando ainda mais a sua situação perante todos. Após o jantar, foram todos passear no jardim e Augusto foi isolado por todas as moças. Apenas D.Ana aceitou passear com ele. Augusto quis dar explicações à D.Ana, mas preferiu ir a um lugar mais reservado. Ela sugeriu então que fossem até uma gruta, onde sentaram num banco de relva. Começaram a conversar e Augusto contou sobre seus antigos amores e entre eles do mais especial, que foi aos treze anos, quando viajando com seus pais conheceu uma linda garotinha de oito anos, com quem brincou muito na praia, quando um pobre menino pediu-lhes ajuda. Eles foram levados a uma cabana onde estava um velho moribundo a beira da morte. Sua mulher e seus filhos estavam chorando.

As crianças comovidas deram todo o dinheiro que possuíam à mulher do pobre velho. O velho agradeceu e pediu de cada um deles um objeto de valor. O menino deu-lhe um camafeu de ouro que foi envolvido numa fita verde e a menina deu-lhe um botão de esmeralda que foi envolvido numa fita branca, transformando-os em breves. O camafeu ficou com a menina e a esmeralda com o menino. Depois trocados os breves, o velho os abençoou e disse que no futuro eles se reconheceriam pelos breves e se casariam. Foram embora e a menina saiu correndo de encontro a seus pais sem ter revelado o seu nome, e a partir daquele momento nunca mais se viram. Acabada a história Augusto levantou-se para tomar água. Ao pegar um copo de prata foi interrompido por D.Ana que resolveu lhe contar a história da gruta, que era a lenda de uma moça que se apaixonara por um índio que não a amava e de tanto ela chorar, deu origem a uma fonte, cuja água era encantada.

Disse também que quem bebesse daquela água teria o poder de adivinhar os sentimentos alheios e não sairia da ilha sem se apaixonar por alguém. D.Ana explicou também que a moça cantava uma canção muito bela, quando de repente eles escutaram uma linda voz. Augusto perguntou a D.Ana de onde vinha aquela melodia e ela explicou que era Carolina que cantava sobre a pedra de gruta e ele ficou encantado. Logo após o passeio, foram todos até a sala para tomar café e a Moreninha derramou o café de Fabrício sobre Augusto. Ele foi se trocar no gabinete masculino quando Filipe entrou e sugeriu que ele fosse se trocar no gabinete feminino, para que pudesse ver como era. Augusto aceitou e enquanto se trocava, ouviu vozes das moças que iam em direção ao gabinete. Ficou apavorado, pegou rapidamente as roupas e se enfiou debaixo de uma cama. As moça entraram, sentaram-se e começaram a conversar sobre assuntos particulares.

O rapaz ouviu toda a conversa e quase não resistiu ao ver as pernas bem torneadas de Gabriela na sua frente. De repente ouviram um grito e Joaninha disse que a voz parecia com a de sua prima D.Carolina. Todos saíram correndo para ver o que estava acontecendo e Augusto aproveitou para terminar de se trocar e saiu do gabinete para ver a causa daquele grito. O grito era da Moreninha que viu sua ama D. Paula caída no chão, devido a alguns goles de vinho que tomou junto do alemão Kleberc. D.Carolina não queria acreditar que sua ama estivesse bêbada e levaram-na para o quarto. A Moreninha estava desesperada quando Augusto, Filipe, Leopoldo e Fabrício entraram no quarto e percebendo a embriaguez da velha senhora começaram a dar diagnósticos absurdos. D.Carolina só acreditou em Augusto e não aceitou o verdadeiro motivo do mau estar de sua ama. Todos saíram do quarto e se dirigiram até o salão de jogos. Augusto foi conversar com D.Ana e perguntou sobre o paradeiro da Moreninha. D.Ana disse que ela estava no quarto cuidando de sua ama.

Augusto foi até até o aposento e chegando na porta viu uma cena inesquecível; ela lavava com suas delicadas mãos os pés de sua ama e ele comovido se ofereceu para ajudá-la. Depois disso Augusto sugeriu que a deixasse repousar pois no dia seguinte estaria bem. D.Carolina foi se trocar para em seguida ir ao Sarau, colocou um vestido muito bonito mas fora dos padrões normais, pois mostrava parte de suas pernas. Todos queriam dançar com ela e Fabrício pediu-lhe a terceira dança, mas a garota mentiu dizendo que iria dançar com Augusto. Ele por sua vez dançou com todas as moças e jurou-lhes amor eterno, inclusive para a Moreninha. No fim da festa Augusto encontrou um bilhete que estava em seu paletó, dizendo para ir à gruta no horário marcado e logo após encontrou outro no qual dizia que aquilo era uma armadilha.

No dia seguinte, Augusto foi até a gruta no horário marcado e encontrou as quatro jovens e antes que elas pudessem falar, foram surpreendidas pelo rapaz que contou cada uma o que ouvira no gabinete. As moças ficaram revoltadas e depois de irem embora Augusto foi surpreendido pela Moreninha que começou a contar a conversa dele com D.Ana. Mas primeiro ela tomou um copo da fonte e foi por este motivo que Augusto ficou mais impressionado pois lembrou-se da lenda da fonte encantada, e logo depois do susto, declarou-se a ela. Depois de acabadas as comemorações, as pessoas voltaram para suas casas. Augusto não se cansava de contar sobre D.Carolina para Leopoldo, que sempre dizia que aquilo era amor. Os rapazes acharam conveniente visitar D.Ana, Augusto se encarregou dessa tarefa no domingo. D. Ana foi recebê-lo e contou-lhe que D.Carolina estava triste até saber se sua vinda para a ilha. Durante o almoço Augusto viu um lenço na mão de D.Carolina e adivinhou que ela o tinha bordado e após muita conversa D.Carolina resolveu ensiná-lo a bordar. Depois do almoço, Filipe e Augusto foram jogar baralho, quando ouviram o chamado da Moreninha para a primeira aula de bordado.

A lição acabou ao meio dia e Augusto achou prudente ir embora, despediu-se de todos e combinou com D.Carolina, que no domingo seguinte voltaria e traria o lenço já terminado. No domingo seguinte, Augusto voltou até a ilha e levou o lenço totalmente pronto, para que sua mestra pudesse o ver, ela não acreditou que ele fizera um trabalho tão bem feito e começou a chorar, dizendo que ele tinha outra mestra. Augusto tentou explicar-se de todas as maneiras possíveis, e disse que o lenço fora comprado de uma velha senhora. Depois de muita insistência a Moreninha aceitou a situação, pois D.Ana disse-lhe que sua atitude era infantil. Depois do incidente Augusto chamou a Moreninha para um passeio e percebeu que ela estava um pouco nervosa, foi então, que ele perguntou-lhe se havia um amor em sua vida, ela respondeu com a mesma pergunta e Augusto disse que o grande amor de sua vida era ela. A Moreninha ficou imóvel e disse que o seu amor poderia ser ele.

Augusto voltou para sua casa e foi proibido de voltar à ilha por seu pai pois seus estudos estavam sendo prejudicados. D.Carolina não era mais a mesma desde a partida de Augusto que agora estava em depressão. Seu pai, vendo que estava prestes a perder seu filho, achou melhor que Augusto voltasse à ilha e pedisse a mão da Moreninha em casamento. Chegando próximo à ilha, viram a Moreninha cantando sobre a pedra, e ela ao vê-los ignorou-os. D.Ana foi recebê-los e o pai de Augusto explicou a situação se seu filho. Eles foram até a sala e de repente a Moreninha apareceu com seu vestido branco chamando a atenção de todos, foi então que o pai de Augusto fez o pedido diretamente a Moreninha, pois seu filho não tinha coragem o suficiente. A moça ficou assustada e disse que daria a resposta mas tarde na gruta mas D.Ana disse ao pai de Augusto que não se preocupasse, pois a resposta seria sim. Augusto, ansioso, foi até a gruta e chegando lá encontrou a Moreninha, os dois conversaram e ela perguntou se ele ainda amava a menina da praia.

Ele disse que não pois seu amor pertencia somente a ela. Ela disse que não poderia se casar pois ele já estava comprometido com outra pessoa. Irritado, ao sair da gruta foi surpreendido quando ela lhe mostrou o breve verde. Augusto não agüentou a emoção e pegando o breve ajoelhou-se aos pés da Moreninha, começando a desenrolar o breve reconhecendo o seu camafeu. O pai de Augusto e D.Ana entraram na gruta e não entenderam o que estava acontecendo, acharam que os dois estavam malucos e Augusto dizia que encontrara sua mulher e a Moreninha por sua vez dizia que eles eram velhos conhecidos. Logo após Filipe, Leopoldo e Fabrício viram a alegria do novo casal, mas Filipe foi logo dizendo que já se passaram um mês, Augusto perdera a aposta e deveria escrever um romance. Augusto surpreende a todos dizendo que o romance já estava pronto e se intitulava A Moreninha.

Fontes:
http://pt.wikipedia.org
Capa do Livro = http://www.vestibular.brasilescola.com

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Nilto maciel (Artur Eduardo Benevides e os Mistérios do Conto)

Tido como um dos maiores poetas cearenses de seu tempo, Artur Eduardo Benevides pratica o conto também desde longas datas. Braga Montenegro, o mais completo estudioso da história curta no Ceará, no ensaio “Evolução e natureza do conto cearense”, publicado pela primeira em 1952, na revista Clã, lembra do poeta “um conto muito bom, premiado num concurso, demonstrando ali acentuadas inclinações para o gênero, sobretudo a facilidade de realçar a justa gradação trágica, contudo numa forma nem de todo isenta do transbordamento vocabular”.

Lembra também o livro Caminho Sem Horizonte, de 1958, “em que reúne nove estórias, todas acomodadas numa estreita faixa de temas, sem maior esforço experimentalista e sem penetração no espaço da literatura, isto é, no espaço dos mitos e dos símbolos poéticos”. Com a publicação do volume A Revolta do Computador e Outros Contos de Mistério, em 2001, Artur demonstrou ser contista não somente inclinado para o gênero, mas capaz de compor um conjunto de peças insólitas em dialeto irrepreensível e, ao mesmo tempo, de agradável leitura. A coleção abarca 17 narrativas curtas, em linguagem concisa, enxuta, límpida e livre de transbordamentos vocabulares.

Há, pelo menos, três tipos de história no livro: os realistas, os neogóticos, como quer Révia Herculano, e os de ficção científica. Nos dramas vividos pelos personagens do dos dois primeiros grupos a realidade cede lugar à fantasia, ao mistério, ao inusitado, ao extraordinário, ao inesperado. Podem ser vistos como realistas aqueles em que pouco de mistério se pode vislumbrar em suas tramas, embora nos desfechos se encontrem laivos de obscuridade dos fatos. Em “O Grito Final”, o narrador Nimrod, domador de serpentes, fala para gravador portátil, momentos antes de sua morte. Picado pela serpente Peralta, ao se distrair com a presença de Moya, sua “pequena” de anos atrás, espera a morte. Em “A Sede”, o narrador é “doido varrido”, em cidade pequena, fustigado por alucinações e, ao mesmo tempo, alucinado por mulheres.

Estranhamente, essas mulheres vão morrendo, sem que se saiba se ele as matou ou não. Primeiro a tia Ana, encontrada no chão sem vida, “depois de uma trovoada sem fim”. Depois Lindalva, que trabalhou em sua casa algumas semanas. Logo em seguida, Tiana. “E outras mais”. História realista, mas ao mesmo tempo de cunho misterioso. De feitio semelhante a este é “Pesadelo”. O narrador conta episódios de sua infância nas matas de Marajó. Como em outras narrativas, a selva amazônica é o palco desta trama. O protagonista tem pesadelos e em sua mente se embaralham as figuras do avô, do pai desconhecido, da mãe prisioneira em casa, de índio xapacura que guardava a mãe do narrador e um dia o empurrou e pôs o pé enorme no seu peito, da professora morta e, finalmente, da filha manca, Aglaê. A selva é misteriosa, a vida na selva é misteriosa, o narrador é misterioso e mais misterioso é o desfecho, no qual pode ser entrevisto relacionamento incestuoso: “Chamo-a docemente, (…) Ela vem devagar e sinto suas pisadas como se fossem o pé enorme do xapacura sobre o meu peito, nas noites de longos pesadelos e relâmpagos clareando o pantanal (…)”.

Em “A Serpente Enciumada”, uma das mais belas peças da coleção, outra cobra é fundamental no enredo. O narrador é herdeiro de fortuna deixada por tio exótico, colecionador de “cousas e bichos”. Diferente do morto, o homem se livra, aos poucos, de quase todas as coleções, menos de uma serpente, Dafne. Em dado momento planta no leitor uma dúvida: “Não sei se Dafne é mulher. Para mim, é apenas uma serpente”. Ora, no imaginário popular (em lendas e mitologias) a mulher é serpente. “Tia Heliodora ou o Clarão da Súbita Bondade” (título inadequado para a beleza da peça) é tipicamente realista. Narrado por menino, os personagens principais são a solteirona Heliodora e um leproso. A trama se desenrola num tempo em que os hansenianos eram recolhidos em asilos e, quando saíam às ruas, tocavam sineta, para avisar os cidadãos de sua presença. O pânico se instalava nas pessoas, que corriam e se trancavam nas casas. No final, a mulher abre a porta e dá água ao doente, em gesto considerado imperdoável pelos demais cidadãos.

A presença de cobras nas narrativas de Artur é relevante. Nuns, como ente simbólico; noutro, “O Encantado”, como ser lendário. O protagonista é o homem encantado pela serpente que vive nas águas amazônicas. O drama se inicia quando se perde na selva e “senti qualquer coisa extraordinária à minha volta”. Socorrido por bolivianos, é avisado de que “está encantado”. E conduzido para o seringal: “Aqui, nas proximidades, deve haver uma grande jibóia, com olhos na sua nuca”. Passa a ter pesadelos. Certa vez sonha com imensa cobra e acorda “com o corpo moído, como se algo incomum me houvesse apertado durante a noite”.

Em “Trevas”, o protagonista sem nome explícito (como muitos outros) fala ou pensa (monólogo ou solilóquio), enquanto assiste sozinho a filmes na televisão. E ora se comunica, pela visão e pela audição, com os personagens dos filmes (Conde Drácula, Tom Mix, Flash Gordon) e até com a atriz Catherine Deneuve, como se também fizesse parte da história; ora com os próprios fantasmas, como a sua irmã paralítica já morta, o menino morto na lagoa, aranhas gigantescas. Na realidade, está só, mas “percebe” que há outra pessoa na sala, “invisível e presente”. O tema da narrativa é a solidão: “Sou um lobo solitário. Um homem sozinho. Com medo”. Em “O Último Rosto” também o realismo cede lugar ao mistério. O narrador, ex-funcionário da Sinfônica Municipal, vê desaparecem um a um os rostos de seus companheiros da foto do grupo de sete pessoas, à medida que iam morrendo.

Em mais de uma obra, protagonistas vêem e se comunicam com pessoas mortas. Um deles, o de “Trevas”, chega a falar em mediunidade ou hipersensibilidade. Outro, em “A Boa Velhinha”, imagina-se louco, após ter estado com uma senhora, em visita oficial aos moradores de rua cujas casas seriam demolidas para dar lugar à “grande maternidade municipal”. Dias depois, volta ao local e é informado de que a tal mulher “morreu há uns vinte anos” e “nessa casa não mora ninguém desde então…” O mesmo fenômeno se verifica em “O Retrato Pendurado no Tempo”. O narrador é cavaleiro de sociedade hípica. Na primeira cena, nas proximidades do Convento do Carmo, se depara com dois anõezinhos malucos que “estavam a rasgar, aos gritos, as roupas do frade”. Indignado, expulsa a chicotadas os agressores. Dias depois, visita o convento e procura Frei Vitalino, o personagem do primeiro momento da trama. Surpreende-se ao ouvir do zelador a frase: “Frei Vitalino não existe, meu caro. É uma lenda”. Mais adiante o funcionário avisa: “Cuidado! Por aqui aparece visagem. É mal-assombrado. Aqui e na sala dos retratos”. E no final a confirmação de que havia estado com um morto: em placa de prata abaixo do retrato do frade viam-se duas datas: 1820-1896. Em “A Senhora de Azul, com Cabelos Grisalhos”, o narrador conhece estranha personagem, “jovem senhora, vestida de azul”, cuja presença é garantia de tragédia ou acontecimento funesto. Seria a própria morte, ser fictício simbólico.

Os contos de fundo científico (science-fiction) de Artur envolvem seres humanos, extraterrestres e máquinas, alguns destes alcançando a posição de protagonistas. O mistério neles é de outra natureza, menos psicológica e mais ontológica. Em “Depoimento Sigiloso” o narrador é homem afeiçoado aos objetos voadores não identificados que nega conhecer os estranhos acontecimentos relacionados a Ovnis. Aliás, toda a narrativa é composta de negativas. A história que dá título ao volume se enquadra perfeitamente subgênero ficção científica. Narrado também por ser humano, o protagonista é, no entanto, um computador superinteligente, de nome Stanley, um semideus, no ano de 2106. Em “Zyw” o ser fictício principal é alienígena, vindo de satélite de Júpiter, “um garotão de quase três metros de altura”, criado em fazenda experimental no Araguaia. O narrador é também extraterrestre, nascido em Tritão.

O poeta está presente nas narrações e descrições de quase todas as peças. “A Sede” é obra poética, sem deixar de ser narrativa. Há frases em que a poesia se mostra em sua plenitude: “Estava a chover nos telhados da infância” (p. 61). A última peça, “As Carruagens do Sem-Fim” é composição de fino lavor, talvez o mais misterioso dos contos do livro. É poesia pura. Os personagens, que não são poucos, vêm dos confins das lendas e dos mitos e viajam na grande nave interestelar, até que o círculo se feche. E Artur Eduardo Benevides fecha o seu livro com chave de ouro, como só os narradores criativos, os poetas, os iluminados sabem e podem fazê-lo: envolto em mistérios.

Fontes:
http://www.cronopios.com.br/

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Janice Bittencourt Pavan (Paixão-Mulher)

“Paixão-Mulher: seria a paixão vista e sentida do ponto de vista feminino, ou a mulher considerada na sua totalidade amorosa? Acredito que o hífen entre os dois
substantivos determina exatamente a junção dessas duas hipóteses.

Para Janice Pavan desde as primeiras páginas deste seu livro de poemas de amor, a paixão se confunde com o amor ardente que a tudo provê e ilumina. Sentimento de bem-querer profundo, com larga tendência ao contato sexual, o amor provido de desejo, no sentido de posse e perenidade.

Sinopse:

Com muita objetividade traduz em seu texto poético: amor enlouquecido de paixão que encontra no ente amado todo e talvez o único foco de prazer. Mulher feita em pleno século XXI Janice, em todo o livro, exalta a mulher que desbrava um novo horizonte, que tem “razões para viver por inteiro / não como apêndice de seu Adão”. Essa admiração à Mulher-Mãe-Trabalhadora dimensiona-se em amplitude emocional na direção das outras pessoas com quem convive.

Testemunha-se a sensibilidade da artista, manifestada sem falsos puritanismos, numa linguagem de profundo erotismo, fácil de ser lida, entendida e apreciada, que enleva e seduz o leitor”.

Fonte:
Câmara Catarinense do Livro.

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Vikas Swarup (Quem Quer ser um Milionário?)

O livro que inspirou o filme Quem quer ser um milionário?, vencedor de 8 Oscars em 2009, é ainda muito melhor que o filme, segundo a crítica.

Sua resposta vale um bilhão, romance de estréia do diplomata indiano Vikas Swarup, é uma narrativa à maneira das Mil e uma noites, com uma história central em que um personagem conta histórias para outro. O contador de histórias aqui é Ram Mohammad Thomas, um garçom de dezoito anos que ganhou um bilhão de rupias – o maior prêmio de todos os tempos – num programa televisivo de perguntas e respostas. Os organizadores do concurso, inadimplentes, se recusam a pagar o prêmio. Alegam que um garoto inculto como Ram não poderia conhecer as respostas, e o entregam à polícia para que ele seja torturado e confesse a fraude. Salvo por uma advogada, Ram terá de contar a ela a história de sua vida. Cada episódio explica como ele ficou sabendo coisas como o significado da inscrição INRI, que aparece nos crucifixos, e qual a maior condecoração por bravura concedida pelas forças armadas indianas. Unificadas pela presença do protagonista, herói picaresco que sempre acaba se saindo bem, graças a uma combinação de esperteza e sorte, as narrativas são ora cômicas, ora trágicas e apresentam um rico panorama da Índia contemporânea, onde passado e presente, miséria e opulência, religiosidade e comercialismo, ternura e violência se misturam.
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MATÉRIA NA FOLHA DE S. PAULO – 28/02/2009

Livro quer mostrar a “nova Índia”, não miséria. Autor de obra que originou “Quem Quer Ser um Milionário?” tenta expor país “dinâmico”

“Sua Resposta Vale um Bilhão”, de Vikas Swarup, tem reedição no Brasil; escritor diz querer romper com literatura maravilhosa indiana

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

A volumosa premiação no Oscar do filme “Quem Quer Ser um Milionário?”, do diretor britânico Danny Boyle, fez o mundo observar e lamentar a dura vida nas favelas da Índia. Curiosamente, o livro que deu origem à produção condecorada com oito estatuetas no último domingo está longe de ser uma obra preocupada em expor a miséria do país.

“Sua Resposta Vale um Bilhão”, do indiano Vikas Swarup, 46, agora relançado no Brasil, é um thriller urbano. Nele, o protagonista é também um rapaz pobre que se dá bem num programa de perguntas e respostas televisivo. Mas a comparação vai só até aí.

Enquanto Boyle preferiu reforçar o papel da favela na vida do rapaz, Swarup leva seu herói a vagar por cidades do que considera ser a nova Índia, ouvindo histórias inusitadas e aparentemente aleatórias, mas que o ajudam a acertar as questões que surgem quando está diante das câmeras.

Swarup diz que quer romper com a tradição da literatura maravilhosa indiana. “Não sou Salman Rushdie, quero escrever livros de mistério e suspense, que se passam no mundo real”, disse à Folha, em entrevista por telefone. E, por mundo real, Swarup entende a nova situação geopolítica da Índia.

“Todos querem saber como o país se moderniza e cresce tão rápido, mesmo neste momento de crise, e ainda assim consegue manter um pé em tradições e costumes”, diz, orgulhoso, o homem que durante o dia exerce atividades diplomáticas. Atualmente, trabalha na embaixada de seu país em Pretória, na África do Sul.

Fábula

“A questão das favelas não é importante para o meu trabalho, busco a Índia das transformações”, explica. E acrescenta: “As pessoas estão acostumadas a olhar para nós e ver o exótico ou a pobreza. Minha literatura quer mostrar que lá tudo é mais complexo e dinâmico.”

Ao tentar construir um romance que tocaria indianos de todos os cantos e religiões do país, criou o personagem central com diversos elementos. O garoto Ram Mohammad Thomas, como o nome indica, é, ao mesmo tempo, hindu, árabe e cristão. “Na Índia, quando alguém diz o nome, é possível saber sua religião, a parte do país de onde vem e até que comida consome. Ao juntar os nomes, fiz uma figura que representa todas as crenças e culturas.”

A produção cinematográfica e a obra literária obedecem a um mesmo eixo narrativo. Há um garoto pobre e sem formação que vence um programa do tipo “Show do Milhão” porque, por sorte, sabe as respostas. Essa “sabedoria” é adquirida ou por experiência própria ou por ter ouvido uma história em que a resposta aparece.

Do livro para o filme, permanece essa linha, mas as situações mudam. Na história original, por exemplo, há uma passagem da guerra entre Índia e Paquistão que não seria possível reproduzir nas telas com o curto orçamento do filme. Este, por sua vez, cria soluções mais rápidas e ágeis para obedecer à montagem pop da produção. “Não acho ruim que tenham mudado as situações. O que me deixa feliz é que a estrutura narrativa, a essência da história permanece e, no final, dá sentido ao conjunto”, diz Swarup.

Mas ele aponta que há algo distinto entre os dois formatos. “O filme é sobre o destino; o livro é sobretudo acerca da sorte e da esperança. Thomas adquire conhecimento sem necessariamente estar atrás dele. E isso é algo que nos passa sempre na vida sem nos darmos conta. Ele teve sorte de tropeçar em coisas que lhe seriam valiosas no futuro. Mas será que isso não é comum a todos nós? E só precisamos prestar atenção no que nos passa diante dos olhos? Reparar nos acasos também é construir conhecimento. Ele sai vitorioso ao notar isso.”

“Sua Resposta Vale um Bilhão”, primeiro livro do autor, já havia sido traduzido para 37 línguas antes mesmo do Oscar. O segundo, “Six Suspects”, saiu na Inglaterra em 2008.
SUA RESPOSTA VALE UM BILHÃO
Autor: Vikas Swarup
Lançamento: Companhia das Letras
Tradução: Paulo Henriques Britto
343 págs.
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SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

O humor negro cumpre diversas funções em “Sua Resposta Vale um Bilhão”, de Vikas Swarup. É o que permite, por exemplo, transitar pelo cenário de extrema pobreza dos meninos de rua indianos – em Déli, Mumbai (antiga Bombaim) e Agra – sem perder a batalha para o sentimentalismo.

A autoironia da narração em primeira pessoa, com ótimo uso de frases curtas e imagens recorrentes, possibilita também que doses pesadas de crítica sociopolítica sejam feitas de maneira mais efetiva do que se o texto discursasse, com ar professoral, contra as injustiças do país.

O órfão Ram Mohammad Thomas -cujo nome, sozinho, já embute o colorido anedótico do romance, ao fundir raízes hinduístas, muçulmanas e cristãs- aprende a se fazer de bobo, o que ajuda na sobrevivência, mas às vezes é mesmo ingênuo, o que o atira em dificuldades.
A alternância entre esperteza e fragilidade, o olhar agudo e a verve inquieta do protagonista criam com o leitor a cumplicidade necessária para que se associe esse contumaz contador de histórias à Sherazade de “As Mil e Uma Noites” e também ao personagem manipulador de Kevin Spacey em “Os Suspeitos” (1995).

Todos eles envolvem seus interlocutores porque precisam sobreviver, mas Ram Mohammad Thomas o faz também porque precisa falar. Ao torná-lo porta-voz de uma geração de indianos excluídos, em trama muito mais rica, suja e engenhosa do que sugere o filme “Quem Quer Ser um Milionário?”, Vikas Swarup o transforma em um daqueles personagens que não queremos abandonar ao final do livro.

Fonte:
Colaboração da Livraria Resposta.
http://www.livrariaresposta.com.br

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Márcio Bueno (A Origem curiosa das palavras)

Por que razão chamamos um veículo de jardineira e uma escola de jardim-de-infância, se nenhuma relação existe com flores ou plantas ornamentais? De onde vem o termo chorinho, se a música é alegre e brejeira? Em que circunstância o verbo azarar, que significa urubuzar, incorporou o sentido de paquerar? De onde vêm termos usados no mundo do futebol como barbada, embaixada, frango, gol olímpico, lanterna, zebra etc.? Por que chamamos uma ave de peru (Peru), os povos de língua inglesa chamam de turkey (Turquia) e os de francesa de dinde (da Índia), se não é originária de nenhum desses três países?

Márcio Bueno, com seu espírito inquieto e questionador, decidiu procurar respostas para várias dessas questões intrigantes. Aliás, tem por hobby colecionar a história de palavras que apresentam alguma curiosidade em seu nascimento, em sua evolução ou ao assumir novas acepções.

A partir de 1995 e durante sete anos, o passatempo transformou-se em pesquisas sistemáticas, com consultas a trabalhos dos mais conceituados etimólogos, filólogos e historiadores de língua portuguesa, de outras línguas neolatinas e também de germânicas. E o autor foi além, desenvolvendo pesquisas de campo que apresentaram resultados surpreendentes, como a descoberta da origem de biruta, que até hoje os estudiosos não haviam identificado. O resultado final é um dos mais sérios e profundos estudos de etimologia voltados para o grande público. As surpresas se sucedem a cada página.

Profissional de televisão, Bueno tem uma forte ligação com imagens. Essa é a razão por que o livro é ilustrado com desenhos e fotografias de objetos e personalidades que deram origem a palavras que usamos no cotidiano. Em diversos verbetes, é possível conhecer as injunções políticas e econômicas que motivaram o surgimento de novos vocábulos. No verbete cuba-libre, por exemplo, são desvendados os interesses que estiveram por trás da criação do nome e também da própria bebida. Em muitos outros casos, o autor fala da origem das palavras e também da própria coisa significada, a exemplo de asa delta, bina, capoeira, chorinho, tênis etc.

Embora respeitando fundamentalmente o que dizem os estudiosos, o autor descobriu pelo menos um caso em que a razão está com os chamados iletrados. Segundo suas pesquisas, quando o povo pula do bisavô para o tataravô, ignorando solenemente a existência do intermediário, o trisavô, está tão somente resistindo a uma mudança que teve como base um equívoco cometido no século XIX. No capítulo Influência Portuguesa, o autor nos brinda com termos correntes em diversos outros idiomas, incluindo o inglês, o francês e o japonês que tiveram origem em nosso idioma. É o momento de maior elevação da auto-estima de quem fala português.

O AUTOR

Márcio Bueno é jornalista e publicitário. Trabalhou ou colaborou em publicações como os jornais Movimento, Pasquim, Folha de São Paulo, Jornal do Brasil e O Globo. Em televisão, foi editor nacional de telejornais na Rede Globo, dirigiu telejornais e programas na Rede Manchete e exerceu a função de superintendente de Jornalismo na TV Educativa. É co-autor do livro 20 Anos de Resistência – As Alternativas da Cultura no Regime Militar, publicado em 1986 pela Editora Espaço e Tempo.

Fonte:
Colaboração da Livraria Resposta.
http://www.livrariaresposta.com.br

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James Joyce (Dublinenses)

Primeiro livro de ficção do escritor irlandês, reúne 15 contos escritos quanto ele tinha 23 anos. O próprio Joyce dividiu as histórias em quatro temas: infância, adolescência, vida madura e vida pública. Os contos acabam formando uma espécie de história moral da Irlanda, como definiu o escritor. O estilo dos textos é naturalista, com clara influência de Flaubert, de Tchecov e de Maupassant.

Síntese

Estes quinze contos que compõem Dublinenses são sem dúvida a melhor porta de entrada para o conhecimento da obra do mais radical inovador da literatura do século 20.

Em narrativas curtas, o jovem irlandês James Joyce (1882-1941) presta aqui o seu tributo à grande tradição realista do século 19, sobretudo a Flaubert e Tchecov. Mas, como não poderia deixar de ser, o realismo de seus precursores é sutilmente subvertido nos pequenos retratos “fora de foco” de sua Dublin natal.

A trama dos contos pode ser vista como uma série de variações sobre temas irlandeses: o catolicismo rígido, a severa educação escolar, as relações familiares pautadas pela autoridade e a violência, o alcoolismo, a vida cinzenta da classe média, o nacionalismo diante da poderosa Inglaterra.

Vistas em conjunto, essas ficções dão forma ao que o próprio escritor definiu como “uma história moral da Irlanda”.

História pública, mas vista predominantemente a partir de um ângulo privado: o escritório, a casa, o Irish pub. Sem chegar ao monólogo interior que marcaria as obras da maturidade, Joyce devassa os movimentos íntimos de suas personagens, confundindo o dentro e o fora, a impressão subjetiva e as miudezas cotidianas. Enfim: todos os elementos que seriam expandidos até a explosão em suas obras maiores, Ulisses e Finnegans Wake.

Em 1987, o cineasta norte-americano John Huston fez o último filme de sua carreira baseado no conto mais extenso e mais famoso de Dublinenses: “Os Mortos”, incluído em incontáveis antologias dos maiores contos em língua inglesa de todos os tempos.

Trechos do livro Dublinenses

As irmãs

Desta vez não havia esperança para ele: fora o terceiro ataque. Noite após noite, ao passar diante da casa (era tempo de férias), observava o retângulo iluminado da janela e, todas as noites, encontrava-o com a mesma luz pálida e uniforme. Se estivesse morto, pensava, eu veria o reflexo das velas nas cortinas escuras, pois sabia que duas velas devem ser colocadas à cabeceira de um defunto. Dissera-me várias vezes “não ficarei muito tempo neste mundo” e eu julgara vãs suas palavras. Sabia agora que eram verdadeiras. Toda noite, ao olhar a janela, murmurava comigo a palavra paralisia. Ela sempre soara estranha aos meus ouvidos, como a palavra gnômon em Euclides e simonia no catecismo. Agora, porém, soava como o nome de um ente maléfico e pecaminoso. Enchia-me de terror, mas ainda assim ansiava contemplar de perto seu trabalho implacável.

Quando desci para o jantar, o velho Cotter estava sentado junto à lareira, fumando. Enquanto minha tia preparava-me um prato de aveia, ele disse, como retomando uma observação anterior:

– Não, não afirmaria que era exatamente… mas havia nele algo de excêntrico… de misterioso. Em minha opinião…

Começou a tirar baforadas do cachimbo, por certo ganhando tempo para forjar a tal opinião. Velho enfadonho, tolo! No princípio, quando o conhecemos, costumava ser interessante com suas conversas sobre vermes e desmaios, mas logo cansara-me dele e de suas intermináveis histórias a respeito da destilaria.

– Tenho minha teoria sobre isso – prosseguiu. – Penso que se trata de um desses… casos peculiares… Mas é difícil afirmar…

Voltou a aspirar o cachimbo, sem nos expor a teoria. Vendo-me de olhar atento, meu tio dirigiu-se a mim:

– Bem, seu amigo morreu. É uma notícia triste para você.

– Quem?

– O padre Flynn.

– Está morto?

– O senhor Cotter acaba de nos contar. Passou há pouco diante da casa…

Sabia que me observavam e continuei a comer como se o fato não tivesse interesse para mim. Meu tio explicou ao velho Cotter:

– O garoto e ele eram grandes amigos. O velhote ensinou-lhe muitas coisas, compreende? Dizem que o queria muito bem.

– Deus tenha misericórdia de sua alma – murmurou, em tom piedoso, minha tia.

O velho Cotter fitou-me um instante. Senti seus olhos pequenos e negros, redondos como duas contas, examinarem-me. Mas não lhe daria o prazer de desviar meus olhos do prato. Ele retornou ao cachimbo e, passado algum tempo, cuspiu grosseiramente na lareira.

– Não gostaria que um filho meu – recomeçou – tivesse muito a falar com um homem desse tipo. – Que pretende dizer com isso, senhor Cotter? – perguntou minha tia.

– Que não é nada bom para uma criança. Minha opinião é a seguinte: rapazes devem andar e se divertir com rapazes da mesma idade e não… Estou certo, Jack?

– Também penso assim – concordou meu tio. – Ele que aprenda a se defender. Estou sempre dizendo a esse rosa-cruz aí: faça exercícios. Quando eu era rapazote, tomava toda manhã, fosse inverno ou verão, uma ducha fria. É o que me conserva firme até hoje. Cultura é coisa muito boa, mas… Voltou-se para minha tia:

– … creio que o senhor Cotter apreciaria uma fatiazinha desse carneiro.

– Não, não. Para mim não – recusou o velho Cotter.

Minha tia trouxe a travessa do guarda-comida e colocou-a na mesa:

– Mas por que não é bom para as crianças, senhor Cotter? – insistiu ela.

– Porque são muito impressionáveis. Quando vêem coisas como essas, a senhora sabe, isso tem um efeito…

Enchi a boca de aveia, temendo que minha raiva me traísse. Velho narigudo, enfadonho, imbecil!

Era bem tarde quando adormeci. Embora irritado com o velho Cotter, que me tratara como criança, esforçava-me em compreender o sentido de suas frases inacabadas. Na escuridão do quarto, imaginei estar vendo o rosto severo e grisalho do paralítico. Puxei as cobertas sobre a cabeça e procurei pensar no Natal, mas o rosto continuou a perseguir-me. O espectro movia os lábios e compreendi que desejava confessar-me alguma coisa. Senti a alma retroceder para uma região agradável e corrupta e, também lá, encontrei-o esperando por mim. Começou a confessar-se numa voz murmurada e eu me indagava por que razão ele não parava de sorrir e por que seus lábios estavam tão úmidos de saliva. Recordei-me então que morrera de paralisia e percebi que eu também sorria delicadamente, como para absolvê-lo da simonia do seu pecado.

Na manhã seguinte, após o café, desci para observar a pequena casa da rua Great Britain. Era uma loja modesta, designada pelo vago nome de Armarinhos. Seus artigos consistiam, principalmente, em guarda-chuvas e botas para crianças. Em dias normais, havia uma tabuleta pendurada na vitrina: Recobrem-se guarda-chuvas. Não se via a tabuleta agora, pois as cortinas estavam fechadas. Uma coroa de crepe estava presa à maçaneta por uma fita. Duas mulheres pobres e um garoto entregador de telegramas liam o cartão espetado na coroa:

1.° de julho de 1895

Reverendo James Flynn (outrora da Igreja de Santa Catarina, rua Meath), com a idade de sessenta e cinco anos.

R. I. P.

O cartão convenceu-me de que estava morto e a comprovação perturbou-me. Se estivesse vivo, eu entraria no quarto pequeno e escuro nos fundos da loja, onde o encontraria na poltrona junto à lareira, sumido quase dentro do seu casaco. Titia talvez lhe tivesse mandado um pacotinho de High Toast e esse presente arrancá-lo-ia do entorpecimento. Era sempre eu quem esvaziava o pacote na caixinha, pois suas mãos, trêmulas demais, não permitiriam que ele próprio o fizesse sem derramar metade no chão. Mesmo quando levava o rapé ao nariz, com a mão larga e incerta, minúsculas nuvens de fumo escapavam-lhe por entre os dedos sobre o casaco. Essa constante chuva de tabaco era talvez responsável pela cor verde e surrada de seus paramentos eclesiásticos, pois o lenço vermelho, quase sempre sujo de uma semana, com que tentava remover as migalhas de fumo, mostrava-se de todo ineficaz.

Quis entrar para vê-lo, mas faltou-me coragem de bater à porta. Afastei-me devagar e, enquanto caminhava pela parte ensolarada da rua, ia lendo os anúncios de teatro nas vitrinas das lojas.

Surpreendia-me que nem eu, nem o dia, aparentasse tristeza e fiquei realmente aborrecido ao descobrir em mim uma sensação de alívio, como se sua morte me houvesse de alguma forma libertado. Espantava-me porque, como dissera meu tio na noite anterior, o velho padre instruíra-me muito. Havia cursado o colégio irlandês de Roma e ensinara-me a pronunciar corretamente o latim. Contara-me histórias acerca das catacumbas e de Napoleão Bonaparte; explicara-me o significado das diversas cerimônias da missa e das diferentes vestes usadas pelo sacerdote. Às vezes, divertia-se fazendo-me perguntas difíceis. Perguntava-me o que uma pessoa deveria fazer em determinada circunstância, se este ou aquele pecado era venial, mortal ou apenas imperfeição.

Suas inquirições mostravam-me como eram complexas e misteriosas certas normas da Igreja, que eu sempre tivera como atos muito simples. Os deveres do sacerdote para com a Eucaristia e o sigilo do confessionário pareceram-me tão graves que me admirava ter alguém suficiente coragem para assumi-los. E não me surpreendi ao ouvi-lo dizer que, elucidando aquelas complicadas questões, os padres haviam escrito livros tão grossos como o Anuário do Correio e em letra tão miúda como a das notas jurídicas dos jornais. Eu geralmente não sabia responder ou o fazia de forma tímida e hesitante, diante do que ele balançava a cabeça e sorria. Mandava-me às vezes dizer as réplicas da missa, que me fizera decorar. Enquanto eu tagarelava, ele sorria pensativamente, movendo a cabeça e aspirando, de tempo em tempo, grandes pitadas de rapé numa e noutra narina, alternadamente. Ao sorrir, mostrava grandes dentes enegrecidos e sua língua pendia sobre o lábio inferior – hábito que me causara má impressão no início de nossa amizade, quando ainda não o conhecia bem.

Caminhando pelo sol, recordei-me das palavras do velho Cotter e tentei lembrar a seqüência do sonho. Recordei-me de ter visto longas cortinas de veludo e uma lâmpada antiga oscilando suspensa. Tinha a sensação de haver estado muito longe – na Pérsia, pensei -, mas não pude reconstituir o final do sonho.

À tardinha, titia levou-me com ela para a visita de pêsames. Era quase noite, mas as janelas das casas voltadas para o ocaso refletiam o ouro fulvo de um aglomerado de nuvens. Nannie recebeu-nos no vestíbulo e como se fosse indelicado dirigir-lhe a palavra, titia limitou-se a apertar-lhe a mão. A idosa mulher apontou para cima interrogativamente e, ao assentimento de minha tia, adiantou-se a nós e subiu com esforço a escada estreita, arqueando a cabeça quase ao nível do corrimão. Parou no primeiro patamar e indicou-nos a porta aberta da câmara mortuária. Minha tia entrou. Vendo que eu hesitava, a mulher encorajou-me com repetidos acenos.

Entrei na ponta dos pés. Através das cortinas uma luz fosca e dourada invadia o quarto, empalidecendo a chama das velas. Ele estava no caixão. Nannie fez um sinal e nós três nos ajoelhamos ao pé da cama. Fingi estar rezando, mas não conseguia ordenar meus pensamentos, pois os murmúrios da velha distraíam-me. Reparava na forma grosseira com que sua saia estava presa às costas por um alfinete e nos saltos de suas botas de pano, gastos de um lado só. Ocorreu-me então a idéia de que o velho sorria deitado no caixão.

Mas não. Quando nos levantamos e fomos à cabeceira do leito, vi que não estava sorrindo. Jazia ali, imenso, solene, vestido como para a missa, as mãos segurando molemente um cálice. Na verdade seu rosto, circundado por escassa penugem branca, era truculento, escuro e maciço, com narinas negras e cavernosas. Um odor pesado no quarto: as flores.

Persignamo-nos e saímos. Na saleta, embaixo, encontramos Eliza dignamente sentada na poltrona que pertencera ao morto. Com timidez, dirigi-me à cadeira de costume, no canto, enquanto Nannie apanhava uma garrafa de xerez e alguns cálices no guarda-louças. Colocou-os na mesa e convidou-nos a tomar um pouco de vinho. A um sinal da irmã, serviu o xerez e passou-nos os cálices.

Insistiu para que eu aceitasse alguns biscoitos, mas recusei achando que iria fazer muito barulho mastigando-os. Pareceu um tanto desapontada com minha recusa e, em silêncio, foi sentar-se no sofá, atrás da irmã. Ninguém falava: olhávamos todos para a lareira apagada. Minha tia esperou que Eliza suspirasse e disse:

– Bem, foi para um mundo melhor.

Eliza tornou a suspirar e balançou a cabeça, concordando. Titia bateu com o dedo na haste do cálice, antes de provar um minúsculo gole.

– … foi… tranqüila? – perguntou ela.

– Oh, muito tranqüila, madame – respondeu Eliza. – Nem se percebeu quando a respiração cessou. Teve uma bela morte, louvado seja Deus!

– E tudo?…

– Padre O’Rourke esteve com ele na terça-feira. Deu-lhe a extrema-unção e preparou-o.

– Então ele sabia?

– Estava totalmente conformado.

– Seu rosto mostra isso – comentou minha tia.

– Foi o que disse a mulher que veio lavá-lo: “Parece estar dormindo, tão resignada e serena é sua expressão.” Ninguém podia imaginar que daria um defunto tão bonito.

– É verdade – concordou titia.

Bebeu outro pequeno gole e prosseguiu:

– Bem, senhorita Flynn, de qualquer maneira deve ser um grande consolo para vocês saber que fizeram tudo o que podiam. Foram muito devotadas a ele.

Eliza pôs as mãos nos joelhos, alisando o vestido:

– Ah! Pobre James! – exclamou. – Deus sabe que apesar de nossa pobreza fizemos o que estava ao nosso alcance. Não lhe deixaríamos faltar nada enquanto vivesse.

Nannie reclinara-se na almofada do sofá e parecia prestes a adormecer.

– Veja a pobre Nannie – disse Eliza, fitando-a. – Está esgotada. O trabalho que tivemos, procurando a mulher para lavá-lo, vestindo-o, colocando-o no caixão, cuidando dos preparativos para a missa na capela. Sem o padre O’Rourke, não sei o que seria de nós. Foi ele quem trouxe todas essas flores e os dois castiçais da capela. Escreveu também a nota para o Freeman’s General, cuidou de todos os papéis para o enterro e do seguro do pobre James.

– Muita bondade dele, não acha? – disse titia.

Eliza fechou os olhos e balançou a cabeça, lentamente:

– Nas horas difíceis o que vale são os velhos amigos. Amigos em que se pode confiar.

– É bem verdade – aprovou minha tia. – Estou certa de que agora, na vida eterna para onde foi, ele não se esquecerá de vocês e de toda sua dedicação.

– Ah! Pobre James! – lamentou Eliza novamente. – Não nos dava muito trabalho. Não se notava sua presença na casa mais do que agora. No entanto, sei que morreu e…

– Quando tudo terminar é que sentirão sua falta – observou titia.

– Sei disso. Nunca mais lhe trarei a sopa de carne, nem a senhora, madame, o presenteará com o rapé. Oh, pobre James!

Ficou um instante em silêncio, a comungar com o passado, e acrescentou com expressão sagaz: – Sabe, notei que algo estranho lhe ocorria ultimamente. Sempre que lhe trazia a sopa, encontrava-o inerte na poltrona, a boca aberta, o breviário caído no chão.

Pôs um dedo sobre o nariz e franziu a testa:

– Mesmo assim, continuava a dizer que qualquer dia, antes do verão terminar, iria visitar nossa velha casa em Iristown e nos levaria com ele. Se pudesse alugar no Johnny Rush aqui perto, ao menos por um dia – afirmava ele – uma dessas carruagens modernas e silenciosas, com rodas macias para pessoas reumáticas, de que lhe falara padre O’Rourke, então sairíamos os três numa tarde de domingo… Era uma idéia fixa… Pobre James!

– Deus tenha misericórdia de sua alma! – rogou minha tia.

Eliza tirou o lenço e enxugou os olhos. Tornou a guardá-lo no bolso e fitou por um momento a lareira apagada, sem nada dizer.

– Foi sempre tão escrupuloso – recomeçou. – Os deveres do sacerdócio foram pesados demais para ele e sua vida foi, pode-se dizer, frustrada.

– Sim – disse minha tia. – Era um homem desiludido. Percebia-se isso.

Aproveitando o silêncio que se apossou da sala, fui até a mesa, provei meu vinho e retornei silenciosamente à minha cadeira. Eliza parecia ter mergulhado em profundo devaneio.

Respeitosamente, esperamos que ela rompesse o silêncio. Após longa pausa, ela disse lentamente:

– Aquele cálice que ele quebrou… Foi o começo de tudo. Disseram, é claro, que não tinha importância, o cálice estava vazio, creio eu. Mesmo assim… Disseram-lhe também que a culpa fora do coroinha, mas o pobre James era tão nervoso! Que Deus tenha piedade dele!

– Então foi isso? – perguntou minha tia. – Ouvi dizer que…

Eliza balançou a cabeça:

– Isso perturbou-lhe a mente. Depois do acidente, ficou desorientado. Divagava, não falava com ninguém. Certa noite, procuraram-no para atender a um chamado e não o encontraram em lugar nenhum. O sacristão sugeriu que tentassem a capela. Ele, padre O’Rourke e mais outro sacerdote que lá estava apanharam as chaves e levaram uma lanterna para procurá-lo. Imagine que ele estava sentado no confessionário, sozinho, olhos arregalados e rindo consigo mesmo.

Calou-se bruscamente como para ouvir alguma coisa. Também prestei atenção, mas não havia na casa o mínimo rumor e eu sabia que o velho sacerdote continuava no caixão, tal como o havíamos visto, solene e truculento na morte, um cálice inútil sobre o peito.

Eliza recomeçou:

– Os olhos arregalados e rindo sozinho… Naturalmente, ao verem isso, pensaram logo que alguma coisa não andava bem com ele…

Fontes:
http://vestibular.uol.com.br/ultnot/livrosresumos/
Imagem = http://wwwrenatacordeiro.blogspot.com

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W Somerset Maugham (O Fio da Navalha)


Larry Darnell, um jovem americano da alta burguesia que conhecera a morte nos campos de batalha da Primeira Guerra na Europa, volta para a cidade em que nascera (Chicago) em estado de choque. Abandona tudo confortos materiais para buscar o sentido da vida. A ação transcorre entre os anos 20 e 40 em lugares tão díspares quanto Chicago, Paris, Marselha, Índia e ranchos no Texas.

Síntese

O século 20 produziu uma quantidade enorme de histórias sobre ex-combatentes de guerra que, ao voltarem para casa, não se reconhecem mais naquilo que vêem e precisam de algum modo reencontrar o fio da meada. No entanto poucas obras literárias se tornaram tão emblemáticas dessa situação quanto este romance de W. Somerset Maugham.

Depois de ver seu melhor amigo morrer nos campos de batalha da Primeira Guerra, o jovem norte-americano Larry Darrell retorna aos Estados Unidos completamente transformado. Em pouco tempo, decide deixar a vida burguesa de Chicago e adiar seu casamento com a bela Isabel. Como muitos jovens de sua geração, Darrell vai passar uma temporada de aprendizado existencial em Paris, onde perambula pelos cafés e começa a ler livros sobre a Índia e o Nepal.

Entusiasmado com as descobertas e a possibilidade de um mundo radicalmente novo, Darrell viaja para esses países em busca de iluminação espiritual –assim como o próprio autor fez na década de 30. Anos mais tarde, de volta a Paris, Darrell reencontra Isabel e vários amigos americanos que haviam deixado os EUA depois da crise financeira de 1929.

O Fio da Navalha, expressão retirada por Maugham de um dos upanixades (textos sagrados da Índia), rendeu várias versões para o cinema, entre elas a de 1946, com Tyrone Power no papel principal, e a de 1984, estrelada por Bill Murray.

Trechos do livro O Fio da Navalha
Capítulo 1

Nunca senti maior apreensão ao começar um romance. E se digo romance é por não saber de que outra maneira chamá-lo. Não tem grande enredo, não acaba com morte nem com casamento. A morte põe termo a todas as coisas e é, portanto, fim lógico para uma história; mas também o casamento é solução muito correta e os blasés fariam mal em escarnecer daquilo que comumente se diz que “acabou bem”. O instinto popular anda acertado ao afirmar que, com isto, tudo o que devia ser dito foi dito. Quando, depois de inúmeras vicissitudes, macho e fêmea finalmente se reúnem, sua função biológica foi cumprida e o interesse passa à geração vindoura. Mas estou deixando o meu leitor no escuro. Este livro consiste das recordações que tenho de um homem com quem, em épocas muito espaçadas, tive íntimo contato; mas pouco sei do que lhe aconteceu nos intervalos. Creio que, recorrendo à imaginação, eu poderia preencher plausivelmente as lacunas e tornar mais coerente a minha narrativa; mas a tal não me sinto atraído. Quero unicamente relatar fatos de que tenho conhecimento.

Há anos escrevi um romance intitulado Um gosto e seis vinténs. Nele destaquei um famoso pintor, Paul Gauguin, e, valendo-me do privilégio do romancista, imaginei vários incidentes, no intuito de ilustrar o tipo que eu criara inspirado nos escassos fatos que conhecia da vida do artista francês. Na obra atual nada tentei de semelhante. Não inventei coisa alguma. Para poupar constrangimento a pessoas que ainda vivem, dei aos personagens desta história nomes fictícios e procurei, por outros meios, evitar que sejam reconhecidos. O homem sobre quem escrevo não é célebre; talvez nunca chegue a sê-lo. É possível que, ao atingir o fim da vida, não deixe, de sua passagem pela terra, vestígio maior que aquele que a pedra, atirada ao rio, deixa na superfície das águas. Neste caso, se o meu livro for lido, sê-lo-á exclusivamente pelo interesse intrínseco que possa ter. Mas é possível que o gênero de vida que esse homem escolheu para si próprio e a singular força e doçura do seu caráter tenham uma influência sempre crescente sobre seus semelhantes, de modo que, mesmo muito tempo depois de sua morte, talvez se compreenda que nesta época viveu uma criatura extraordinária. Ficará, então, claro sobre quem escrevi neste livro, e aqueles que desejarem conhecer alguma coisa dos primeiros anos da existência desse homem talvez aqui encontrem algo que lhes satisfaça. Creio que o meu livro, dentro de suas possibilidades, que reconheço limitadas, será uma útil fonte de informações para os biógrafos do meu amigo.

Não é minha intenção fazer crer que as conversas foram registradas literalmente. Não tomei nota sobre o que foi dito nesta ou naquela ocasião, mas tenho boa memória quanto ao que me diz respeito e creio que, embora expressas em minhas próprias palavras, essas conversas representam fielmente o que foi dito. Há pouco declarei nada ter inventado; quero agora modificar essa asserção. Tomei a liberdade, que desde o tempo de Heródoto os historiadores têm tomado, de pôr nos lábios dos meus personagens palavras que eu, pessoalmente, não poderia ter ouvido. Agi pela mesma razão que os fez agir; para dar vida e verossimilhança a cenas que teriam sido incolores se apenas relatadas. Quero ser lido, e creio estar no meu direito quando faço o possível para tornar agradável a leitura do meu livro. O leitor inteligente facilmente perceberá em que ocasiões me vali deste artifício e tem toda a liberdade de rejeitá-lo.

Outro motivo que me fez iniciar esta obra com apreensão foi o fato de eu aqui lidar a maior parte do tempo com americanos. É difícil a gente compreender bem as criaturas e não creio que possamos conhecer ninguém a fundo, a não ser os nossos próprios compatriotas. Pois os homens não são somente eles; são também a região onde nasceram, a fazenda ou o apartamento da cidade onde aprenderam a andar, os brinquedos que brincaram quando crianças, as lendas que ouviram dos mais velhos, a comida de que se alimentaram, as escolas que freqüentaram, os esportes em que se exercitaram, os poetas que leram e o Deus em que acreditaram. Todas essas coisas fizeram deles o que são, e essas coisas ninguém pode conhecê-las somente por ouvir dizer, e sim se as tiver sentido. Só pode conhecê-las quem é parte delas. E, por não se poder conhecer as pessoas de um país estrangeiro a não ser por observação, é difícil torná-las reais nas páginas de um livro. Mesmo um observador sutil e cuidadoso como Henry James, embora tivesse vivido quarenta anos na Inglaterra, jamais conseguiu criar um inglês que fosse cem por cento inglês. Quanto a mim, a não ser em alguns contos, nunca tentei manejar a não ser os meus próprios compatriotas; e, se nas histórias curtas me aventurei à exceção, foi porque nelas o escritor pode tratar os tipos mais sumariamente. Dá ao leitor indicações gerais e deixa por conta dele os detalhes. Possivelmente perguntarão por que motivo, já que transformei Paul Gauguin em inglês, não pude fazer o mesmo com os personagens deste livro. A resposta é simples: não pude. Eles não teriam sido quem são. Não quero dizer que sejam americanos como os americanos vêem a si mesmos; são americanos, sob o ponto de vista inglês. Não tentei reproduzir as singularidades do seu modo de falar. A barafunda que fazem os escritores ingleses quando se atiram à empreitada só pode ser comparada à confusão que fazem os escritores americanos quando tentam reproduzir o idioma inglês como é falado na Inglaterra. A gíria é a grande arapuca. Nos seus contos ingleses, Henry James sempre fez uso dela, mas nunca da mesma maneira que os ingleses; assim sendo, em vez de conseguir o desejado efeito coloquial, a maior parte das vezes dá ao leitor inglês um desagradável sobressalto.
2
Aconteceu-me estar em Chicago em 1919, a caminho do Extremo Oriente, pretendendo, por motivos que nada têm com esta história, ali me demorar durante duas ou três semanas. Pouco tempo antes eu publicara um romance que obtivera sucesso; estando, portanto, em evidência, fui entrevistado assim que desembarquei. No dia seguinte meu telefone tocou. Atendi.

– Quem fala aqui é Elliott Templeton.

– Elliott? Pensei que você estivesse em Paris.

– Não; vim visitar minha irmã. Queremos que você venha almoçar conosco.

– Com muito prazer.

Ele indicou a hora e o endereço.

Meu conhecimento com Elliott datava de quinze anos. Na ocasião em que me telefonou ele devia estar perto dos sessenta anos, homem alto e elegante, de traços agradáveis e espessos cabelos escuros e ondulados, com a nota grisalha apenas suficiente para acentuar a distinção de sua aparência. Ele comprava os acessórios de toalete em Charvet, mas seus ternos, chapéus e sapatos eram de Londres. Tinha em Paris um apartamento na Rive Gauche da elegante Rue St. Guillaume. As pessoas que não o apreciavam diziam que ele era negociante, acusação que o indignava. Elliott tinha gosto e entendia de arte, não se importando de confessar que, em anos idos, quando pela primeira vez se instalara em Paris, dera a ricos colecionadores o favor de sua opinião; e, quando devido às suas relações sociais ouvia falar de algum fidalgo arruinado, inglês ou francês, que estava disposto a vender um bom quadro, ficava satisfeito de poder pô-lo em contato com os diretores de museus americanos que, acontecia ele saber, estavam à procura de uma obra-prima de tal ou tal mestre. Havia na França e na Inglaterra muitas famílias antigas cujas circunstâncias as obrigavam a dispor de uma peça assinada, de Buhl, ou de uma escrivaninha feita pelo próprio Chippendale, se o negócio pudesse ser feito sem alarde, e que gostavam de conhecer um homem de grande cultura e finas maneiras que saberia tratar discretamente do assunto. Supunha-se, naturalmente, que Elliott lucrava com essas transações, mas a boa educação não deixava que se tecessem comentários a respeito. Pessoas pouco generosas afirmavam que em seu apartamento tudo estava à venda e que, depois de ter oferecido a milionários americanos um ótimo almoço, com vinhos velhos, uma ou duas de suas valiosas telas desapareceriam, ou uma cômoda de madeira entalhada seria substituída por uma outra, laqueada. Quando lhe perguntavam por que razão sumira determinada peça, ele muito logicamente explicava que não a achara bem à sua altura e resolvera, portanto, substituí-la por outra de superior qualidade. Acrescentava que era enfadonho estar sempre a ver as mesmas coisas.

– Nous autres américains, nós, americanos, gostamos de variar – dizia ele. – É, ao mesmo tempo, a nossa fraqueza e a nossa força.

Algumas das senhoras americanas residentes em Paris, que se gabavam de saber tudo a respeito de Elliott, diziam que sua família era muito pobre e que, se ele conseguia manter-se no padrão em que vivia, era por ter sido muito hábil. Não sei a quanto montava a sua fortuna, mas o duque de quem era inquilino certamente o fazia pagar muito pelo apartamento que, além do mais, era mobiliado com peças de valor. Havia, nas paredes, desenhos dos grandes mestres franceses, Watteau, Fragonard, Claude Lorraine e outros; tapetes Savonnerie e Aubusson exibiam sua beleza em soalhos de parquete; e na sala de visitas havia um conjunto Luís XV, em petit point, de tal elegância que poderia ter pertencido, como afirmava ele, a madame Pompadour. Em todo caso, Elliott possuía bastante para viver no estilo que considerava correto para um cavalheiro, sem precisar para isso ganhar dinheiro, e o método que no passado usara para consegui-lo era assunto que, a não ser que se quisesse romper relações com ele, era conveniente evitar. Liberto assim de preocupações materiais, ele se dedicou à paixão máxima de sua vida – relações sociais. Suas transações comerciais com os fidalgos empobrecidos, tanto na França como na Inglaterra, consolidaram a posição que ele conseguira ao chegar à Europa, moço, com cartas de apresentação a pessoas importantes. Sua origem o favorecia aos olhos das titulares americanas a quem vinha recomendado, pois ele pertencia à antiga família da Virgínia, e do lado materno podia reclamar parentesco direto com um dos signatários da Declaração da Independência. Tinha boa aparência, era vivo, dançava bem, atirava regularmente e sobressaía no tênis. Era elemento que valia a pena ter-se em qualquer festa. Ninguém mais pródigo, em se tratando de flores e caixas de bombons. Embora recebesse pouco, quando o fazia era com originalidade que agradava; aquelas ricaças achavam divertido ser convidadas a restaurantes boêmios em Soho ou bistrôs no Quartier Latin. Ele estava sempre pronto a servir e não havia favor, por maçante que fosse, que se lhe pedisse, que ele não fizesse com prazer. Esforçava-se bastante por ser agradável a senhoras maduras e rapidamente se tornava o ami de la maison, o queridinho de muita mansão imponente. Era extrema a sua gentileza; nunca se ofendia por ser convidado à última hora, quando alguém deixava a dona da casa em apuros, e a gente podia colocá-lo ao lado de uma velhota enfadonha, tendo certeza de que seria espirituoso e amável como só ele sabia ser.

Dentro de dois anos, tanto em Londres – para onde ia durante a última parte da temporada, e no princípio do outono para fazer algumas visitas a casas de campo – como em Paris, onde se instalara definitivamente, Elliott conhecia todas as pessoas que era possível a um jovem americano conhecer. As senhoras que o tinham introduzido na sociedade surpreenderam-se ao verificar como se alargara o seu círculo de relações. Os sentimentos dessas senhoras eram confusos. Por um lado, ficaram satisfeitas com o sucesso do seu protégé e, por outro, um tanto despeitadas ao vê-lo em tais termos de intimidade com pessoas com quem elas continuavam a manter relações de absoluta cerimônia. Embora Elliott continuasse a ser obsequioso e serviçal, elas tinham a desagradável impressão de que ele as usara como escada para o seu avanço social. Desconfiavam que ele fosse esnobe. Claro que o era. Incrivelmente esnobe. Um esnobe sem a menor vergonha. Ele engoliria qualquer afronta, ignoraria qualquer desfeita, toleraria qualquer descortesia para ser convidado a uma festa a que desejasse ir ou para conseguir aproximar-se de alguma rabugenta duquesa-mãe. Neste particular era incansável. Quando fixava o olhar na presa, perseguia-a com a tenacidade do botânico que, para conseguir uma orquídea rara, desafia enchentes, terremotos, febres e nativos hostis. A guerra de 1914 deu-lhe a sua oportunidade decisiva. Logo no início, entrou para o Corpo de Saúde e serviu, primeiro em Flandres, depois em Argonne; voltou ao fim de um ano com uma fita vermelha na lapela e conseguiu um posto na Cruz Vermelha de Paris. Nessa época, já estava em ótima situação financeira e contribuiu generosamente para obras de caridade patrocinadas por pessoas importantes. Com seu fino gosto e dom de organização, estava sempre pronto a trabalhar para qualquer festa de caridade que fosse amplamente anunciada. Ficou sócio de dois dos mais seletos clubes de Paris. Era ce cher Elliott para as maiores damas da França. Finalmente vencera.

Fontes:
http://vestibular.uol.com.br/ultnot/livrosresumos/ult2755u111.jhtm
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http://outrasescritas.blogspot.com

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José Saramago (Memorial do Convento)

Apesar de ter sido trazida da Áustria já há dois anos, especialmente para gerar o sucessor ao trono de D. João V, rei de Portugal, a rainha D. Maria Ana Josefa parece não conseguir engravidar. Sendo o rei um símbolo de virilidade, ela é quem é considerada infértil e, conseqüentemente, a única culpada pelo fato de o rei ainda não ter tido herdeiros. Quando, ao cair da noite, o rei se prepara para ir ao quarto da rainha para mais uma tentativa, chega ao palácio D. Nuno da Cunha, bispo inquisidor, acompanhado de um velho frade franciscano, Antônio de S. José, que propõe uma solução para o problema do rei. Diz o frade que a rainha engravidaria assim que o rei prometesse construir um convento para os frades da ordem dos franciscanos na vila de Mafra. Feita a promessa, o casal real vai finalmente para o quarto.

Depois de consumado o ato sexual, rei e rainha dormem e sonham cada um com seus próprios desejos, suas diferentes fantasias: ela sonha que tem um encontro amoroso com seu cunhado, o Infante D. Francisco, enquanto o rei sonha que seu pênis está se transformando em árvore e, logo em seguida, em colunas do convento que ele prometera construir para os franciscanos.

Em tom irônico, o narrador revela suspeitas de que, antes mesmo da promessa, talvez a rainha já estivesse grávida e que talvez o padre o já sabia disso. Em todo caso, se a concepção da rainha ocorresse, o fato seria visto como mais um entre os vários milagres tradicionalmente relacionados à ordem de São Francisco. Diz-se, por exemplo, que um tal frei Miguel da Anunciação, mesmo depois de morto, conservara seu corpo intacto durante dias, atraindo, desde então, uma grande quantidade de devotos para sua igreja. Em outra ocasião, a imagem de Santo Antônio, que vigiava uma igreja franciscana, locomovera-se até à janela, onde ladrões tentavam entrar, passando-lhes assim um grande susto. E do convento de S. Francisco de Xabregas conta-se que, certa vez, suas lâmpadas tinham sido roubadas, e logo depois foram encontradas, como se por acaso, num mosteiro de jesuítas. A gravidez da rainha foi atribuída ao poder milagroso de Santo Antônio ou, segundo outros, à ameaça que um frade velho fizera contra a imagem do santo, acusando o protetor de descuido.

Passado o “entrudo” , como de costume, durante a quaresma as ruas se encheram de gente que fazia cada um suas penitências. Segundo a tradição, a quaresma era a única época em que as mulheres podiam percorrer as igrejas sozinhas e assim gozar de uma rara liberdade que lhes permitia até mesmo de se encontrarem com seus amantes secretos. Porém, D. Maria Ana não podia gozar dessas liberdades, pois, além de ser rainha, agora se encontrava grávida. Assim, tendo ido para a cama cedo, consolou-se em sonhar outra vez com D. Francisco, seu cunhado. Passada a quaresma, todas as mulheres retornaram para a reclusão de suas casas.

Em contraste com os conflitos da família real está a história de Baltasar Mateus, um homem de 26 anos, conhecido como “o Sete-Sóis”. Baltasar dirige-se a Lisboa, caminhando pela estrada real, depois de ter sido soldado e perdido a mão esquerda em uma batalha contra a Espanha, para decidir a quem pertenceria o trono espanhol. Com um que lhe servia de mão e um espigão de ferro que funcionava como uma arma, Baltasar pede esmola em Évora e, a caminho de Lisboa, mata um ladrão que havia tentado assaltá-lo. Não sabendo ainda se ficaria em Lisboa ou se continuaria viagem em direção a Mafra , onde ainda viviam seus pais, Baltasar anda pelas ruas da capital e conhece João Elvas, com quem, junto a outros mendigos, vai passar a noite num “telheiro abandonado”. Antes de dormir, cada um conta histórias de crimes que ocorreram na cidade, os quais são comparados às mortes que alguns deles presenciaram na guerra.

Não somente por causa da gravidez de cinco meses, mas também por estar de luto pela morte de seu irmão, a rainha Maria Ana deixa de freqüentar o grande auto-de-fé na praça do Rossio em Lisboa, evento muito popular, que já há dois anos não ocorria. Ali seriam castigados pela Inquisição diversos casos de heresia.

Entre os condenados pelo Santo Ofício, um é focalizado com maior destaque. É Sebastiana Maria de Jesus, acusada de ser feiticeira e cristã-nova . Sebastiana, durante alguns parágrafos, torna-se a narradora da história.

Sebastiana Maria de Jesus tem uma filha de 19 anos: Blimunda, jovem de poderes sobrenaturais, que assiste à procissão ao lado do padre Bartolomeu Lourenço. Perto dela está um homem, Baltasar Mateus, o Sete-Sóis, a quem ela se dirige e cujo nome procura saber. Voltando a sua casa, Blimunda leva consigo o padre e deixa a porta aberta para que o recém-conhecido também possa entrar. Depois de o padre sair, Blimunda convida Baltasar para que fique morando em sua casa, pelo menos até que ele tivesse que voltar a Mafra . No dia seguinte, ao acordar, Blimunda, sem abrir os olhos, come um pedaço de pão e promete a Baltasar que nunca o olharia “por dentro”.

Começa aqui a fiel e duradoura amizade entre os três personagens que se contrapõem aos personagens da família real, heróis da historiografia oficial. Inicia-se também a relação amorosa entre Baltasar e Blimunda, que ocupará o centro da narrativa.

Ao encontrar-se com o padre Bartolomeu Lourenço, que estava procurando usar sua influência no palácio para conseguir dinheiro. Baltasar fica sabendo que o padre era conhecido como “o Voador”, por ter criado uma máquina a qual todos ridicularizam, chamando de “a passarola”. Baltasar aceita o convite do padre para ser seu ajudante no projeto de construir a tal “máquina de voar”, mas enquanto não chega o dinheiro para o material necessário, fica trabalhando em um açougue.

Enquanto isso, no palácio, para decepção do rei, a rainha dá à luz uma menina, Maria Xavier Francisca Leonor Bárbara, que é batizada por sete bispos. Apesar de o frade Antônio de S. José já ter morrido quando do nascimento da criança, a promessa do rei de construir o convento seria mantida.

Baltasar, que sempre dormia no lado direito da enxerga _ , procura saber por que Blimunda sempre comia pão ao acordar, antes mesmo de abrir os olhos. Ele já tinha tentado descobrir o mistério através do padre Bartolomeu Lourenço que, apesar de conhecer a verdadeira razão, não a quis revelar, dizendo apenas que voar é um mistério pequeno se comparado ao mistério de Blimunda. Certa manhã, tentando desvendar esse mistério de uma vez por todas, Baltasar esconde o pão de Blimunda que, ao acordar, começa a procurá-lo desesperadamente. Finalmente, depois de receber o pão das mãos de Baltasar, Blimunda revela que tem o poder de “olhar por dentro das pessoas”, o que podia fazer somente quando estava em jejum. No dia seguinte, para provar-lhe seu poder (ou infortúnio), Blimunda, ainda em jejum, sai à rua com Baltasar, evitando olhá-lo, já que antes tinha prometido não “olhá-lo por dentro”.

Dentre as coisas que vê, Blimunda descreve a gravidez de uma mulher, o que existe no subsolo, o órgão sexual de um jovem, apodrecido por doença venérea, e até mesmo uma moeda enterrada no chão.

Enquanto no palácio nascia D. Pedro, segundo filho da família real, e o rei viajava a Mafra para escolher o lugar onde seria erguido o convento monumental, Baltasar e Blimunda mudam-se para a abegoaria na quinta do duque de Aveiro, amigo do rei, em S. Sebastião da Pedreira. Além de proporcionar-lhe o lugar de trabalho, o rei, que se interessara pelo projeto do padre como uma criança se interessa por um brinquedo novo, com sua amizade e influência protegia o padre das garras da Inquisição que, caso viesse saber dos projetos do padre, teria motivos suficientes para acusá-lo de heresia.

Na quinta do duque de Aveiro, Padre Bartolomeu, com a ajuda de Baltasar e Blimunda, prossegue na construção da passarola. Decide, então, partir à Holanda, onde dizem que os sábios conhecem os mistérios da alquimia e a natureza do éter , o único elemento que, segundo ele, estava faltando para que sua invenção fosse concluída.
Baltasar e Blimunda, depois que o padre parte, decidem mudar-se para Mafra , terra natal de Baltasar. Antes de partir, o casal decide assistir, ao invés de mais um auto-de-fé que seria realizado na praça do Rossio, a uma outra festa popular, a tourada. Assim como os autos-de-fé , as touradas sempre terminavam com um forte cheiro de carne queimada, proveniente do churrasco realizado no final da festa _ . Ao chegar à casa da família em Mafra , acompanhado de Blimunda, Baltasar é recebido por sua mãe, Marta Maria, já que João Francisco, seu pai, estava trabalhando no campo. Baltasar fica sabendo que sua única irmã, Inês Antônia, estava casada com Álvaro “Pedreiro” Diogo. Dos dois filhos desse casal, apenas um sobreviveria, sendo que o outro morreria ao atingir a mesma idade em que o infante D. Pedro, filho de D. João V, também morreria, anos mais tarde.

Baltasar fala à família de suas intenções de ficar morando com a mulher em Mafra . A família acolhe bem Blimunda, depois de se certificar de que ela não era judia ou cristã-nova , o que não era completamente verdade. O pai informa ao filho recém-chegado de que abrira mão de suas terras na Vela, pois elas haviam sido desapropriadas para a construção do convento, uma obra monumental que, segundo acreditavam, traria muitos empregos para os moradores da região, especialmente para o cunhado de Baltasar, que era pedreiro. Baltasar vai visitar as obras do convento e, ao retornar, encontra Blimunda conversando com Maria Marta, de quem a jovem se tornaria companheira e ajudante, enquanto Baltasar iria trabalhar com o pai no cultivo de terras que não lhes pertenciam.

Encontrando-se o rei bastante enfermo, seu irmão aproveita as perspectivas que lhe são favoráveis e revela à rainha seu interesse em tornar-se seu marido e o novo rei. O infante D. Francisco declara saber que é objeto dos sonhos da rainha, numa conversa que seria a primeira entre tantas que finalmente acabariam por destruir o desejo original que ela experimentara. Mesmo depois de recuperada a saúde do rei, seus antigos sonhos nunca teriam aquele mesmo encanto de antigamente, já que ela tem plena consciência de que sua condição de mulher e rainha mudaria pouco, fosse ela casada com um ou outro irmão.

Voltando da Holanda, onde estivera por três anos, o padre Bartolomeu Lourenço dirige-se à quinta de S. Sebastião da Pedreira, encontrando a albegoaria abandonada. Algumas semanas depois, parte em direção a Coimbra, de onde conta retornar já “doutor em cânones”. Antes, porém, decide visitar o casal amigo em Mafra , onde, ao chegar, encontra um pároco, Francisco Gonçalves, que lhe oferece um quarto para ficar hospedado. Em conversa com Blimunda e Baltasar, o padre Bartolomeu conta-lhes o que descobrira na Holanda, ou seja, que ao contrário do que se pensa, o éter não é uma substância que possa ser encontrada pelas artes da alquimia, mas que, antes de subir ao céu, o éter existe dentro das pessoas, pois nada mais é do que a “vontade” de cada um. Assim, o padre pede a Blimunda que olhe dentro das pessoas e encontre essa “vontade”, que é como uma nuvem fechada. E que, cada vez que percebesse a vontade de alguém escapando, que ela a capturasse usando um frasco contendo âmbar, que é a substância que atrai o éter.

Em Mafra, pela primeira vez Blimunda comunga conforme manda os ensinamentos da igreja católica, ou seja, em jejum. Ao fazê-lo, vê na hóstia uma nuvem fechada, o que muito a impressiona. Já tendo o padre ido para Coimbra há algum tempo, o casal decide partir de volta à quinta, assim que passassem as festividades de inauguração dos alicerces do convento, cujas primeiras pedras seriam colocadas pelas mãos do próprio rei.

Dias antes da inauguração dos alicerces, uma grande tempestade de vento, comparável ao “sopro de Adamastor” derruba a igreja de madeira construída especialmente para a cerimônia. Sabendo do acidente, o rei começa a distribuir moedas de ouro, e distribui ainda mais quando os pedreiros voltam ao trabalho e reconstroem a igreja em dois dias, de modo que o que era catástrofe passou a ser visto como milagre. No primeiro dia de festividades, a inauguração foi feita em cerimônias restritas a poucos convidados e, no dia seguinte, (ou seja, a 17 de novembro de 1717, seis anos depois de o rei ter feito sua promessa), realizou-se uma grande festa pública.

De volta à quinta do Duque de Aveiro, Baltasar desmonta a passarola que, abandonada, encontrava-se com a estrutura enferrujada e os panos cheios de mofo. Pouco tempo depois chega o padre, que logo quer saber quantas vontades Blimunda já recolhera. Ao ouvir que até então havia apenas trinta “vontades” na garrafa, o padre lhe diz que eram necessárias pelo menos duas mil. Baltasar continua trabalhando na “máquina de voar” enquanto padre Bartolomeu vai constantemente a Coimbra, a fim de concluir seus estudos. Quando volta definitivamente para Lisboa, o padre fica conhecendo o músico Domenico Scarlatti , napolitano de 35 anos, professor particular de música da infanta D. Maria Bárbara que, a essas alturas, já tem nove anos de idade. O encontro dos dois homens estimula uma discussão sobre o poder extraordinário da música e a essência da verdade, comparando-se finalmente a música do italiano com a oratória do padre.

Em outra ocasião, o padre e o compositor se encontram e juntos vão à S. Sebastião da Pedreira, onde o padre revela seu segredo ao músico e apresenta-lhe a “trindade terrestre”, composta por ele, o amigo e ajudante Baltasar e sua companheira Blimunda.

Depois da partida do italiano que, tendo prometido que voltaria trazendo seu cravo e o tocaria para o casal e para a passarola, o padre Bartolomeu Lourenço começa a trabalhar em um sermão que estava preparando para a festa do Corpo de Deus. Nesse sermão, que a princípio receberia a aprovação e até mesmo a admiração dos padres e censores do Santo Ofício, o padre questiona os fundamentos da doutrina cristã da trindade divina.

Sabendo de uma epidemia de febre amarela que, trazida do Brasil, se alastrava por Lisboa e já matara quatro mil pessoas em três meses, o padre Bartolomeu pede a Blimunda que aproveite a ocasião para recolher as vontades que se desprendem do peito dos moribundos. Blimunda faz o que o padre lhe pedira e, no final da epidemia, consegue recolher as duas mil vontades necessárias para fazer voar a “passarola”. O casal acaba se tornando conhecido em Lisboa, por sempre andar pela cidade sem medo da epidemia.

Depois de cumprida a tarefa, Blimunda fica doente e, durante toda sua convalescença, o músico Scarlatti vai tocar-lhe cravo, o que contribui para a restauração de sua saúde.

Estando as vontades recolhidas e a máquina de voar já pronta, nada falta para que o invento do padre seja testado. Além disso, o rei já não pode fazer nada para que o Duque de Aveiro lhes empreste a quinta onde trabalham. O padre, que andava receoso do Santo Ofício, vai ao palácio se certificar da proteção e amizade do rei, mas volta aflito, pois descobrira que o Santo Ofício já estava a sua procura. Assim, só lhe resta propor ao casal que os três terminem rapidamente o projeto e juntos fujam na “máquina de voar”. Assim, depois de retirarem o telhado da abegoaria e colocarem tudo o que possuem dentro da máquina, deixando para trás apenas o cravo de Domenico Scarlatti , a “passarola” enfim levanta vôo. Scarlatti , que chegara à quinta a tempo de ver a máquina subir aos ares, senta-se ao cravo e toca uma música, antes de lançar o instrumento ao fundo de um poço.

Depois de passarem despercebidos sobre a cidade de Lisboa, os três sobrevoam a vila de Mafra , onde várias pessoas vêem a máquina voadora, julgando ser uma aparição do Espírito Santo. Encontrando dificuldades para controlar a máquina, finalmente a fazem aterrissar, graças à iniciativa de Blimunda de segurar junto a seu peito as duas esferas contendo as “vontades”.

No dia seguinte, o casal impede o padre, que se encontrava aflito de emoção ou de medo, de atar fogo à máquina. Mas não podem impedir que ele parta sozinho mata adentro, para nunca mais voltar. Blimunda e Baltasar escondem a máquina sob a ramagem e partem na mesma direção tomada pelo padre, até chegarem, depois de alguns dias, a Mafra , onde uma procissão celebrava o milagre que o povo acreditava ter presenciado. Ali, Baltasar, a exemplo de tantos outros moradores locais, começa a trabalhar nas obras do convento, cuja dimensão e quantidade de homens que emprega muito o impressionam, apesar de achar o ritmo com que se desenvolve demasiado lento. Chegam notícias do terremoto de Lisboa, que foi seguido de inaudita tempestade _ . Apesar dos estragos causados por ambos os desastres, implementaram-se os negócios de vários setores da sociedade e, em particular, da igreja, que freqüentemente se aproveitava das catástrofes para alimentar a religiosidade popular.

Dois meses depois de terem chegado a Mafra , Baltasar decide voltar ao Monte Junto, onde haviam deixado a máquina de voar. Ele a encontra no mesmo lugar, mas necessitando de alguns reparos. A partir de então, ele faria visitas freqüentes ao local, cuidando da manutenção da máquina, sempre com uma certa esperança de reencontrar o padre. Algum tempo depois, Domenico Scarlatti chega a Mafra , onde fora visitar as obras do convento, ficando hospedado na casa de um visconde. Ao se cruzarem na rua, Blimunda e Scarlatti , tentando evitar as suspeitas dos moradores, que poderiam achar estranho duas pessoas de níveis sociais tão diferentes se conhecerem, conversam às escondidas. O músico trazia a notícia da morte do padre Bartolomeu de Gusmão em Toledo, Espanha, para onde ele havia fugido no dia 19 de novembro, o dia da tempestade em Lisboa. Em seguida, enquanto no palácio o rei medita sobre suas riquezas, celebra-se em Mafra uma missa para um grande número de trabalhadores.

A construção do convento exige esforços colossais e causa muitas vítimas. Um dos eventos mais penosos foi o transporte, da vila de Pêro Pinheiro até a vila de Mafra , de uma imensa pedra, destinada a ser a laje de uma varanda sobre o pórtico da igreja. Seiscentos homens e um grande número de bois foram utilizados na empreitada, que durou oito dias, durante os quais não faltaram acidentes fatais. Um dos casos mais dramáticos foi o do trabalhador Francisco Marques, que acabou esmagado sob uma roda de um carro de bois.

Depois de quase quatro anos em Mafra , Blimunda pela primeira vez pede a Baltasar para acompanhá-lo em uma de suas visitas periódicas ao Monte Junto. Depois de lá chegarem, resolvem passar a noite para que, ao amanhecer, Blimunda, ainda em jejum, se certificasse de que as vontades ainda estavam guardadas dentro de cada uma das duas esferas.

Enquanto isso, na residência real, D. João V manifesta seu desejo de construir uma Basílica em Portugal como a de S. Pedro em Roma. Para dar conta do projeto gigantesco, o rei chama o arquiteto alemão João Frederico Ludovice (ou Ludwig), que o dissuade da idéia, com o argumento de que o rei não viveria o suficiente para ver a obra concluída. Convencido, o rei decide então ampliar a dimensão do projeto do convento de Mafra, de modo que, ao invés de 80, coubessem nele 300 frades, o que muito agrada ao provincial dos franciscanos da Arrábida. O projeto é, sem dúvida, ambicioso demais para os recursos do reino, o que se reflete em conversa, imaginada pelo narrador, entre o rei e o almoxarife ou guarda-livros.

Finalmente, o rei decide que a sagração da basílica deveria ser realizada dois anos mais tarde, no dia vinte e dois de outubro de 1730, quando ele completasse 41 anos, estivesse ou não a obra concluída. Com a ampliação do projeto, tornara-se necessário que se recrutasse um grande número de trabalhadores, dentre os quais muitos seriam levados a fazer o trabalho contra a própria vontade, o que causaria grande tristeza a muitas famílias de toda a região. Simultaneamente, as famílias reais de Portugal e de Espanha logo se preparariam, em 1729, para se unirem através de dois casamentos.

De fato, a “troca das princesas” uniria, em 1729, as famílias reais de Portugal e Espanha, segundo um acordo que já havia sido concluído havia quatro anos. Mariana Vitória, da Espanha, de 11 anos, seria trazida a Portugal para que se casasse com o infante D. Pedro, enquanto Maria Bárbara, de 17 anos, seria levada a Espanha para unir-se a Fernando, dois anos mais novo que a noiva. Assim, uma comitiva leva a família real até a fronteira dos dois países, sobre o rio Caia, em Elvas, passando por Mafra . Na região de Mafra , os trabalhadores, que à força são levados às obras do convento, chamam a atenção da princesa e por um momento lhe despertam compaixão.

Além da coincidência entre o nascimento da princesa e a promessa do rei de construir o convento de Mafra , no nível popular, duas outras histórias convergem. João Elvas, que conhecera Baltasar em Lisboa logo depois da guerra, acompanha, junto a um grupo de pedintes, a comitiva à fronteira onde está situada sua cidade natal. Ao conversar com um certo Julião Mau-Tempo, que menciona a enorme pedra transportada até Mafra, João Elvas lembra-se do ex-soldado, seu amigo Baltasar, com quem o interlocutor havia trabalhado.

Em 1730, pouco mais de um ano depois da “troca das princesas”, a basílica do convento seria enfim consagrada, mesmo estando as obras, tanto as da basílica como as do convento, ainda longe de serem concluídas. Várias estátuas de santos desfilam pelas ruas e são transportadas até o local onde seriam instaladas. Blimunda e Baltasar resolvem ver as imagens dos santos Segundo acreditam, os santos passariam a noite conversando pela última vez, antes de serem isolados em seus nichos, na basílica.

Ao amanhecer, Baltasar decide ir sozinho ao Monte Junto, verificar o estado da “passarola”. Ao tentar fazer os já costumeiros reparos na máquina, Baltasar tropeça e rasga os panos que cobriam as esferas, de modo que quando os raios de sol as atingem, a máquina inesperadamente levanta vôo. Blimunda vai procurá-lo no dia seguinte, ao mesmo tempo em que romarias se dirigem à sagração da basílica, mas não encontra seu amado, apenas o espigão de ferro, que ela não hesita em usar quando um frade a tenta violá-la.

Blimunda continua a procurar Baltasar durante nove anos, perambulando por todas as partes do país. Sua jornada termina em Lisboa, em situação semelhante àquela em que conhecera Baltasar. Em 1739, em um auto-de-fé na praça do Rossio, onze vítimas encontram-se a caminho da fogueira – inclusive o dramaturgo Antônio José da Silva, “O Judeu”. Estava lá também Baltasar, cujo vulto Blimunda vê. Quando Baltasar está para morrer, sua “vontade” se desprende e é finalmente recolhida dentro do peito de sua amada Blimunda.

Fontes:
1100 Cursos e Apostilas. CEC0004 – Digerati Com. Tecnologia Ltda. (CD ROM)
Capa do Livro = http://www.submarino.com.br

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Victor Hugo (Os Miseráveis – O Corcunda de Notre Dame)

Os Miseráveis
Um fato histórico…

Durante 73 dias, a cidade sitiada, dominada pela Comuna mobilizada para a guerra, enfrentou o exército. Brigadas de operários e suas mulheres, as petroleuses, numa resistência desesperada, deslocavam-se pelas avenidas e ruas incendiando os prédios públicos. Num repente, os miseráveis que Victor Hugo imortalizara no seu gigantesco romance (Les misèrables, 3 volumes com 2.800 páginas, que, desde 1862, vendera sete milhões de exemplares!), rebelados, tentavam “tomar o céu de assalto”. Milhares de Jeans Valjeans, na companhia das Fantines e das pequenas Cosettes, assistidas pelo moleque Gavroche, um minúsculo herói das barricadas – personagens da grande epopéia literária do proletariado francês -, haviam ocupado as ruas de Paris preparando-se para o embate final. O poeta, ainda na Bélgica, impotente, deprimiu-se. Logo ele que tanto apostara nos Estados Unidos da Europa. Não só alemães lutaram contra franceses, como esses, agora, brigavam entre si.

Glória imorredoura

Por essas e outras é que 700 mil pessoas desfilaram em frente a sua residência na avenida Eylau (hoje Victor Hugo) ao ele completar 80 anos, em 26 de fevereiro de 1881. Nem Napoleão vira tanto povo assim do seu palanque. A sua casa tornou-se local de romaria de gente do mundo inteiro. Até um poema sobre o Brasil ele compôs para o imperador D. Pedro II. Nada em matéria de multidão equiparou-se ao seu enterro quando, no dia 31 de maio de 1885 (ele falecera no dia 22), partindo do Arco do Triunfo onde seu modesto ataúde estava exposto, um milhão de franceses se irmanaram pelos Campos Elísios para levar o féretro de Père Hugo até o Panteão. Nos seus 70 anos de atividade ele fizera de tudo: foi par da França, membro da Academia de Letras, deputado, exilado político, militante anti-bonapartista, integrante do senado e o escritor mais famoso e mais popular das letras francesas em todos os tempos. Além de célebre defensor da abolição da pena capital e emérito ativista das causas populares. Dizem que no delírio que antecedeu a morte, ele gritou “esta é a luta entre o dia e a noite”. Pode ter sido a chegada da noite para ele, mas para a França, que agora celebra o bicentenário do nascimento do seu maior poeta, ocorrido em Besançon em 26 de fevereiro de 1802, Victor Hugo vai ser sempre a luz do dia.

O clássico Os miseráveis, do escritor francês Victor Hugo, foi chamado de “um dos maiores best-sellers de todos os tempos”. Em 1862, nas 24 horas seguintes à publicação da primeira edição de Paris, as 7 mil cópias foram todas vendidas. O livro foi publicado simultaneamente em Bruxelas, Budapeste, Leipzig (na Alemanha), Madri, Rio de Janeiro, Rotterdam e Varsóvia. Depois, a obra foi traduzida para quase todas as línguas do mundo. No século XX, Os miseráveis se tornou filme e musical da Broadway.

Trecho da obra de Victor Hugo:
(…)
Jean Valjean achava-se pois no esgoto de Paris.
Outra semelhança de Paris com o mar. Como no oceano, o mergulhador pode nele desaparecer.
A transição era inaudita. Jean Valjean saíra da cidade mesmo no meio dela e, num abrir e fechar de olhos, no tempo de levantar e abaixar uma tampa, passara da luz do dia para a completa escuridão, do meio-dia para a meia-noite, do tumulto para o silêncio, do turbilhão dos trovões para a estagnação do túmulo; e, por uma peripécia muito mais prodigiosa ainda do que a da rua de Polonceau, do extremo perigo para a segurança absoluta.
Permaneceu alguns segundos como atordoado, estupefato. A bondade celeste tinha-o, de certo modo, surpreendido por traição. Adoráveis emboscadas da Providência!
Mas o ferido não fazia o mínimo movimento, e Jean Valjean não sabia se o que então levava às costas era Mário ou um cadáver.
A sua primeira sensação foi a cegueira. Repentinamente, deixou de ver. Pareceu-lhe que num minuto ensurdecera. Não ouvir já coisa alguma. A frenética e homicida tempestade que se desencadeava alguns metros acima dele não lhe chegava, como já dissemos, ao ouvido, senão muito confusamente, e como um rumor saído de uma profundidade graças à espessura de terra que o separava dela. Adiantou com precaução um pé, temendo que se lhe deparasse um buraco, desaguadouro ou um abismo; e convenceu-se de que o lajedo se prolongava.
Contudo, podia-se penetrar naquela muralha de nevoeiro, e forçoso era fazê-lo. Jean Valjean lembrou-se de que a grade, descoberta por ele debaixo das pedras, podia-o ser também pelos soldados e que tudo dependia de um tal acaso. Podiam também descer ao cano e revistá-lo. Não havia um minuto a perder. Depusera Mário no chão, tornou a pô-lo às costas e meteu-se ao caminho. Entrou resolutamente naquela escuridão.
(…)

G G G G G G G G G G G G G
O Corcunda de Notre-Dame
(Notre-Dame de Paris)

Victor Hugo tinha a reputação principalmente como poeta, mas a fama bem maior lhe veio com a publicação do romance Notre-Dame de Paris, também intitulado O Corcunda de Notre-Dame em diversas traduções. O Misterioso tema do livro tocava profundamente os leitores, em particular dura crítica de uma sociedade que, nas pessoas de Frollo, o arcebispo, e de Phoebus, o soldado, condenava à infelicidade o corcunda Quasímodo e a cigana Esmeralda. Enquanto este romance estava sendo escrito, Luís Felipe , um rei constitucional , havia sido elevado ao poder pelos estudantes e pela burguesia liberal, nos três dias da chamada Revolução de Julho (1830). Hugo compôs um poema em honra ao acontecimento, que seria precursor de muita poesia política. O autor não se contentava, com os seus versos, em exprimir emoções pessoais : pretendia ser o “eco sonoro” do seu tempo, e assim, desempenhar a verdadeira função do poeta, tal como a entendia. Problemas filosóficos e políticos se misturavam à inquietação religiosa e social do período. Um poema tratava da miséria dos trabalhadores, outro proclamava a eficiência das orações .

Algumas versões da obra de Victor Hugo já são bem conhecidas, filmes ou desenhos com adaptações diferenciadas já foram produzidos, para alguns casos, como a Disney por exemplo, o enfoque principal cai sobre a personagem Quasímodo. Na França, um grande musical vem sendo encenado sob o título de Notre Dame de Paris, que é também o título original da obra, que, quando da tradução para português, recebeu o nome de “O CORCUNDA DE NOTRE DAME”, daí talvez algumas leituras caiam sobre esta personagem

Notre-Dame é um livro com o porte de um monumento. Como a igreja que o inspira, é uma obra de transição, exibindo a majestade de um clássico e a decadência do folhetim. Suas personagens expressam a diversidade e se identificam com cada um dos elementos da sua estrutura múltipla e complexa: o padre santo e sábio transformado em vilão ao longo da narrativa e que abriga e alimenta, sem saber, a figura que sintetiza sua própria decadência; o poeta dividido entre a cultura vazia do poder e a presença viva do povo nas ruas; a dançarina que encarna a beleza e a graça do movimento em confronto com uma espiritualidade rígida fundada no medo. Assim, a trama que enreda o leitor revela a solidez acumulada pela História em queda livre para o abismo.

Em oposição a esta imagem do escritor no século 19 – que Victor Hugo denuncia ambientado no século 15 – um livro feito de pedra como Notre-Dame de Paris instaura uma postura intelectual sólida. A obra literária opõe-se à decadência, resgatando a grandeza perdida da arte. Em Gringoire, as palavras são como a caiação deformando antigos monumentos. Em Victor Hugo, elas funcionam como uma orquestra e assumem a força de uma tempestade.

(crítica de Nei Duclós em artigo “Um livro feito de pedra”)
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Sobre Nei Duclós
Nei Carvalho Duclós (Uruguaiana, 29 de outubro de 1948) é jornalista, poeta e escritor brasileiro. Tem quatro livros lançados e inúmeros textos publicados na imprensa brasileira.
Aos 17 anos se mudou para Porto Alegre e se matriculou no curso de engenharia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o qual abandonaria logo depois em favor da faculdade de Jornalismo. Envolveu-se no movimento estudantil brasileiro após o golpe militar de 1964. Trabalhou no jornal gaúcho Folha da Manhã e publicou seu primeiro livro, Outubro, em 1975. Mudou-se para São Paulo, onde desenvolveu longa carreira como jornalista, tendo trabalhado no jornal Folha de S. Paulo, revistas Brasil 21, Senhor, e IstoÉ. Publicou textos também em O Estado de S. Paulo, Veja e Jornal do Brasil. Publicou Outubro e No Meio da Rua, ambos pela editora LP&M, em 1980, e No Mar, Veremos, pela editora Globo, em 2001, todos de poesia. Em 2004 publicou seu primeiro romance, Universo Baldio, pela W11 Editores. É bacharel em História pela Universidade de São Paulo. Trabalha na revista Empreendedor e publica coluna no Diário Catarinense.
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Nora Roberts (Estante de Livros)

Luzes do Norte

Um romance sobre duas almas solitárias que encontram amor e redenção numa remota vila do Alasca.

A vila de Lunacy é a última chance para Nate Burke. Como polícia em Baltimore, assistiu à morte do colega na rua, e a culpa ainda o persegue. Sem mais nenhum lugar para onde ir, aceita a função de Chefe da Polícia nessa pequena e remota vila do Alasca. Quando começa a perguntar-se se a mudança não terá sido um grande erro, um beijo imprevisto e arrebatador na passagem do ano, levanta o seu espírito e convence-o a ficar mais tempo.

Meg Galloway, nascida e criada em Lunacy, está habituada à solidão. Era apenas uma jovem quando o seu pai desapareceu e teve de aprender a ser independente, pilotando a sua pequena avioneta e vivendo nos arredores da vila na companhia dos seus huskies.

Depois do beijo ao novo Chefe da Polícia, permite-se ceder à paixão. E, agora, as coisas em Lunacy começam a aquecer. Há alguns anos, numa das majestosas montanhas que sombreiam a vila, ocorreu um crime que nunca foi resolvido e Nate suspeita que o assassino continua em Lunacy. A sua investigação vai desenterrar segredos e suspeitas, bem como trazer ao de cima o instinto de sobrevivência que fez dele um dos melhores polícias em Baltimore. O que ele não podia saber é que a sua descoberta vai ameaçar a nova vida e o novo amor…

A Dama Negra

O ar estava frio quando a Dra. Miranda Jones chegou a casa depois de uma longa semana de trabalho. Mas o seu sangue gelou quando sentiu encostarem-lhe uma faca ao pescoço. Depois de roubaram tudo o que trazia, os assaltantes desapareceram.

Profundamente abalada, Miranda decide esquecer aquela experiência assustadora. E, para isso, nada como aceitar o convite para ir a Itália confirmar a autenticidade de A Dama Negra, um bronze renascentista representando uma cortesã dos Medici.

Mas, em vez de cimentar a sua posição como a maior perita mundial nesse campo, a viagem a Itália destrói-lhe a reputação. Sentindo-se alvo de uma cilada, Miranda está decidida a limpar o seu nome. Mas ninguém parece disposta a ajudá-la… com a exceção de Ryan Boldari, um sedutor ladrão de arte, cujos objetivos são obscuros.

Agora torna-se evidente que o assalto à porta de sua casa foi muito mais do que isso… e que a Dama Negra possui tantos segredos quanto a cortesã que a inspirou. Com a ajuda de um homem em quem não deve confiar, mas por quem sente uma atração intoxicante, o futuro de Miranda parece repleto de traições, mentiras e perigos mortais

Tesouros Escondidos

Dora Conroy tem uma pequena loja de antiguidades e, num leilão de arte, compra um quadro que é muito mais do que parece. Depois há o novo inquilino do apartamento por cima da sua loja, Jed Skimmerhorn, um ex-polícia que tem tanto de rude quanto de charmoso. Mas é ele quem a salva quando a loja é assaltada e Dora descobre que os outros compradores do mesmo leilão estão a ser assassinados. Juntando forças com Dora para descobrir quem está por detrás dos roubos e das mortes, Jed é atraído para a vida agitada de Dora e para o dia-a-dia da sua família excêntrica mas imensamente calorosa.

A Villa

Sophia Giambelli jamais temeu a concorrência. Durante as três gerações, os vinhos Giambelli têm sido reconhecido pela sua espetacular qualidade. Orgulho da família e alta executiva de relações públicas, Sophia é apaixonada por seu trabalho, no qual se destaca imensamente.

Entretanto, importantes mudanças estão a caminho da Villa, Giambelli. Teresa, a matriarca, anunciou a fusão com a vinícola MacMillan,e Sophia passará a ter uma nova função. Como empresária eficiente devia estar preparada para tudo… Menos para Tyler MacMillan. Eles receberam ordens para trabalhar diretamente juntos, a fim de facilitar a fusão. Sophia precisa ensinar a Ty as particularidades do marketing, e ele, por sua vez, precisa mostrar a ela como se agachar e sujar as mãos de terra, e fazer um bom uso do sol, da chuva e do solo para obter as mais doces frutas do vinhedo.

Ao trabalharem juntos, nos campos e nos escritórios da empresa, Sophia se vê dividida entre uma poderosa atração e a rivalidade profissional. No fim da estação, o rumo da família – e o legado da Villa – talvez tome uma direção inteiramente nova. E quando atos de sabotagem ameaçam não só a empresa, mas principalmente a própria estrutura familiar, a luta de Sophia não será apenas pelo comando dos negócios, mas também pela própria sobrevivência.
Santuário

Fotógrafa de sucesso, Jo Ellen Hathaway pensava que tinha escapado de Sanctuary há muito tempo. Fora lá que passara seus anos mais solitários, depois que a família ficara abalada pelo súbito e inexplicável desaparecimento de sua mãe. Mesmo assim, a ilha na costa da Geórgia continua a atormentá-la em seus sonhos. Ainda mais angustiantes são as fotografias que alguém vem enviando para ela, estranhos closes, instantâneos agressivos… e a mais chocante de todas, uma foto de sua mãe, há muito tempo perdida, bela, nua e morta.
Jo compreende que é tempo de voltar a Sanctuary. A pousada na ilha, de sua família amargurada e desunida, traz de volta recordações dolorosas, enquanto ela se envolve mais uma vez em relacionamentos que tanto se esforçou para esquecer. Com a ajuda de um homem, ela precisa descobrir a verdade sobre o que a espreita… e sobre o trágico passado que ainda atormenta sua família. mas a ameaça que levou Jo a Sanctuary seguiu-a até lá. E as pessoas da ilha descobrirão que seu santuário pode ser o mais perigosos de todos os lugares.
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Trilogia das Chaves

A Chave da Luz

Deve procurar a beleza, a verdade e a coragem. Uma sozinha não se aguentará. Duas sem a terceira ficarão incompletas. Procure no interior e descubra que ainda há mais a saber. Procure o que o escuro encobre mais frequentemente. Procure no exterior, onde a luz vence as sombras, como o amor vence a mágoa. Vertem-se lágrimas prateadas pela canção que ela aí cria, pois a canção vem das almas. Olhe adiante e no meio, veja onde a beleza floresce e a deusa canta. Poderá haver medo, poderá haver dor, mas o coração verdadeiro a ambos vence. Quando encontrar o que procura, o amor quebrará o feitiço, e o coração irá forjar a chave, trazendo-a à luz.» Três mulheres. Três chaves. Cada uma das três mulheres tem vinte e oito dias para encontrar o seu caminho através de uma perigosa busca que poderá completar-lhe o destino… ou destruir para sempre a sua vida.

A Chave do Saber

Pitte tirou da arca a caixa de vidro, dentro da qual dançavam as luzes azuis. Pousou a Caixa das Almas em cima de uma mesa, com grande cuidado, depois posicionou-se de um dos lados, imponente como um guerreiro, enquanto Rowena parava do outro. Ao ver aquelas luzes, Dana sentiu o coração apertado. Restavam duas fechaduras. Enfiou a chave na primeira e sentiu o ouro aquecer contra a sua pele, viu a luz percorrer o metal e os seus dedos, enquanto a rodava.» Três mulheres. Três chaves. Cada uma das três mulheres tem vinte e oito dias para encontrar o seu caminho através de uma perigosa busca que poderá completar-lhe o destino… ou destruir para sempre a sua vida.

A Chave da Coragem

A beleza e a verdade não são nada sem a coragem para as manter. Mas um par de mãos pode apertar com demasiada força, e o que é precioso corre por entre os dedos. Perda e sofrimento, mágoa e vontade, marcam o árduo caminho pela floresta. Ao longo da viagem há sangue, a morte da inocência e dos fantasmas do que podia ter sido. Sempre que o caminho se bifurca, é a fé que escolhe o caminho ou a dúvida que o bloqueia. Será desespero, ou alegria? Poderá haver realização sem o risco de perder? Tratar-se-á de um final, ou de um princípio? O caminho seguirá até à luz, ou regressará às trevas?» Três mulheres. Três chaves. Cada uma das três mulheres tem vinte e oito dias para encontrar o seu caminho através de uma perigosa busca que poderá completar-lhe o destino… ou destruir para sempre a sua vida.

Fontes:
http://www.saidadeemergencia.com/
http://www.livrosparatodos.net/

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José Rodrigues dos Santos (Estante de Livros)

A Vida num Sopro

Através da história de uma paixão que desafia os valores tradicionais do Portugal conservador, este fascinante romance transporta-nos ao fogo dos anos em que se forjou o Estado Novo.
Portugal, anos 30.

Salazar acabou de ascender ao poder e, com mão de ferro, vai impondo a ordem no país.
Portugal muda de vida. As contas públicas são equilibradas, Beatriz Costa anima o Parque Mayer, a PVDE abafa a oposição.

Luís é um estudante idealista que se cruza no liceu de Bragança com os olhos cor de mel de Amélia. O amor entre os dois vai, porém, ser duramente posto à prova por três acontecimentos que os ultrapassam: a oposição da mãe da rapariga, um assassinato inesperado e a guerra civil de Espanha.
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A Filha do Capitão

Decorrendo durante a odisseia trágica da participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial, A Filha do Capitão conta-nos a aventura de um punhado de soldados nas trincheiras da Flandres e traz-nos uma paixão impossível entre um oficial português, o capitão Afonso Brandão e uma bonita francesa Agnés Chevallier. Mais do que uma simples história de amor, esta é uma comovente narrativa sobre a amizade, mas também sobre a vida e sobre a morte, sobre Deus e a condição humana, a arte e a ciência, o acaso e o destino.

Até ao final de 2007, esta obra de José Rodrigues dos Santos já havia alcançado uma tiragem de 85.000 exemplares o que constitui um grande sucesso editorial no mercado português. No entanto, as obras seguintes, tais como O Codex 632, A Fórmula de Deus e O Sétimo Selo, ultrapassaram em muito aquele número.
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O Sétimo Selo

Um cientista é assassinado na Antártida e a Interpol contata Tomás Noronha para decifrar um enigma com mais de mil anos, um segredo bíblico que o criminoso rabiscou numa folha e deixou ao lado do cadáver: 666.

O mistério em torno do número da Besta lança Tomás numa aventura de tirar o fôlego, uma busca que o levará a confrontar-se com o momento mais temido por toda a humanidade.

O apocalipse.
De Portugal à Sibéria, da Antártida à Austrália, O Sétimo Selo transporta-nos numa empolgante viagem às maiores ameaças que se erguem à sobrevivência da humanidade.
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A Ilha das Trevas

Paulino da Conceição é um timorense com um terrível segredo. Assistiu, juntamente com a família, à saída dos portugueses de Timor-Leste e a todos os acontecimentos que se seguiram, tornando-se um mero peão nas circunstâncias que mediaram a invasão Indonésia de 1975 e o referendo de 1999 que deu a independência ao país.

Só há uma pessoa a quem Paulino pode confessar o seu segredo – mas terá coragem para o fazer?

A vida e tragédia de uma família timorense serve de ponto de partida para aquele que é o romance de estréia de José Rodrigues dos Santos,.

Um romance pungente onde a ficção se mistura com o real para expor, num ritmo dramático, poderoso e intenso, a trágica verdade que só a criação literária, quando aliada à narrativa histórica, consegue revelar.
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A Formula de Deus

Contratado para decifrar um manuscrito de Einstein só agora descoberto, Tomás Noronha, professor universitário, envolve-se num jogo duplo entre o Ministério da Ciência Iraniano e a CIA, procurando desvendar a prova científica da existência de Deus, descoberta por Einstein, embora o Irão e os EUA julguem que o documento do cientista expõe a fórmula para fabricar facilmente uma bomba nuclear.

Com a ajuda de Ariana Pakravan, por quem se apaixona, ele tenta sair ileso de mais uma aventura. Enquanto o seu pai tem os dias contados devido a um cancro do pulmão, Tomás tem de escapar às perseguições dos iranianos, após os ter traído para ajudar a CIA. É Ariana quem o ajuda, acabando por se deixar levar pelos seus sentimentos relativamente ao português.

Após uma viagem que vai desde o Irão ao Tibete, e ainda em Portugal, eles conseguem provar, precisamente no dia do funeral do pai de Tomás, que o documento de Einstein não contém a fórmula para o fabrico para uma bomba nuclear, mas sim uma tese científica relativa à existência de Deus.

Personagens
Tomás Noronha: protagonista da trilogia, Tomás é professor de História na Universidade Nova de Lisboa e criptanalista, divorciado desde há cerca de cinco anos. É contratado por Ariana Pakravan em nome do Ministério da Ciência iraniano para decifrar o Die Gottesformel, o documento de Einstein que tematiza a existência de Deus. Mais tarde, é forçado a espiar os iranianos para a CIA, uma vez que quer esta quer o Irão, pensam que o Die Gottesformel dá a fórmula para a criação de uma bomba nuclear fácil, barata e destrutiva como nunca antes visto. Acaba por se apaixonar por Ariana.
Ariana Pakravan: física nuclear a trabalhar para o Ministério da Ciência do Iran. Ajuda Tomás a decifrar o manuscrito de Einstein e chega a trair o seu país para salvar o português. Apesar de apaixonada por ele, Ariana resiste às investidas de Tomás devido às severas leis iranianas e à diferença cultural entre ela e ele.
Frank Bellamy: dirige o Diretório de Operações da CIA. Pensando que os iranianos estão a tentar fabricar uma nova arma nuclear, obriga Tomás a fazer um jogo duplo, ajudando os iranianos, mas revelando todas as informações à agência americana.
Manuel Noronha: pai de Tomás, fica com um cancro pulmonar devido ao tabagismo. Apesar de morrer por causa da doença no final, Manuel, professor de Matemática na Universidade de Coimbra, revela-se uma ajuda importante na investigação de Tomás, com quem nunca teve uma relação tão próxima como deveria ser entre pai e filho.
Luís Rocha: assistente do professor Augusto Siza, que colaborou com Einstein na criação de Die Gottesformel e foi raptado pelos iranianos, ajuda Tomás na interpretação dos resultados na investigação acerca do manuscrito.

Temática
Este romance trata principalmente as provas para a existência de Deus. Expõe também argumentos contra o modo como a Bíblia caracteriza Deus, embora mostre cálculos que mostram a existência de certas verdades científicas no Gênesis.
Trata ainda temas como a diferença entre culturas (Irã, Tibete, Portugal), o plano nuclear iraniano, o modo como a CIA opera, as semelhanças entre a ciência ocidental e o pensamento oriental e o cancro pulmonar.

Tese principal: a existência de Deus
A tese exposta no livro é baseada em teorias verdadeiras, algumas até conhecidas, como a Teoria da Relatividade, de Einstein, o Princípio Antrópico, ou o Teorema da Incompletude. Há um grande foco sobre o Big Bang, devido à comparação entre este e a famosa frase do Gênesis: “faça-se luz!”.

Neste livro, defende-se a existência de um Deus não antropomórfico, como afirma a Igreja, mas sim como uma inteligência superior e com uma determinada intenção na criação do Universo e no surgimento da Humanidade.
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O Códex 632

Baseado em documentos históricos genuínos e fundamentalmente no trabalho do historiador Augusto Mascarenhas Barreto (The Portuguese Columbus: Secret Agent of King John II, 1992, McMillan Edition), (“Cristovão Colombo – Agente Secreto de EL Rei D.João II”, em 1988, Editora Referendo), ao longo das suas 552 páginas, “O Codex 632” conta a história de uma investigação em torno da possibilidade de Cristóvão Colombo ser português, apoiando-se em lacunas do percurso do navegador cuja identidade e missão continuam a suscitar dúvidas.

Em 2005, José Rodrigues dos Santos estabeleceu um acordo com uma das principais editoras a operar nos Estados Unidos da América, a Harper Collins, com o objectivo de lançar “O Codex 632” naquele país. O livro foi apresentado na Book Fair America de 2007 como um dos principais lançamentos daquela editora, estando agendada a sua publicação para o dia 1 de Abril de 2008 sob a chancela da William Murrow, um dos principais selos do grupo. O livro estará à venda na Barnes & Noble e na Borders, as duas principais livrarias dos EUA. Entretanto, outro acordo foi obtido pelo autor e e pela Gradiva com o Gotham Group, uma empresa de Los Angeles ligada às principais produtoras de Hollywood, tal como a Paramount, Twentieth Century Fox ou a Universal Studios, com o objectivo de adaptar “O Codex 632” ao cinema. A acontecer, José Rodrigues dos Santos será o segundo autor português, a seguir a José Saramago com “Ensaio sobre a Cegueira”, a ver uma obra ser transposta para o cinema pelos estúdios de Hollywood.

Até ao final de 2008, “O Codex 632” já havia alcançado a sua 32ª edição, com uma tiragem total de 175.000 exemplares. Encontra-se editado em Portugal, no Brasil, Espanha, Itália e Reino Unido.

Fontes:
http://www.portaldeliteratura.com.br
http://pt.wikipedia.org

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Pearl S. Buck (A Boa Terra)

Segundo romance da escritora norte-americana Pearl S. Buck, ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura, este livro é um clássico que retrata a vida na China numa época em que grandes mudanças políticas e sociais transformaram um país agrário em uma potência mundial. Tendo como fio condutor a trajetória de um camponês e sua família, A Boa Terra traça todo o ciclo da vida , os horrores, as paixões, as ambições desmedidas e as recompensas. Best-seller nos Estados Unidos, onde vendeu quase 2 milhões de exemplares apenas em 1931, ano de seu lançamento, o livro foi traduzido para mais de trinta línguas e adaptado para o teatro e para o cinema.

A história começa no dia do casamento do jovem camponês Wang Lung com O-lan, uma escrava da abastada família Hwang. Juntos, eles trabalham duro no campo, até o nascimento de seu primeiro filho. No Ano Novo, a mãe orgulhosa leva o bebê para seus antigos senhores conhecerem. É quando descobre que os Hwang estão em dificuldades financeiras e querem vender suas terras. Com as economias de um ano de boa colheita, o jovem casal compra parte da propriedade. A vida prospera, nascem mais dois filhos, mas as dificuldades logo chegam.

Um tio inescrupuloso, investimentos equivocados e uma seca inclemente trazem a primeira crise financeira e forçam a família a vender os móveis para ter o que comer. A miséria leva O-lan a estrangular a terceira filha, assim que a criança nasce, para evitar que morra de fome. Wang Lung recusa-se a abrir mão de suas terras, mas se vê obrigado a migrar com a mulher e os filhos para a cidade, onde sobrevivem mendigando. Quando grupos de revolucionários saqueiam a casa de uma família rica, o casal aproveita a oportunidade. Com o dinheiro e as jóias do saque, eles voltam para o campo, onde uma sucessão de boas colheitas lhes proporciona nova fortuna. A riqueza, no entanto, não garantirá felicidade a Wang Lung e O-lan.

Fonte:
http://www.quebarato.com.br/classificados/a-boa-terra-pearl-s-buck__190402.html
Capa do livro = http://livrarianaftalina.blogspot.com

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1ª Coletânea de Poesias Teia dos Amigos

Lista dos Participantes da Coletânea Teia dos Amigos

Antonio Carlos Menezes
Badú
Dorival C. Fernandes
Efigênia Coutinho
Elaine Freitas
Fátima Mello
Iára Pacini
Ieda Cavalheiro
Mara Inez N. de Moraes
Maria Antonia Canavezi Scarpa
Marilda de Almeida
Regina Lu
Sandra M. Julio
Socorro Lima Dantas
Sonia Pallone
Sonia Orsiolli
Vany Campos

Capa executada por Sonia Orsiolli
Editora Ottoni
166 páginas

Prefácio:
Sob luzes de estrelas, essa teia de poetas que ousa estender-se, como uma teia, que se une a nós.

São as folhas ao vento, distendidas ao caule, onde a doce seiva depreende-se no olor poético, vazando a produção, nesta obra, de valor.

Desde 2002… Julho. E o site em 2003, aos poucos, iniciando, como nascente, depois, um fio de água, até formar esse forte tributário, o que vem gerar luz, acordar, os que precisam ver acreditar, navegar, ser o próprio timoneiro.

São mãos agregadas, as que tecem na teia, e formaram uma rede, sedimentadas, às vezes nas lágrimas, outras tantas a emoção, e bem outras, no amor; o que queima se sentir.

Cada qual de nós sabe que são os tempos de paixão, sobretudo de amizade.

E do que falar, dessa plêiade, que são os pontos cristalinos, os irmãos que enfeitam o céu, e se derramam, emprestam o ouro da poesia em seus tesouros.

Ao centro a Sonia Maria Grando Orsiolli, uma semente, entre as tantas desses girassóis, que pelo coletivo, dá o colorido vivo.

Assim estendo o tapete no átrio, abraços estendendo a gratidão, e nosso obrigado.

Fica a nossa homenagem, antes fácil, a teia, com um nó de amor, onde enfeixo o laço, nessa ultima “Flor do Lácio”, onde cada qual se apura da ganga impura. Homenagem aos poetas de valor.

A todos e a cada um, a nossa gratidão e de muitos como nós, ao que mais nos deliciamos, coletando essas pétalas e sementes, espargidas, dessa equipe.

JOÃO FERREIRA FILHO (Advogado e Poeta)
Ribeirão Preto/SP

Para adquirir a Coletânea solicitar pelo email: teiadosamigos@uol.com.br

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Rita Chaves (Angola e Moçambique: Experiência Colonial e Territórios Literários)

São Paulo: Ateliê Editorial, 295 págs.

Para quem quer conhecer as literaturas africanas de expressão portuguesa Angola e Moçambique: experiência colonial e territórios literários, de Rita Chaves, é um caminho seguro.

Reunindo textos que abrangem um esforço iniciado ao final da década de 1980, quando o interesse no Brasil pelas culturas africanas ganhou maior intensidade, e chegam até o começo do novo século, o volume é, porém, o resultado de um trabalho de três décadas de paixão pela literatura africana de Língua Portuguesa, pois foi em 1978, sob a orientação de Vilma Arêas, na Universidade Federal Fluminense, que a autora descobriu o seu caminho para o continente africano. Desde então, não se limitou apenas àquelas viagens interiores que se costuma fazer através dos livros, mas percorreu in loco a África do Atlântico ao Índico, tendo sido professora visitante na Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo, entre os anos de 1998 e 2000.

Dividido em três seções, o livro de Rita Chaves, na primeira parte, “Signos de identidade na literatura angolana”, discute a nova literatura nascida especialmente a partir da independência do país em 1975, analisando especificamente autores como José Luandino Vieira, Agostinho Neto, Pepetela, José Eduardo Agualusa, Ana Paula Tavares e Ruy Duarte de Carvalho. Num dos oito ensaios que compõem essa parte, “O passado presente na literatura angolana”, a autora, baseada nas idéias de Frantz Fanon (Paris, Pour la révolution africaine, François Maspéro, 1964), a partir da experiência francesa na Argélia, tenta compreender o colonialismo português em Angola, observando que também ocorreram tentativas de apagamento da história anterior à chegada dos europeus. O que justificaria a idéia de libertação que marca o início do processo literário angolano, repetindo, guardadas as distâncias e proporções, o que ocorreu no Brasil no século XIX, quando os românticos procuraram fazer do índio um dos símbolos da identidade brasileira.
Após a independência”, diz a autora, “a essa noção de passado instaurado no período pré-colonial, junta-se outra.

A euforia da vitória converte em passado o próprio tempo colonial. É o momento então de centrar-se nesse período como forma de engrandecer o presente. A celebração eleva as antinomias: aos heróis do passado remoto se vão aliar os heróis que participaram na construção desse presente em contraposição àqueles que o discurso colonialista apresentava como vencedores do mal”.

Em sua análise, Rita Chaves constata uma segunda fase na literatura angolana, a idade adulta, em que, passada a euforia dos primeiros anos da independência e depois do fracasso da experiência socialista e de guerras civis devastadoras, o que há é a injustiça do presente, já que, como diria Antônio Lobo Antunes, o destino de todas as revoluções seria, afinal, sempre o de substituir uma aristocracia por outra.

A continuidade da guerra, as imensas dificuldades no cenário social, o esvaziamento das propostas políticas associadas ao estatuto da independência, a incapacidade de articular numa concepção dinâmica a tradição e a modernidade compuseram um panorama avesso ao otimismo”, diz a autora, observando que, em função dessa realidade imutável, em que o colonizador já não pode ser responsabilizado como antes, regressa-se ao passado outra vez “para se tentar compreender o presente desalentador”. É nesta situação em que viveria o escritor angolano de hoje, buscando no passado – às vezes, num passado remoto e até mitológico – uma maneira de vislumbrar hipóteses para um mundo que, por razões diversas e em variados níveis, lhe surge como um universo à revelia”.

Já na segunda parte do livro, “A poesia em português na rota do Oriente”, formada por quatro ensaios e uma entrevista com José Craveirinha, Rita Chaves não busca compreender a literatura moçambicana de hoje como resultado do colonialismo português como fez em relação à literatura angolana, embora haja paralelismos bem evidentes nos dois processos. Concentra-se, isso sim, na análise da obra de poetas como José Craveirinha, Eduardo White, Rui Knopfli e Luís Carlos Patraquim.

Em “Eduardo White: o sal da rebeldia sob os ventos do Oriente na poesia moçambicana”, ensaio publicado também em África e Brasil: letras em laços (São Caetano do Sul-SP, Yendis Editora, 2006) de Maria do Carmo Sepúlveda e Maria Teresa Salgado (organizadoras), procura compreender a obra de um dos nomes mais expressivos da poesia moçambicana de hoje, a partir de suas ligações com a Ilha de Moçambique, a presença mais marcante hoje no imaginário poético de Moçambique. “Ali, o autor vai buscar as sedas, o m´siro, as miçangas, as oferendas de Java, o séqüito ajawa, o curandeiro macua, o monge birmanês, com que compõe o desenho do universo em que projeta a sua identidade”, diz a autora.

Na terceira parte, “Literaturas em Língua Portuguesa: a utopia em trânsito sob os vento do Império”, que reúne mais quatro ensaios, chama a atenção o texto “O Brasil na cena literária dos países africanos de Língua Portuguesa” em que a autora procura estabelecer a utopia que a terra brasileira sempre representou no imaginário africano, concluindo que, felizmente, os escritores africanos souberam catalisar numa chave progressista as imagens (brasileiras) que convidavam à mudança. E conclui que esses escritores souberam compreender como a realidade brasileira – povoada pelas injustiças e pelos preconceitos que conhecemos – poderia auxiliá-los na mobilização em favor de “um projeto conduzido pelo sentido da liberdade e outras utopias”.

Além de ensaios bem elaborados, o livro de Rita Chaves traz uma entrevista que ela fez com o poeta moçambicano José Craveirinha (1922-2003), em fevereiro de 1998, em sua casa em Maputo. Nela, Craveirinha, filho de pai português e mãe africana, entre outros tantos temas, diz da influência que ele e outros autores moçambicanos receberam na década de 40 e 50 de escritores brasileiros, como Jorge Amado e Rachel de Queiroz, e, especialmente, daqueles jornalistas e cronistas que escreviam na célebre revista O Cruzeiro, como David Nasser, embora sua formação inicial tenha sido mesmo por meio de Eça de Queirós, Antero de Quental, Guerra Junqueiro, Camões e Soeiro Gomes e ainda dos franceses Victor Hugo e Zola.

Curiosa é também esta frase: “(…) hoje andam aí pelas ruas grande parte daqueles que de fato lutaram, mas os que estão nas cadeiras são precisamente aqueles que não lutaram. E que engordam desavergonhadamente. E a gente olha e fica triste, mas paciência”, dizia para, em seguida, reconhecer que ficava admirado quando ia a Portugal e recebia alguma homenagem: “(…) Há qualquer coisa que não bate bem: ou eu, ou eles! Uma das mais importantes comendas de Portugal foi concedida a mim. Depois de tudo, toda a comenda que eu deveria receber de Portugal era uns pontapés no rabo, mas não uma comenda. Ora, isso faz com que fiquemos um pouco duvidosos de nós próprios e ao mesmo tempo isso retira um determinado ônus de cima da cabeça dos portugueses”, dizia, com bom humor. Até porque teve oportunidade de constatar que o Portugal que o homenageou na década de 1990 não era o Portugal das décadas de 60 e começo de 70 que ele combateu em Moçambique, quando, então, passou um bom tempo na cadeia.

Professora de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa da Universidade de São Paulo, Rita Chaves, hoje, dirige o Centro de Estudos Portugueses da instituição e é pesquisadora associada do Centro de Estudos Afro-Asiáticos da Universidade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro. Entre outros títulos, publicou A formação do romance angolano em é co-organizadora de Portanto… Pepetela, Literaturas em movimento – hidridismo cultural e expressão e Exercício crítico e Brasil/África: como se o mar fosse mentira.
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Outro artigo da Rita Chaves (Caminhos da Ficção da África Portuguesa)
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/02/caminhos-da-fico-da-frica-portuguesa.html

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Fonte:
Adelto Gonçalves (Viagem ao universo africano).
http://literaturasemfronteiras.blogspot.com/2009/01/viagem-ao-universo-africano-adelto.html

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Christopher Paolini (Ciclo da Herança)

O bestseller Eragon, primeiro volume da Trilogia da Herança, do norte-americano Christopher Paolini, com mais de quatro milhões de exemplares vendidos em 38 países, chegou ao topo da lista dos livros mais vendidos do New York Times, do Washington Post, do USA Today e do Publishers Weekly. No rastro do sucesso de outros títulos de fantasia, como Harry Potter e O Senhor dos Anéis, Eragon também chegou às telas dos cinemas mundiais em 2006, pela Fox.

Nos Estados Unidos, o título manteve-se por 52 semanas no topo da lista dos mais vendidos. Em apenas seis meses, Eragon foi reeditado por três vezes na Turquia. Na Espanha, a edição de 80 mil exemplares esgotou-se em apenas um mês. Na Polônia, o título de Paolini só perde em vendas para o O Código Da Vinci e já vendeu 45 mil exemplares. Eragon é uma história repleta de ação, vilões e locais fantásticos, com dragões e elfos, cavaleiros, luta de espada, inesperadas revelações e uma linda donzela. Inspirado em J.R.R. Tolkien, que criou idiomas para os diálogos de seus personagens, Paolini utiliza o norueguês medieval para a linguagem dos elfos e inventa expressões específicas para os anões e os urgals, de modo a dar veracidade ao lendário reino de Alagaësia, onde a guerra está prestes a começar.

Ciclo da Herança

Até 2007, dois dos quatro livros já haviam sido publicados: Eragon (2003) e Eldest (2006). O terceiro livro foi lançado na América, Canadá e Reino Unido no dia 20 de setembro de 2008, sendo lançado no Brasil em novembro de 2008. Tanto Eragon quanto Eldest entraram na lista de bestsellers do The New York Times. Em 2006, Eragon foi adaptado para o cinema, numa película de mesmo nome.
Passada no mundo fictício de Alagaësia, a história se foca no adolescente Eragon sua parceira Saphira, um dragão com a qual compartilha sua consciência, e a descoberta de ser um Cavaleiro de Dragões, um lendário grupo que governava as terras em tempos passados,(tais dragões não são de forma alguma meras bestas, pelo contrário, cavaleiros e dragões são tratados como iguais).O Rei Galbatorix, que destruiu a antiga ordem (os Cavaleiro de Dragões) e pegou a coroa para si, envia seus assassinos para capturar o rapaz e Saphira, e assim, inicia a sua jornada.

Livro Um: Eragon

Roran tem por volta de dezoito anos no inicio da saga e é o único filho de Garrow e irmão de criação de Eragon, que tem quinze-dessezeis anos no início da saga. É apaixonado por Katrina, a quem chega a pedir em casamento. No início da trama Roran parte para Therrinsford afim de conseguir dinheiro para o dote de Katrina, uma vez que Sloan, pai da moça, nunca aceitaria ver a filha casada com um “joão-ninguem” (essa história foi completamente alterada no filme “Eragon” uma vez que Katrina vira personagem aleatória na história e Roran vai para Therrisford com medo de ser alistado para o exercito do reino Bodring-Império). Quando os Ra’zac destroem sua fazenda e assassinam seu pai a procura do ovo de dragão (que pertencia a seu primo Eragon – embora Roran não soubesse disso), ele é avisado por Baldor (filho de Horst, um amigo) e retorna para Carvahall (onde nasceu e cresceu).

Livro Dois: Eldest

Esse livro conta com uma participação bem mais ativa de Roran, sendo ele também considerado um dos personagens principais, como Arya, Orik e o próprio Eragon. Roran tem por volta de vinte anos no começo do livro, e sua maior preocupação era reconstruir sua fazenda para poder pedir Katrina em casamento. Num determinado momento do livro trinta soldados do império mais os Ra’zac (vilões recorrentes da série) tentam capturar Roran, pois Galbatorix tinha esperança de que ele soubesse onde Eragon estaria. Para se proteger Roran, que estava hospedado na casa Horst, o ferreiro, esconde-se numa montanha.

A Invasão de Carvahall
Com a desculpa de estava caçando Roran foge para as montanhas na esperança de que os soldados se irritassem e partissem, o que não aconteceu e após uma série de eventos, como a morte de Quimby e o celeiro de Carvahal incendiado, Roran volta para a casa de Horst e combina com vários outros habitantes a expulsão dos soldados. Com o intuito de apenas espantar os soldados mas com o resultado da morte de um deles a reação de Carvahal, de certa forma marcou o fim do vilarejo. Construindo algumas barricadas toscas feitas em suma com carroças tombadas o vilarejo sofreu uma intimidação de um Ra’zac que sozinho destruiu as barricadas improvisadas e jurou escravizar todos os habitantes do lugar. Tentando proteger a cidade Roran encarregou diversos homens de fazerem novas barricadas, desta vez mais resistentes, feitas de troncos de árvores. Após o primeiro ataque dos soldados, Roran decidiu levar todas as mulheres e crianças para as Cataratas Igualda, porém com certa relutância. Quando Roran estava dormindo com Katrina, que havia sido deserdada pelo pai, Roran é atacado pelos Ra’zac e tem seu braço gravemente ferido

A Espinha
Convecido de que o unico jeito de salvar Katrina -que foi sequestrada pelos ra’zac- e impedir a completa destruição de Carvahall era levar todo o vilarejo até Surda, ele os convencem com grande discurso. Com o plano de chegar a Narda e pegar um barco até Surda, Roran leva os habitantes de Carvahall a atravessarem a espinha.

Narda
Roran passa a ser conhecido como martelo forte pelos aldeões(por usar um martelo em batalha) e em Narda conhece o capitão Clóvis com quem negocia uma viagem por chatas até Teirm. Ao chegar lá, Roran realiza um motim porque não possuía dinheiro para pagar a viagem.

Teirm
Ao chegarem a Teirm conhece Jeod- que já havia encontrado Eragon algum tempo antes – que estava falido. Assim, eles junto com outros piratas roubam o asa-de-dragão (o melhor navio de toda Teirm)

O Olho de Javali
A bordo do Asa de Dragão e fugindo dos navios de Galbatorix, Roran se vê obrigado a passar pelo olho de javali, um imenso ciclone entre as ilhas Nía e Beirland.

A Campina Ardente
Ao chegar à Surda, Roran é avisado que uma guerra irá acontecer entre os Varden e o Império. Tentando ajudar os Varden, Roran leva o Asa-de-Dragão para a Campina Ardente (local da guerra). Lá ele encontra Eragon, agora um cavaleiro, e mata dois magos do império, conhecido como gêmeos. Ao fim da batalha, Roran descobre que Katrina está aprisionada em Helgrind e parte para salvá-la.

Livro Três: Brisingr

Este é o penúltimo livro do Ciclo da Herança. O livro começa logo por contar o resgate de Katrina, noiva de Roran que havia sido raptada pelos Ra’zac’s, por parte de Eragon, Roran e Saphira. Ao longo do livro vai-se contado o percurso de Eragon no acampamento em Surda, e como ele vai lidando com as diversas batalhas tanto bélicas como pessoais. Neste livro é revelado porque Galbatorix tem tanto poder. Katrina esta grávida de Roran. O nome do livro é Brisingr, pois Eragon volta a Ellesméra e lá Rhunon faz uma espada para Eragon, porém como ela tinha prometido que nunca mais faria uma espada, ela possui Eragon e Eragon faz sua própria espada. Oromis e Glaedr saem de Du WeldenVarden e vão ajudar a conquistar Gil’ead. Quando eles chegam lá, encontram Murtagh e Thorn. Eles duelam quando e no meio da luta Galbatorix possui Murtagh e o próprio Galbatorix mata Oromis e Glaedr. Glaedr dá seu Eldunari(coração dos corações dos dragões) a Eragon. Galbatorix roubou a maioria dos eldunari dos dragões que matou e é por isso que ele é tão poderoso. Eragon e Roran matam os Ra’zac e sua montarias. Os elfos também saem de Du WeldenVarden conquistam Ceunon e Gil’ead.Os Varden conquistam Aroughs e Feinster. Em Feinster Arya e Eragon encontram outro Espectro, Arya o mata com a ajuda de Eragon. Orik se torna o rei dos anões. Agora os Varden no quarto livro pretendem marchar sobre Belatona e Dras-Leona para depois se encontrarem com os elfos nos portões de Urû’baen, mas antes Eragon e os Elfos tem que encontrar alguma maneira de tirar os Eldunari do Galbatorix e do Murtagh ( Galbatorix deu alguns Eldunari para Murtagh).

Alagaësia
Alagaësia (pronunciado A-la-guÊi-gia) é um país fictício em que é ambientada a trilogia.

Habitantes
• Dragões- Existentes desde o princípio de Alagaësia;
• Elfos- Originários de terras longuíquas aportaram antes dos humanos
• Anões- Primeiros governantes de Alagaësia.
• Humanos- Dominaram depois dos anões.
• Urgals- Vieram a Alagaësia seguindo os elfos.
• Espectros- Poucos foram vistos ou comentados,e por terem uma origem não-natural é difícil dizer quando surgiram.

Lugares
Carvahall – Vilarejo ao norte, lar e ponto de partida de Eragon, Brom e Saphira. A oeste existe a Espinha uma cadeia de montanhas.

Therinsford – Pequena cidade vizinha de Carvahall.

Teirm – Cidade mercante, vive principalmente do comércio marítimo. Lar de Jeod, amigo de Brom.

Deserto Hadarac – Um deserto de grandes proporções e marca o fim da Alagaësia.

Dras-Leona – Cidade que mantém relações com a capital Uru’baen.

Helgrind – Montanha próximo a Dras-Leona. Seu nome significa portões da morte na Língua Antiga.

Uru’baen – A capital do Império, e sede do governo de Galbatorix.

Gil’ead – Outra cidade-base do Império, foi palco da grande batalha entre Brom e Morzan.

Cavaleiro de Dragões

No Ciclo da Herança de Christopher Paolini a Ordem dos Cavaleiros de Dragões foi uma grandiosa instituição cuja missão era proteger a terra de Alagaësia.Todos os Cavaleiros compartilham suas mentes com um dragão, os quais são seus aliados e parceiros, permitindo além de tudo que seu cavaleiros os usem como montaria,e possuem numa da palma das mãos um gëdwey ignasia uma marca prateada brilhante.Sua base localizava-se na cidade de Dorú Areaba,na ilha de Vroengard. É importante ressaltar que o cavaleiro não possuía o dragão, ou o contrário, o que eles tinham era uma aliança que ia além de posses ou laços físicos, eles eram ligados por suas mentes e, portanto, eram iguais.

Habilidades

Gëdwey Ignasia

Todo Cavaleiro possui uma gëdwey ignasia (palma prateada na Língua Antiga), fato de eles serem chamados também de argetlam, que tem o mesmo significado. Eles a recebem no momento em que tocam um filhote de dragão. Essa marca funciona como uma espécie de “receptor” de magia.

Vantagens
Todos os Cavaleiros possuem sua vida prolongada além de um humano normal, praticamente são imortais. Também recebem um aumento de força, velocidade e resistência. O efeito disso é o longo contato com seus dragões, criaturas misteriosas e mágicas. E também, sempre teriam um companheiro, em qualquer situação, quem nunca irá abandonar você, a não ser que se o dragão fosse morto.

Fonte:
http://www.livrariacultura.com.br

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José Verdasca (A Vida, o Homem e o Universo: ensaios crítico-analíticos)

O Autor procedeu a uma pesquisa cuidadosa, servindo ao leitor as opiniões das várias tendências filosóficas e científicas que pontuaram de luz a sabedoria humana ao longo dos tempos. Uma obra de boa e reta intenção, sem precipitações e principalmente sem conclusões, obviamente impossíveis e indesejáveis num campo de tão delicados conteúdo e contorno.

Ao escolher uma temática desta natureza, ao fazer-nos navegar entre a essência e a existência, das incertezas epistemológicas para as que a escatologia suscita, o autor conseguiu promover o pensamento introspectivo de quem lê, tornando a leitura deste livro num sadio exercício da busca de si próprio e de novas descobertas ou alegrias intelectuais, alargando os horizontes desde o psicológico/individual ao coletivo/sociológico/humanidade. Ao interrogar-se sobre o seu próprio momento entre a origem e o fim, com os escassos instrumentos de complexidade cerebral de que ainda dispõe, o ser humano não deixará certamente de desejar a passagem dum tempo geológico que lhe permita abarcar tudo quanto lhe escapa… Se não vier a destruir a sua própria humanidade.

Pois se é verdade que o Homem aprendeu a dominar a Ciência e a Técnica antes de ter atingido a verdadeira dignidade humana; se é o único ser vivo sobre a Terra capaz de contrariar o terceiro princípio da termodinâmica; se não se capacitar da necessidade fundamental de uma convivência sadia consigo próprio, com os outros e com o ecossistema de que também faz parte – aquilo a que Carl Roger chamou nos anos 60’s fenômeno organísmico – nunca a espécie humana viverá o tempo geológico suficiente para compreender as origens e o destino da humanidade que irá destruir, em conjunto com a sua aldeia global, num tempo meramente histórico.

Na contracapa:

Conhece-te a ti mesmo, e conhecerás o Universo e os deuses”
(Inscrição no Templo de Delfos)

Fruto de séria e profunda investigação, serena e intuitiva meditação e objetiva e honesta reflexão, através das quais o autor tentou dissecar os segredos da alma humana, descortinar os domínios secretos da Vida e do Homem e penetrar os mistérios do Universo, esta obra aborda os problemas do Espírito à luz do misticismo de Profetas, Filósofos, Sábios e os até agora ignorados elétrons espirituais, revelados pêlos maiores físicos subatômicos da atualidade, muitos dos quais se vêm identificando com os místicos de antanho, como que a provar o ciclo vicioso que a tudo e a todos acompanha, talvez porque de forma esférica sejam o cérebro humano e o Globo Terrestre, os astros e as estrelas, o átomo e as partículas subatômicas, e, quiçá, o próprio Universo.
Não sendo obra de natureza religiosa e muito menos de opinião, trata-se, isso sim, de um livro de índole reflexiva e expositiva, cujos objetivos primordiais visam informar o(a) leitor(a), e, sobretudo, levá-lo(a) a refletir profundamente sobre os mistérios que ensombram a existência humana, os segredos que rodeiam a Essência ou origem dos Espíritos e os enigmas que à Vida concernem e que aguçam a curiosidade intelectual dos homens superiores, desafiam a intuição humana e agridem as mais lúcidas inteligências, tornando-se fonte de constantes preocupações e indagações ao longo da nossa experiência, enquanto seres espirituais que realmente somos.
Nilton Barbosa Lima (do Parlamento Mundial para Segurança e Paz)

Alguns trechos do prólogo do livro:

com o prólogo (do gr. pro=a favor+logos=exposição, discurso, verbo, texto), temos a intenção de apresentar, esclarecer e explicar o texto, desejando torná-lo mais acessível, claro e compreensível, em especial no que concerne aos assuntos, idéias e conceitos habitualmente considerados complexos e ou de difícil entendimento, pelo que podem bloquear a nossa limitada capacidade de discernir e ou escapar ao campo da nossa inteligência; aos temas metafísicos, que estão acima ou para além da física (Natureza); e, ainda, dos considerados místicos (do gr. Mystikos=misterioso), de natureza especificamente intuitiva, contemplativa e ou meditativa, e que abordam o possível e ou hipotético contato dos humanos com o divino e com os seus mistérios, dogmas e ou enigmas, valendo-se da contemplação e da meditação, através da intuição mística, quando esta busca explicar as “visões” e ou experiências extra-sensoriais e ou da Vida do Espírito.

Ao longo da nossa exposição vamos tentar analisar, clarificar, relatar e definir, primordialmente, os conceitos expressos nos vocábulos título – Vida, Homem, Universo – perfeita trilogia cósmica que guarda semelhança com a Trindade formada pela essência (origem, constituição primeira, atributo fundamental), pela existência (viver de entes e seres), e pela Natureza (physis=conjunto dos seres e do mundo físico), aqui englobadas a natureza do Homem e a natureza da Natureza, bem como os fenômenos físicos e suas causas; acreditamos que os conceitos dos citados vocábulos título apresentam grande analogia com a idéia que a cristandade faz de Santíssima Trindade – Pai, Filho e Espírito Santo – ou ainda com os seus equivalentes dos antiqüíssimos deuses bramânicos – Brama (o Pai), Maya (a Mãe), e Visnu (o Filho) – que são essência, substância e Vida segundo os Upanishad da doutrina bramânica.

Temos plena consciência de que os assuntos aqui abordados são naturalmente polêmicos, mas gostaríamos de encarecer que não nos move qualquer intenção de polemizar, mas tão somente o desejo de debater para esclarecer, de expor para aprofundar e de comparar para optar, pois os temas são apresentados com o objetivo de despertar a curiosidade e o interesse do leitor, no sentido de tentar desmistificar tabus, de estudar crenças e religiões e de – conhecendo-as melhor – podermos alicerçar nossas convicções em bases e dados mais sólidos, onde a intuição mística seja complementada pelo raciocínio dedutivo, para que, através dele e por meio do silogismo, possamos tentar chegar a conclusões lógicas, portanto inteligentes.

O tema – ou temas – da presente obra é, ou são, talvez, os mais profundos de que poderíamos ocupar-nos, porquanto, desde sempre, a preocupação maior de nossos antepassados foi com as nossas origens, com o significado e interpretação daquilo que chamamos nascimento e morte e com o nosso destino após esta, e em especial com o sofrimento humano, mormente com a ansiedade e ou a angústia que, sem aviso prévio, muitas vezes de nós se apodera: a estas o Papa João Paulo II chamou “sofrimento da alma”, exclusivo da nossa espécie ao longo do percurso dos homens na Terra; tal sofrimento tem muito a ver com a especulação dos crentes acerca da chamada vida extra-terrena ou eterna, e muito especialmente com a intranqüilidade ou insegurança provocada pelos primitivos mitos de céu ou paraíso, inferno e purgatório.
(…)
Acerca do título da obra – A Vida, o Homem e o Universo – urge explicar que se trata de três vocábulos de conceitos convergentes, porquanto a Vida inclui todas as vidas (em todo o Universo), quando o Homem engloba todos os homens (passados, presentes e futuros), ou seja a Humanidade, com o Universo abarcando o todo material e espiritual que são as vidas da Vida, que dele procedem para encarnar nos homens, e à Natureza retornam após a desencarnação; deste modo, estamos em presença de uma Trilogia interdependente e ou complementar, quando as três partes compõem o todo, quando o Microcosmos se aglomera e ou aglutina para formar o Macrocosmos, ou seja, quando as partículas elementares se vão juntando para a incorporação, perfeita, contínua e permanente evolução renovadora dos seres, cuja aparente matéria será fruto da atuação conjunta das quatro forças universais conhecidas: forças nuclear forte, nuclear fraca, eletromagnética, e gravítica.

Relativamente ao Universo, impõe-se-nos que o tentemos enxergar como incomensurável – como supomos que realmente é – composto de sistemas “provavelmente formados ou criados à imagem e semelhança do Sistema Solar”, gigante sideral por sua vez também “desenhado” segundo o modelo do átomo, cujo núcleo equivaleria ao Sol, e cujos elétrons corresponderiam aos satélites, pois, como estes, giram em torno do núcleo, quando tudo e todos seriam compostos por matéria altamente concentrada, quem sabe talvez apenas energia que ainda confundimos com matéria. Neste nosso Universo – que continua praticamente desconhecido, “comandado” pelas citadas “grandes forças” a que pensamos dever a sua harmonia, o seu equilíbrio, o seu funcionamento, talvez mesmo a sua existência – nada acontece por acaso, pois todos os fenômenos ditos naturais têm suas causas específicas, mesmo que por nós ignoradas; e se avançarmos em hipóteses e elucubrações, raciocínios e explicações, teses e conclusões, decerto acabaremos valendo-nos da nossa intuição mística que nos guiará no caminho já seguido pelos grandes místicos, fundadores de velhas religiões e ou de sérias teorias filosófico-morais.

É, pois, de tais seres e temas, conceitos e problemas, idéias e sistemas que vamos tratar, com seriedade mas com muita humildade; com determinação mas com profundo respeito; com objetividade mas sem qualquer tipo de preconceito; e, finalmente, com a melhor das intenções e com a mais rigorosa honestidade intelectual, apesar de sabermos – como muito bem sabemos – que a inteligência humana tem seus limites, que o domínio da língua é precário e que a linguagem escrita se presta a mal entendidos, incompreensões, distorções, erros e mesmo a contradições, falhas que aqui decerto existem, já agora assumimos e pelas quais definitiva e pessoalmente nos responsabilizamos; no que respeita às nossas limitações – por demais evidentes a quem tiver a bondade de ler o presente trabalho – delas temos uma rigorosa noção e para elas solicitamos generosa compreensão. É pois com sincera humildade, mas com muita esperança, que passamos a desenvolver os temas que nos propusemos, certos de que – em maior ou menor grau, e em circunstâncias favoráveis – alguma utilidade, proveito ou benefício poderão os nossos leitores obter deste trabalho.
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Fontes:

– VERDASCA, José. A vida, o homem e o universo: ensaios crítico-analíticos. São Paulo: Scortecci, 2006. (contracapa e pp.25-27, 33,34).

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Pedro Viegas (Trajetória Rebelde)

“A história acontece à sua maneira, única em cada realidade; seu registro, no entanto, dá-se por versões conflitantes, em que predomina por tempo indefinido a dos vencedores. Somente a perseverança investigativa pode levar à verdade completa ou próximo a ela. E este depende de elementos de reconstituição, de cada depoimento e parecer, em especial, quando possível, dos que tiveram a fortuna de sobreviver ao capítulo que lhe correspondeu estar presente, seja como ator, seja como observador.”

No turbilhão de acontecimentos que desembocou no golpe de 1964, poucos episódios terão sido tão dramáticos quanto o cerco militar a centenas de marinheiros e fuzileiros navais reunidos para comemorar o segundo aniversário de sua associação (AMFN) na sede do antigo Sindicato dos Metalúrgicos da Guanabara, que se arrastou angustiantemente entre os dias 25 e 27 de março de 1964.

A celebração fora levada a cabo desrespeitando proibição expressa do Comando da Marinha, que se negava a reconhecer a legitimidade da associação. A solução dada ao impasse pelo governo Goulart – que incluía a anistia aos amotinados – foi tomada como prova de que ele estaria instigando ou ao menos sendo conivente com a quebra de hierarquia, que já assombrava as Forças Armadas desde a revolta dos sargentos, ocorrida em setembro do ano anterior em Brasília. Segundo diversos relatos, isso teria precipitado a adesão de oficiais até então legalistas ao movimento golpista em curso.

Dali em diante, graves suspeitas foram levantadas em relação a esse movimento, que, atingindo um ponto particularmente sensível do espírito de corpo militar, foi visto por muitos como estopim do golpe de 1964. A posterior trajetória do então presidente da AMFN, o marinheiro de primeira classe José Anselmo dos Santos (que entraria para a História erroneamente identificado como “cabo Anselmo”), contribuiu para fortalecer a hipótese de que a revolta teria sido obra de provocadores, sendo apontado até o possível envolvimento da CIA, a odiada agência de inteligência norte-americana.

Anselmo, como é bem sabido, viria a aderir à Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) – que tinha como um e seus dirigentes o também ex-militar Carlos Lamarca. Segundo seu próprio testemunho, o “cabo”, após ser preso pela equipe do delegado Fleury – da polícia política paulista –, teria negociado a preservação de sua vida pela delação e atuação como agente duplo. Isso viria a custar a vida de diversos militantes, incluindo-se aí sua companheira, Soledad, grávida de sete meses.

É fácil, portanto, compreender por que a “revolta dos marinheiros” se tornou uma página maldita na história da esquerda brasileira. Infelizmente, parece que a repugnância causada pela figura de Anselmo contribuiu para que a interpretação do episódio, um dos divisores de águas entre as diversas abordagens sobre as causas do golpe, tenha até o momento se baseado mais nas deduções decorrentes de esquemas explicativos mais gerais que nos resultados de pesquisa empírica.

Já o testemunho de Viegas – elaborado com uma capacidade de reconstituição de detalhes prodigiosa e pleno domínio da técnica narrativa – tanto oferece uma preciosa visão de dentro sobre a associação e a revolta quanto resgata a peculiar trajetória posterior de seus protagonistas, geralmente às margens das principais organizações clandestinas da esquerda brasileira.

Ex-marinheiro que teve seu curso de jornalismo interrompido pela condenação à prisão – em função de um artigo publicado no periódico da associação, Tribuna do Mar –, o autor desempenhou ativo papel na articulação do pequeno e sugestivamente batizado MAR (Movimento de Ação Revolucionária) e na condução de sua mais espetacular ação: a fuga da Penitenciária Lemos de Brito em 1969.

Condenar os derrotados e responsabilizá-los pelos “desvios” da História é procedimento de praxe do pensamento conservador reproduzido de inúmeras formas pela esquerda, acadêmica ou não. As contradições da realidade, entretanto, permanecem. É sabido que compactuar com a quebra de disciplina nas Forças Armadas é abrir caminho para o rompimento da institucionalidade democrática, tão arduamente reconquistada e ampliada. Mas poder-se-á efetivamente falar em democracia quando a vida de instituições vitais continua a ser regida pela negação de direitos fundamentais da cidadania seus subalternos? Mais ainda, quando esse modelo legitima a reprodução do exercício cotidiano do arbítrio em tantos outros espaços da vida social? Por essas e por outras, o livro de Viegas, mais do que recontar uma experiência com o devido respeito por aqueles que a viveram, dão o que pensar.

Viegas, de posse da velha bússola, consegue nesta empreitada manter sempre regulado o rumo do norte. E como experimentado marinheiro, ensina que não se pode confundir, em alto mar ou terra firme, impacto da onda com farfalhar frívolo da espuma.
Para acompanhá-lo nessa viagem, é bom saber que o mergulho na História contemporânea, embora já coisa do século passado, exige desprendimento. “Era uma vez…” configura formato interessante. “Meninos, eu vi!”, também. Era uma vez um grupo do qual Viegas fazia parte. E ele viu muita coisa, testemunhou, sofreu e alegrou-se. É como se contasse a História, sem querer enfeita-la, despindo-a de tons épicos, o que não significa abolir atos de coragem, altruísmo e humanidade, mas contar a você uma parte relevante de fatos ainda insuficientemente esmiuçados. Alguns episódios e nomes não conhecidos. Mas nada é apenas repetitivo. Aquis estão revelações que ajudam a formatar lentamente um mosaico gigantesco, com partidos e organizações, alas e tendências, filosofias e engajamentos, confrontados com uma repressão de momentos brutais, selvagens, exterminadores.
[…] Porque neste livro, com alentadores momentos de audácia, Pedro Viegas ousa desmentir Carl Jung: “Todos nós nascemos originais e morremos cópias”. Ele, não. Coisa de marinheiro calejado, que não teme as chibatadas de nosso tempo, das quais está nos ajudando a ficar livres, dizendo sem receio, do Leviatã, que nós também não somos assim
” (Percival de Souza, in Trajetória Rebelde, p. 13)

Fontes:
– trechos do artigo de Alexandre Fortes in http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/article.php?storyid=3328
– VIEGAS, Pedro. Trajetória Rebelde. Cortez Editora, 280 páginas, 2004.

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Paul Auster (1947)

Paul Benjamin Auster (Newark, 3 de fevereiro de 1947) é um escritor norte-americano autor de vários best-sellers como Timbuktu, O Livro das Ilusões, A Noite do Oráculo e A Música do Acaso.

Aos 15 apaixona-se pela literatura e é então que começa a ler Dostoiévsky, Hemingway, Fitzgerald, Faulkner, Kafka, Hodërlin e Proust. Por força da leitura decide começar a escrever com o objetivo de decifrar o mundo recriando-o.

Frequentou a Universidade de Columbia e viveu durante quatro anos em França. A sua proximidade à literatura francesa haveria de marcá-lo para sempre. Foi confesso admirador de André Breton, Paul Éluard, Stéphane Mallarmé, Sartre e Blanchot, alguns dos quais traduziu para a língua inglesa. O seu gosto pela tradução é muitas vezes referido pelo próprio, que aconselha os jovens escritores a traduzir poesia para entenderem melhor o significado intrínseco das palavras. Além destes autores, Paul Auster refere ainda como suas influências Dostoiévsky, Ernest Hemingway, Fitzgerald, Faulkner, Kafka, Hodërlin, Samuel Beckett e Marcel Proust.

Em 1998, realizaria o seu primeiro filme, “Lulu on the Bridge”. Nos seus livros é evidente a influência cinematográfica norte-americana e as suas histórias desenrolam-se numa sucessão que faz lembrar um thriller, usando igualmente o método da “caixa chinesa”, sucessão de histórias no interior umas das outras. A sua obra parece ser mais apreciada na Europa do que no seu país natal.

Boa parte da sua história é contada por ele como se fosse uma autobiografia. “Da Mão para a Boca” reúne relatos de sua vida, um jogo criado pelo escritor chamado action baseball, e mais três peças, consideradas por ele mesmo como “fracas”.

Atualmente vive em Brooklin com Siri, a sua segunda mulher, que descreve como “alta, loura e exultantemente bela”, os seus dois filhos, a poesia, dentro dos livros e para os livros. Paul Auster tem inúmeras obras publicadas em Portugal pela Presença.
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HOMEM NO ESCURO (2008)

Cruzando as memórias de um homem de 72 anos que viveu intensamente cada instante de sua vida com as realidades iníquas e violentas de um mundo em pé de guerra, e ainda por cima encontrando espaço para uma subtrama labiríntica de corte fantástico e orwelliano, Auster mostra aqui,em grande estilo, toda a sua maestria ficcional. August Brill, crítico literário aposentado, recupera-se na casa da filha, em Vermont, Estados Unidos, de um acidente de carro em que quase perdeu uma perna. Quando o sono se recusa a dar as caras, Brill permanece na cama e libera a imaginação para tecer histórias que o ajudem a desviar o foco mental das vicissitudes que ele gostaria de esquecer: a morte recente da mulher, o assassinato do namorado da neta no Iraque e a dolorida solidão da única filha, abandonada pelo marido.

Em meio a divagações de toda ordem, Brill constrói um mundo paralelo, em que os Estados Unidos se acham mais uma vez numa guerra civil sangrenta. À medida que a noite em claro avança, adensa-se a trama do insone, ameaçando engolfar seu próprio criador numa delirante vertigem autopunitiva. No fim da madrugada angustiante, a neta Katya vem lhe fazer companhia, com perguntas incisivas que o remetem a um torvelinho de lembranças, boas e más, do casamento dele com a falecida Sonia, cantora lírica e mãe de Miriam, com quem dividiu os grandes momentos de sua vida. Com sua prosa a um tempo refinada e contundente, Homem no escuro é o romance dos tempos atuais, um livro que força o leitor a se confrontar com a noite sombria até mesmo quando celebra uma existência feita de alegrias comuns.
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VIAGENS DO SCRIPTORIUM (2007)

Fechado num pequeno quarto e vigiado o tempo todo por câmeras e microfones, um homem de certa idade busca reconstituir sua memória. Ele não sabe onde está – hospital, prisão, asilo? – e muito menos o que faz ali. Todos os dias recebe a visita de uma enfermeira que lhe desperta lembranças imprecisas e dolorosas e, mais esporadicamente, de um ex-policial. Aos poucos, descobre que no passado foi alguém com o poder de enviar pessoas a missões difíceis e perigosas das quais muitas não voltaram com vida. Sobre a escrivaninha do quarto o homem encontra um manuscrito inacabado. É a história de um agente de uma grande potência, numa época indeterminada, que ultrapassa clandestinamente a fronteira entre seu país e as terras bárbaras a fim de investigar uma possível insurreição dos povos independentes. Uma história ilumina obliquamente a outra, e o protagonista sai de sua letargia ao imaginar uma continuação para o manuscrito.

Ao lado do persistente desejo sexual, a fabulação literária parece ser a única força que o mantém vivo. Desse início intrigante, mero fiapo de história que sugere uma trama de espionagem, Paul Auster torna a surpreender seu leitor, encaminhando-o sutilmente a uma reflexão sobre o ato de escrever ficção. Não por acaso, o nome do protagonista é Blank, que em inglês indica o papel em branco, o espaço vazio, o vácuo a ser preenchido, o alvo a atingir. Um dos encantos dessa pequena narrativa está justamente no fato de colocar o leitor numa posição análoga à de Blank, que tem que descobrir aos poucos quem é e o que faz naquele local. Saindo um pouco de seu registro habitual, de ambientação realista, urbana e contemporânea, mas sem perder o encanto envolvente de sua prosa, o autor compartilha com o leitor, em Viagens no scriptorium, as agruras e delícias do ofício de inventar e escrever histórias.
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A HISTORIA DE MINHA MAQUINA DE ESCREVER (2006)

A História da Minha Máquina de Escrever é um tributo à relação – intensa e muitas vezes determinante – entre um escritor e a sua máquina de escrever. Ao longo de 30 anos, a velha máquina Olympia de Paul Auster foi a corrente de transmissão dos romances, contos e textos de um dos mais emblemáticos escritores norte-americanos.

Paralelamente, os vigorosos e obsessivos desenhos e pinturas que Sam Messer dedica ao autor e à sua máquina de escrever conseguiram, como escreve Paul Auster, «converter um objeto inanimado num ser com personalidade, com uma presença no mundo».
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DESVARIOS NO BROOKLYN (2006)

Prestes a completar sessenta anos, Nathan Glass acha difícil vislumbrar um futuro para si. Compulsoriamente aposentado devido a um câncer aparente processo de remissão, recém-saído de um casamento falido e rejeitado pela única filha, busca um lugar tranqüilo para morrer. Muda-se então para o bairro nova-iorquino do Brooklyn, onde nasceu, onde espera encontrar um final silencioso para uma vida triste e absurda.

Quer o acaso, porém, que Nathan não só não morra como se meta em Várias peripécias, como a desencadeada por sua paixonite por uma jovem garçonete – e a conseqüente ameaça de morte que lhe dirige o marido brutamontes da moça – e confrontos involuntários com um membro de uma seita cristã ultrafundamentalista. Além disso, sua amizade com um vigarista falsificador de obras de arte dará origem a outra série de encrencas.

A narrativa tem início durante a primavera que antecede a controvertida eleição para a presidência dos Estados Unidos, em 2000. Por uma das inúmeras coincidências que se sucedem ao longo do romance, Nathan encontra o sobrinho Tom Wood, a quem não vê há anos. Assim como o tio, Tom esta sem rumo, fugindo do que poderia ter sido uma carreira acadêmica promissora, do amor e da vida em geral. O reencontro dos dois e seguido de perto pela entrada em cena da sobrinha de Tom, garota esperta de nove anos de idade que surge do nada na soleira do quartinho onde vive o tio, sem bagagem nenhuma, recusando-se a revelar o paradeiro da mãe. Na verdade, recusando-se literalmente a falar.

Criada essa ponte entre três gerações do clã, descrito por Nathan como um bando de almas confusas e atrapalhadas, a trinca protagoniza uma história cheia de reviravoltas, com cenas hilariantes e comovedoras, nas quais se destaca o desencanto de Nathan e Tom com os rumos políticos dos Estados Unidos a partir do resultado das eleições. Enquanto entretem o leitor com as aventuras desses e de outros personagens cujas vidas se esbarram e se entrelaçam, Paul Auster explora com brilho o terreno mais vasto da América contemporânea – em que sonhos desfeitos e desatinos humanos se combinam de maneira única.
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MR. VERTIGO (1995)

“Tinha doze anos a primeira vez que caminhei sobre as águas.” Assim começa este romance de Paul Auster. Ele próprio afirmou que ao escrevê-lo “qualquer coisa de diferente aconteceu”, talvez marcando uma virada no seu percurso criativo. A ação inicia-se em Saint Louis, Missouri, nos anos 20, e mergulha na memória coletiva americana, tecendo-se desses acasos, tão ao gosto do autor, que fazem coincidir de certa forma a vida do Rapaz Maravilha com a própria história da América. Auster arquitetou-o como um livro de memórias, escrito pelo herói já no fim da vida, mas pode também ser entendido como um romance iniciático onde o tema da solidão é tratado com uma lucidez fulgurante. «Mr. Vertigo» confirma Paul Auster como um dos mais singulares escritores do nosso tempo, levando ousadamente mais longe a sua sedutora arte de narrar que, desta vez, atinge uma dimensão quase épica.
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LEVIATAN (1993)

O autor renova de forma cativante o tema central do eu-sombra, do Outro. Quando Peter Aaron, o narrador, lê a notícia de que um homem não identificado explodiu numa estrada do Norte de Wisconsin, sabe tratar-se de Benjamin Sachs, o seu melhor amigo e um promissor romancista. A partir desse momento Aaron impõe-se a si mesmo a árdua missão de desvendar o mistério que envolve a vida e morte de Sachs, empreendendo uma jornada que é, simultaneamente, uma autodescoberta. Com o objetivo único de repor a verdade, revive a amizade que o ligara durante quinze anos a Sachs. «Leviathan» é uma história sobre a amizade, a traição, o desejo, as incursões do imprevisto no quotidiano, mas é, sobretudo, uma história audaciosa pela complexidade dos mundos criados, pelo intrincado dos enredos, pelas coincidências bizarras, pelas perturbantes ambiguidades. Um romance onde Auster dá asas à sua arte de criar ambientes densos e envolventes
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A MUSICA DO ACASO (1992)

A Música do Acaso» é um dos mais intrigantes romances de Paul Auster. Nele conta-se a história de alguém que inesperadamente recebe uma herança, decide abandonar tudo e viajar sem rumo. Disposto a continuar enquanto tiver dinheiro, não estabelece nenhum ponto de chegada, deixando-se conduzir pelo acaso. Este torna-se a força motriz que determina a sua vida, transformando-a numa sucessão de acontecimentos aparentemente sem significado. Assente sobre este jogo perverso, o autor desenrola a história dos seus personagens de acordo com os seus próprios temas-obsessões, definindo o indivíduo simultaneamente pela sua impotência e pela sua capacidade de viajar até aos limites da solidão. Paul Auster é um autor que recolhe o melhor da tradição ficcional americana, fundindo-a com influências várias, entre as quais podemos citar Kafka, Mallarmé ou Blanchot, que marcaram o seu próprio percurso na ficção.
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PALACIO DA LUA (1990)

«Palacio da Lua» é a narração do processo de crescimento do jovem Marco Fogg, a um passo do estado adulto. Marco está neste romance um pouco como Marco Polo quando iniciou a sua viagem até ao Extremo Oriente. Fogg, por outro lado, tem algo de Phileas Fogg que partiu para a volta ao mundo em 80 dias para tudo ver e experimentar. Apenas, a viagem de Marco Fogg é, não tanto uma viagem física, mas uma viagem no espaço interior da personagem. Esta viagem tem as etapas essenciais da morte e do amor, e a estrutura do ser vai-se construindo. Nos princípios da vida de Marco Fogg, ínicios dos anos 60, acontece a primeira viagem à Lua e, desde então, a Lua é a presença constante num firmamento nem sempre límpido. A Lua que representa a força do imaginário do autor e a mudança de fase na vida de Marco Fogg.
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ACHEI QUE MEU PAI FOSSE DEUS; E OUTRAS HISTORIAS DA VIDA AMERICANA (2005)

Achei Que Meu Pai Fosse Deus é uma coletânea de centenas de histórias reais escritas por pessoas de todos os cantos dos Estados Unidos e organizadas pelo renomado escritor Americano Paul Auster. Tudo começou quando Auster foi convidado a fazer um programa mensal numa rede de emissoras públicas de rádio dos Estados Unidos. Não estava disposto a aceitar o convite, mas sua esposa lhe deu uma idéia: em vez de escrever histórias, pedir aos ouvintes que mandassem as suas. O romancista selecionaria os melhores para ler no ar. Assim nasceu o National Story Project.

O resultado superou todas as expectativas: em um ano, Paul Auster recebeu mais de 4 mil histórias. Eram relatos engraçados, coincidências dolorosas, encontros milagrosos, sofrimentos, sonhos, quase sempre narrados de forma direta e crua, sem pretensões literárias. Diante da riqueza da material e da impossibilidade de ler todos os textos na rádio, Auster decidiu publicar um livro com as melhores histórias.
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TIMBUKTU

Timbuktu conta a amizade entre um vira-lata (Mr.Bones) e um poeta indigente (Willy) que perambulam pelo mundo.

Através dos olhos e pensamentos de Mr.Bones acompanhamos as extravagâncias e fracassos de Willy.

O cão sofre pelo dono, mas não deixa de amá-lo, nem quando este parte para Timbuktu – lugar onde vão os mortos – e parte para uma busca desesperada por um novo dono, sempre lembrando ternamente as lições de Willy, e esperando reencontrá-lo.
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O LIVRO DAS ILUSÕES

Em O Livro das Ilusões, David Zimmer entra em depressão após a morte da mulher e dos filhos num acidente de avião. Para fugir ao desespero, David entrega-se à escrita de um livro sobre Hector Mann, um virtuoso do cinema mudo dado como desaparecido em 1929. Após a publicação da obra, David aceita traduzir as “Memórias do Túmulo”, de Chateaubriand, e refugia-se num lugar perdido para fazer face à hercúlea tarefa que se impôs. É então que recebe uma estranha carta proveniente de uma pequena cidade do Novo México, supostamente escrita pela mulher de Hector: «Hector leu o seu livro e gostaria de encontrá-lo. Está interessado em fazer-nos uma visita?». Zimmer, incrédulo, hesita. Mas uma noite uma jovem mulher bate-lhe à porta e obriga-o a decidir-se, transformando para sempre a sua vida.

Narrada pela jovem mulher, a história do extraordinário e misterioso Hector Mann é o fio condutor de “O Livro das Ilusões”. Mas o poder descritivo de Paul Auster transporta-nos bem para lá da magia do cinema mudo e mergulha-nos num universo muito pessoal, em que o cômico e o trágico, o real e o imaginado, a violência e a ternura se misturam e se dissolvem.

Fontes:
http://www.portaldaliteratura.com/
http://www.submarino.com.br
http://pt.wikipedia.org

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Lançamento do Livro "Saboreando Crônicas", de Luiz Eduardo Caminha

artigo de Tchello d’Barros

Luiz Eduardo Caminha é um homem do Renascimento. Só que atuando em plena contemporaneidade com seus vários talentos, seja cantando, tocando, pintando, escrevendo, gourmetiando ou ainda organizando encontros, sejam literários, gastronômicos ou culturais. Mas a tônica é sempre a mesma, a aproximação das pessoas em torno da amizade, como por exemplo o grande sucesso que é o mega evento Stammtische, de Blumenau/SC.

Bem, eu já conhecia a produção poética do rapaz, e quando, aqui em Maceió, abro seu recente livro Saboreando Crônicas, fiquei um pouco apreensivo com esse título tão singular, mas bastou ler a primeira crônica e a ficha caiu na hora. Trata-se de uma obra das mais saborosas, nos dois sentidos, pois não bastasse o fato de cada crônica vir acompanhada de uma receita gastronômica, o autor tempera suas contações de causos e histórias com uma linguagem que é praticamente o autor falando, conversando, coisa rara nos cronistas contemporâneos. Quem conhece o Caminha pessoalmente vai confirmar isso. Manuel Bandeira já dizia que o Brasil é o único país onde as pessoas escrevem de uma forma diferente da que falam. Taí um livro pra andar um pouco na contramão dessa afirmação.

Quanto a leitura do livro, talvez caiba uma metáfora culinária: sabe aquele almoço onde a gente já se alimentou o suficiente mas não consegue parar de comer porque a comida está muito saborosa? Pois é, assim é o Saboreando Crônicas. Havia me planejado pra ler uma crônica por dia, mas quem disse que a gente consegue parar de ler? É que o autor, com sua linguagem de bate-papo entre amigos, nos transporta para as historietas de uma forma que a gente se sente envolvido pelos causos e personagens, muitos deles hilários, e mal termina uma crônica, já se quer saber da próxima, como se fosse num rodízio de pizza ou churrasco.

É possivel que o livro seja recebido como uma coletânea de crônicas sobre causos, sobre culinária ou mesmo de humor, já que é impossível não rir sozinho ao ler as presepadas dos personagens do Caminha. Mesmo na escrita o autor consegue traduzir os sotaques de manezinhos de Floripa, dos alemães da germânica Blumenau, e até mesmo o inconfundível e musical sotaque de nossos irmãos nordestinos. Mas digo que esse trabalho vai além. É um livro de Crônicas no sentido mais amplo do termo, pois trata de costumes, hábitos e de vivências de uma época e de um lugar, de vários lugares. Nas entrelinhas dos fatos percebemos o modo de viver não apenas de alguns grupos de cidades catarinenses, mas também do Nordeste, onde esse escritor e agitador cultural é figurinha fácil, dadas as suas andanças e confessa paixão por várias cidades desse lado do país.

Saboreando Crônicas é um livro para se gostar e degustar. É ainda uma obra que surge como um acréscimo de qualidade para a literatura contemporânea de Santa Catarina.
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Release

Estão todos convidados, afinal o livro tem tudo a ver com Florianópolis e Blumenau, já que muitas das crônicas retratam situações aqui vividas“, assim o escritor e Poeta Luiz Eduardo Caminha convoca os interessados em literatura para o lançamento/noite de autógrafos, de seu livro, na Livraria Livros & Livros. FCB.

O novo livro de Luiz Eduardo Caminha marca sua estréia no universo das crônicas, gênero que, aliás, se diz um admirador. “Embora escreva romances e poemas, considero-me muito mais um cronista. Diria até que muito mais que um poeta, não obstante ame a poesia” refere o autor. “A crônica me faz viajar pelo dia-a-dia de minha vida, tanto passado, como presente, permitindo-me pincelar, muitas vezes, o momento que estou passando. É mais factual e, portanto, certas vezes, mais contusa, aguda ou cômica” continua Caminha.,

Nesta obra, Caminha reúne algumas divertidas – outras sérias – passagens de sua vivência com amigos, pacientes e, em especial, no seu quase que diário contato com os “Stammtische” (grupos de amigos), dos quais sempre foi um incentivador e cujo resgate histórico teve o autor como um dos responsáveis. Há também passagens sobre suas vivências de manézinho da ilha, “pois sou manézinho, de fato e de direito, desde criancinha, nascido na Maternidade Carlos Correa, quarto 21 e crescido nas bandas da Conselheiro Mafra e da Avenida Mauro Ramos”, acrescenta o autor.

De curiosidade em todas as crônicas, há referência a algum prato culinário – talvez por sua simpatia pelas artes da cozinha – Caminha dispõe aos leitores, ao fim de cada narrativa, receitas destes pratos, passo-a-passo, que, segundo ele mesmo afirma, foram todos experimentados antes de submetidos ao público.

São deliciosas crônicas e, não menos, saborosas receitas.

Conforme o autor, as coisas não ficarão por aí. “Por sugestão de meu amigo Tchello d’Barros. Estou preparando outros dois livros de crônicas com a mesma motivação do Saboreando. Cada um deles com receitas de entradas, sobremesas e outros pratos. Quem sabe não nasce aí uma Trilogia?”, indaga o autor de maneira divertida.
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Quem é Luiz Eduardo Caminha?
Luiz Eduardo Caminha é médico, proctologista, graduado em Florianópolis e pós-graduado no Rio de Janeiro, Inglaterra e Alemanha. Nasceu em Florianópolis, em 04/10/51, Dia de São Francisco de Assis. Residiu em Blumenau por 25 anos. Dedicou-se a inúmeras atividades sócio-comunitárias, religiosas, políticas, representativas de classe e culturais. Casado com Seluta, pai de 3 filhos, Alexandre, Luciano e Maria Eduarda e duas noras Elianir e Francielle, costuma dizer que estas são as maiores dádivas que Deus lhe concedeu.

Seus inúmeros amigos, pacientes e sua família são, para ele, “a maior alavanca para superar as dificuldades enfrentadas nos últimos 5 anos de minha vida, onde a doença me foi uma parceira infame, mas que ajudou a me lapidar”.

Exerceu estreita ligação com os meios de comunicação, uma paixão ladeada pela medicina. Foi co-responsável pelo movimento que resgatou a tradição germânica dos “Stammtische”, de seus encontros e dos encontros de amigos e patotas, em Blumenau e em Santa Catarina.

Publicou inúmeros artigos e crônicas na internet e na imprensa, onde foi colunista de “Opinião e Política” da Folha de Blumenau. Aventura-se, agora, em sua terceira produção literária, as duas primeiras com o livro de poesias Reflexos, de 1997 e o “e-book” Poemas, de 2007, editado por Iara Melo, do Portal CEN – Cá Estamos Nós (o maior site da lusofonia do mundo). É mentor e editor do site “Stammtisch, Confrarias e Patotas” http://www.stmt.com.br/ e foi Coordenador do III Encontro Luso-Brasileiro de Escritores, realizado em Blumenau entre 12 e 15 de Junho de 2008. É o atual Vice-Presidente do Portal CEN para o Brasil um Site que reúne mais de 1.200 escritores da língua portuguesa..

A par disto, é membro fundador do Capítulo Santa Catarina da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores; ocupa a Cadeira nº. 078, da Galeria dos Decanos do Conselho Acadêmico do Clube dos Escritores de Piracicaba; autor do Portal CEN – “Cá Estamos Nós”, e da Sociedade de Escritores de Blumenau (SEB).

Sua paixão por escrever vem dos tempos de Primário e aflorou em 1975 quando da aula magna proferida pelo poeta Lindolf Bell, no Curso de Artes e Comunicação da Universidade Federal de Santa Catarina. Pensava em fazer Jornalismo mas, com a transferência do Curso para Porto Alegre, desistiu e prestou novo Vestibular para Medicina. Graduou-se Médico em 1976, com especialização em Colo-Proctologia realizada no Rio de Janeiro, Londres (Inglaterra) e Wiesbaden (ex-Alemanha Ocidental).

Foi Presidente da Associação Médica de Blumenau no biênio 1992/93, Secretário de Saúde de Blumenau entre 1993 e 1996, Presidente do Conselho Estadual de Secretários Municipais de Saúde de 94 a 97 e Vice-Presidente do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde de 93 a 97.

De 1985 a 1989, editou, sozinho, o Jornal “Clarins do Vale”, impresso nas oficinas da Fundação Cultural de Blumenau. De 1989 a 1992 foi produtor e apresentador do Programa Canal Livre no Rádio, na então Rádio União AM, Rede Fronteira de Comunicação. Entre 1999 e 2002 produzia e apresentava o Programa Feliz Cidade, na TV Galega. De Abril de 2000 a agosto de 2004 produziu e apresentou o Programa Stammtisch, na mesma emissora.

Foi através deste programa que se iniciou o resgate da tradição dos “Stammtische”, em Blumenau e região. Como tal, foi um dos articuladores dos Encontros de Stammtisch (Strassenfest mit Stammtischtreffen).

Seu conhecimento e pesquisas sobre esta tradição germânica, além da estreita relação com a literatura e o jornalismo, motivaram-lhe a lançar um Sítio na Internet denominado “Stammtisch, Confrarias e Patotas” http://www.stmt.com.br/ , em 23 de dezembro de 2005. Desde abril de 2006 o site situa-se em 1º lugar entre todas as referências mundiais para o termo “stammtisch” nos principais sítios de busca do mundo (Google, Yahoo, Cadê, MSN Buscas, entre outros).

De março/2006 a julho/2007, escreveu a “Coluna Caminha” , no Jornal Folha de Blumenau.

Em 11/09/2007 foi inscrito como Jornalista no Serviço de Identificação e Registro Profissional – SIRP do Ministério do Trabalho, sob nº 2966SC.

Fontes:
Colaboração do autor

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Julieta de Godoy Ladeira (Contos Brasileiros Contemporâneos)

Feliz Aniversário
Clarice Lispector

Postada à cabeceira da mesa, a senhora, que completa 89 anos, assiste a chegada de seus filhos e noras. Um a um vão sentando-se ao redor da mesa para a comemoração. A velha senhora, ressentida com a fraqueza de seus filhos, reflete na razão pela qual “os frutos foram tão diferentes árvore que os engendrou”. O único que lhe dá prazer é Rodrigo, neto de sete anos, de rosto viril e corajoso.

Depois de cantarem “Feliz Aniversário”, aumenta a indignação da aniversariante, que cospe ao lado da mesa, afrontando a todos, depois do que pede um copo de vinho, servido com ressalvas pela nora Dorothy: “Vovozinha, não vai lhe fazer mal?” – “Que vovozinha que nada! Que o diabo vos carregue, corja de maricas, cornos e vagabundas! Explode a aniversariante.”

À hora das despedidas, a nora mais nova, Cordélia, olha uma última vez para a sogra, sentada à cabeceira: “o punho mudo e severo, fechado sobre a mesa, dizia para a infeliz nora que sem remédio amava talvez pela última vez: É preciso que se saiba. É preciso que se saiba. Que a vida é curta. Que a vida é curta.”

Superado o momento das despedidas, resta a velha, “erecta, definitiva”, à cabeceira da mesa. “A morte era seu mistério”.

O caráter epifânico é uma das marcas registradas de Clarice Lispector. Em todos os seus relatos, os personagens vivenciam experiências que os despertam para determinadas verdades como que encobertas por um véu de mediocridade. A situação vivenciada por Dorothy em uma fração de segundo teve esse caráter. A atitude após a descoberta é que permanece uma incógnita.

Desvendando toda a hipocrisia que permeia as relações familiares, a autora também põe em relevo a situação na qual se encontra a aniversariante. Praticamente abandonada por todos os filhos, que reúnem-se em sua casa a cada aniversário, vivendo com Zilda, a filha solteira, espera a morte, inconformada com este tratamento.

Clínica de Repouso
Dalton Trevisan

Maria mora com a mãe, dona Candinha, que começa a implicar com a presença de um hóspede: João. Ao descobrir os dois aos beijos no sofá, e sendo informada que João é noivo da filha, pressiona a filha para mandá-lo embora. Assustado com a situação, João vai-se embora, e as brigas entre mãe e filha põem dona Candinha doente. Sob os cuidados da filha, sente-se bem, mas continua de cama, gostando do tratamento que está recebendo.

Com o passar dos dias, Maria decide internar a mãe no Asilo Nossa Sra. da Luz, entre doidos, epiléticos e alcoólatras, no qual um sistema de alto-falantes (o dr. Alô) ameaça com choques e injeções na espinha a quem reclamar. “D. Candinha sustentava-se a chá de mate e biscoito duro”.

Ressentida com o tratamento que a filha que criara lhe devota, a velha, internada no asilo, vê os dias passarem tratando uma mosca grande que, afeiçoada a ela, vem alimentar-se sobre sua mão.

Daton Trevisan consegue captar o poético a partir de textos extremamente objetivos. Dona Candinha, abandonada pela filha, encontra consolo em uma última companheira: a mosca. É importante perceber que a atmosfera construída pelo autor resgata o lirismo a partir de um final absolutamente insólito.

Os Músculos.
Ignácio de Loyola Brandão

(…) os fatos
Em uma manhã de domingo, ao passar o rastelo pelo terreno reduzido de sua horta de 4 metros quadrados, Danilo depara com um arame de fio de aço inoxidável entranhado na terra. Surpreso, escava e não encontra a origem da estranha “planta”. Aos poucos o arame cresce e toma conta de toda a horta, e a plantação de arame produz o suficiente para cercar casas, cidades e o país.

Acossado por acusações de vizinhos, perseguido por processos movidos por grandes casas do ramo, que o acusam de não recolher impostos pela produção de arame, que continua a crescer em seu quintal, o homem abre uma brecha por entre a floresta de arame buscando refúgio. Ninguém teria coragem de penetrar ali para buscá-lo, e ele se dá conta que os reflexos do sol reluzindo sobre os fios de arame formam desenhos inusitados; o vento soprando, produz sons agradáveis, agradáveis o suficiente para embalá-lo.

Sob o jugo da vida na cidade, os personagens das obras de Inácio de Loyola Brandão sujeitam-se ao isolamento que esta vida lhes impõem. Entretanto, no auge do desespero, surge uma saída: adentrar à “floresta de arame”, e tentar discernir o belo mesmo naquelas condições. Apercebendo-se dos desenhos e da música que o sol e o vento produzem, o personagem também encontra um refúgio para a vida opressiva que lhe é imposta.

Guardador
João Antônio

Jacarandá tenta ganhar a vida como guardador de carros. Mora (ou se esconde) no oco do tronco de uma árvore. Às vezes, bebendo, começa a pensar sobre os tipos de pessoas que dão esmola. São três: o primeiro – uns poucos – dá por entender o “misere”; o segundo, para ver-se livre do pedinte; o terceiro tipo, “otários de classe média”, dá esmola para não parecer “duro” – “Para eles, não ter cai mal”.

Domingo, saída de missa , ele pensa nos dois tipos de piedade: o de dentro e o de fora da igreja; “por quê resistem ao pagamento da gorjeta?”.
Volta e meia Jacarandá é preso. Umas duas semanas de cadeia, desintoxicado, volta ao trabalho. Agora é outro. Movimentos rápidos, o corpo magro, lembra o corpo do jovem passista que ele foi.. Mas não passa-se uma semana e ele volta à cachaça.

Certa noite, “um bacana enternado, banhado de novo” lhe estende uma moeda. Altaneiro no seu porre, Jacarandá recusa: “trabalho com dinheiro; com esse produto não, doutor.” O carro sai cantando pneus, “Xará, eu ganho mais que ele. É que não saio do botequim”.

Dedicando-se ao submundo daqueles que não têm nenhuma perspectiva, João Antônio desvenda a personalidade de uma figura deste ambiente. Jacarandá, o bêbado guardador de carros, consegue perceber as razões pelas quais os que lhe dão gorjetas o fazem. Não há espaço para ilusões neste mundo, mas o personagem principal encontra uma maneira de rebelar-se: o tratamento que dirige ao motorista nos sugere um homem que, mesmo em situação crítica, procura manter a dignidade.

Há que se perceber também o trabalho de linguagem. A gíria do guardador é utilizada ao longo do texto, em expressões como “uca, pé-de-cana, muquiras, chué”, que sugerem uma distância intransponível entre o guardador e aqueles a quem cobra seus serviços.

A Máquina Extraviada
José J. Veiga

Mandando notícias do sertão para seu compadre, o narrador fala do último grande acontecimento: a chegada de uma máquina descarregada defronte à Prefeitura.
Depois de montada, “a máquina ficou ao relento, sem que ninguém soubesse quem a encomendara nem para que servia”. As crianças, aos poucos, começam a brincar na máquina, tiram o encerado que a cobre, e pulam entre suas engrenagens.

Apesar de estar na cidade há tempos, a máquina continua causando sensação. Não há quem passe sem olhá-la; até mesmo as velhinhas que saem da igreja, ao passar pela máquina, fazem uma curvatura reverente.

Ninguém sabe quem a comprou, mas o prefeito designou um funcionário da prefeitura para zelar pela máquina. Ela tornou-se o orgulho da cidade. O antigo coreto, no qual realizavam-se as festividades foi abandonado. As festas são realizadas defronte à máquina, que ocupa cada vez um espaço maior na vida da cidade.

O único acidente ocorreu com um jovem bêbado, que, ao sair de uma serenata, decidiu dormir no alto da máquina. Rolou lá de cima, e com a queda, acionou algumas engrenagens que “comeram” sua perna. Hoje ele ajuda a zelar pelas partes baixas da máquina.

“Minha maior preocupação é alguém chegar aqui e dizer para que serve a máquina. Ao fazê-la funcionar, quebrar-se-á o encanto, e não existirá mais máquina”.

Traço importante deste conto é a ambientação em um contexto rural, no qual a máquina surge como elemento estranho aos poucos absorvido. José J. Veiga utiliza o episódio de forma a ilustrar a capacidade de o homem aceitar o estranho e respeitá-lo, enquanto estranho. Por isso, a explicação da serventia da máquina faria com que esta perdesse a magia capaz de suscitar o respeito.

A Caçada
Lygia Fagundes Telles

Em uma loja de antiguidades, um homem encontra uma grande tapeçaria, suspensa sobre a parede. Admirado, tenta lembrar-se de onde, ou em que tempo, já havia assistido àquela cena: um caçador de arco retesado, apontando para uma touceira espessa; outro caçador, este uma figura mais apagada, também espreitava a caça. “Teria sido uma personagem da tapeçaria? Mas qual? O caçador em primeiro plano? O outro?”

Tão viva é a gravura, que ele pressente o arquejar da caça escondida. Talvez tivesse sido o pintor da tapeçaria, “mas se detesto caçadas! Por quê tenho de estar aí dentro?”
Saindo da loja, a imagem não desaparece. Ao dormir, sonha com a tapeçaria, ele entrelaçado à paisagem. Apalpa o rosto, procurando a barba do primeiro caçador, mas ao invés disso, sente a viscosidade do sangue, e acorda com um grito.

Na manhã seguinte, volta à loja. Ao defrontar-se com a tapeçaria, vê a loja sumindo e a tapeçaria se alastrando pelo chão, até tomá-lo por inteiro. Agora estava dentro da tapeçaria. Era importante correr. Era a caça? O caçador? “Gritou e mergulhou em uma touceira. Ouviu o assovio da seta varando a folhagem, a dor! “Não … – gemeu de joelhos. Tentou ainda agarrar-se à tapeçaria. E rolou encolhido, as mãos apertando o coração”.

Lygia Fagundes Teles é uma contista que prima por trabalhar o aspecto psicológico em suas obras. A angústia do personagem criado pela autora pode ser interpretada como a angústia despertada pela busca de si mesmo, processo que pode fazer com que o homem passe da situação de caça à de caçador em um instante.

Luz sob a porta
Luiz Vilela

Nélson está com alguns amigos bebendo chopp em uma festa. Preocupado com as horas, decide ir-se. É o aniversário de sua mãe e já são onze e vinte.

É com muita dificuldade que à consegue desvencilhar-se dos amigos, e ao chegar a casa de sua mãe já são cinco para a meia-noite. “Havia luz sob a porta, ela estava esperando-o”.

A recepção é triste. A mãe reclama da idade e do esquecimento a que foi relegada. Fala-lhe do medo que tinha que ele não viesse.
Desculpando-se por não haver trazido um presente, Nélson consola a mãe que chora.

Todo o conto é desenvolvido através de diálogos. A economia do autor é expressa de forma a criar situações nas quais o diálogo seja suficiente para evocar o almejado. Assim, à futilidade dos diálogos entre os amigos do bar ( “Imaginem só: me deu a maior cantada!” – Kafka? Estou lendo. O processo.”) sobrepõe-se a densidade do diálogo entre mãe e filho ( “Quer dizer que a senhora passou o dia sozinha?” – “Passei, mas não teve importância; arrumei uma costurinha pra fazer.”).

Ao mesmo tempo que explicita a dramaticidade do relato, esta estratégia também coloca o trabalho com a linguagem em um plano privilegiado.

A Moça Tecelã
Marina Colasanti

A cada amanhecer, a moça, com seu tear, passava os dias tecendo. “Linha clara para começar o dia.(…) Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava”.

Com o passar do tempo, sentindo-se sozinha, pensa que seria bom ter um marido a seu lado. “Com capricho de quem tenta uma coisa desconhecida” ela vai tecendo sua companhia. Ao fim do trabalho, batem a sua porta: “Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando na sua vida”.

Aos poucos, a moça vai tecendo a casa, que não basta ao marido. Ele agora quer um palácio, que toma meses de trabalho da tecelã. Na torre mais alta deste palácio fica a moça trabalhando, e com o passar do tempo, sente-se sozinha, tecendo as riquezas que o marido exige.

Uma noite, enquanto o marido dorme, ela levanta-se e desmancha todo o tapete, tornando a sua solidão.

Note-se que a autora coloca nas mãos da moça tecelã o poder de começar e romper a relação. É ela que “tece” o marido e engendra o meio familiar. Mas também é ela que “tece a própria solidão”. Tendo o universo feminino como fonte, Marina Colasanti desvela a alma da mulher que prefere, a uma relação que a subjuga, a antiga solidão.

No retiro da Figueira
Moacyr Scliar

Angustiada com a violência da cidade, uma família recebe pelo correio o prospecto de um condomínio fechado chamado Retiro da Figueira, “um dos últimos lugares onde você pode ouvir um bem-te-vi cantar”.

Holofotes, cerca eletrificada, vigilantes, sistema de alarmes, tudo remetia à idéia de segurança absoluta. A família mudou-se, e uma das primeiras exigências do chefe dos vigilantes foi uma lista de parentes e amigos dos moradores, “questão de segurança, para qualquer emergência”.

Uma segunda-feira, soa a sirene de emergência, e todos reúnem-se no salão de festas, onde são informados que a fuga de alguns presidiários impossibilitará a saída dos moradores do condomínio; “questão de segurança” informa-lhes o chefe dos vigilantes.
Quatro dias depois, o condomínio cercado, desce um jatinho no aeroporto do condomínio e uma mala cheia de dinheiro é entregue ao chefe de segurança, que decola com o dinheiro, acompanhado de sua equipe. “Nunca mais vimos o chefe e seus homens, mas estou certo que estão gozando o dinheiro pago por nosso resgate”.

O isolamento a que se sujeita o homem que se cerca é tratado ironicamente pelo autor gaúcho. As cercas que tornam o espaço seguro, também distanciam o homem, e o absurdo da situação torna ainda mais cômico um final inesperado: aqueles responsáveis pela segurança tornam-se os algozes dos que preferiram o ambiente cercado.

Botão-de Rosa
Murilo Rubião

Numa segunda-feira de março, todas as mulheres da cidade amanhecem grávidas, e o músico Botão-de-Rosa é acusado. Ouve a chegada da multidão: “vinham pegá-lo”. Ao sair à janela para deixar clara sua intenção de entregar-se é apedrejado.
Escoltado, segue até a prisão onde José Inácio é designado seu defensor. Todo o processo, repleto de falhas é analisado, e a resignação do acusado, negando-se a declarar sua inocência, colocam o advogado em uma situação delicada.

À acusação de sevícia, soma-se a de tráfico de entorpecentes, e Botão-de-Rosa continua impassível, enquanto José Inácio, pressionado pelo povo da cidade, tem uma atuação medíocre na defesa, o que colabora para a sentença de morte do acusado.
A produção de Murilo Rubião caracteriza-se pela exploração de um recurso desenvolvido por diversos autores latino-americanos: o Realismo-Mágico. Botão-de-Rosa abre mão da oportunidade de defender-se por saber-se condenado de antemão. Sua situação marginal (músico em uma cidade pequena) é que sofre a condenação.

A atitude adotada pelo advogado José Inácio cristaliza esta situação. Sua atuação é medíocre por que entre indispor-se com as autoridades comprometendo seu futuro e permitir a condenação do músico, escolhe a segunda alternativa.

Noivado
Osman Lins

Giselda e Mendonça conversam sobre as perspectivas deste último, que está prestes a aposentar-se de seu trabalho na repartição pública. Namorados há vinte e oito anos, Giselda já habituou-se a manter nas malas seu enxoval, enquanto recebe periodicamente a visita dos antigos “Mendonça”. Seu preferido é o Mendonça sensível, aos dezessete anos, muito diferente daquele aos trinta e nove anos que abriu mão dos sonhos para mergulhar em uma vida medíocre de funcionário público.

Conversando com o noivo sob o olhar silencioso dos dois outros “Mendonça”, a noiva comenta, em tom de despedida: “um homem, para ser saqueado, precisa abrir as portas”, referindo-se à entrega do amante à vida de burocrata.
“Passa por mim, com seu barulho de correntes arrastadas, de arame farpado rasgando couro de bois.”

Noivado é trabalhado de forma que possamos perceber as três perspectivas: a do noivo, da noiva, e dos momentos a dois. Esta diversidade de focos narrativos faz com que saibamos o que se passa com cada um dos interlocutores, e é uma maneira que nos coloca imersos no relato, como parte atuante.

Giselda sabe que o afastamento entre ela e o noivo ocorreu há muito tempo atrás, e todo o questionamento a que se propõe Mendonça é incapaz de resgatar o homem que já existiu onde hoje há um funcionário público.

Circuito Fechado
Ricardo Ramos

Circuito Fechado – 1 –

Trabalhando exclusivamente com substantivos (Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água.) Ricardo Ramos foca o despertar do homem no ambiente urbano completamente tomado pela rotina. Preso ao relógio, este homem não consegue romper o circuito, que fecha-se com a volta aos chinelos: (Chinelo. Coberta, cama travesseiro.)

Circuito Fechado – 2 –

Fechado em sua “memória intermediária” (“não a de muito longe, nem a de ontem”), o personagem sente o desbotar que ocorre com o passar dos anos refletido no retrato. Vem dessa memória intermediária a sensação de perda. “Os dias, não as noites, são o que mais ficou perdido”.)

Circuito Fechado – 3 –

Em um monólogo apressado, no qual inferimos respostas monossilábicas de diversos interlocutores, o autor expõe o isolamento ao qual o personagem vai se sujeitando, na medida que aumenta sua insensibilidade.

Tudo nos sugere uma distância intransponível, e os diálogos impessoais mantidos com secretárias e atendentes, repete-se com a esposa: “Vamos dormir? É, leia que é bom. Ainda agosto e esse calor. Me acorde cedo amanhã, viu?”.

Circuito Fechado – 4 –

Tematizando o sentimento de posse (“Ter, haver”) o autor demonstra como este sentimento de posse apropria-se do personagem, e como este, objeto dessa sensação, torna-se incapaz de fugir ao círculo vicioso. “Uma prisão que segura” e ao mesmo tempo evoca as diversas lembranças de infância, na qual não havia este tipo de preocupação.

Circuito Fechado – 5 –

Retornando à rotina evocada em Circuito Fechado – 1 – , o autor condensa o sentimento de impotência expresso nos outros episódios. Perceba-se o caráter pessimista desde o começo do texto, iniciado com uma negativa, “Não. Não foi o belo” .

Aos poucos, aprofundando-se em muitas outras negativas, o texto nos suscita a sensação da perda absoluta de concretude, de inversão total de valores, culminando com a constatação do erro de avaliação na inversão desses valores: “Não foi sempre, nem faltou, foi mais às vezes. Não foi o que, foi como e onde, e quando. Não, não foi.

Composição II
Sérgio Sant’Anna

Uma Sala.
Descrevendo a sala (paredes, mesa, sofá, gramofone e televisão, na qual a imagem de uma moça anunciando uma televisão idêntica repete-se infinitamente), um homem albino sentado na sala em posição de ioga segura uma guitarra elétrica, “apontada para o observador como se fosse uma metralhadora (…) mas da ponta da metralhadora – ou guitarra – saem balas de confeitaria e escorre, fracamente, um líquido amarelado”.

Duas mãos rompem o papel celofane que envolve toda a cena, retirando um disco e colocando-o em um toca-discos em uma outra sala, nova e bem organizada. “Desliga-se a televisão e apaga-se a luz”. E ouve-se a letra da canção: “Estou farto de tudo e vou tomar o ônibus vinte e sete e viajar para outra galáxia”.

Como uma cena, o universo do artista impassível é maculado pela mão que rompe o celofane para ouvir a música do disco. É importante perceber os dois ambientes (uma sala desarrumada coberta por papel celofane na qual o guitarrista medita e a outra, extremamente organizada na qual o disco será reproduzido),como que ilustrando dois ambientes diversos e incomunicáveis.

Nunca é Tarde, Sempre é Tarde
Sílvio Fiorani

Su acorda-se e maquia-se para o trabalho. Olha-se apressadamente no espelho, não se preocupando com beleza, “Beleza é pra fim de semana”. Ao colocar a mão na maçaneta, ouve o ruído da campainha de seu relógio Westclox, “e se deu conta de que sequer havia-se levantado. Tudo por fazer”. Repete os mesmos gestos mecanicamente, e a situação torna a acontecer: novo despertar com a campainha do relógio. Decide apelar para a mãe que, “envolta pelos vapores da cozinha”, promete à filha acordá-la.

Submetida à rotina que torna todos seus gestos automáticos, Su necessita de alguém que a desperte. É importante perceber que o auxílio de outra pessoa é necessário para “acordar” a personagem de um sonho que teima em acontecer e que a desgasta.

Fonte:
http://www.pvsinos.com.br/jornal/edicao99_1/ed99_1_contos_br_contemporaneos.htm

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Fábio Pestana Ramos (Por mares nunca dantes navegados)

A árdua conquista dos mares. Há mais de quinhentos anos, os portugueses iniciaram um processo que mudaria a face do mundo: lançaram-se à empreitada marítima. A coragem de desbravar e encontrar novas rotas era marca dos aventureiros portugueses, que se lan

A árdua conquista dos mares. Há mais de quinhentos anos, os portugueses iniciaram um processo que mudaria a face do mundo: lançaram-se à empreitada marítima. A coragem de desbravar e encontrar novas rotas era marca dos aventureiros portugueses, que se lançaram em águas tão inóspitas quanto as terras que descobriram nos séculos XV, XVI e XVII. A Editora Contexto iça as velas da história e apresenta o livro Por mares nunca dantes navegados: a aventura dos Descobrimentos, escrito pelo historiador Fábio Pestana Ramos. Ele leva o leitor a uma fantástica viagem pelos oceanos, a bordo de naus e caravelas, passeando ao lado de passageiros e marujos, prostitutas e religiosos, oficiais e degredados, comerciantes e escravos. Portanto, Ramos buscou documentação manuscrita inédita, coletada nos arquivos portugueses.

O que os motivava? Como era o cotidiano a bordo? O que encontraram no trajeto? Chegariam? Realizariam seus sonhos? Em Por mares nunca dantes navegados, o leitor acompanhará os dramas pessoais e coletivos da gente embarcada nos navios lusitanos, no tempo dos Descobrimentos e das Grandes Navegações. Conhecerá as ambições de Portugal e dos portugueses, explicadas dentro do contexto da época.

O inferno podia se instalar durante tempestades, calmarias e naufrágios. Mas o inferno também podia se instalar dentro das embarcações. O ‘marinheiro’ convidado a ler esse livro sentirá na pele, dos outros, as privações, os perigos e os invariáveis conflitos sociais enfrentados em alto mar. As doenças, provindas da falta de higiene e a alimentação, quase sempre insuficiente para todo o trajeto, eram constantes. Mulheres e crianças embarcadas muitas vezes não escapavam da ‘sede’ dos marujos, já que violações eram práticas comuns. As leis da terra não eram empregadas no mar. Os oficias faziam vistas grossas para os abusos, isso quando não participavam deles.

E se a travessia marítima não era fácil, o desembarque, na África, na Ásia ou na América, também podia reservar surpresas e situações perigosas. Deparando-se com realidades totalmente diversas da vivida no Velho Mundo, esses viajantes tornaram-se os principais protagonistas de encontros e desencontros culturais, violências e conflitos com nativos, em cenários de destruição, exploração e extermínio. E ao mesmo tempo em que foram desenvolvidas relações comerciais, surgiram povoados e cidades, e a paisagem foi modificada.

A paisagem brasileira começou a ser modificada oficialmente em 1500, mas hoje quase ninguém contesta a presença portuguesa antes dessa data. Entre os navegadores Bartolomeu Dias (1488) e Vasco da Gama (1497) existem diversas possibilidades de um possível Descobrimento ou ‘achamento’ como preferem alguns, que só não foi anunciado porque havia um entrave diplomático entre Espanha e Portugal. Fábio Pestana Ramos conta em detalhes a manobra política feita para garantir tal feito. Com a parte jurídica acertada, coube a Pedro Álvares Cabral oficializar o ‘achado’, antes de cumprir a sua verdadeira missão: acertar um tratado de paz com os governos indianos. Com o Brasil oficialmente descoberto, Cabral partiu para as Índias, onde não obteve muito sucesso, o que acabou frustrando toda a missão e o rei D. Manuel. Depois disso, nunca mais esse fidalgo comandou sequer um navio.

Indicada a todos os interessados em embarcar nesta jornada recheada de aventuras, a obra é uma leitura divertida e muito bem fundamentada historicamente. Paraíso ou inferno? É o que veremos em Por mares nunca dantes navegados. Todos a bordo!
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Fábio Pestana Ramos possui Bacharelado e Licenciatura Plena em Filosofia pela Universidade de São Paulo e Doutorado em Ciências (História Social) também pela USP, onde foi orientado pela profa. Dra. Mary Del Priore. Já atuou como docente no curso de história da PUC de Campinas e como professor titular na Uniban, onde, além de lecionar nos cursos de história, pedagogia e administração de empresas, entre outros, exerceu o cargo de coordenador dos cursos de letras e pedagogia e fez parte do corpo docente do mestrado em educação; tendo também exercido atividade de ensino em outras grandes universidades particulares e como pesquisador da FAPESP. Atualmente é professor, na graduação e especialização, em universidades privadas como colaborador e docente concursado na autarquia municipal Fundação Santo André. Tem experiência docente na área de Educação, História, Filosofia, Sociologia e Antropologia; com intensa atividade de pesquisa e passagens por arquivos históricos no Brasil e em Portugal, tal como a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, o Arquivo Público do Estado da Bahia, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo Histórico Ultramarino, Biblioteca Nacional de Lisboa e Biblioteca Central da Marinha Portuguesa. Já recebeu pelos seus trabalhos de pesquisa uma menção honrosa da USP e, na qualidade de co-autor, o prêmio Jabuti e o prêmio Casa Grande e Senzala. Possui farto volume de publicações, em revistas Acadêmicas e na mídia impressa de grande circulação, tal como Jornal do Brasil, Folha de São Paulo e as Revistas Superinteressante e Aventuras na História; participou, como co-autor, de vários livros, como, por exemplo, a obra clássica História das Crianças no Brasil ; é autor dos livros “Por mares nunca dantes navegados”, “No tempo das Especiarias” e “Naufrágios e Obstáculos”, amplamente citados pela mídia e utilizados como material didático em nível superior.

Fonte:
Colaboração de Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece

Curriculo Lattes.

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Domingos Pellegrini (O Caso da Chácara Chão )

Romance conta o assalto a uma chácara

O escritor Domingos Pellegrini produziu algumas obras primorosas e é um dos maiores escritores brasileiros da atualidade. Ele reside numa chácara perto de Londrina, Paraná e divide seu tempo entre o trabalho literário e os afazeres da terra, que de alguma forma se assemelham na possibilidade de contato com a essência.

Vencedor do Prêmio Jabuti 2001 com o romance “O caso da chácara chão”, Editora Record, certamente inspirado em sua opção de vida, novamente vemos Pellegrini concorrer ao mais importante prêmio literário brasileiro (em vigor desde 1959), com o romance “No coração das Perobas”.

Na definição do próprio autor, trata-se de um painel das revoluções brasileiras; aliás, seu primeiro livro, “O homem vermelho”, foi o vencedor do Prêmio Jabuti em 1977.

Dentre a vasta obra do escritor paranaense existe uma antologia de contos chamada “Pensão Alto Paraná” reeditada na Coleção Brasil Diferente, da Imprensa Oficial do Paraná em 2000, cujos contos apresentam a força da rudeza dos pés vermelhos e a poeticidade mais profunda na percepção do ser humano acabado, definido e destinado de antemão.

Segundo Rodrigo Penteado, não se vêem meias palavras, rubores fora de lugar ou palavras exageradas. A simplicidade prática de suas personagens permite que o texto desfira certeiro sobre nós, leitores. As reminiscências de uma infância familiar e cheia dos mistérios assistidos pelos adultos como coisa finita e sem nenhuma sentimentalidade ou nostalgia é marca presente nesta antologia de contos e em outras publicações, como “Tempo de Meninos”.

Em “O Caso da Chácara Chão”, romance que está na relação de leitura obrigatória dos vestibulares das Faculdades Toledo de Araçatuba, Pellegrini vive numa chácara nos arredores de Londrina e certamente foi daí que tirou inspiração para seu premiado romance, criando Alfredo Manfredi, uma espécie de alter ego do escritor, também ele autor de livros juvenis, que decide fugir do estresse da cidade grande indo abrigar-se numa chácara. É neste momento que a ficção assume a trajetória do livro com um assalto que transforma completamente a vida de Manfredi e de sua família.

A trama, desenvolvida num ritmo cinematográfico, próprio do gênero policial, envolve Olga, a mulher do escritor, com os assaltantes, criando um clima tenso de ruptura, em que o que era um assalto comum torna-se motivação para uma crise psicológica com dúvidas, inseguranças e cogitações sobre o crime passional.

Como destaca o autor, alguns ingredientes bem brasileiros são forças presentes na narrativa, tais como – “violência, drogas, corrupção policial, burocracia, jornalismo sensacionalista, racismo, conformismo e também amor, perdão, revolta e amizade

Fontes:
http://www.portrasdasletras.com.br
Capa do livro =
http://www.editoras.com

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Clarice Lispector (Felicidade Clandestina)

A narradora recorda sua infância no Recife. Ela gostava de ler. Sua situação financeira não era suficiente para comprar livros. Por isso, ela vivia pedindo-os emprestados a uma colega filha de dono de livraria. Essa colega não valorizava a leitura e inconscientemente se sentia inferior às outras, sobretudo à narradora. Certo dia, a filha do livreiro informou à narradora que podia emprestar-lhe “As Reinações de Narizinho”, de Monteiro Lobato, mas que fosse buscá-lo em casa. A menina passou a sonhar com o livro. Mal sabia a ingênua menina que a colega queria vingar-se: todos os dias, invariavelmente, ela passava na casa e o livro não aparecia, sob a alegação de que já fora emprestado. Esse suplício durou muito tempo. Até que, certo dia, a mãe da colega cruel interveio na conversa das duas e percebeu a atitude da filha; então, emprestou o livro à sonhadora por tanto tempo quanto desejasse. Essa foi a felicidade clandestina da menina. Fazia questão de “esquecer” que estava com o livro para depois ter a “surpresa” de achá-lo. “Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com seu amante.”

Uma amizade sincera: O narrador conheceu um colega de escola no último ano de estudo. Desde então, tornaram-se amigos inseparáveis. Quando não estavam conversando pessoalmente, falavam-se pelo telefone. A partir de certo momento, os assuntos começaram a faltar. Às vezes, marcavam encontro e, juntos, não tinham sobre o que conversar. Calados, logo logo se despediam e, ao chegar cada qual em sua casa, a solidão batia mais forte.

A família do narrador mudou-se para S. Paulo e ele, então, ficou no apartamento dos pais. O amigo morava sozinho, pois seus parentes ficaram no Piauí. A convite do outro, dividiram o mesmo apartamento. Ficaram alegres, porém instalou-se a falta de assunto. Só tinham amizade e mais nada. Tentaram organizar umas farras no apartamento, contudo a vizinhança reclamou. As férias foram angustiantes. A solidão de um ao lado do outro era incômoda demais. Quando o amigo teve uma pequena questão com a Prefeitura, o narrador fez disso pretexto para uma intensa movimentação, assumiu cuidar de toda a documentação exigida. No fim do dia os dois tinham assunto, pois exageravam as palavras no comentário de detalhes de pouca importância. Foi então que o narrador entendeu por que os namorados se presenteiam, por que marido e mulher cuidam um do outro e por que as mães multiplicam o zelo pelos filhos. É para terem oportunidade de ceder a alma um ao outro.

Resolvida a questão com a Prefeitura, os dois arrumaram falsas justificativas de viajarem sós para estar com as respectivas famílias. Sabiam que nunca mais se reveriam. “Mais que isso – conclui o narrador – que não queríamos nos rever. E sabíamos também que éramos amigos. Amigos sinceros.”

Miopia Progressiva: O menino era tido como inteligente e astuto em casa. O que ele dizia provocava olhares mútuos de confirmação de sua superioridade. Então ele começou a compreender que dependia dele a boa convivência dos membros da família. Quando não era ele o centro das atenções, eles se desentendiam. Para apoderar-se da chave de sua inteligência, o menino costumava repetir seus ditos; mas ninguém prestava mais atenção. Essa instabilidade dos familiares passou para ele, que adquiriu, então, um hábito mantido o resto da vida: pestanejava e franzia o nariz, deslocando os óculos que usava por causa da miopia.

Toda vez que desenvolvia esse cacoete, era sinal de que estava interiormente tendo noção de sua instabilidade. Certa vez, disseram-lhe que passaria o dia inteiro na casa de uma prima casada, sem filhos, que adorava crianças. Ali, pressentiu ele, não haveria instabilidade: o tempo todo seria julgado o mesmo menino. Na semana que antecedeu a esperada visita, a cabeça do menino ferveu: como se apresentaria diante da prima? Inteligente? Bem comportado? Quem sabe até como palhaço? Triste talvez? Sentia até aperto no estômago quando antecipava a situação de que ia ser amado sem seleção, sem escolha, o que representava uma estabilidade ameaçadora. Aos poucos, suas preocupações passaram a ser outras: que elementos ele daria à prima para ela ter certeza de quem ele era? Como encararia o amor que ela nutria por ele? Ao entrar na casa da prima, duas surpresas o desnortearam (ele se desnorteava com surpresas): a prima tinha um dente de ouro no lado esquerdo da boca; ela o recebeu com naturalidade, sem evidenciar amá-lo.

Já que suas previsões foram por terra, resolveu brincar de não ser nada. No entanto, à medida que o dia avançava, o amor da prima se evidenciou. Era um amor sem gravidez: ela queria que ele tivesse nascido dela; por isso demonstrava o amor estável, a estabilidade do desejo irrealizável. Amor que incluía paixão, a paixão pelo impossível. Quando o menino descobriu o ingrediente da paixão no amor, ele perdeu a miopia e viu o mundo claramente. Foi como se ele tivesse tirado os óculos e a própria miopia o fizesse enxergar. Desde então, talvez, ele adquiriu o novo hábito de tirar os óculos a pretexto de limpá-los “e, sem óculos, fitava o interlocutor com uma fixidez reverberada de cego.”

Restos do Carnaval: A menininha de Recife gostava de carnaval. Entretanto, a atenção da família se concentrava na doença da mãe; por isso, se permitia pouca participação da menina na folia: ficava até onze horas da noite, ao pé da escada do sobrado onde morava, olhando os outros se divertirem. Passava o carnaval inteiro economizando o lança-perfume e o saco de confetes que ganhava. Ela não se fantasiava; porém, cheia de felicidade, se assustava com os mascarados e até conversava com alguns deles. Aos oito anos, houve um carnaval diferente. A mãe de uma amiguinha fantasiou a filha de rosa, usando papel crepom; com as sobras, fez a mesma fantasia para ela. Os cabelos ficariam enrolados e lhe passariam baton e rouge.

Desde cedo, ela viveu a expectativa do momento de vestir a fantasia; a euforia era tanta que até superou o orgulho ferido de ganhar um presente porque sobrou papel. Quase na hora de ser fantasiada, a mãe dela subitamente piorou de saúde. Coube à menina, sem os cabelos enrolados e sem maquiagem, correr pela rua para buscar remédio. Mais tarde, acalmada a crise da mãe, ela saiu com a fantasia completa, contudo o encantamento já não existia mais. Como poderia ela se divertir, se a mãe estava mal? Só horas depois veio a compensação: um garoto de doze anos encheu a cabeça dela de confetes. “Considerei pelo resto da noite que alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.”

O Grande Passeio: Uma velhinha pobre andava pelas ruas. Era apelidada de Mocinha. Havia sido casada, tivera dois filhos: todos morreram e ela ficou sozinha. Depois de dormir em vários lugares, Mocinha acabou, não se sabia por que, passando a dormir sempre nos fundos de uma casa grande no bairro Botafogo. Cedinho ela saía “passeando”. Na maior parte do tempo, a família moradora da casa se esquecia dela.

Certo dia, a família achou que Mocinha já estava lá por muito tempo. Resolveram levá-la para Petrópolis, entregá-la na casa de uma cunhada alemã. Um filho da casa, com a namorada e as duas irmãs, foi passar um fim-de-semana lá e levou Mocinha. Na noite anterior, a velhinha não dormiu, ansiosa por causa do passeio e da mudança de vida. Como se fossem flashes descontínuos, vinham-lhe à cabeça pedaços de recordações de sua vida no Maranhão: a morte do filho Rafael atropelado por um bonde; a morte da filha Maria Rosa, de parto; o marido, contínuo de uma repartição, sempre em manga de camisa – ela não conseguia se lembrar do paletó… Só conseguiu dormir de madrugada. Acordaram-na cedo e a acomodaram no carro.

A viagem transcorreu para Mocinha entre cochilos e novos flashes de memória com cenas entrecortadas da vida passada. Foi deixada perto da casa do irmão do rapaz que dirigia, Arnaldo; indicaram-lhe o caminho e recomendaram que dissesse que não podia mais ficar na outra casa, que Arnaldo a recebesse, que ela poderia até tomar conta do filho… A alemã, mulher de Arnaldo, estava dando comida ao filho; deixou Mocinha sentada sem lhe oferecer alimento, aguardando o marido. Este veio, confabulou com a mulher e disse a Mocinha que não poderia ficar com ela. Deu-lhe um pouco de dinheiro para que tomasse um trem e voltasse para a casa de Botafogo. Ela agradeceu e saiu pela rua. Parou para tomar um pouco de água num chafariz e continuou andando, sentindo um peso no estômago e alguns reflexos pelo corpo, como se fossem luzes. A estrada subia muito. “A estrada branca de sol se estendia sobre um abismo verde. Então, como estava cansada, a velha encostou a cabeça no tronco de árvore e morreu.”

Come, meu filho: A mãe dá comida ao filho Paulinho e ele fica puxando conversa para evitar ter que comer. Os assuntos que ele traz são desconexos, simples pretextos para não comer. Por exemplo: o mundo é chato e não redondo; o pepino parece “inreal”, faz barulho de vidro quando a gente mastiga; quem teria inventado o feijão com arroz; o sorvete é bom quando o gosto é igual à cor… A mãe, paciente, vai respondendo laconicamente e insistindo em que Paulinho não converse tanto e coma. No fim, ele pergunta se é verdade que adivinhou que ela o olha daquele jeito não é para ele comer, mas porque gosta dele. A mãe diz que ele adivinhou sim, mas torna a insistir em que ele coma. Paulinho retruca: “ – Você só pensa nisso. Eu falei muito para você não pensar só em comida, mas você vai e não esquece”.

Perdoando Deus: Andando pela Avenida Copacabana, a narradora teve uma sensação inédita: sentiu-se a mãe de Deus, o qual era a própria Terra, o mundo. Teve um carinho maternal por Deus. Foi quando ela pisou num rato morto. Encheu-se de susto e pavor como uma criança. Então revoltou-se contra Deus. Por que num momento de tanta beleza interior ela tinha topado exatamente com um rato? Teve vontade de negar que Deus existisse como Deus… Mas percebeu que esse pensamento é a vingança dos fracos quando tomam consciência de sua fraqueza.

Concluiu que a sensação tão solene que tivera era falsa, estivera amando um mundo que não existe (“ no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é. E porque ainda não sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele.(…) Como posso amar a grandeza do mundo se não posso amar o tamanho da minha natureza?”) Finalmente, ficou esclarecido na mente dela que estava querendo amar a um Deus só porque ela não se aceitava. Ela estaria amando um Deus que seria seu contraste, esse Deus seria apenas um modo de ela se acusar. “Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe”.

Tentação: À tarde, sentada nos degraus de uma escada, em rua deserta do Grajaú, a menininha pobre, ruiva, solitária estava com um soluço seco a incomodá-la. Nisso, veio passando um cachorro basset ruivo. Parou diante da menina, sem latir. Fitaram-se mudamente. Sem emitir som, eles se pediam: um solucionaria o problema de solidão do outro. O cachorro foi embora. Incrédula, os olhos da menina acompanharam-no até vê-lo dobrar a outra esquina. “Mas ele foi mais forte do que ela. Nem uma só vez olhou para trás.”

O Ovo e a Galinha: O ovo é a própria existência real, objetiva, em si mesma. A galinha é nossa visão de vida interior; ela só existe por causa do ovo. Sem o ovo, a galinha não tem sentido. Ela é o meio de transporte para o ovo, tonta, desocupada e míope. O ovo é sempre o mesmo, isto é, a vida; a galinha é sempre a tragédia de cada época. O ovo tem sua forma definida; a galinha continua sendo redesenhada. “Ainda não se achou a forma mais adequada para uma galinha.(…) O seu destino é o ovo, a sua vida pessoal não nos interessa.” A galinha prejudicial ao ovo é aquela que só pensa em si, que não quer sacrificar sua vida.

Os homens são os agentes da vida. Os que têm amor são os que participam um pouco mais da vida. Mas, como o amor é a desilusão de tudo o mais, poucos amam, porque a maioria não suporta perder as outras ilusões. “Inclusive amor é a desilusão do que se pensava que era amor.” Os homens existem para que o ovo se faça. Aqueles que não entendem isso, suicidam-se ou são eliminados. Estes não entendem o nosso mistério: somos apenas um meio e não um fim. Os que não aceitam o mistério procuram eliminar os que o aceitam. Então eles mandam que estes falem. Enquanto falam, o ovo é esquecido.

Cem anos de Perdão: A menina e sua colega olhavam para os palacetes e disputavam a posse imaginária deles. Um dia, a menina viu uma rosa e apanhou-a, tomando cuidado para não ser vista. Enquanto ela colhia as rosas a fim de levar para casa, a colega vigiava. As duas, usando dessa estratégia – uma colhia, a outra vigiava – passaram a furtar rosas com freqüência. Além de rosas, furtavam também pitangas. “Ladrão de rosas e pitangas têm cem anos de perdão. As pitangas, por exemplo, são elas mesmas que pedem pra ser colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens.”

A Legião Estrangeira: A narradora recebeu, às vésperas do Natal, um pinto de presente, vindo de uma família que fora vizinha dela e sumira inexplicavelmente. Então, ela se lembrou de Ofélia, a filha de oito anos dessa família. Eram pessoas que bloqueavam qualquer intimidade. Mas Ofélia adquiriu o hábito de visitar a narradora todos os dias. Enquanto esta ficava à máquina de escrever, trabalhando em sua profissão de copiar o arquivo de um escritório, Ofélia sentava-se, olhava para ela e dava conselhos, muito formal, como se fosse uma adulta cheia de sabedoria. A narradora ouvia, dificilmente falava, sempre a última palavra era da menina, numa postura antipática.

Certo dia, a narradora comprou na feira um pinto para os filhos, ainda pequenos, brincarem. Quando Ofélia chegou para a visita habitual, ouviu o piar do pinto, pediu para vê-lo e pegá-lo. Nesse instante, perdeu a pose de adulta e se tornou uma criança brincando com o pintinho. Depois deixou-o na cozinha, despediu-se e voltou para a casa dela. Seguindo uma intuição, a narradora, logo após a saída da menina, foi à cozinha e encontrou o pinto morto. O pinto recebido hoje estremece embaixo da mesa. “Como na Páscoa nos é prometido, em dezembro ele volta. Ofélia é que não voltou: cresceu. Foi ser a princesa hindu por quem no deserto sua tribo esperava.”

Os Obedientes: Um casal viveu muitos anos junto. Sua harmonia conjugal era aparentemente perfeita. Mas não tinham emoções. Cumpriam com perfeição a rotina, totalmente obedientes ao que se convencionou chamar de realidade de um casal, inclusive quanto à fidelidade. Nem individualmente nem em comum faziam ou diziam algo de inconveniente. Já ultrapassada a idade de 50 anos, ambos começaram a ter alguns sonhos. Cada um pensava timidamente em seu interior sem falar: ele imaginava que muitas aventuras amorosas significariam vida; ela, que outro homem a salvaria.

Certo dia, ela estava comendo uma maçã e sentiu quebrar-se um dente da frente. Olhou-se no espelho do banheiro, “viu uma cara pálida, de meia-idade, com um dente quebrado, e os própiros olhos…” Então, jogou-se pela janela. O marido continuou existindo; “seco inesperadamente o leito do rio, andava perplexo e sem perigo sobre o fundo com uma lepidez de quem vai cair de bruços mais adiante.”

A repartição dos pães: Os convidados para um almoço de sábado compareceram à casa da anfitriã. Todos vieram por obrigação. Ficaram constrangidos e incomunicáveis antes de serem convidados para a sala do almoço, considerando a anfitriã uma ingênua, por tirar cada um da sua maneira pópria de viver o sábado. Quando, porém, os convidados entraram na sala do almoço, surpreenderam-se com o requinte da refeição: uma quantidade excessiva de legumes e frutas, leite, vinho!

Todos comeram em nome de nada, era hora de comer e, à medida que comiam, veio a fome. Estabeleceu-se uma cordialidade rude: ninguém falou de ninguém porque ninguém falou bem de ninguém. A comida dizia: come, come e reparte. Assim se expressa a narradora: “Comi sem ternura, comi sem a paixão da piedade. E sem me oferecer à esperança. Comi sem saudade nenhuma.” E termina: “Nós somos fortes e comemos. Pão é amor entre estranhos.”

Uma Esperança: Uma esperança – um inseto que se chama esperança – pousou na parede da casa da narradora. Ela e os filhos ficaram observando a esperança andar, sem voar (“Ela esqueceu que pode voar, mamãe.”) Uma aranha saiu de trás do quadro e avançou em direção à esperança. Embora “dê azar” matar aranha, ela foi morta por um dos filhos. A narradora se espanta de não ter pego a esperança, ela que gosta de pegar nas coisas. Lembrou-se de certa vez que uma esperança pousou no seu braço. “Em verdade nada fiz. Fiquei extremamente quieta como se uma flor tivesse nascido em mim. Depois não me lembro mais o que aconteceu. E, acho que não aconteceu nada”.

Macacos: Perto do Ano-Novo, a família ganhou um mico de presente. Era um macacão ainda não crescido, que não dava sossego a ninguém. A dona da casa-narradora estava exausta. Uma amiga entendeu o sofrimento dela e chamou uns meninos do morro. Eles levaram o macaco. Um ano depois, a narradora comprou uma macaquinha nas mãos de um vendedor em Copacabana. Era delicada e recebeu o nome de Lisette. Vestiram-na de mulher e ela encantava a todos. Três dias depois, Lisette estava na área de serviço sendo admirada pela família.

Ela encantava sobretudo pela doçura. Só que não era doçura, era a morte chegando. Levaram-na rapidamente para o veterinário, enfrentando um trânsito difícil. Ela estava tendo falta de oxigênio. Deixaram-na na clínica. No dia seguinte, morreu. Uma semana depois, o filho mais velho disse para a mãe: “Você parece tanto com Lisette! ‘Eu também gosto de você’, respondi.”

Os desastres de Sofia: A narradora recorda o que lhe aconteceu quando tinha nove anos. Ela gostava do professor gordo, grande, silencioso, feio. Era atraída por ele. Mas infernizava as aulas. A menina fazia este jogo: amava-o atormentando-o. Não estudava nem aprendia nada. Um dia, o professor deu como tema de redação uma história em que certo homem pobre saiu atrás de um tesouro e não conseguiu encontrá-lo. Então ele voltou para sua casinha e começou a plantar no seu diminuto quintal. Tanto plantou, tanto colheu, tanto vendeu, que ficou rico. A menina fez um redação rápida, doida para ir correr no pátio do colégio que era enorme, cheio de árvores.

No final da composição ela tirou uma lição de moral oposta ao espírito da história: há um tesouro disfarçado, que está onde menos se espera. Entregou logo o caderno e foi correr no pátio. Mas, certo tempo depois, ela se lembrou de ir procurar algo que estava na sala. Lá ele encontrou o professor sozinho. Pela primeira vez, ficou frente a frente com ele, paralisada de medo e de confusão nos seus sentimentos. O professor mandou que apanhasse o caderno e ela não conseguiu, tamanha foi a sua perturbação. Pela primeira vez, ele riu e disse que ela era engraçada e doidinha: onde tinha tirado aquela idéia de tesouro disfarçado? A redação estava bonita. A menina teve a sensação de ele ter-se deixado enganar : havia acreditado nela. Pensou que um homem adulto acreditava, como ela, nas grandes mentiras.

Sem pegar o caderno, a menina voltou correndo para o recreio e correu tanto no parque até ficar exausta. Era uma maneira quase desesperada de se defrontar com a perturbação que a tomou. Naquele momento, perdeu a fé nos adultos, pois acreditava na sua futura bondade, superando a fase má infantil. No entanto, o amargo ídolo havia caído na armadilha de uma criança “safadinha”, confusa, sem candura; deixara-se guiar pela sua diabólica inocência… Quem sabe ele estaria pensando que ela era um tesouro disfarçado? “O professor agora destruía meu amor por ele e por mim (…) Aquele homem também era eu.” A menina foi subitamente forçada a amadurecer, a descobrir que ela conseguira atingir o coração do professor. “E foi assim que no grande parque do colégio lentamente comecei a aprender a ser amada, suportando o sacrifício de não merecer, apenas para suavizar a dor de quem ama.”

A Criada: Eremita era uma empregada doméstica que nada mais apresentava a não ser o perfil de um criada: nem bonita nem feia, cumpria seus deveres sem competência e sem desleixo; mas, por trás da figura-padrão e das frases convencionais pronunciadas convencionalmente, escondia-se um mundo interior indecifrável para qualquer pessoa, inclusive para ela mesma. De vez em quando, se interiorizava, se desligava; quando retornava desse passeio por sua floresta íntima, estava mais calma e ia consolidando a sua doçura próxima das lágrimas. Nada em Eremita denunciava perigo, a não ser uma maneira rápida de comer pão. “No resto era serena. Mesmo quando tirava o dinheiro que a patroa esquecia sobre a mesa, mesmo quando levava para o noivo em embrulho discreto alguns gêneros da despensa. A roubar de leve ela também aprendera em suas florestas.”

A Mensagem: Um rapaz de dezesseis anos e uma moça de dezessete, colegas de escola sem amizade, um dia se sentiram ligados um ao outro porque ela disse que sentia angústia e ele também. A partir de então se tornaram íntimos. Intimidade que não significava sexo nem amor. Eles se sentiram ligados porque ambos queriam ser autênticos, sinceros, diferentes dos outros. Não se viam como homem e mulher, mas como dois seres angustiados, à procura de algo que eles não sabiam o que fosse. Vagamente, confusamente, achavam-se portadores de uma mensagem. Mas o que era isso?

Saindo do colégio no último dia letivo, os dois caminhavam numa rua próxima do Cemitério S. João Batista, no Rio. A calçada era estreita e os ônibus passavam rentes. De repente, os dois se viram colados a uma casa velha. Pararam diante dela, olharam para a fachada. Em seu íntimo cada um foi se descobrindo ali, parados: ele era apenas um rapaz e ela, uma moça. Não tinham mais o que se dizer e por que continuarem juntos. Ela despediu-se, correu para um ônibus que estava parado. Entrou subindo como se fosse um macaco, pensou ele, vendo-a acomodar-se lá dentro. A moça saíra envergonhada por se sentir mulher; o rapaz tinha acabado de nascer homem. “Mas, atolado no seu reino de homem, ele precisava dela. Para quê? (…) para não esquecer que eram feitos da mesma carne, essa carne podre da qual, ao subir no ônibus, como um macaco, ela parecia ter feito um caminho fatal.”

O que estava acontecendo a ele naquele momento em que viu a moça entrar no ônibus daquele jeito? Nada! Apenas um instante de fraqueza e vacilação. Só que agora ele se sentia fraco para resistir ao que os outros tentavam ensinar-lhe para ser homem. “Mas e a mensagem?! a mensagem esfarelada na poeira que o vento arrastava para as grades do esgoto. Mamãe, disse ele.”

Menino a Bico de Pena: Um menino, que ainda não fala nem anda direito, está sentado no chão. Tenta dar alguns passos, cai; engatinha, baba. Depois a mãe o toma no colo, o faz dormir, troca a fralda dele e o ouve dar os primeiros sinais da fala.

Uma história de tanto amor: Uma menina de Minas Gerais tinha duas galinhas, Pedrina e Petronilha. Cuidava delas como se fossem pessoas. Certa vez, foi passar o dia fora e, quando voltou, Petronilha tinha sido comida pela família. Ficou contrariada. Mas a mãe lhe disse que foi pena as duas – ela e a filha – não terem comido algum pedaço de Petronilha, pois, quando a gente come os bichos, eles ficam parecidos com a gente, assim dentro de nós.

Pedrina morreu naturalmente. Morte apressada pela menina que, ao vê-la doente, colocou-a embrulhada num pano escuro, em cima de um fogão de tijolos. Um pouco maiorzinha, a menina teve outra galinha, a Eponina. Esta foi comida ao molho pardo por toda a família, inclusive pela menina que, embora sem fome, quis que Eponina se incorporasse nela e se tornasse mais dela morta do que em vida. “Nessa refeição tinha ciúmes de quem também comia Eponina. A menina era um ser feito para amar até que se tornou moça e havia os homens.”

As águas do mundo: Às seis horas da manhã, a mulher entra no mar: este, o mais ininteligível das existências não humanas; ela, o mais ininteligível dos seres vivos. Ela vai entrando, cumprindo uma coragem. Avançando, abre o mar pelo meio. Ela brinca com a água. Com a concha das mãos cheia de água, bebe em goles grandes. “E era isso o que lhe estava faltando: o mar por dentro como o líquido espesso de um homem. Agora ela está toda igual a si mesma.”

Mergulha de novo, de novo bebe mais água. Como contra os costados de um navio, a água bate, volta, não recebe transmissões. Depois caminha na água e volta à praia. Agora, pisa na areia. “E sabe de algum modo obscuro que seus cabelos escorridos são de um náufrago. Porque sabe – sabe que fez um perigo. Um perigo tão antigo quanto o ser humano.”

A Quinta História: A narradora conta que se queixou a uma vizinha de que subiam no seu apartamento as baratas que vinham do térreo. Então a vizinha lhe deu a seguinte receita para matar as baratas: misturar em partes iguais açúcar, farinha e gesso. “A farinha e o açúcar as atrairiam, o gesso esturricaria o de-dentro delas”. Assim foi feito e as baratas morreram.

Então a narradora conta a mesma história com cinco versões: “Como matar baratas” (exatamente a história acima); “O Assassinato” ( em que são acrescentados pormenores do estado de espírito rancoroso da narradora); “Estátuas” (em que se destaca a visão das baratas mortas); na quarta versão, a narradora opta por dedetizar a casa; a quinta história só tem o título: “Leibnitz e a Transcendência do Amor na Polinésia”.

Encarnação Involutária: A narradora tem o hábito de, quando vê uma pessoa que nunca viu, observá-la e encarnar-se nela, para poder conhecê-la. Certa vez, num avião encarnou-se numa missionária. Durante toda a viagem e alguns dias em terra, assumiu o “ar de sofrimento-superado-pela-paz-de-se-ter-uma missão”. A narradora levanta a hipótese de nunca ter sido ela mesma senão no momento de nascer, e o resto tinha sido encarnações. Depois ela afirma que não, que ela é uma pessoa. “E quando o fantasma de mim mesmo me toma – então é um encontro de alegria, uma tal festa, que a modo de dizer choramos uma no ombro da outra”.

Uma vez, também em viagem, ela encontrou uma prostituta perfumadíssima que fumava entrefechando o olhos e estes ao mesmo tempo olhavam um homem que já estava sendo hipnotizado. Então, a narradora fez o mesmo. “Mas o homem gordo que eu olhava para experimentar e ter a alma da prostituta, o gordo estava mergulhado no New York Times. E meu perfume era discreto demais. Falhou tudo”. Duas histórias a meu modo: A narradora relembra duas histórias, que ela escrevera para se divertir, dando ao autor imaginário o nome de Marcel Aymé. Félicien era um vinicultor francês que produzia o melhor vinho da região, mas não gostava de vinho. Ele e a mulher Leontina escondiam de todos esse fato. Félicien costumava até fingir-se de alcoolizado para esconder que não bebia vinho.

Outra história: Etienne Duvilé, funcionário estadual em Paris, gostava de vinho, mas não o tinha. Sua realidade era uma família grande que sonhava com mesa farta e ele, com vinho. Depois do sonho de uma noite de sábado, a sede de vinho piorou. Ele passou, acordado, a querer não só beber vinho mas beber todo o mundo. Até hoje ele está internado num hospício, tratado com água mineral “ que estanca sedes pequenas e não a grande”.

O primeiro beijo: Um rapaz conta para sua namorada que já havia beijado outra mulher. Numa excursão de ônibus escolar, ele estava com muita sede. Quando houve uma parada perto de um chafariz, ele foi o primeiro a chegar para beber. Colou a boca no orifício de onde jorrava a água. Depois que se saciou, abriu os olhos e viu que o orifício era a boca de uma estátua de mulher nua. Afastou-se, ficou olhando para a estátua. Fora seu primeiro beijo. “Perturbado, atônito, percebeu que uma parte de seu corpo, sempre antes relaxada, estava agora com uma tensão agressiva. (…) Ele se tornara um homem.”

Fontes:
http://www.coladaweb.com/resumos/clandestina.htm
Capa do Livro =
http://www.sebodomessias.com.br

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Guimarães Rosa (Grande Sertão: Veredas)

Grande Sertão :Veredas – travessia que Riobaldo, narrador-personagem, faz em suas memórias a fim de narrar suas vivências a um “senhor” durante três dias. Travessia que Guimarães Rosa faz através do caráter insólito e ambíguo do homem, tornando uma experiência individual (Riobaldo ) em caráter universal – “o sertão é o mundo”.

A primeira parte do romance (até aproximadamente à página 80), Riobaldo faz um relato “caótico” e desconexo de vários fatos (aparentemente sem relações entre si ), sempre expondo suas inquietações filosóficas (reflexões sobre a vida, a origem de tudo, Deus, Diabo, …) -Eu queria decifrar as coisas que são importantes. E estou contando não é uma vida de sertanejo, seja se fôr jagunço, mas a matéria vertente. “O discurso ambivalente de Riobaldo (…) se abre a partir de uma necessidade, verbalizada de maneira interrogativa”. No entanto, há uma grande dificuldade em narrar e organizar seus pensamentos : Contar é muito dificultoso. Não pelos anos que se já passaram. Mas pela astúcia que tem certas coisas passadas – de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. É o compadre Quelemém de Góis que lhe socorre em suas dúvidas, mas não de forma satisfatória, daí a sua necessidade de narrar.

A partir da página 80, Riobaldo começa a organizar suas memórias. Fala da mãe Brigi, que o obrigava à esmolação para a paga de uma promessa. É nessa ocasião, à beira do “Velho Chico”, que Riobaldo se encontra pela primeira vez com o garoto Reinaldo, fazendo juntos uma travessia pelo rio São Francisco. Riobaldo fica fascinado com a coragem de Reinaldo, pois como este afirma : “sou diferente (…) meu pai disse que eu careço de ser diferente (…).

A mãe de Riobaldo vem a falecer, sendo ele levado à fazenda São Gregório, de seu padrinho Selorico Mendes. É lá que Riobaldo toma contato com o grande chefe Joca Ramiro, juntamente com os chefes Hermógenes e Ricardão. Selorico Mendes envia o seu afilhado ao Curralinho, a fim de que tivesse contato com os estudos. Posteriormente, assume a função de professor de Zé Bebelo (fazendeiro residente no Palhão com pretensões políticas. Zé Bebelo, querendo pôr fim aos jagunços que atuavam no sertão mineiro, convida Riobaldo a participar de seu bando. Riobaldo troca as letras pelas armas. É desse ponto que começa suas aventuras pelo norte de Minas, sul da Bahia e Goiás como jagunço e depois como chefe.

O bando de Zé Bebelo faz combate com Hermógenes e seus jagunços, onde este acaba por fugir. Riobaldo deserta do bando de Zé Bebelo e acaba por encontrar Reinaldo ( jagunço do bando de Joca Ramiro), ingressando no bando do “grande chefe”. A amizade entre Riobaldo e Reinaldo acaba por se tornar sólida , onde Reinaldo revela o seu nome – Diadorim – pedindo-lhe segredo. Juntamente com Hermógenes , Ricardão e outros jagunços , combate contra as tropas do governo e de Zé Bebelo .

Depois de um conflito com o bando de Zé Bebelo, o bando liderado por Hermógenes fica acuado, acabando-se por se separar , reunindo-se posteriormente . O chefe Só Candelário acaba por integrar-se ao bando de Hermógenes , tornando-se líder do bando até o encontro com Joca Ramiro . Nessa ocasião , Joca Ramiro presenteia Riobaldo com um rifle , em reconhecimento à sua boa pontaria (a qual lhe faz valer apelidos como “Tatarana” e “Cerzidor”) . O grupo de Joca Ramiro acaba por se dividir para enfrentar Zé Bebelo , conseguindo capturá-lo . Zé Bebelo é submetido a julgamento por Joca Ramiro e seus chefes – Hermógenes , Ricardão, Só Candeário , Titão Passos e João Goanhá – acabando a ser condenado ao exílio em Goiás .

Depois do julgamento, o bando do grande chefe se dispersa, Riobaldo e Diadorim acabam por seguir o chefe Titão Passos. Posteriormente, o jagunço Gavião-Cujo vai ao encontro do grupo de Titão Passos para informar a morte de Joca Ramiro, que foi assassinado à traição por Hermógenes e Ricardão (“os judas”). Riobaldo fica impressionado com a reação de Diadorim diante da notícia. Os jagunços se reúnem para combaterem os judas .

Por essa época , Riobaldo tem um caso com Nhorinhá (prostitutriz), filha de Ana Danúzia. Conhece Otacília na fazenda Santa Catarina, onde tem intenções verdadeiras de amor. Diadorim, em determinada ocasião, por ter raiva de Otacília, chega a ameaçar Riobaldo com um punhal.

Medeiro Vaz junta-se ao bando para a vingança, assumindo a chefia. Inicia-se a travessia do Liso do Sussuarão. O bando não agüenta a travessia e acaba por retornar. Medeiro Vaz morre. Zé Bebelo retorna do exílio para ajudar na vingança contra os judas, tomando a chefia do bando.

Por suas andanças, o bando de Zé Bebelo chega à fazenda dos Tucanos, onde são encurralados por Hermógenes. Momentos de grande tensão. Zé Bebelo envia dois homens para informarem a presença de jagunços naquele local. Riobaldo desconfia de uma possível traição com esse ato. O bando de Hermógenes fica acuado pelas tropas do governo e os dois lados se unem provisoriamente para escaparem dos soldados . Zé Bebelo e seus homens fogem à surdina da fazenda, deixando os hermógenes travando combate com os soldados. Riobaldo oferece a pedra de topázio a Diadorim, mas este recusa, até que a vingança tenha sido consumada .

Os bebelos chegam às Veredas-Mortas. É um dos pontos altos do romance, onde Riobaldo faz o pacto com o Diabo para vencerem os judas. Riobaldo acaba assumindo a chefia do bando com o nome de “Urutu-Branco”; Zé Bebelo sai do bando. Riobaldo dá a incumbência a “seô Habão” para entregar a pedra de topázio a Otacília, firmando o compromisso de casamento. O chefe Urutu-Branco acaba por reunir mais homens ( inclusive o cego Borromeu e o menino pretinho Gurigó).

À procura dos hermógenes, fazem a penosa travessia do Liso do Sussuarão, onde Riobaldo sofre atentado por Treciano, que é morto pelo próprio chefe. Atravessado o Liso, Riobaldo chega em terras baianas, atacando a fazenda de Hermógenes e aprisionando sua mulher . Retornam aos sertões de Minas, à procura dos judas. Encurralam o bando de Ricardão nos Campos do Tamanduá-tão, onde o Urutu-Branco mata o traidor. Encontro dos hermógenes no Paredão. Luta sangrenta. Diadorim enfrenta diretamente Hermógenes, ocasionando a morte de ambos. Riobaldo descobre então que Diadorim se chama Maria Deodorina da Fé Bittancourt Marins, filha de Joca Ramiro.

Riobaldo acaba por adoecer (febre-tifo). Depois de se restabelecer, fica sabendo da morte de seu padrinho e herda duas fazendas suas. Vai ao encontro de Zé Bebelo, o qual o envia com um bilhete de apresentação a Quelemém de Góis : Compadre meu Quelemém me hospedou , deixou meu contar minha história inteira. Como vi que ele me olhava com aquela enorme paciência – calma de que minha dor passasse; e que podia esperar muito longo tempo. O que vendo, tive vergonha, assaz .
Mas , por fim , eu tomei coragem , e tudo perguntei:
-“O senhor acha que a minha alma eu vendi , pactário?! “
Então ele sorriu, o pronto sincero, e me vale me respondeu :
-“Tem cisma não. Pensa para diante. Comprar ou vender, às vezes, são as ações que são as quase iguais …”
(…)
Cerro. O senhor vê. Contei tudo. Agora estou aqui, quase barranqueiro. (…) Amável senhor me ouviu, minha idéia confirmou: que o Diabo não existe. Pois não? O senhor é um homem soberano , circunspecto. Amigos somos. Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se fôr … Existe é homem humano. Travessia.

Linguagem

Em Grande Sertão: Veredas, Guimarães Rosa faz uma recriação da linguagem , “recondicionando-a inventivamente, saindo do lugar-comum a fim de dar maior grandeza ao discurso. Nu da cintura para os queixos (ao invés de nu da cintura para cima) e ainda Não sabiam de nada coisíssima (no lugar de não sabiam de coisa nenhuma) constituem exemplos do apuramento da linguagem roseana.

Toda a narrativa é marcada pela oralidade (Riobaldo conta seus casos a um interlocutor), portanto, sem possibilidades de ser reformulado, já que é emitido instantaneamente. Ainda tem-se as dúvidas do narrador e suas divagações, onde é percebido a intenção de Riobaldo em reafirmar o que diz utilizando a própria linguagem .

O falar mineiro associado a arcaísmos, brasileirismos e neologismos faz com que o autor de Sagarana extrapole os limites geográficos de Minas. A linguagem ultrapassa os limites “prosaicos” para ganhar dimensão poético-filosófica (principalmente ao relatar os sentimentos para com Diadorim ou a tirar conclusões sobre o ocorrido através de seus aforismos).

Aforismos

1. Viver é muito perigoso
2. Deus é paciência
3. Sertão. O senhor sabe : sertão ‘onde manda quem é forte , com as astúcias .
4. …sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar .
5. …toda saudade é uma espécie de velhice
6. Jagunço é isso . Jagunço não se escabreia com perda nem derrota – quase tudo para ele é o igual.
7. Deus existe mesmo quando não há . Mas o demônio não precisa de existir para haver .
8. Viver é um descuido prosseguido .
9. sertão é do tamanho do mundo
10. Vingar , digo ao senhor : é lamber , frio , o que o outro cozinhou quente demais .
11. Quem desconfia , fica sábio .
12. Sertão é o sozinho .
13. Sertão : é dentro da gente .
14. …sertão é sem lugar .
15. Para as coisas que há de pior , a gente não alcança fechar as portas .
16. Vivendo , se aprende ; mas o que se aprende , mais , é só a fazer outras maiores perguntas .
17. …amor só mente para dizer maior verdade .
18. Paciência de velho tem muito valor .
19. Sossego traz desejos .
20. … quem ama é sempre muito escravo , mas não obedece nunca de verdade .

Estrutura de Narrativa

I – TEMPO

Psicológico . A narrativa é irregular ( enredo não linear), sendo acrescidos vários casos pequenos.

II – FOCO NARRATIVO

Primeira pessoa – narrador-personagem – utilizando-se do discurso direto e indireto livre.

III – ESPAÇO

A trama ocorre no sertão mineiro (norte) , sul da Bahia e Goiás . No entanto , por se tratar de uma narrativa densa , repleta de reflexões e divagações , ganha um caráter universal – “o sertão é o mundo”.

IV PERSONAGENS

· PRINCIPAL:

Riobaldo : personagem-narrador que conta sua estória a um doutor que nunca aparece. Riobaldo sente dificuldades em narrar, seja por sua precariedade em organizar os fatos , seja por sua dificuldade em entendê-los. Relata sua infância, a breve carreira de professor (de Zé Bebelo ), até sua entrada no cangaço (de jagunço Tatarana a chefe Urutu-Branco), estabelecendo-se às margens do São Francisco como um pacato fazendeiro.

· SECUNDÁRIOS:

Diadorim: é o jagunço Reinaldo, integrante do bando de Joca Ramiro. Esconde sua identidade real (Maria Deodorina) travestindo-se de homem. Sua identidade é descoberta ao final do romance, com sua morte.

Zé Bebelo: personalidade com anseios políticos que acaba por formar bando de jagunços para combater Joca Ramiro. sai perdedor, sendo exilado para Goiás e acaba por retornar com a morte do grande chefe para vingar o seu assassinato.

Joca Ramiro: é o maior chefe dos jagunços, mostrando um senso de justiça e ponderação no julgamento de Zé Bebelo, sendo bastante admirado .

Medeiro Vaz : chefe de jagunços que se une aos homens de Joca Ramiro para combater contra Hermógenes e Ricardão por conta da morte do grande chefe .

Hermógenes e Ricardão: são os traidores, sendo chamados de “judas”, que acabam por matar Joca Ramiro. Muitos jagunços acreditavam que Hermógenes havia feito o pacto com o Diabo .

Só Candelário: outro chefe que ajuda na vingança. Possuía grande temor de contrair lepra.

Quelemém de Góis: compadre e confidente de Riobaldo, que o ajuda em suas dúvidas e inquietações sobre o Homem e o mundo.

· AS TRÊS FACES AMOROSSAS DE RIOBALDO:

Nhorinhá : prostituta, representa o amor físico. O seu caráter profano e sensual atrai Riobaldo, mas somente no aspecto carnal.

Otacília: contrária a Nhorinhá , Riobaldo destina a ela o seu amor verdadeiro (sentimental). É constantemente evocada pelo narrador quando este se encontrava desolado e saudoso durante sua vida de jagunço. Recebe a pedra de topázio de “seô Habão”, simbolizando o noivado.

Diadorim : representa o amor impossível, proibido. Ao mesmo tempo em que se mostra bastante sensível com uma bela paisagem, é capaz de matar a sangue frio. É ela que causa grande conflito em Riobaldo, sendo objeto de desejo e repulsa (por conta de sua pseudo identidade).

Fonte:
http://vbookstore.uol.com.br/resumos/grandesertao.shtml

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Adriana Lisboa (Contos Populares Japoneses)

Quando esteve no Japão pesquisando sobre a obra do poeta Matsuo Basho para escrever o romance Rakushisha, lançado em 2007, a premiada escritora carioca Adriana Lisboa trouxe na mala – e na memória e no coração muito mais do que os haicais do poeta do século XVII. Grande admiradora da cultura oriental, ela mergulhou fundo também nas lendas e na tradição popular da terra do sol nascente, e apresenta aos leitores brasileiros uma seleção de histórias que sobrevivem ao tempo e fazem parte da milenar cultura popular nipônica na coletânea Contos populares japoneses, ilustrada pela sansei paulista Janaina Tokitaka.

O livro reúne seis contos que estão entre os mais conhecidos da cultura japonesa e são também os preferidos da autora. As narrativas falam sobre gente simples, mas cheia de esperança e valores, sobre animais encantados e seres fantásticos, e constituem belas metáforas do comportamento humano, de nossos sonhos, alegrias, angústias e medos. Com graça, leveza, alguns toques de suspense e muita imaginação, os contos são uma amostra vívida da força da literatura popular japonesa e sua capacidade de cruzar fronteiras.

O primeiro conto do livro, “A história de Urashima Taro”, relata a aventura de um jovem e bondoso pescador que embarca numa doce, mas irreversível, viagem rumo às profundezas do mar; “Chapéus de bambu” mostra que ajudar o próximo sem esperar nada em troca é a melhor forma de ser recompensado pela graça divina; já “A mulher da neve” é uma lenda ao mesmo tempo bela e sombria sobre uma misteriosa mulher que detém o poder da vida e da morte, e mostra a importância de se cumprir a palavra dada a alguém; “O grou” narra a história de um mágico e talentoso pássaro branco salvo da morte por um solitário casal de velhinhos; “A chaleira da sorte” fala da amizade profunda entre o texugo encantado, um funileiro e sua esposa, e mostra que nem tudo na vida é apenas o que parece ser; por fim, “A história de Momotaro” conta a saga de um menino que nasceu de um suculento pêssego com a missão de combater o mal e levar alegria a um pobre lenhador e sua esposa.

No ano em que se celebra o centenário da imigração japonesa no Brasil, Contos populares japoneses presta uma homenagem ao Japão e à riqueza de sua literatura, deixando ao alcance de leitores brasileiros de todas as idades narrativas que constituem a identidade da gente japonesa e refletem sobre temas universais, como honra, amor, generosidade, saudade, gratidão, compromisso e solidariedade. Um passeio pelas mais belas histórias dessa literatura conduzido pelo olhar sensível e a escrita refinada de Adriana Lisboa, em sintonia com as ilustrações cheias de graça e leveza de Janaina Tokitaka capaz de aquecer o coração.

Fonte:
http://www.adrianalisboa.com.br/

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Adriana Lisboa (Sinfonia em Branco)

A história de duas irmãs é o fio condutor do novo romance de Adriana Lisboa. O enredo desenvolve-se sem alarde e, através de breves relatos vividos ou imaginados, de descrições que se intercalam entre a vida e a memória, de diálogos e silêncios, o leitor se envolve no mundo de medos e pequenas maravilhas que cerca Maria Inês e Clarice. A infância na fazenda, os amores, a presença marcante do pai, os casamentos, as viagens, os descaminhos, as dolorosas tentativas de entender, tudo se entrelaça numa história carregada de intenso lirismo.

Sinfonia em branco é um romance desenhado a bico-de-pena. Cada frase parece ter sido escrita com a precisão e a delicadeza necessárias à elaboração de um retrato imaginário, no qual se possam reconhecer os traços de vidas miúdas, vividas à sombra. Quase nada acontece e tudo acontece na história das irmãs que vivenciam, cada qual a seu modo, uma experiência que vai marcá-las para sempre. Mesmo seguindo por caminhos diversos, Maria Inês e Clarice irão manter por toda a vida a cumplicidade de quem divide um segredo.

No plano maior da narrativa, alguns personagens de Sinfonia em branco vão construindo seus próprios relatos, fadados a não ter destinatários. Otacília, Afonso Olímpio, Tomás reescrevem, no interior do círculo traçado pela história das duas irmãs, suas histórias particulares. São relatos montados, não a partir do que aconteceu, mas do que poderia ter acontecido. Breves, intensas e silenciosas narrativas do que não foi, do beijo não recebido, da palavra não dita, do gesto interrompido, do gesto não interrompido.

Como no quadro de Whistler que dá título ao livro, Adriana Lisboa elabora uma “poesia da visão”, conferindo ao romance uma leveza poucas vezes encontrada na prosa brasileira das últimas décadas. Sem aderir a modismos estéticos de qualquer natureza, a autora vem moldando uma forma própria de escrever, numa prosa marcada pela habilidade de tratar de forma singela e sedutora temas tão complexos como o desejo, a interdição, a culpa. Com seu novo livro, a escritora reforça o que já se podia entrever no primeiro romance, Os fios da memória, tão bem recebido pela crítica: um estilo refinado, que se ergue nos detalhes, nas filigranas, nas rachaduras, poderosas e sutis, do cotidiano.

Fonte:
http://www.adrianalisboa.com.br/

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Platão (Fedro)

Segundo Jorge Paleikat: O “Fedro” é um dos mais célebres e mais sugestivos diálogos de Platão. Já os escritores antigos, como Dionísio de Halicarnasso, assim o consideravam. No século passado [século XIX], um filósofo que era ao mesmo tempo um erudito, Frederico Schleiermacher, considerava “Fedro”, como o resumo da filosofia de Platão.

O mistério do amor fornece a este diálogo a sua intensidade dramática. E a maneira pela qual Platão examina esse tema eterno, faz de “Fedro” não somente uma profunda obra filosófica mas, ainda, uma magnífica obra-prima do pensamento humano.

O “Fedro” prolonga o “Banquete”, acrescentando maior nitidez a algumas questões que foram examinadas neste último diálogo. Dá ao pensamento de Platão maior precisão e desenvolve idéias do mais alto interesse no que se relaciona com o problema da cultura filosófica. É-se tentado a aceitar que o “Fedro” representa, na filosofia de Platão – e talvez mesmo na filosofia da Grécia – aquele “dia feliz de verão”, de que fala Wilamowitz. Resumindo o “Fédon”, o “Banquete” e a “República”, o “Fedro” é um dia radioso no alvorecer da filosofia. Nele se cruzam idéias expostas em outros diálogos, se anunciam, através de um névoa a que o sol dá um brilho particular, outros problemas fundamentais do pensamento humano.

Não se sabe bem quando foi composto este diálogo. Julgam os especialistas que foi redigido por volta do ano de 366 antes de Cristo. Mas, estas minúcias não são de tal importância diante do interesse que o diálogo apresenta por si mesmo.

Os interlocutores deste diálogo são dois: o velho e irônico Sócrates e o “jovem” entusiasta, Fedro. Mais jovem talvez pelo espírito do que propriamente pela idade. Duas outras figuras aparecem no diálogo, mas de uma maneira indireta: Lísias e Isócrates. O primeiro é um logógrafo, uma causídico ou mestre de retórica, meteco que teve uma certa fama em Atenas. Isócrates – amigo de Platão – é o orador grego, dotado de certo espírito filosófico, traço este que falta a Lísias.

Sumariando o diálogo, encontramos, logo de início, Fedro grandemente entusiasmado com um discurso que Lísias pronunciara. Encontrando-se com Sócrates, Fedro convida-o para ouvir o discurso de Lísias. Por amizade a Fedro e também porque é grande admirador de discursos, nos quais encontra sempre um pouco da expressão da alma dos homens, Sócrates acompanha Fedro até fora dos muros da cidade. Estendem-se os dois à sombra frondosa de um plátano e Fedro passa a ler o discurso de Lísias.

A primeira parte do diálogo é ocupada pela leitura do discurso descosido de Lísias. Fala-se aí do amor que é paixão e do amor sensatez. Mas, – Platão aí pôs, imitando talvez os retóricos a quem combatia, – o artificialismo próprio dos discursos dos “logógrafos”, isto é, nos quais não se encontra uma idéia justa, sugestiva e verdadeiramente fecunda, mas onde se podem perceber todas as regras da arte retórica.

Ao terminar a leitura do discurso que tanto o entusiasmara, repara Fedro na expressão irônica de Sócrates. Desafia-o, chega até a ameaçá-lo e obriga-o a retomar o mesmo assunto tratado por Lísias. Sócrates começa confessando que não encontrara, na “obra-prima” de Lísias, as qualidades necessárias a um discurso que fosse, ao mesmo tempo, belo e verdadeiro. Falta à retórica de Lísias inspiração e ele não possuía sabedoria. Sócrates retoma o tema que Lísias tratara e, apelando para as recordações do passado, sobretudo para o que ouvira, de Safo e de Anacreonte, passa a mostrar quais os efeitos do amor que é paixão, o amor que ele, – assim como Lísias havia considerado – crê ser um amor nocivo. Ao terminar o seu discurso, que tem mais brilho mas em que as idéias se assemelham muito às que Lísias utilizou, como que tomado de arrependimento por haver blafesmado contra um deus a quem todos prestam um fervoroso culto, entoa, como Estesícoro, uma palinódia ao Deus Amor, a fim de penitenciar-se. O amor não pode ser apenas uma fonte de maldade e maldições. O amor é também inspirador de ações sublimes. Inspirado pelo seu “demônio”, Sócrates estabelece as diversas formas de delírio que conduzem a ação do homem: o delírio profético, inspirado por Apolo e que se relaciona com os presságios; o delírio purificador, sob a inspiração de Dionísio (=Baco para os latinos) e que se liga aos mistérios da religião; o delírio poético, dádiva das Musas e, enfim, o delírio erótico ou amor filosófico, o mais nobre de todos e que se acha sob o poder de Eros, o deus do Amor. O grande motor das ações humanas é o amor. Ele também impele a cultura.

Toda forma de Delírio vem da alma e é necessário que o homem saiba amar, tendo conhecimento, ao mesmo tempo, da sua alma e da dos outros homens. Dir-se-ia mesmo que é mister que ele saiba amar aprendendo antes a conhecer a almas de todas as cousas. Mas qual é a natureza da alma? Difícil pesquisa essa a que tem procurado dar resposta as diversas psicologias e as mais diferentes sociologias! Ainda aqui para que possa dar uma noção aproximadamente exata do que é a natureza da alma, recorre Platão a uma imagem, ou melhor, a um mito: o do carro alado e seu cocheiro. Nessa imagem resume Platão a luta que a razão trava com a vontade e a concupiscência.

Todas as Almas, as dos deuses assim como as dos mortais, todas tentam alcançar o lugar que está para além do céu e onde residem as Verdades Eternas. As almas dos homens, antes de terem caído neste sepulcro que é o corpo, conseguiram vislumbrar – umas mais de perto, outras de maneira menos precisa – a Pureza, a Justiça, a Sabedoria. Decaíram, corromperam-se, encheram-se de vícios ao se ligarem com o corpo. Guardam todavia uma tênue recordação do que antes contemplaram e tendem, sempre, para aquela perfeição que um dia contemplaram. A existência atual da alma nunca perde de todo o seu contato com a existência supra-empírica.

O mito do carro alado, no qual o cocheiro é a razão e os corcéis a vontade e a concupiscência, é riquíssimo. Longo seria, numa simples introdução, indicar tudo aquilo que ele nos sugere e sobre o que nos leva a meditar. Aliás, a leitura desse trecho do diálogo há de sugerir, por certo, àqueles que são dotados de espírito filosófico, os diversos e profundos sentidos deste mito de Platão. Ver-se-á, nesse “momento” do “Fedro”, qual o pensamento de Platão acerca das relações entre a alma humana e a divindade; qual o destino da alma, condenada à queda, a viver ligada ao corpo, qual o sentido que toma o “idealismo”platônico no que diz respeito à hierarquia das almas…
.

Uma inesgotável riqueza de pensamento acumula-se neste mito impregnado de poesia. Um mundo de idéias, que se foi dividindo e engendrando através dos séculos, novas formas de filosofias e de teologias, teve origem nesse momento da filosofia platônica.

A última parte do diálogo é dedicada ao exame de um tema que parece novo. De fato, porém, desde o início esse tema atava marcado. Desde o início do diálogo fala-se do discurso, da qualidade das composições retóricas. O diálogo ocupa-se, assim, na sua última parte, com a retórica. Qual a finalidade dessa arte em que Lísias parece ser o mestre? A sua finalidade consiste, sobretudo, em dirigir as almas e deve ter um sentido, – o da verdade e não o da verossimilhança. Não sendo assim, a retórica não é uma psicagogia mas uma arte tenebrosa, grosseira e condenável que serve apenas para ludibriar. Todos aqueles que, mediante os artifícios do discurso ou as manhas da palavra enganam os homens, lançando-os na confusão do Justo e do Injusto, são vis e medíocres “logógrafos”, reles rábulas que apenas merecem o mais profundo desprezo dos sábios.

Assim, ao ver o velho Sócrates, a retórica verdadeira se reduz à arte do pensamento, à dialética. E esta nada tem de comum com as regras artificiais do h;abeis e espertos mestres de retórica como os Tísias ou os Trasímacos. A condição essencial da verdadeira retórica, da eloqüência é o saber. Não é o miserável ofício de mistificador da palavra, nem a arte sorrateira do falso escritor. O divino poder da direção das almas é o caminho vivo, claro, distinto e harmonioso da Verdade.

Fontes:
Anatoli Oliynik.
http://blog.anatolli.com.br/

Capa do Livro = Editora Martin Claret.

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Isaque de Borba Corrêa (Sinopses das principais obras, Documentários, Peças Teatrais)

São Tomé

A maior pesquisa já feita nas Américas: 20 jesuítas pesquisaram por exatamente 100 anos: de 1530 a 1630. Com tão pouca comunicação naqueles tempos, é incrível a coincidência dos seus relatos.

Quando os jesuítas iniciavam uma catequese, os índios já sabiam dogmas, doutrinas cristãs, bem como passagens bíblicas, inclusive canto. Perguntado como eles sabiam, eram unânimes em responder que fora um tal de Tomé quem os houvera ensinado. Diziam se tratar de um homem branco, de barba, que veio da banda do mar. Pregava um Deus invisível e fazia muito milagres.

Ele aportou em Santa Catarina onde existe o famoso caminho do Peabiru, única entrada para o interior da América. Esse Caminho mais tarde os jesuítas chamaram de Caminho Sagrado de São Tomé. Esteve até na América do Norte, Alvar Nunes Cabeza de Vaca foi confundido com ele por lá.
O jesuíta Antônio Ruiz de Montoya, fez boa parte do seu roteiro até a Venezuela e disse: “Eu não me abalaria a vir até essas lonjuras se não tivesse certeza que o Santo esteve aqui.”

O Espatário

Trata da incrível biografia de Dom Paio Peres Corrêa, 36º Grão-Mestre da Ordem de Santiago de Compostela. Abaixo de reis, ninguém fez o que ele fez na Europa. O medo que os reis tinham de arder no fogo do inferno, faziam prestar uma submissão muito forte à igreja. Porém a igreja estava sendo ameaçada pelos muçulmanos e as ordens militares é que davam proteção à igreja. Assim, papas e reis acabavam prestando muito respeito às ordens, que eram militares, porém religiosas . As ordens mantinham as duas forças mais poderosas do mundo cristão. Assim sendo, um grão-mestre poderia ter poderes e influências capaz de mudar a história.

Ele conjurou contra reis e rainhas, ajudou a depor reis, empossou outros, foi empossado por reis; desmanchou casamento entre reis, casou outros reis; pacificou reinos, destruiu outros tantos.

Como português, sua naturalidade é disputada por duas cidades, porém foi chefe da mais poderosa ordem castelhana e assim ele fez de tudo para manter a paz entre os dois reinos. Conheça a incrível estratégia que ele usou para apaziguar a briga entre Afonso III Portugal e Afonso X, que acabou fazendo nascer Dom Diniz.

Fez muitas coisas, até milagre. Já viu falar no milagre de Tentudia? Pois foi com ele. Ele foi o Gran-comander da reconquista cristã do Algarve e Andaluzia. Lutou em diversas cidades do Algarve, venceu todas as lutas. Voltou para a Espanha, lutou na Andaluzia, venceu todas as guerras tomou novos reinos para o rei de Castela. Morreu na Espanha, em Uclés ainda no reino de Leão e Castela em 1275. Seus restos mortais são disputados nos dois países.

Com a morte do Rei Luis IX (São Luís) a Europa pediu que ele fizesse a cruzada. O Papa pediu que ele encabeçasse essa cruzada. Ele assinou um documento que ia. Será que e foi? O maior paladino cristão não iria lutar pelo maior objetivo do cristianismo que era a Terra Santa?

Conheça os mistérios que envolveram sua história. Aprenda com bom humor como foi um dos períodos mais intensos da história da humanidade.

Dicionário catarinense

Um tratado de dialetologia, falares e sub-falares do Estado de Santa Catarina. Contém um campo lexical com quase 3 mil palavras.

Os Zelotes

Os zelotes eram pessoas consagradas a zelar o templo. Não confundir isso com quem era zeloso pela doutrina, pelas leis ou pelas coisas de Deus. O zelotismo é uma das instituições religiosas mais antigas do mundo que só não é suplantada pelo judaísmo. Os zelotes iniciaram seu ministério no levirato quando foi dividido o reino em tribos. Deut 25:5

Os levitas não tinham possessões geográficas. Eram consagrados a zelar o templo. Dali também nasceu outra corrente religiosa muito parecida que era o nazireado. Os nazireus eram consagrados à vida religiosa desde o ventre da mãe. Os mais antigos nomes nessa instituição registrado na Bíblia é provavelmente Sansão e Samuel. Outros exemplos mais próximos de nós foram João Batista e Tiago irmão do senhor. Jesus Cristo também era um nazireu.

Era nazireu pela sua religião e não pelo adjetivo pátrio. Muitos sustentam que a Igreja criou a cidade de Nazaré na Idade Média, alegando que ela não é citada em nenhum mapa antigo.

Isso para justificar que o termo nazireu ou nazareno, refere-se ao adjetivo pátrio de Jesus, escondendo com isso a sua religião. De fato a Bíblia só cita as religiões dos saduceus e fariseus, sequer fala dos essênios.

Se Jesus criticava ferrenhamente essas duas instituições e com extraordinária competência (Mt 23:23) era óbvio que ele pertencia a uma terceira corrente. Apóstolo Paulo por ser zeloso pelas leis, pelas doutrinas é comumentemente confundido como zelote. Atos 26:5

Ele era fariseu, inimigo número um dos essênios, que os criticavam abertamente. Paulo converteu-se à religião dos nazirenos. Atos 24:5

Zelotes, nazirenos e sicários, são ramificações dos essênios, religião de Jesus, a qual Paulo se converteu. Muitos dizem inclusive que Flávio Josefo também era zelote, por causa do episódio de Jotapata. Ele era fariseu, grão-sacrificador e odiava os essênios, chamando-os freqüentemente de demônios. O próprio Jesus foi tido como chefe dos demônios pelos fariseus. Mt 12:24

Muitos afirmam também que o zelotismo nasceu com a família Macabeus. Não nasceu ali como já vimos, mas foi ali o auge do sofrimento do povo judeu, administrado pela tirania da dinastia selêucida, em especial Antíoco Epifanes. Foi também nessa época onde mais aflorou a motivação zelótica.

O culto judaico, seus rituais, seu folclore, era o único elo de ligação desse povo durante os anos de cativeiro. O folclore é a identidade cultural de seu povo. Quem perde a sua identidade cultural se fragiliza, perde a auto-estima e se deixa dominar. Essa é a arma principal que o colonizador, dominador, usa para subjugar um povo.

Os zelotes e demais religiões judaicas sofreram o golpe final na data aproximada do ano 70, sob as ordens de Tito. A ênfase maior deste livro é o sofrimento desse povo, baseado no texto bíblico, apócrifos, historiadores cristãos do início da era cristã, Josefo e Eusébio.

Documentários

A lenda de Pay Tomé

Um documentário da Saga do Apóstolo no continente americano Direção de Lalo e Beto Bocchino – premiado no Festival Catarina – 2002

A Saga de Aleixo Garcia

Como ele alcançou o Império Inca 10 anos antes de Francisco Pizarro

Tralhas

Como o homem primitivo extraía os fios das folhas do ticum, gravatá e as cordas das cascas de Embaúva e Grandiúva e demais instrumentos para feitura de redes

Pirão com peixe

Mostra as dificuldades do pescador em fazer as diversos tipos de pesca, e a feitura da farinha, desde a plantação da mandioca.

Poranduba Papa-siri

Explorando o folclore do centro do litoral catarinense.

A Freguesia de Nossa Senhora do Bom Sucesso

Longa-metragem que conta a história da fundação da cidade de Camboriú

Santo Amaro & N. S. Do Bom Sucesso

(TCC – dirigido pelo aluno de jornalismo Júlio Cesar Garcia) Conta a história da religiosidade do povo da Barra do Rio Camboriú.

Solilóquio

Ficção onde o mais antigo pescador da Praia de Camboriú, Manoel Germano Corrêa, morto em 1968, conta a sua história e a história de Balneário Camboriú, quando ela tinha apenas 4 moradores. Baseado na entrevista que ele deu para o jornalista, imortal catarinense Silveira Júnior em 1952 e memórias do autor

A sinfonia dos cinzéis

Explora a difícil e árdua profissão na arte da cantaria – Extração do paralelepípedo

Memórias de um menino pobre

Biografia do Jornalista Silveira Júnior, baseado no seu livro autobiográfico Memórias de um menino pobre.

A pescaria da morte

Relata a tragédia de 21 de outubro de 1921, quando um tufão arrasou a comunidade de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Camboriú, matando quase todos os pescadores, numa vila eminentemente formada por modestos pescadores artesanais. Baseada na reportagem de Hermínio Irineo Vieira – Jornal O intransigente – 1921

Fala catarina

Documentário que explora os mais diversos falares e sub-falares do Estado de Santa Catarina o mais multiétnico de todos os estados da federação.

Peças teatrais

Rodamuinho

1999 (adaptação dos textos dos livros História de Duas Cidades e Poranduba Papa-siri) em cartaz pelo Estado há cinco anos Autoria de Dianna Sitônio Direção de Ricardo Gamba

Colóquio

2000 – Baseado no Livro Colóquio. Modus vivendi de uma família tradicional dos anos 50 do século passado no centro do litoral catarinenses.

2004 – Baseado no texto bíblico, retrata o sofrimento do patriarca.

Jesus

2005 – Musical, baseados em músicas tradicionais que traçam toda a biografia do filho de Deus, desde o seu nascimento até a morte.

Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/

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Andrey do Amaral (Como enlouquecer sua sogra)

Desde os mais remotos tempos da história, a sogra é esse elemento que pode despertar amor e ódio (às vezes só amor, às vezes só ódio!). Para apimentar a relação em família, Andrey do Amaral traça o roteiro, com inúmeras dicas para enlouquecer as sogras e afastá-las do território do sagrado lar. Mas será que elas são imunes a essa saraivada de críticas?

O autor promete que esse manual de sobrevivência é um poderoso antídoto.
Entretanto, a artilharia de Andrey, antes de ser uma campanha contra as sogras, é uma homenagem carinhosa.

Com uma abordagem descontraída, tudo se resume no grande folclore a partir de uma rivalidade que habita o imaginário popular. O objetivo do livro é provocar risos.

Disponível em bancas de jornal e nas melhores livrarias (e nas piores também).

Sobre o livro:
Como enlouquecer sua sogra
Autor: Andrey do Amaral
Editora Autodidata (61) 3201-4760
editora@autodidata.com.br
16ª edição
102 pág.
14 X 21 cm
ISBN: 978-85-61922-00-9
Ilustrações: Alex Falcão
Capa: em anexo
Outras informações: diretamente com a editora

Sobre o autor:
Andrey do Amaral (1976) é escritor e professor de literatura. Atualmente, presta consultoria para autores como agente literário. É autor dos sucessos Cuidado eu te amo (Ao Livro Técnico/RJ), O máximo e as máximas de Machado de Assis (Ciência Moderna/RJ) e Mercado Editorial – guia para autores (Ciência Moderna/RJ). Maiores informações: www.andreydoamaral.com

Fonte:
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Livros de Yasunari Kawabata

A DANÇARINA DE IZU

A dançarina de Izu, lançado originalmente em 1926, é uma novela baseada em anotações autobiográficas e tem como temas o amor impossível, a solidão e a sexualidade velada, recorrentes na extensa e brilhante obra de Yasunari Kawabata.

Neste livro, primeira obra de destaque do autor, um jovem de dezenove anos, da elite japonesa, viaja até a península de Izu, região que fica a oeste da capital Tóquio, e lá trava contato com artistas viajantes, com quem faz amizade, e se encanta com uma artista da trupe: a pequena dançarina Kaoru, de treze anos.

A viagem tem início nas termas de Shuzenji, seguindo depois para as de Yugashima. Cruzando as cidades de Oginori e Nashimoto, o estudante chega a uma hospedaria em Yugano. Em companhia dos saltimbancos, na melhor tradição nômade japonesa, segue ao longo do rio Kawazu. Passam a noite na hospedaria Koshuya e finalmente chegam até Shimoda.

Em cada ponto percorrido uma modulação diferente, percepções, por parte do jovem estudante, de coisas que tornam a vida maior e mais intensa. Kawabata queria ser pintor e talvez por isso seus cenários sejam meticulosamente descritos e possuam cores inesquecíveis. Como um pintor, cria o fundo e insere nele os personagens que darão intensidade ao conjunto.

As personagens femininas, sempre melhor compostas que os masculinos, representam papel importante na obra de Kawabata, talvez como antídoto para uma solidão perene que o acompanhou durante toda a vida — o autor teve a trajetória costurada por mortes seguidas e precoces, o que marcou profundamente sua infância. Em A dançarina de Izu a situação não é diferente, pois se trata de um amor platônico, consumado nas profundezas do coração lírico do protagonista.

Nesta novela, a viagem do estudante, a sexualidade guardada e sua solidão são marcas que se sobressaem. A figura do outro (como a do personagem Eikichi, com quem o jovem troca experiências) é de extrema importância. Em muitas passagens do livro, o protagonista se emociona com situações alheias, e estas são necessárias para a apreensão do mundo que o cerca.
A dançarina de Izu é um livro muito lido até hoje no Japão. Teve várias versões cinematográficas, sendo a primeira de 1933, sob a direção de Heinosuke Gosho. Ganha sua versão brasileira traduzida do japonês por Carlos Hiroshi Usirono. Este volume também traz um competente estudo feito pela professora Meiko Shimon, especialista na obra de Kawabata, que traça um panorama crítico da trajetória do autor, tocando em pontos centrais de sua vida e escrita, além de se debruçar sobre algumas de suas importantes obras, como Kyoto ou Contos da palma da mão.

Trechos

“Ele apontou em direção ao banho público, no outro lado do rio. Sete ou oito figuras surgiram vagamente em meio ao vapor. Pude ver então o vulto de uma mulher nua sair correndo da sala de banhos mal iluminada. Em frente ao vestiário, postou-se na ponta dos pés, parecendo que iria pular no rio. Com as mãos e braços bem esticados, parecia dizer algo. Não trajava sequer uma toalha. Era ela, a pequena dançarina. Observando suas pernas, que eram como tenros caules, e seu corpo alvo e bem torneado, senti meu coração mergulhar em êxtase. Por final, soltei um profundo suspiro e sorri maliciosamente.” (p. 25-26)

“Era uma criança. Uma criança que ao nos descobrir em sua alegria, exibia seu corpo aos raios do sol, equilibrando-se e esticando-se completamente. Tomado por um caloroso prazer, continuei a sorrir, e minha mente purificou-se inteiramente.” (p. 26)

“Suas lindas e intensas pupilas negras encerradas em seus grandes olhos eram de rara beleza. Suas sobrancelhas também eram belas. Lembrava uma flor sorrindo. Exatamente: uma flor sorrindo era a melhor definição.” (p. 37)

“Ao me aproximar do píer, meu coração deu um sobressalto ao ver a pequena dançarina agachada perto da borda. Enquanto me aproximava, ela olhava o mar fixamente. Em silêncio, permitiu minha aproximação. A maquiagem era a mesma da noite anterior, deixando-me mais emocionado. O carmim que contornava seus olhos revelava uma certa ira, um ar de valentia infantil.” (p. 54)
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O PAÍS DAS NEVES

Obra máxima de Kawabata, O País das Neves é considerada um marco da literatura intimista e neo-sensorialista que deu destaque mundial ao Prêmio Nobel de 1968

A primeira versão desta obra foi publicada originalmente em 1937, mas foi apenas dez anos depois, já influenciado pelos acontecimentos da Segunda Guerra, que o escritor japonês terminou a versão final deste romance sobre o amor espontâneo e sem nenhuma esperança de retribuição.

Neste livro, de grande repercussão no Japão e no exterior (inclusive com adaptações para o cinema), Kawabata expõe a densidade e as contradições das relações humanas por meio do encontro entre Shimamura, um culto senhor de posses, Komako, uma gueixa das montanhas, e Yoko, uma bela jovem provinciana, trazendo ao leitor um texto comovente e lírico ao extremo.

Em vez de provocantes paixões, o desperdício do amor e o sacrifício pessoal dos personagens conduzem-nos a uma atmosfera gélida, com pinceladas de forte afetividade, em que o branco da neve e o frio penetrante contribuem para dar o tom melancólico da narrativa. Não à toa: a estação termal de Yusawa, que o escritor visitou pela primeira vez em 1934, serviu de inspiração para a criação do cenário onde a história se passa.

* * * * *

Em mais um hino dedicado à beleza e à alma femininas, Yasunari Kawabata literalmente nos transporta para uma região mágica do Japão, o País das Neves, onde ruídos, sentimentos, embates amorosos assumem contornos irreais abafados por densas camadas brancas, cenário ideal para os paralelos que tanto aprazem o Prêmio Nobel de 1968, ao cotejar a pele de suas onipresentes jovens com a tradicional cerâmica japonesa, igualmente perfeitas ao toque.

Shimamura, escritor ora refinado ora diletante, sobre o qual pouco sabemos — qualquer desprezo de Kawabata por seus personagens masculinos não será mero acaso —, deixa para trás casa e família e parte com o rigor de uma missão a cumprir rumo ao reencontro com seus anos jovens (“no final das contas, só esse dedo guardava a memória crua da mulher com a qual estava indo se encontrar”).

Entre casas termais, gueixas aprendizes e paisagens gélidas, revela-se uma insistente busca do eu em um correr do tempo estancado desde que o protagonista desceu do trem após longo trecho de narrativa antológica retomando, via reflexos em janelas, o constante tema do espelhamento na obra de Kawabata. E logo de início, ainda no longo túnel levando de Tóquio ao famoso País das Neves, travessia simbólica que conduz de um Japão do Pacífico ao mundo mais irrequieto do Mar da China, o autor nos leva a um magistral mergulho nos mistérios do relacionamento humano. No caso, um velado triângulo amoroso cujos contornos parecem jamais fechar, mas que inevitavelmente alcançarão um fogoso ponto de ruptura.

O País das Neves pode — e deve — ser visto como ponto crucial na obra de Kawabata, e não é por acaso que Shuichi Kato, o papa japonês da história da literatura, escreve que esta é “claramente a obra-prima de Kawabata” — não por outro motivo que pela construção e caracterização dos personagens. Ao contrário do que ocorre no mundo de Kawabata em geral, no qual os personagens femininos são inteiramente inventados, a gueixa Komako existiu na vida real — e mesmo para um autor deste calibre, alguma diferença parece ter havido.

Trechos

“Como o interior do trem não era muito claro, aquele espelho não era tão nítido quanto deveria ser. Ele não refletia bem as imagens. Por isso, enquanto Shimamura olhava compenetrado, foi se esquecendo da existência do espelho e começou a pensar que a moça flutuava na paisagem do entardecer.

Foi nesse momento que os raios de sol, já tênues, iluminaram o rosto dela. O reflexo do espelho não era suficiente para apagar a claridade de fora, nem esta, forte o bastante para ofuscar a imagem refletida no espelho. A claridade passava como um relâmpago pelo seu rosto, mas não era suficiente para iluminá-lo. A luz era fria e distante. No momento em que o contorno de sua pequena pupila foi se iluminando, como se os olhos da moça e a luz se sobrepusessem, seus olhos se tornaram um vaga-lume misterioso e belo que pairava entre as ondas da penumbra do cair da tarde.” (p. 15)

“… sob a sombra de um beiral, cinco ou seis gueixas conversavam em pé. Shimamura pensou que Komako — nome artístico que ficara conhecendo graças à empregada da hospedaria naquela manhã — poderia estar por ali; de fato, parecendo perceber que ele se aproximava, seu semblante sério a distinguia das outras. Sem que houvesse tempo para Shimamura pensar que ela ficaria ruborizada, desejando que um vento desinteressado a refrescasse, o rosto de Komako já estava vermelho até o pescoço. Já que era assim, ela deveria ter ficado de costas, mas desviando o olhar, visivelmente incomodada, movia aos poucos o rosto na direção em que ele andava.” (p. 48)

“No entanto, ao pensar que Yoko estava naquela hospedaria, Shimamura, sem saber por que, sentiu receio de chamar Komako. Embora o amor de Komako fosse destinado a ele, sentia um vazio como se isso fosse mais um belo esforço em vão. Ao mesmo tempo, também sentia a vida que Komako tentava viver roçar nele tal qual uma pele nua. Compadecendo-se dela, também se compadeceu de si mesmo. Julgou que Yoko era possuidora de um olhar semelhante a uma luz que pungia tal situação, e, por algum motivo, se sentiu atraído por ela também.” (p. 114)

O livro teve duas adaptações para o cinema, em 1957 e 1965, ambas chamadas Yukiguni.
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MIL TSURUS

Tradicional cerimônia do chá serve de cenário para autor expor a complexidade das relações humanas

Publicado originalmente em capítulos por revistas japonesas, este romance foi escrito entre os anos 1949 e 1951, período de reconstrução de um Japão devastado pela Segunda Guerra. Nesse contexto em que a sociedade japonesa se reestruturava e também se defrontava com valores culturais vindos do Ocidente, Kawabata resgata valores tradicionais de seu país, fazendo da cerimônia do chá o pano de fundo para a história de Mil tsurus.

Kikuji Mitani é um jovem que, durante uma cerimônia do chá, reencontra duas antigas amantes de seu falecido pai, Chikako Kurimoto e a viúva Ota, e de repente se vê profundamente envolvido com elas. Enquanto Chikako tenta arranjar um casamento para Kikuji, este inicia um inesperado romance com a senhora Ota, que por sua vez tem uma filha chamada Fumiko, de quem Kikuji também irá se aproximar. Mas há ainda Yukiko, a delicada jovem pretendente a se casar com Kikuji, personagem que representa serenidade num ambiente repleto de ressentimentos e intrigas. Não é por acaso que a moça é descrita usando um lenço de seda ilustrado com tsurus, ave que simboliza nobreza e felicidade na tradição japonesa.

Nessa história em que o passado, através da figura do pai do protagonista, desperta sentimentos em conflito, Kawabata demonstra, mais uma vez, seu profundo conhecimento da antiga cultura de seu país e enaltece a importância da arte oriental, representada nas cerâmicas seculares do ritual do chá. Ao mesmo tempo em que discorre sobre a permanência da arte no decorrer dos séculos, sobrevivendo a gerações, o autor nos mostra o lado efêmero da vida e das relações humanas.

No Brasil, a obra foi publicada pela primeira vez no início dos anos 70, sob o título Nuvens de pássaros brancos (Ed. Nova Fronteira), emprestando-se o título da edição francesa (Nuée d’oiseaux blancs). Preferimos nos reportar ao título original japonês, Senbazuru correspondendo a Mil tsurus.

Trechos

“Da janela do trem, avistava uma larga avenida com altas árvores que despontava logo após a estação Yurakucho e se estendia até a estação de Tóquio, cruzando de leste a oeste a linha do trem. Naquele momento, o asfalto refletia o pôr-do-sol tal qual um cinturão de metal radiante. Contudo, as árvores estavam à contraluz e apenas insinuavam-se suas silhuetas. As sombras pareciam frescas. Os galhos se expandiam para todos os lados, cobertos de folhas. Em ambas as calçadas, havia sólidas mansões de estilo ocidental. Estranhamente, poucas pessoas passavam por ali. Não havia viva alma até bem próximo do fosso do Palácio Imperial. Nem carros havia no asfalto que refletia a luminosidade. Observando de dentro daquele trem lotado, o lugar parecia estar suspenso no entardecer de algum mundo além da imaginação. Havia uma atmosfera estrangeira em tudo.” (p. 63)

“O verniz arranhado daquele vaso antigo deixava semi-aparente a assinatura da peça, ‘Soutan’, que também estava presente na caixa onde ele era guardado. Caso fosse autêntica, a cabaça teria cerca de trezentos anos. Kikuji não conhecia as flores usadas na cerimônia do chá, tampouco sua criada o sabia. Apesar disso, aquela bela-da-manhã parecia ideal a uma cerimônia das primeiras horas do dia. Ficou a observar o arranjo por algum tempo. Que fascinante era ver aquele ramo de vida tão efêmera dentro de uma cabaça tão antiga! Aquela singela flor combinaria melhor com o mizusashi de Shino que o ramalhete de estilo ocidental que comprara? Quanto tempo poderia durar num vaso uma bela-da-manhã? Kikuji sentiu certa inquietude ao pensar na sua fugacidade.” (p. 112)

“A peça era exatamente como Fumiko havia descrito ao telefone naquela manhã. Seu esmalte branco apresentava um leve toque avermelhado. Observando-o por algum tempo, parecia que aquela tonalidade rubra emergia de dentro do branco. Toda a borda era ligeiramente amarronzada, havendo apenas uma faixa mais escura. Seria ali onde a boca tocava? A bebida bem podia ter-lhe tingido a borda, ou então, seriam os lábios de alguém que a maculara. Aquela suave mancha marrom, à medida que era olhada, começava a parecer rosa. Seria mesmo a marca de batom da viúva impregnada na cerâmica, como Fumiko lhe contara? Kikuji também reparou numa coloração marrom-avermelhada nas trincas naturais da cerâmica. Era um tom parecido com o de um batom desbotado, uma rosa vermelha murcha… Mas quando o associou a uma mancha seca de sangue, sentiu-se enjoado. Tinha a sensação de um embrulho no estômago mesclado a uma certa sedução que o fascinava.” (p. 128-9)

“Ele só havia visto Yukiko duas vezes. A primeira, na cerimônia do chá no templo Engakuji, quando Chikako levara a jovem a fazer uma demonstração, com a função de exibi-la a ele. Durante o preparo do chá, seus gestos eram simples e elegantes. Kikuji ainda trazia fresca na memória a imagem dos ombros e das mangas do quimono de Yukiko, bem como de seus cabelos, iluminados sob a divisória de papel-arroz por onde se projetavam suavemente as sombras das árvores próximas. Só não conseguia recordar-se muito bem de suas feições. Já o fukusa vermelho e o lenço de tsurus brancos que a jovem levava quando se dirigia à sala de chá eram-lhe vivas lembranças.” (p. 144)
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A CASA DAS BELAS ADORMECIDAS

Obra serviu de inspiração para o recém-lançado e aclamado Memória de mis putas tristes, de Gabriel García Márquez

Imbuída de um erotismo inusitado, esta obra, escrita em 1961, demonstra a maturidade estilística do autor, que se utiliza de sua virtuose descritiva para contar a história de Eguchi, um senhor de 67 anos que freqüenta a “casa das belas adormecidas”, uma espécie de bordel onde moças encontram-se em sono profundo, sob efeito de narcóticos. Apesar da idade avançada, o protagonista parte em busca dos prazeres perdidos e se depara com moças virgens, que os visitantes podem tocar, mas são proibidos de corromper. Daí derivam passagens antológicas de rememorações pessoais e fantasia.

Kawabata procura desvendar o enigmático universo do corpo feminino em um culto ao belo e ao inalcançável, investigando as dores da solidão a partir da sutileza de um erotismo expressivo, constantemente atravessado por passagens de fina ironia e perturbadora consciência da passagem do tempo, do vazio existencial que permeia as relações humanas.

* * * * *

É objeto de consenso na crítica literária mundial que Yasunari Kawabata descreveu com meticulosa concisão as profundezas da alma feminina e revelou o corpo da mulher em seu mais sutil esplendor. Dono de uma capacidade de observação única, nenhum detalhe, nenhuma verdade escapam de seu olhar incomum. Em A casa das belas adormecidas, Kawabata dedicou-se obsessivamente a esta marca de sua literatura. Imbuído do matsugo no me, que talvez pudéssemos traduzir por “o olhar derradeiro”, Kawabata nos dá a impressão de pintar em cores vivas as últimas imagens de quem vai partir deste mundo.

A sexualidade na idade madura aflora nua e crua num cenário composto para o deleite de quem não mais pode procurá-lo por conta própria. Contrapartida mais fantasiosa e ao mesmo tempo mais radical, apresenta um inegável parentesco com Diário de um velho louco, de Jun’ichiro Tanizaki, outro grande mestre da literatura japonesa moderna. Se este último trata da sensualidade a priori contida que acomete um idoso no cotidiano, Kawabata nos leva aqui em singela exploração sensorial do corpo feminino oferecido em estado de torpor controlado. Os meandros da sexualidade — assim como a inexistência dela — em situações limite, da repressão do desejo e do autocontrole exacerbado compõem um jogo perverso que assume todo seu significado quando o protagonista tem de lidar com a noção de virgindade em seu sentido mais amplo. Temos aqui um indício de até que ponto Kawabata, sempre fiel a si mesmo, foi deliberadamente aos alicerces das estruturas mentais. Yukio Mishima, que louvava Kawabata, escreveu de forma reveladora em seu prefácio à edição norte-americana desta obra: “E será que a impossibilidade de obtenção não coloca definitivamente o erotismo e a morte no mesmo nível? E se nós romancistas não estamos do lado da ‘vida’ (se estamos confinados a uma abstração de certo tipo de neutralidade perpétua), então ‘a radiação da vida’ somente pode aparecer onde morte e erotismo caminham juntos.”

Trechos

“Uma mulher mergulhada no sono, que não fala nada, que não ouve nada: não seria, por outro lado, o mesmo que falar tudo, escutar tudo de um velho que já não tem virilidade para fazer companhia a uma mulher? Para Eguchi, entretanto, essa era sua primeira experiência com uma mulher desse tipo. A garota, por certo, já devia ter experiência de deitar-se com velhos como ele. Entregava-se totalmente e ignorava tudo, mergulhada no sono letárgico tal como uma morte aparente, deitada com um rosto quase infantil e respirando com tranqüilidade.” (p. 22)

“A decrepitude hedionda dos pobres velhotes que procuravam aquela casa ameaçava atingi-lo dentro de alguns anos. Quanto da imensurável amplitude do sexo, da insondável profundidade do sexo ele teria tocado na sua vida de 67 anos? Além disso, em volta dos velhotes nasciam incontáveis peles renovadas de mulheres, peles jovens, de garotas bonitas. Os desejos de sonhos impossíveis, o lamento pelos dias que lhes escaparam e que estavam perdidos para sempre não estariam impregnando os pecados daquela casa secreta? Eguchi já havia pensado que as garotas adormecidas o tempo todo seriam uma eterna liberdade para os velhotes. As garotas adormecidas e mudas certamente lhes falavam tudo que eles gostariam de ouvir.” (p. 43)

“Eguchi afrouxou o braço que apertava a garota com força, abraçou-a com carinho e ajeitou seus braços nus de modo que ela o enlaçasse. E ela o abraçou docilmente. O velho manteve-se nessa posição e permaneceu quieto. Fechou os olhos. Aquecido, sentia-se num deleite. Era quase um êxtase inconsciente. Parecia compreender o bem-estar e a felicidade sentidos pelos velhotes que freqüentavam a casa. Ali eles não sentiriam apenas o pesar da velhice, sua fealdade e miséria, mas estariam se sentindo repletos de dádiva da vida jovem. Para um homem no extremo limite da sua velhice, não haveria um momento em que pudesse se esquecer por completo de si mesmo, a não ser quando envolvido por inteiro pelo corpo da jovem mulher.” (p. 53-4)

“Quando se deitavam em contato com a nudez da jovem mulher, os sentimentos que ressurgiam do fundo do seus âmagos talvez não fossem apenas o medo da morte que se aproximava ou o lamento pela juventude perdida. Talvez houvesse neles também certo arrependimento pelos pecados cometidos, ou pela infelicidade no lar, coisa muito comum nas famílias dos vencedores. Decerto os velhotes não possuíam seu Buda, diante do qual pudessem ajoelhar-se e orar. Por mais que abraçassem fortemente a bela desnuda, derramassem lágrimas frias, se desmanchassem em choro convulsivo ou berrassem, a garota nada ficaria sabendo e jamais acordaria.” (p. 80)
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CONTOS DA PALMA DA MÃO

Produção que acompanhou praticamente toda a vida do autor — o mais antigo data de 1923 e o mais recente, de 1964 —, esses brevíssimos contos, gênero literário dileto de Kawabata, foram reunidos pela primeira vez em 1971. Eram, então, 111, de acordo com a seleção acompanhada pelo próprio escritor, que, na época, declarou: “A maioria dos escritores, quando jovens, escreve poemas, enquanto eu escrevia ‘contos da palma da mão’”. Dez anos mais tarde, numa edição já póstuma, e que se tornaria corrente, acrescentaram-se outros onze. É essa, da editora Shinchosha, a referência para a edição lançada agora no Brasil. Quantos são, de fato, os “contos da palma da mão”, é difícil saber ao certo: há pesquisadores que afirmam existirem 175; outros falam em 146.
Em cada uma das narrativas chama a atenção, em primeiro lugar, o poder de concisão. Ao tratar de uma rica variedade de temas — na qual, aqui e ali, identificam-se recorrências que voltaremos a encontrar também nos romances do autor —, Kawabata sabe escolher o essencial, a palavra precisa, e descartar tudo o que não é absolutamente necessário. As imagens são fortes, a escrita é sinestésica e não há lugar para sentimentalismo, divagações e explicações. Muitas vezes encerra-se a leitura de um conto — que contém, numa média de duas a quatro páginas, tamanho que “cabe na palma da mão”, todo um universo dramático — sem a noção exata de seu significado. Paira no ar uma impressão, algo que, a um só tempo, é capaz de impregnar a imaginação do leitor e ficar além do seu entendimento. E então, em algum momento posterior, essa sensação difusa pode vir a se transformar em revelação plena de sentido.

A morte, o amor, a infância, a cegueira, a sensualidade, os laços de família, os sonhos, as expectativas são alguns dos temas que perpassam os contos, e que muitas vezes nascem da observação do que há de mais cotidiano — e, nesse sentido, invisível — na existência. “[…] entre eles há algumas peças não muito razoavelmente fabricadas, mas há algumas boas, que jorraram de minha pluma naturalmente, de seu próprio aval. […] Vive neles o espírito poético de meus dias jovens”, disse o autor certa vez.

Trechos

“E, por fim, quando chegar o dia em que seu coração nublado e ferido fizer com que veja um gafanhoto como um autêntico suzumushi, ou se vier a sentir que o mundo está repleto de gafanhotos, então, nesses momentos, sentirei pena de você por não possuir meios de recordar esta noite; a brincadeira das luzes verdes de sua bela lanterna que desenhavam seu nome no peito daquela menina.” (p. 43)

“Atraído pelo olhar da moça, o homem também me olhou. Esboçou um sorriso safado, por um instante, e logo voltou à expressão séria de antes. No mesmo instante, fiquei sem graça. Então, a moça também corou um pouco e, como se ajeitasse os cabelos, levantou a mão esquerda para seu momoware. Seu rosto ficou oculto atrás da manga do braço erguido. Tudo isso aconteceu num instante, que se seguiu depois que ela tentou arrebatar a vara da mão do homem pela segunda vez. Sentindo ligeira revolta por aquele quê de maldade lançado pelo vendedor de óculos, e com um pouco de remorso por ter espiado os segredos dos outros, retomei a minha caminhada.” (p. 189-90)

“Quando vira o garoto passar na frente da lojinha, ela saíra voando, sem ter tempo de ajeitar o cabelo. Como se acabasse de tirar a touca de banho de mar, seus cabelos estavam em desalinho, deixando-a ansiosa. No entanto, na frente dele, ela era uma menina inibida que não conseguia arriscar um gesto para ajeitar os fios rebeldes de seus cabelos. O garoto, por sua vez, temia que pudesse ofendê-la se lhe pedisse para ajeitá-los.” (p. 334)

“Ela, que vivera sempre perseguindo amores intensos, mesmo agora que estava enferma, não conseguia conciliar o sono sossegado sem sentir, no seu pescoço ou no peito, o braço de um homem. Entretanto, quando seu estado se agravou, ela implorava:
— Segure meus pés! Não posso suportá-los tão tristes.
[…]
No entanto, inesperadamente, as mãos dele tremeram. Sentiu a sensualidade da mulher vinda dos pequenos pés. Aqueles pequenos e frios pés nas palmas de suas mãos suscitaram nele o mesmo prazer de tocar nos pés quentes e úmidos dela. Envergonhou-se das próprias sensações que pareciam profanar os momentos sagrados da morte da namorada. Mas aquele pedido para ele segurar os pés dela não teria sido seu último recurso da arte do amor? Ao pensar nisso, ficou aterrorizado ante a exacerbada feminilidade daquela mulher.” (p. 348-9)
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KYOTO

Obra que deu reconhecimento internacional ao escritor japonês e foi uma das três citadas pela comissão quando este recebeu o Nobel em 1968

Rico em descrições da cidade que foi a capital do Japão por cerca de mil anos (794-1868), Kyoto, de 1962, foi uma das últimas obras finalizadas pelo autor antes de sua morte dez anos mais tarde. Ambientado no período pós-guerra, o livro narra a trajetória de Chieko, filha adotiva de Takichiro, um comerciante de quimonos, e de sua esposa, Shige.

Chieko é uma jovem que trabalha na loja da família e a vê em processo de falência, assim como vários outros pontos comerciais da antiga capital japonesa, em razão de mudanças nos valores culturais, agora fortemente influenciados pelo Ocidente. Durante um passeio pela aldeia de Kitayama, região montanhosa na periferia de Kyoto onde são cultivados cedros, Chieko acidentalmente conhece sua irmã gêmea, Naeko. Separadas ainda quando bebês, criadas em ambientes hierarquicamente distantes entre si, as irmãs agora tentam se aproximar, e se deparam com a inevitabilidade do destino, o afloramento da sexualidade e o surpreendente curso do acaso.

Kawabata desenvolveu uma extensa e profunda pesquisa para mergulhar na cultura, nos costumes e no dialeto da cidade mais tradicional do Japão, revelando na obra aspectos da região de Kyoto desconhecidos mesmo de japoneses, provenientes de localidades distantes, como o próprio autor, nascido em Osaka. As líricas descrições de Kawabata sobre a cidade, sua mescla de antigas e modernas construções, suas datas festivas e belezas naturais, inspiraram duas versões para o cinema, uma do diretor Noboru Nakamura, indicada ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 1964, e outra de Kon Ichikawa, de 1980.

Trechos

“A maioria das casas de Nakagyo tinha virado cinzas na conturbada época que precedera a Restauração Meiji, em 1867, em decorrência de incêndios, os quais ficaram conhecidos como ‘das Espingardas’ e ‘dos Canhões’. A loja de Takichiro tampouco escapara do mesmo destino. Por isso, mesmo que tenha sido preservado o estilo tradicional das lojas da antiga Kyoto, com as portas frontais gradeadas e pintadas de bengara e janelas do tipo mushiko, na realidade, nenhuma delas tinha mais de cem anos. Dizem, contudo, que o grande depósito nos fundos da loja de Takichiro havia escapado daqueles incêndios… Seu estabelecimento praticamente não fora modernizado, em parte devido ao caráter de seu proprietário, mas também por ser um atacado cuja administração não prosperara.” (p. 47-8)

“A beleza das árvores era sem dúvida proporcionada pela beleza da cidade, pelos cuidados com a limpeza em todos os recantos. No bairro de Gion, até mesmo as ruelas mais recolhidas, onde há muitas casas antigas, pequenas e mal iluminadas, são asseadas. O mesmo pode ser dito de Nishijin, bairro conhecido por seus quimonos. Nas imediações, onde se espremem minúsculas lojas que só de olhar causam pena, as ruas são relativamente limpas. Mesmo as pequenas grades de madeira nunca estão empoeiradas. Assim também é no Jardim Botânico, onde não se vêem papéis espalhados no chão. O exército de ocupação norte-americano havia construído ali casas para seus militares e, naturalmente, a entrada fora proibida aos japoneses. Mas, desde a retirada das tropas, o Jardim Botânico voltara a ser como antes.” (p. 63-4)

“Os cedros da aldeia de Kitayama eram todos administrados por pequenos empresários. Contudo, nem toda família era dona de terra. Pelo contrário, poucos o eram. Chieko cogitava se seus pais também teriam sido empregados de alguma família proprietária. A própria Naeko dissera: ‘Estou trabalhando para…’ Tudo havia acontecido vinte anos antes. Chieko teria sido abandonada porque, na época, ter filhos gêmeos era considerado uma vergonha, além do que se acreditava na dificuldade de criá-los com saúde. Era possível que tivessem se preocupado também com os escassos rendimentos da família. Chieko esquecera de perguntar três coisas a Naeko. Por que abandonaram a ela e não a irmã? Quando ocorrera o acidente do pai, sua queda do alto do cedro? Naeko dissera ser ‘recém-nascida’ na época, no entanto… Havia dito também ter nascido na casa do avô materno, um lugar bem mais remoto do que a aldeia dos cedros. Nesse caso, qual seria o nome do lugar?” (140-1)

Fonte:
http://www.estacaoliberdade.com.br/

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José Rubem Fonseca (A Grande Arte)

Parte I

O narrador – protagonista Mandrake e seu sócio judeu Wexler mantêm um escritório de advocacia. Às vezes perdem suas causas, outras ganham (exemplo: o caso da cafetina Miriam). Recebem a visita da prostituta Gisela, ameaçada de morte por Roberto Mitry (tentara chantageá-lo com uma fita de vídeo). Não aceitam o caso por se tratar de chantagem. R. Mitry tenta contratá-los em seguida, para recuperar a fita; paga qualquer preço. No dia seguinte, Gisela aparece morta. Dois dias depois, sua amiga massagista Danusa – ambas estranguladas e com letra P desenhada a faca na bochecha.

Alfredo (marido de Danusa) conta a Mandrake sobre a relação das moças com Cila (ou Laura Lins, dona da butique Messina e de um bom apartamento), aventureira que chegara do NE para “subir na vida”. Na casa de Laura Lins, alertado pela empregada do “sumiço da patroa”, o detetive chama o delegado e amigo de faculdade, Raul. Arrombam a porta e acham Laura morta. Ao sair, Mandrake leva uma carta recém-chegada, através da qual descobre que ela tem um amante e uma amante: Rosa Leitão, casada com o vice-presidente do Banco Aquiles, mas não consegue localizá-la. Raul procura-a inutilmente na boate Lesbos, do anão preto José Zakkai, o “Nariz de Ferro”, inescrupuloso, vaidoso e falador (cita constantemente pensamentos próprios, que atribui a escritores ou pessoas de renome).

Mandrake e Wexler conversam sobre o passado de Mandrake e a situação do escritório (ausências contínuas do primeiro), quando chega Bebel, filha de Rosa Leitão, propondo-se a levar Mandrake até a mãe, que se escondera num sítio em Itaipava. Apesar de Wexler ser contra a idéia de Bebel para o tal sítio acabam indo. Passam a noite juntos e encontram Rosa no dia seguinte. Ela conta a história de Cila e o estabelecimento da relação entre ambas. Mostra ressentimento contra a amante morta e diz que não imagina quem a matou. Talvez o amante “coronel”. Rosa conversa com a filha Bebel. No jardim, Mandrake pensa em Ada, que quer casar-se com ele e ter filhos, e na gata Elizabeth, a “dona” do seu apartamento (o mundo precisa mais de gatos que de gente). Ele ama Ada, mas não consegue ser-lhe fiel.

No Rio, sai com Ada para jantar. Na volta, são surpreendidos no apartamento por dois homens à procura da fita de vídeo. Um deles esfaqueia Mandrake no abdômen e sevicia (violenta) Ada com o cabo da faca. Os dois vão parar no hospital. Mandrake quer vingança. Pede a Hermes (ex-sargento do exército, que livrara da prisão) especialista no manejo de armas brancas, que lhe ensine a arte do Percor (“perfurar” e “cortar”). Ficam quites. Lê e treina muito. Deixa a barba crescer. Ada volta para a casa dos pais, em Pouso Alto. Uma semana depois, o namorado vai atrás dela. Volta sozinho, chamado por Raul. Identifica Camilo Fuentes (boliviano bruto, forte, que odeia brasileiros e é matador profissional) como o homem que os feriu (usava um cordão de ouro com um unicórnio, presente de Berta). Sem provas concretas, Camilo é libertado e viaja para a Bolívia. É seguido pela polícia federal, que pretende flagrá-lo traficando cocaína.

Mandrake resolve segui-lo disfarçado. No trem Mandrake encontra Camilo no restaurante com duas prostitutas, Zélia e Mercedes. Aproxima-se da Mercedes, a mais velha, quando os outros dois se retiram para a cabine. Apresenta-se como comprador de gado. Mercedes finge que acredita. Começa a informá-lo sobre o boliviano e acabam ficando juntos. Camilo Fuentes odeia os brasileiros, pois seu tio Miguel lhe contara que um deles havia assassinado seu pai. Desconfia de Mandrake e de Mercedes (bebe, mas nunca se embriaga). Odeia Rafael (o outro matador de aluguel, que o chama de China), mas vai encontrá-lo para tratarem de “negócios” em Quijarro e depois em Puerto Suárez. Encontram-se todos no “Dancing Days”. Sentindo-se seguidos, adiam os negócios: Mateus manda Fuentes matar Mandrake e volta com Rafael para o Rio. Mandrake, após segui-los até o aeroporto, vai ao restaurante de Alberto e fica conhecendo sua história. De volta ao quarto, encontra Mercedes com o pescoço quebrado: ela fora descoberta por Fuentes, lutaram e ela o cegara, sendo morta. Chama a polícia e depois acompanha o enterro. No cemitério, fica sabendo que Mercedes era agente federal e que ele, com sua bisbilhotice, estragara o plano da captura de Fuentes.

De volta a São Paulo, antes de entrar no apartamento, na Av. São João, Camilo Fuentes procura o jornaleiro Benito, que o avisa que ele está sendo vigiado. Decide ir ao Rio e combinam um encontro no cine Marabá, daí a quinze dias. No Rio procura um oftalmologista, que lhe recomenda um transplante de córnea, pois não enxerga mais com o olho ferido. Conhece Míriam em um supermercado e gosta dela. Apesar de brasileira e ex-cafetina. Volta a São Paulo, mas encontra Benito morto no apartamento. Vai ao cine Marabá, onde percebe uma armadilha para pegálo.

Mata dois homens, mas antes fica sabendo que foram contratados por Mateus (“queima de arquivo”), a mando do Chefe. Mandrake é procurado por José Zakkai (“Nariz de Ferro”), o anão negro, que lhe conta sua história: “Já cuspiram e cagaram em mim. Ou eu morria ou virava essa maravilha que sou” (pg. 151). Por dever favores a Raul, o anão procura Mandrake e o avisa sobre a lista de “queima de arquivo” da Organização (tóxicos, diversões eletrônicas, mulheres, rede de fast-food e de pornografia). Fazem o jogo do “sim” e do “não”, mas Mandrake deixa a última pergunta para outra oportunidade e não aceita a aliança proposta.

Zakkai vai em busca de Camilo Fuentes e os dois se unem para enfrentar o Escritório Central (Org. Aquiles). Começa a “briga” entre Ada e Bebel por Mandrake.

Parte II
Inicia-se com um “flash-back” para explicar a origem da família Lima Prado e da Organização Aquiles. 1845: José Joaquim de Barros Lima nasce no Rio, filho de imigrantes portugueses. O pai é carvoeiro, mas o filho vira bacharel em Coimbra. Aos 42 anos casase com Vicentina Cintra, filha do senador Abelardo Cintra. Sua banca de advogado prospera com a abolição e a república. Trava amizade com políticos e escritores ilustres, mas tem uma frustração literária: não consegue ser reconhecido como grande poeta. Também se frustou como político: morre na véspera de tomar posse como ministro do S.T.F. (Supremo Tribunal Federal). Sua maior frustração provém das duas filhas, que não o amam: Maria do Socorro leva vida dupla: à noite veste-se de homem, chama-se Mário e freqüenta prostitutas em bordéis. Acaba assassinada por uma delas. A outra filha, Laurinda, casa-se grávida aos 16 anos com José Prescilio Prado, de dezessete anos e sobrenome próspero. Após a morte do pai sustenta a mãe no Rio. Laurinda vive em São Paulo e tem três filhos – Fernando, Maria Augusta e Maria Clara.

Torna-se patronesse das artes, recebe escritores, artistas e amantes, patrocina revistas literárias. O marido perde fortunas no pôquer e no vício (drogas), suicidando-se no aniversário de casamento (31 anos de casados). Laurinda vende sua mansão na Av. Paulista e muda para o Rio, com os três filhos: Maria Augusta casa-se com um “nobre” francês, Bernard Mitry, que a abandona e ao filho Roberto; Maria Clara era doente mental, uivava feito lobo e vivia presa no porão; Fernando, casado com Luísa Montillo, vive de um emprego modesto na prefeitura do Rio. Seu filho, Thales Lima Prado, guarda cioso um livro de 500 páginas sobre a vida da família Prado (Retrato de família, de Basílio Peralta, 1949) e sonha tornar-se escritor famoso. Enquanto isso, torna-se banqueiro famoso e presidente da Organização Aquiles. Desde os 19 anos, a avó Laurinda, que o adora, dissera-lhe não ser ele filho de Fernando, mas de Bernard Mitry. Segundo ela, só Thales teria escapado do destino trágico da família Prado. Como presidente da poderosa organização, corrompe políticos, “lava” dinheiro proveniente do tráfico de drogas e outros serviços escusos.

Mantém hábitos estranhos e defende as idéias de Hitler e do nazismo. Ordena a Mateus a “queima de arquivos”: o primo Roberto Mitry (fita de vídeo), Mandrake, Fuentes e o anão Zakkai, que ameaça seu poder. Rafael inicia o “trabalho” com R. Mitry, Titi e Tatá, duas ninfetas com quem este dormia depois de uma festa pesada” em seu apartamento. O crime triplo repercute na imprensa muito mais que as matanças nas favelas. No clube, Lima Prado conversa com um senador sobre “negócios” e sai para encontrar-se com Mônica, com quem faz sexo. Tornam-se amantes. Na verdade, Thales (ou Ajax) é filho de Fernando com a irmã louca. Daí a preferência da avó por ele. Pensa na loucura. Fuentes e Miriam querem começar nova vida. Ela conta a ele sobre o advogado Mandrake. Camilo e Zakkai encontram-se em um circo. O casal muda para uma casa na ladeira Madre de Deus (tentando fugir).

Camilo e Zakkai encontram Rafael em seu sítio. Torturam-no (comer barata) e o anão o mata com uma tesoura. Acham a fita. Zakkai assiste ao vídeo e liga para Thales Lima Prado, que combina um encontro: Hermes vai buscar a fita, mas é morto por Camilo Fuentes. Thales, acuado, suicida-se enfiando uma faca na axila. Deixa seus cadernos de anotações na mesa da cozinha, ao lado de uma garrafa de álcool. Mandrake é abandonado pelas três mulheres. Lilibeth, Bebel e Ada (que viaja com Wexler). Miriam visita o advogado para contar sobre a morte de Camilo Fuentes e para devolver-lhe o unicórnio de ouro. Mandrake decifra os cadernos de Lima Prado, que a polícia não conseguira entender, e soluciona a trama: Thales, em busca da fita, matou as prostitutas e marcou-as com o P. Rosa Leitão, que ascendera socialmente até se casar com o vice-presidente do banco e tornar-se amante do presidente da Organização, assassinou Cila por ciúme, ao flagrá-la com outra mulher. Todos os outros crimes foram atribuídos à “queima de arquivos”. Zakkai assume o controle da Holding que controlava a Pleasure, a Fun e a Fastfood, separando-se do banco. Procurado por Mandrake, responde à terceira pergunta de Mandrake (O que havia na fita? – Nada, só risquinhos). Bebel volta para Mandrake. Falam de amor.

Personagens

Mandrake: narrador-personagem. Advogado com tendências a detetive, solteirão irresistível às mulheres, extremamente sedutor. Aprecia vinhos finos e charutos. Foi menino introvertido e solitário. Embora tenha fobia a sangue, inicia-se na arte do PERCOR (perfurar e cortar), mas não consegue encontrar-se na arte do amar (“amo aqueles que me amam”). Cinismo disfarça insegurança.

Ada: namorada “oficial” de Mandrake, corpo bonito e atlético, acaba desencantando-se e optando pela serenidade de Wexler.

Wexler: advogado judeu, sócio de Mandrake. Apaixonado por Ada, mantém-se ético até o final, quando sai de viagem levando Ada junto.

Thales Lima Prado: Chefe da Organização criminosa “Escritório Central”, constitui-se no grande vilão do livro. Foi militar. Ao tentar escrever um livro sobre a família Prado, descobre-se filho incestuoso e sua personalidade começa a desintegrar-se na loucura. “Patrocina” a grande maioria dos assassinatos do livro, suicidando-se no final (como o Ajax mitológico).

José Zakkai (o Nariz de Ferro): Anão negro, feio e inescrupuloso. Sai do esgoto para tornar-se “uma maravilha”. Vive citando pensamentos e atribuindo-os a escritores e filósofos, para simular erudição.Ambicioso, torna-se o principal adversário de Thales, a quem trai para conseguir a direção dos braços da organização ligados ao tráfico, jogo e prostituição.

Roberto Mitry: primo de Thales, que o usava para desviar recursos ao exterior. Cultivava aberrações sexuais (sado-masoquismo). É assassinado na “queima de arquivos”.

Camilo Fuentes: matador boliviano que odeia brasileiros. Esfaqueia Mandrake e sevicia Ada com o cabo de sua faca. Frio e cuidadoso, bandeia-se para o lado de Zakkai. Morre fuzilado (queima de arquivo).

Hermes: professor na arte do PERCOR, quando militar, assassinou um superior e foi defendido por Mandrake, a quem dá aulas para livrar-se da dívida. É morto por Camilo Fuentes.

Rafael: membro da Organização, é assassino cruel. Ao mesmo tempo, cultiva rosas. É assassinado por Zakkai, com uma tesoura. namoradas de Mandrake: Ada, Bebel, Lilibeth, Berta.

prostitutas: Miriam (cafetina), Gisela, Danusa, Cila, Titi e Tatá…

mulheres arrivistas: Rosa Leitão, Laura Lins (Cila) a família Lima Prado (avós, filhos e netos), de trágica linhagem.

Tempo

Embora procure seguir certa cronologia, apresenta vários cortes: em função das informações fragmentárias que o narrador vai recolhendo sobre os crimes; apresenta cortes cinematográficos e simultaneidade de cenas; há um grande “flash-back” no início da Parte II para que a genealogia da família Prado seja conhecida.

Espaço
Rio de Janeiro: a alta e a baixa sociedade, convivendo violentamente em busca de riqueza e poder. São Paulo – Cuiabá – Bolívia – Pouso Alto (MG).

Sobre o autor postagem em 14/04/08

Fonte:
Digerati CEC 003. (CD Rom)

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Federico Garcia Lorca (A Casa de Bernarda Alba)

A Casa de Bernarda Alba (1936) é a última peça, e a terceira da trilogia de dramas folclóricos, do escritor espanhol Federico García Lorca. Compõem a trilogia as peças Bodas de Sangue(1933) e Yerma (1934).

Dados sobre a obra

Finalizada exatos trinta dias antes de morrer assassinado, em 19 de agosto de 1936, por forças do governo durante a Guerra Civil Espanhola, A Casa de Bernarda Alba, última peça teatral escrita pelo poeta espanhol Federico García Lorca, teve sua montagem de estréia apenas em 1945, em Buenos Aires, cidade na qual Lorca passara cinco meses em 1933, e só viria a ser encenada na Espanha no ano de 1964.

Enredo

Em A casa de Bernarda Alba, seu único texto de teatro escrito em prosa, Lorca recorre ao simbolismo para realizar uma nova investida no teatro. Bernarda Alba, personagem central do texto, é uma matriarca dominadora que mantém as cinco filhas, Angústia, Madalena, Martírio, Amélia e Adela sob vigilância implacável, transformando a casa onde vivem, em um pequeno povoado na Espanha, em um caldeirão de tensões prestes a explodir a qualquer momento.

Com a morte de seu segundo marido, Bernarda decretara um luto de oito anos e submete suas filhas à reclusão dentro das frias paredes de sua casa e das janelas cerradas. Duas das moças, porém, apaixonadas por um mesmo galanteador das redondezas, um rapaz de vinte e cinco anos chamado Pepe Romano, desencadeiam no meio daquele luto uma disputa cruel e perigosa para conquistarem o amor daquele mesmo homem, com conseqüências trágicas.

A construção central do drama de Lorca – a casa na qual uma família de mulheres solitárias é controlada por uma mãe centralizadora e tirânica – teria sido inspirada por uma família da pequena cidade granadina de Valderrubio, onde os pais do poeta tinham uma propriedade rural e conheceram certa Frasquita Alba, mãe de quatro filhas às quais comandava com mão de ferro e um homem de nome Pepe de la Romilla, que teria se casado com a filha mais velha de Frasquita por seu dote e, posteriormente, se envolvido com a mais jovem das irmãs. Dessa história real, Lorca apropriou-se da idéia de uma casa sem homens para compor o tema central de La Casa de Bernarda Alba, qual seja o lugar da mulher na sociedade espanhola.

Estrutura e trama

O drama divide-se em três atos, todos situados no interior da casa de Bernarda Alba, mãe de cinco filhas – Angustias, Madalena, Amélia, Martírio e Adela – que vive com elas e sua mãe senil em um pequeno povoado do interior da Espanha.

Primeiro ato

O primeiro ato inicia-se com um diálogo entre La Poncia, serva mais antiga da casa, e outra mulher que Lorca denomina apenas por Criada. Elas conversam enquanto arrumam a sala de visitas para a chegada dos que acompanharam o cortejo fúnebre do segundo marido de Bernarda Alba, e por intermédio das falas dessas duas personagens é que são apresentadas a personagem-título do drama, descrita como tirana de todos los que la rodean e mãe controladora das cinco hijas feas que lhe restaram com a morte do esposo, bem como as demais personagens e a própria ambientação da trama. Sabe-se também que Angustias, a filha mais velha, é fruto do primeiro casamento de Bernarda Alba e a única detentora de um dote deixado pelo pai, ao contrário das irmãs, que nada herdam do pai recém-falecido.

Entram em cena as mulheres vindas do enterro de Antonio Maria Benavides, e Bernarda dá ordens às criadas para que sirvam os homens, que ficaram a conversar do lado de fora da casa. É ela também quem conduz as orações pelo morto e, depois da saída das convidadas, maldiz o falatório que, acredita, será iniciado pelas pessoas daquele povoado assim que passarem pelos umbrais de sua porta. Bernarda anuncia que as mulheres da casa manterão um luto de oito anos, nos quais permanecerão trancadas naquela casa, sem contato com o mundo exterior. Ouvem-se gritos e a Criada surge a contar para Bernarda Alba dos desvarios de Maria Josefa, avó das moças; ela ordena à serviçal que leve sua mãe para o pátio, para que os vizinhos não a ouçam, mas orienta em que lugar específico deve ser mantida a velha senil para que os vizinhos não a vejam.

Dando por falta de sua filha Angustias, Bernarda descobre que a moça estava a conversar com um homem no portão de casa e espanca-a; ela opõe-se à idéia de que suas filhas mantenham qualquer relacionamento com os homens. Amélia e Martírio, espelhando as palavras de Bernarda, comentam sobre a história do pai de Adelaida, uma moça do povoado, cujas desilusões que causou às mulheres são aludidas como sinal do terror que é a convivência com os homens. Magdalena, por sua vez, entra em cena para contar às irmãs que Angustias, a mais velha, será pedida em casamento por Pepe el Romano – o que ela atribui apenas ao interesse do jovem rapaz pelo dote da irmã. Adela, a mais nova, apaixonada em segredo pelo pretendente da irmã, lamenta sua sorte.

O primeiro ato encerra-se com a aparição de Maria Josefa, a mãe de Bernarda Alba, que expressa em sua loucura a vontade das netas: ¡Quiero irme de aqui, Bernarda! ¡Bernarda, yo quiero um varón para casarme y para tener alegria! Apesar de o drama de Lorca ter em seu título a chefe da família de mulheres solitárias, Bernarda Alba, muito se questiona sobre quem seria a real protagonista da história. Ainda que não esteja presente em todas as cenas, a personagem da matriarca está contida em todas as ações por ser a referência de medo, de ordem e, conseqüentemente, de transgressão na vida das filhas e criadas . É pelo discurso das personagens que a presença de Bernarda Alba impõe-se em cena desde o primeiro ato, que tem poucas ações e apresenta um caráter quase didático em seu início, que funciona à guisa de prólogo semelhante ao antes visto no Filoctetes, de Sófocles, no qual duas personagens apresentam uma terceira quase em tom narrativo, para situar a audiência na trama.

Segundo ato

No segundo ato, as irmãs encontram-se em uma peça interior da casa, tecendo e bordando o enxoval de Angustias. Conversam sobre a corte de Pepe el Romano à irmã mais velha, e La Poncia faz um contraponto aos comentários de Angustias ao contar sua própria história de como conheceu e casou-se com um marido que pouca alegria lhe trouxera.

Adela não está presente e as irmãs preocupam-se com ela; procurada pelas irmãs, Adela surge em cena algo transtornada, e La Poncia diz-lhe em particular que seu mal é cobiçar o noivo de sua irmã. A serva tenta convencer a filha mais nova de Bernarda Alba que seu destino é aguardar que sua irmã venha a falecer para assumir o posto de segunda esposa de Pepe el Romano, e diz que assim o faz para defender a honra da casa em que trabalha há tantos anos. Adela revolta-se com La Poncia e afirma que lutará por seu direito de amar o homem que deseja. As demais irmãs, por sua vez, lamentam seus destinos de mulheres solitárias, quando La Poncia conta-lhes sobre os novos homens que chegaram ao povoado, trabalhadores para a colheita próxima, do qual se ouve o canto distante. Quando saem as irmãs para espiar pelas frestas das janelas os homens que passam na rua, Angustias surge em cena reclamando o desaparecimento de uma fotografia de Pepe el Romano, que estava em seu quarto, presente de seu noivo.

Bernarda ordena que La Poncia procure o retrato desaparecido; as suspeitas recaem sobre a mais jovem, Adela, mas a serva encontra-o entre as roupas de dormir de Martírio. Bernarda ameaça espancar a filha, que diz ter sido o ato apenas uma brincadeira inocente que fizera com a irmã, Angustias, mas Adela acusa Martírio de nutrir uma paixão secreta por Pepe el Romano. As paixões ocultas, a inveja e a hipocrisia começam, então, a ser desmascaradas: Martírio e Adela dizem a Angustias que Pepe el Romano casa-se apenas por interesse em seu dote, e Bernarda ordena, rispidamente, que as filhas se calem.

La Poncia, em conversa reservada com a matriarca, diz suspeitar que Martírio escondera o retrato por conta do amor de Enrique Humanes, um rapaz que a cortejou mas que fora rechaçado pela mãe por ser de uma classe social inferior. Bernarda, desgostosa com os comentários da serva, relembra-a que ela está naquela casa por piedade da matriarca, que a acolhera ainda jovem, mesmo sendo La Poncia filha de uma meretriz. Sem perceber o perigo do comentário, La Poncia conta que Pepe el Romano esteve até às quatro e meia da madrugada a conversar a noiva, mas diante da negativa de Angustias percebe-se que ele esteve em companhia de outra pessoa da casa. Martírio e Adela conversam em particular e a mais jovem revela que Pepe el Romano está a cortejá-la em segredo.

La Poncia traz a notícia de uma jovem da aldeia que engravidara sendo solteira, dera à luz um menino em segredo e que o matara, sendo o crime revelado por acaso do destino; ouve-se o povo nas ruas que clama pelo linchamento da moça; Bernarda e Martírio saem em apoio à morte da pecadora, enquanto Adela desespera-se e clama pela libertação da moça, recordando que ela também corria perigo por seu amor secreto por Pepe.

Nesse segundo ato, Lorca antecipa diversos elementos que irão desencadear no desfecho apresentado no ato seguinte, como antes fizera no primeiro ato ao mostrar a paixão de Adela por Pepe el Romano: sabe-se então do amor e da inveja de Martirio pelo casamento de Angustias por meio de uma revelação que beira o inverossímil – a primeira furta da irmã que está noiva um retrato do futuro marido – e do envolvimento carnal de Adela com o rapaz, sugerido pelas ações finais do segundo ato. A situação trágica – a entrada, no universo fechado da casa de Bernarda Alba, do elemento masculino e o desequilíbrio por ele causado na harmonia inicial – é preparada para a catástrofe final, apresentada no ato final.

Terceiro ato

O terceiro ato passa-se no pátio interno da casa de Bernarda Alba, onde a matriarca recebe a visita de Prudência e com ela compartilha de uma ceia modesta. A visitante conta a Bernarda Alba de seus desgostos por conta de sua filha, expulsa de casa pelo pai. Angustias e Martírio estão brigadas, e Bernarda insiste que elas façam as pazes ao menos para manter as aparências de um lar em harmonia. A filha mais velha diz desconfiar de Pepe, que lhe avisara que aquela noite não iria à casa por conta de outros compromissos com os pais em outro povoado, e todas retiram-se para dormir. Bernarda e La Poncia conversam sobre as suspeitas da empregada de que uma cosa tan grande estaria a passar na casa; a matriarca rechaça essa idéia, e diz confiar que em suas mãos está o controle total do que se passa ali.

La Poncia parece antever a desgraça que se aproxima e comenta com a Criada sobre o envolvimento de Adela e Pepe; a moça aparece no pátio e some logo em seguida, entrando no curral. Maria Josefa, a mãe de Bernarda, surge em cena carregando uma ovelha nos braços e, em sua loucura, fala do poder de Pepe el Romano sobre todas as netas, às quais agoura um destino cruel de solidão. Martírio vai até o curral e chama Adela, que aparece algum tempo depois, recompondo-se; elas brigam por conta do que Adela estaria a fazer com a irmã mais velha, Angustias, ao roubar-lhe o futuro esposo, mas Adela acusa Martírio de também estar apaixonada pelo rapaz, e esta acaba por confessar que o ama. Seguem as duas brigando, pois Martírio diz que irá denunciá-la, e Adela fala de sua intenção de fugir e tornar-se amante de Pepe el Romano.

Bernarda aparece no pátio e ameaça surrar Adela; esta toma-lhe o bastão das mãos e quebra-o em duas partes. Com o alvoroço de vozes, as demais mulheres surgem em cena. Adela diz, então, a Angustias que ela, a mais jovem, é a verdadeira mulher de Pepe; Bernarda sai de cena e busca uma escopeta com a qual entra no curral e atira. Martírio mente, dando a entender que a mãe matara Pepe el Romano, que na verdade apenas correra com o disparo. Adela corre para o curral e lá se tranca; Bernarda ordena que Adela abra a porta, mas é La Poncia quem abre o curral e descobre a tragédia: Adela está morta, enforcada.

Bernarda, diante da comoção de todas e da notícia trazida pela criada de que os vizinhos já se levantavam para ver o que acontecia naquela casa, ordena que a filha morta seja vestida como si fuera doncela e que as demais filhas mantenham silêncio sobre o que ali se passara.

O final do drama, como nas demais peças estudadas, parece precipitado – e tal sensação é ainda mais forte em A Casa de Bernarda Alba por conta da rapidez com que os acontecimentos – e as falas – finais se sucedem. A situação trágica agudiza-se com a presença de Pepe el Romano no curral, onde mantém um encontro furtivo com a filha mais nova, Adela, e tal situação parece insuportável para Martírio, talvez por uma associação de diversos sentimentos: a dor de ver seu objeto de desejo interessado na irmã mais nova; a sensação de que ele, pela primeira vez, adentra a casa, domínio das mulheres, ameaçando o equilíbrio da família; e a inveja por saber que duas irmãs o possuem – uma pelo dote e pelo casamento, outra pelo desejo e pelo amor carnal – e nada para ela restara a não ser a lembrança de um amor do passado que lhe fora impedido pela mãe.

Do momento em que o conflito entre Martírio e Adela é deflagrado até o ato desesperado de Adela, o drama de Lorca é acelerado pela brevidade das falas e intempestividade das ações das personagens, sobretudo de Bernarda Alba, que parece agir rapidamente na tentativa de retomar a harmonia da casa, tão profundamente abalada pelos acontecimentos.

A verossimilhança, que a princípio seria abalada pela decisão extrema de Adela em se matar diante da possibilidade da morte do amado, não se vê ameaçada por conta da forma intensa que o autor escolheu para terminar seu drama, oferecendo à audiência uma solução trágica, para uma situação dramática opressora e claustrofóbica, que parece funcionar como única alternativa possível para a personagem Adela diante de um mundo que só lhe oferecia limites e nenhuma escolha.

Sobre a Peça

Lançando mão de personagens-tipo, representantes de condutas sociais claramente marcadas, o último drama rural lorquiano consegue agudizar ainda mais a crítica iniciada por Bodas de Sangue (1933) e Yerma (1934). Cada uma das personagens tem um comportamento diferente do das demais, o que destaca sobremaneira várias nuances da sociedade espanhola. Assim como fazem o Estado e a Igreja, Bernarda Alba cerceia a liberdade de suas filhas – representantes do povo, reprimido e assustado, incapaz de enfrentar o sistema que o sufoca, embora desejoso de mudanças e liberdade -, esconde sua mãe e oprime os empregados. De acordo com FOUCAULT (2004: 247), “Geralmente se chama instituição todo comportamento mais ou menos coercitivo, aprendido. Tudo que em uma sociedade funciona como um sistema de coerção, sem ser um enunciado, ou seja, todo o social não discursivo é a instituição”.

Sob essa perspectiva, não somente as instituições públicas são responsáveis pela opressão do indivíduo. A que se destacar, também, o imenso poder que emana do núcleo familiar, instituição privada que fortalece as bases do sistema político autoritário que está prestes a dominar a Espanha que Lorca retrata. Ainda segundo FOUCAULT (2004: 249), o poder flui através dos discursos, a partir de um ponto que aos pouco se irradia:

De modo geral, penso que é preciso ver como as grandes estratégias de poder se incrustam, encontram suas condições de exercício em micro-relações de poder. Mas sempre há também movimentos de retorno, que fazem com que as estratégias que coordenam as relações de poder produzam efeitos novos e avancem sobre domínios que, até o momento, não estavam concernidos.

Analisada sob a ótica foucaultiana, a última peça escrita por García Lorca permite afirmar que o poder político que o Estado e a Igreja demandam, na sociedade espanhola, oferece a Bernarda a credencial necessária para reproduzir em microcosmo o despotismo observado em macroescala. Para a filha que ousou ultrapassar os padrões de comportamento impostos, resta a morte: castigo para aqueles que, como o que vitimou próprio autor da peça, é imputado àqueles que ousam desacomodar a ordem vigente.

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/A_Casa_de_Bernarda_Alba
– Luciana Ferrari Montemezzo. O Poder e as instituições na Casa de Bernarda Alba. In http://coralx.ufsm.br/grpesqla/revista/num09/art_05.php
– Imagem = http:// http://www.tap.org.br/

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Sir Arthur Conan Doyle (Sherlock Holmes: Um Estudo em Vermelho)

No mundo inteiro dificilmente se encontrará alguém que não conheça Sherlock Holmes, talvez o mais famoso e genial detetive de todos os tempos. Durante o século 19 seu nome se tornou um ícone em quase todas as linguas do mundo, garantindo a ele mais admiração e respeito que os reais detetives da atualidade. Mas isso não surpreende pois seus métodos de investigação não podem ser imitados por ninguém.

Sherlock Holmes foi criado por Sir Arthur Conan Doyle, autor britânico, em fins do século 19. Um Estudo em Vermelho foi a primeira prova das habilidades de nosso imortal herói.

A sala de estar estava cheia de ouvintes: havia, por exemplo, alguns homens da Scotland Yard que buscavam fama e respeito dos londrinos que diriam “quão bem eles haviam investigado o caso”. Subitamente dois garotos entram na sala acompanhados de um velho.

“Deixe-me apresentá-los ao assassino!”, gritou Sherlock Holmes apontando o velho, que era um dos poucos proprietários de carruagem de Londres. A longa e misteriosa estória estava pronta para iniciar. O velho, Sr Jeferson Hope, não tinha nada a dizer pois era incapaz de esconder qualquer detalhe de Sherlock Holmes.

Vingança, velhos ódios e ressentimentos tinham um papel muito importante a desempenharem na estória. O caso tinha se iniciado a muito tempo atrás longe da Inglaterra, mas as consequências deste passado não morreram até Jeferson Hope estar apto a vingar o que seus inimigos haviam feito a sua amada e ao pai dela.

O Sr Hope não era um prisioneiro típico que chora, tenta lutar e recusa-se a admitir que o jogo esta terminado. Ele era um velho moribundo que não se importava com o que lhe aconteceria no futuro.O fato de seus inimigos terem pago, através de suas mãos, pelos trágicos acontecimentos do passado era suficiente. Ele queria nada mais do que contar toda a verdade e morrer redimido.

A complicada verdade torna-se clara mais tarde quando Sherlock Holmes tem a oportunidade de explicar suas investigações ao Doutor Watson. Meu livro quase caiu ao chão quando percebi quão simples tudo realmente havia sido. “O maior erro que pode ser cometido é fazer as coisas mais complicadas do que elas realmente são”, Sherlock Holmes explica. Mesmo nos dias de hoje cada palavra sua ainda é verdade: as pessoas tornam tudo difícil quando elas mesmas fazem parecer difícil.

Doutor Watson, que sempre trabalhou com Sherlock Holmes tentando ajudá-lo, ficou também boquiaberto. Ele era uma pessoa muito inteligente e calma, entretanto inábil em perceber os detalhes “claros” como pegadas e cinzas de diferentes tipos de cigarro. Ele só podia escutar e observar como seu amigo trabalhava. Sherlock Holmes, que não era o companheiro ideal, estava pronto a responder qualquer pergunta. Ele não queria esconder sua genialidade e inteligencia de ninguém, mas acima de tudo, ter seus talentos notados.

Mesmo em sua vida diária o comportamento de Sherlock Holmes era quase auto didata. Ele tinha muitas opiniões fortes que todos deviam aceitar. “Eu não tenho que ser interessado em nada”, era um de seus pensamentos favoritos. Emoções e relacionamentos com outras pessoas não significavam nada para ele. Doutor Watson era talvez a única excessão.

Acredito que Sherlock Holmes era, apesar de seu comportamento orgulhoso, uma pessoa que merece todo o respeito do mundo. Ele devotou sua vida a capturar assassinos e outros criminosos, fazendo seu trabalho fiel e cuidadosamente. Já seu primeiro caso “Um Estudo em Vermelho” deixa claro que ele sabia exatamente o que estava fazendo. Ele não era somente um jovem e inexperiente garoto mas um super inteligente detetive.

O modo como o Sr Conan Doyle conduz e descreve os eventos e pessoas em seu primeiro romance merece todo meu respeito. Suas descrições exatas me fizeram sentir como se eu fizesse parte do que estava acontecendo. Até as pessoas, descritas tão cuidadosamente, me fizeram imaginar outras coisas que não foram mencionadas: como elas falavam, que tipo de voz tinham e como elas realmente se pareciam. A linguagem era também clara e vívida com frases não muito complicadas de entender.

Se voce quer ler algo muito emocionante e que não o deixe entendiado voce deve realmente ler “Um Estudo em Vermelho” ou outras estórias de Sherlock Holmes. Com seus enigmas muito complicados eles lhe oferecerão uma boa oportunidade de voce usar sua imaginação. A resposta da pergunta “quem fez isso” nunca está escondida atrás da próxima porta; a casa inteira tem que ser investigada.

Fontes:
http://www.netsaber.com.br/resumos/

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Salman Rushdie (Sinopse de Alguns Livros)

Harun e o mar de histórias

A imaginação de uma criança depende do quanto ela possa nadar, boiar, brincar, chapinhar no enorme “mar de histórias”.

“Harun e o mar de histórias” é a primeira história escrita por Salman Rushdie, num dos lugares onde esteve refugiado depois de ter sido condenado à morte, após ter escrito Versículos Satânicos.

Em “Harun e o mar de histórias”, Salman Rushdie conta-nos a história de Harun, um menino, cujo pai era um famoso contador de histórias no mítico país de Alefbey. Um dia a mãe de Harun decide fugir com um crítico do trabalho do marido. (”Para que servem as histórias, se nem sequer são verdade?” dizia ele. Harun revoltado com a fuga da mãe faz a mesma pergunta ao pai, Rashid. Este com o coração partido, perdeu a alegria de viver e o dom da palavra, não conseguindo contar nem mais uma história. Abria a boca e nada saía.

Harun descobre que o pai, magoado, tinha cancelado o seu contrato com a “água das histórias” situada numa segunda lua da Terra cuja órbita é tão rápida que até hoje não foi detectada pelos satélites.

Uma noite, Harun ouve um barulho. Vai ver. Era o génio Iff, vindo da lua de Kahani, a desligar a canalização da água de histórias. Conversam os dois e Harun começa a fantástica aventura na procura das palavras para devolver ao pai, viajando com o génio até à lua de Kahani. Vamos com ele até ao momento em que deslumbra a superfície desta lua, e vê que ela é coberta pelo Mar de Fios de Histórias: Harun olhou para a água e viu que esta era feita de milhares e milhares de correntes diferentes, cada uma de sua cor, que se entrelaçavam como uma tapeçaria líquida, de uma enorme complexidade. E Iff explicou que aqueles eram os Fios de Histórias, e que cada fio colorido representava e continha uma única narrativa. Nas diferentes áreas do Mar havia diferentes tipos de histórias, e como todas as histórias que já foram contadas e muitas das que ainda estavam para ser inventadas se podiam encontrar ali. O Mar de Fios de Histórias era, na verdade, a maior biblioteca do universo. E como as histórias ficavam ali guardadas em estado líquido, elas conservavam a capacidade de mudar, de se transformar em novas versões de si mesmas, de se unirem a outras histórias. Assim, ao contrário de uma biblioteca, o Mar de Histórias era muito mais do que um depósito de livros. Não era um lugar morto. Era um lugar cheio de vida.

Harun percebe então que o mar está cheio de peixes “milbocas” que engolem histórias e em cujas entranhas “acontece um milagre”: um bocadinho de uma história junta-se com uma ideia de uma outra e pronto! Quando os peixes cospem as histórias, elas já não são as mesmas, são outras novas. Nenhuma história vem do nada; elas nascem das velhas. São novas combinações que fazem com que elas sejam novas.

Escapando de muitos perigos, Harun conseguirá vencer as tenebrosas forças da escuridão e do silêncio.

O mar de histórias é uma metáfora para a textura narrativa. Quanto mais complexa, colorida e diversa é essa textura, mais vivo estará o mar.

Salman Rushdie dedicou esta história ao seu filho Zafar, então com nove anos. Uma narrativa com humor, uma defesa da criação, da fantasia e da liberdade. Uma celebração da alegria de contar histórias e do prazer de ouvi-las e lê-las.

“Há milhares de fios de histórias, há milhares de peixes de “milbocas”, a vitalidade da narrativa está simbolizada nesta história de Rushdie. Quanto mais histórias forem contadas, ou contadas por um maior número de pessoas, maiores são as possibilidades de recriação, logo de maior vitalidade imaginativa. A imaginação de uma criança depende do quanto ela possa brincar, nadar, boiar, chapinhar no enorme “mar de histórias”.
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Shalimar, O Equilibrista (Brasil) ou Shalimar, o Palhaço

É uma obra de ficção de Salman Rushdie publicada em 2005 e que conta a história do personagem Shalimar, da infância à morte, da sua carreira como artista a assassino profissional, tendo em foco em quatro personagens fundamentais: Índia/Cachemira, Boonyi, Max, e o próprio Shalimar. O livro não segue a ordem cronológica dos eventos e inicia-se com um misterioso assassinato que se desvenda ao longo do romance.

O lançamento mundial do livro teve como principal evento a Festa Literária Internacional de Paraty, no Brasil, em 2005, com a presença do autor.
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O Chão que Ela Pisa

Publicada em 1999. É um romance viciante. 575 páginas que assustam quem olha por fora e suspendem quem olha por dentro. Mas, do início então. “O Chão que ela pisa” é a história do casal Ormus e Vina, contada por Ray.

Ormus e Vina formam o núcleo artístico e pensador do VTO, uma banda de rock que vende bilhões de discos, incomoda a ordem vigente com suas letras e que é o veículo de expressão do amor louco de Ormus por Vina, e vice-versa.
Ray é fotografo, amigo de Ormus, amante de Vina. É ele quem conta a história depois de todo o desastre.

O romance é a recriação do mito de Orfeu e Eurídice. No mito, Orfeu desce ao inferno para buscar Eurídice, morta por uma picada de cobra. Nesse romance, Vina, tragada por um terremoto, é o caminho do inferno para a dupla Ormus/Ray, mas, a certa altura, o interlocutor questiona: “Será que o fracasso de Orfeu em resgatá-la é uma prova do destino inevitável do amor (ele morre); ou da fragilidade da arte (ela não é capaz de levantar os mortos); ou da covardia platônica (Orfeu não morre para estar com ela; não é nenhum Romeu, ele); ou da dureza dos, digamos, deuses (eles enrijecem o coração contra os amantes) ?”.

O pano de fundo da história é o rock and roll e a nascente industria de celebridades. A certa altura Ray contempla:

Por que a gente gosta de cantores? Onde se esconde o poder das canções? Talvez se origine da mera estranheza de se existir canto no mundo. A nota, a escala, o acorde; melodias, harmonias, arranjos, sinfonias, ragas, óperas chinesas, jazz, blues: o fato de essas coisas existirem, de termos descoberto os intervalos mágicos e as distâncias que produzem o pobre punhado de notas, todas ao alcance da mão humana, com as quais construímos nossas catedrais sonoras, é um mistério tão alquímico quanto a matemática, ou o vinho, ou o amor. Talvez os pássaros tenham nos ensinado. Talvez não. Talvez sejamos, simplesmente, criaturas em busca de exaltação. Coisa que não temos muito. Nossas vidas não são o que merecemos. De muitas dolorosas maneiras elas são, temos de admitir, deficientes. A música as transforma em outra coisa. A música nos mostra um mundo que merece os nossos anseios, ela nos mostra como deveriam ser os nossos eus, se fôssemos dignos do mundo“.

O “Chão que ela pisa” é romance contemporâneo, clássico, vivo, instigante e inteligente. É uma história de amor, morte e rock and roll. É cultura popular global. É obrigatório. E, ah, claro, Salman Rushdie é, sim, autor dos Versos Satânicos, e a canção do VTO, letra de Ormus, que dá titulo ao livro, The ground beneath her feet, foi definido por Toni Morrison como uma obra global. O título inspirou uma canção homónima da banda irlandesa U2.

Fontes:
http://www.screamyell.com.br/literatura/chaoquelapisa.htm
http://pt.wikipedia.org
http://www.interescolas2006.esel.ipleiria.pt/?p=129

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Elizabeth Kostova (O Historiador)

O Historiador consumiu 10 anos de pesquisas da autora, Elizabeth Kostova, e é inspirado na história real de Vlad, o Conde Drácula, numa mistura magistral de folclore e mito, com preciosos dados históricos, antropológicos e geográficos. Mas a explicação de seu imenso sucesso está na força dramática do seu enredo e na imensa vitalidade de seus personagens.

Certa noite bem tarde, ao explorar a biblioteca do pai, uma jovem encontra um livro antigo e um maço de cartas amareladas. As cartas estão todas endereçadas a “Meu caro e desventurado sucessor”, e fazem mergulhar em um mundo com o qual ela nunca sonhou – um labirinto onde os segredos do passado de seu pai e o misterioso destino de sua mãe convergem para um mal inconcebível escondido nas profundezas da história.

As cartas fazem alusão a um dos poderes mais maléficos que a humanidade jamais conheceu, e a uma busca secular pela origem desse mal e sua erradicação. É uma caça à verdade sobre Vlad, o Empalador, o governante medieval cujo bárbaro reinado gerou a lenda de Drácula. Gerações de historiadores arriscaram reputação, sanidade, e até mesmo as próprias vidas para conhecer essa verdade. Agora, uma jovem precisa decidir continuar ou não essa busca – e seguir seu pai em uma caçada que quase o levou à ruína anos antes, quando ele era um estudante universitário cheio de energia e sua mãe ainda era viva.

Fonte:
http://www.americanas.com.br

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Ueda Akinari (Morada das Sarças)

conto integrante do livro: Os contos da Chuva e da Lua

Personagens Principais: Katsushirô, Miyagi
Local: Província de Shimoosa
Tema: Fidelidade

Katsushirô decide tentar uma vida melhor na cidade, para tanto, tem que deixar sua mulher, pois, não teria como leva-la junto consigo. Não querendo deixar a esposa, Katsushirô promete que voltará para casa, o mais breve conseguisse vender todas as sua peças de sedas e conseguisse um bom dinheiro e a esposa aceita e promete que estará esperando por ele, na mesma casa onde eles moravam.

Passam-se anos e a província de Shimoosa, passa por um período de guerra e todos os moradores da província fogem para salvar suas vidas e Miyagi, mesmo sabendo que sua vida corria risco, permanece na sua casa, na esperança de o marido voltar.

O marido, ao saber que a Província de Shimoosa, estava em guerra, acha que a mulher está morta e já não tem porque voltar, já que tudo o que tinha conseguido conquistar com a venda de sedas tinha sido furtado e sua casa, imaginava ele, já nem devia existir mais. Então ele permaneceu onde estava, pois para ele não restava mais aonde ir.

No entanto, a esposa persiste na Província de Shimoosa, ressentida pelo marido não ter cumprido a promessa, mas ao mesmo tempo, esperançosa de algum dia ter o marido de volta. Dessa forma, Miyagi persiste até o último dia de sua vida.

O marido, depois de um tempo, ressentido pelo remorso, regressa a Província de Shimoosa, a fim de ter notícias de sua esposa, porém sem esperanças de encontra-la viva. A sua surpresa ao chegar a sua casa foi tê-la encontrado na casa. A mulher o recebeu e Katsushirô emocionado pede perdão a esposa, que mostrou-se fiel a ele até o último momento.

Fontes:
http://www.netsaber.com.br/resumos/

Capa do Livro http://www.estampa.pt

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Umberto Eco (O Nome Da Rosa)

Quando Eco publicou a sua primeira obra de ficção, em Setembro de 1980, um romance passado na Idade Média, ninguém (e menos ainda o próprio autor) era capaz de imaginar o sucesso internacional sem paralelo que teria. Em 1986, o realizador francês Jacques Annaud fez um filme com Sean Connery, Christian Slater e F. Murray Abraham. Assim, pouco tempo após a publicação do romance, já a reputação de Umberto Eco ultrapassara largamente o círculo relativamente pequeno de eruditos e intelectuais familiarizados com a sua obra teórica e ganhara fama internacional.

O livro tornou-se um best-seller no mundo inteiro, desencadeando um debate crítico acerca do seu significado e importância, que ainda hoje continua a inspirar comentários extremamente sofisticados. A literatura crítica sobre este romance transformou-se numa espécie de pequena indústria que vai desde os guias práticos com a tradução das muitas passagens em latim, para ajudar o leitor menos instruído, até volumes mais eruditos dedicados a questões teóricas implicitamente suscitadas pelo texto. Pela sua natureza pós-moderna o livro pelo menos três tipos de leitura:

A primeira categoria de leitores será seduzida pelo enredo e pelos golpes de teatro e aceitará igualmente as longas discussões livrescas e os diálogos filosóficos, pois aperceber-se-á de que é precisamente nessas páginas divagantes que Se aninham os signos, os indícios, os sintomas reveladores.

A segunda categoria deixar-se-á arrebatar pelo debate de ideias e tentará estabelecer conexões(que o autor se recusa a autorizar) com o presente.

A terceira dar-se-á conta de que este texto é um tecido feito de outros textos, um giallo de citações.

Seja como for, o autor recusa-se a revelar a qualquer destas categorias o que o livro significa. Se escreveu um romance é porque descobriu, chegado à maturidade, que essas coisas sobre as quais não se pode teorizar devemos narrá-las. O aspecto mais significativo da arte narrativa de Eco é o consumado talento com que muda constantemente de um nível para outro, com o objectivo de seduzir os seus três públicos.

A história passa-se em finais de Novembro de 1327 numa abadia beneditina no Norte de Itália, para a qual se dirigem um franciscano inglês, Guilherme de Baskerville, e o seu noviço beneditino alemão, Adso de Melk. Guilherme é ali enviado por Luís IV da Baviera (m. 1347) para encetar negociações entre o Papa João XXII (m. 1334) e um grupo de franciscanos críticos do Papa e da Igreja Católica por causa da atitude tolerante da Igreja para com as riquezas e da forma como negligencia a prática da pobreza pregada por Cristo. Quando Guilherme chega, depara com uma situação de emergência: um monge foi encontrado morto e em breve descobrem outros mortos, não se sabe se assassinados. Pedem-lhe que resolva os mistérios, antes de o grupo do Papa chegar, visto que faz parte dele um inquisidor, Bernardo Gui.

Então, Guilherme dedica-se a investigar o caso no gigantesco edifício da abadia e sua biblioteca construída como um labirinto com passagens secretas, alçapões e recessos obscuros. No decurso da sua investigação, o leitor fica a saber muitas coisas sobre a história eclesiástica da época, sobretudo os vários movimentos heréticos que se opõem às riquezas acumuladas pela Igreja no exercício do poder temporal, bem como grande cópia de pormenores a respeito dos variados tipos de manuscritos que nessa época se podiam encontrar numa biblioteca abacial verdadeira.

O romance acaba quando se descobre que um velho monge cego originário de Espanha, Jorge de Burgos, é a mente perversa que está por detrás de grande parte dos aterradores acontecimentos. Esta revelação, bem como a descoberta de que os crimes e maquinações de Jorge visavam ocultar o livro perdido de Aristóteles sobre a comédia, dá-se demasiado tarde para Guilherme, que com Adso escapa por pouco à morte num terrível incêndio que engole a abadia e a sua inestimável biblioteca (incluindo o manuscrito de Aristóteles.

Guilherme é um frademedieval particularmente anacrónico, e os seus anacronismos reflectem o sentido de humor pós-moderno de Eco.É adepto dos ensinamentos de Roger Bacon (e. 1214-c.1292), Guilherme de Occam (c. 1285-1349) e Marsilius de Padua (c. 1275-1342), o que é de esperar num erudito medieval. Mas também possuía um conhecimento mais que superficial da teoria semiótica contemporânea de Peirce e Eco! E Guilherme de Baskerville fumaria uma forma medieval de marijuana, usava óculos e estava equipado com um imã que lhe prestou bons serviços quando se perdia no labirinto da biblioteca. Assim, é uma combinação de Sherlock Holmes, de filósofo céptico, de semiótico e de frade. Esta combinação de características aparentemente díspares segue a melhor tradição dos mais famosos detectives da ficção policial, de Edgar Poe e Conan Doyle aos nossos dias. Uma das lições que Umberto Eco nos parece querer transmitir é que a procura da verdade não deve precisar de inquisição e outras ameaças às vidas das pessoas.

Fontes:
http://www.netsaber.com.br/
http://raquelsallaberry.com

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Umberto Eco (Baudolino)

Porque é verdade. Mas não penses que te censuro. Se queres transformar-te num homem de letras, e, quem sabe um dia escrever Histórias, deves também mentir, e inventar histórias, pois senão a tua História ficaria monótona.

Mas terás que fazê-lo com moderação. O mundo condena os mentirosos que só sabem mentir, até mesmo sobre coisas mínimas, e premia os poetas que mentem apenas sobre coisas grandiosas.”

Depois do estrondoso sucesso de “O nome da Rosa”, Umberto Eco – o mais importante intelectual italiano deste século – retorna à Idade Média, dessa vez para homenagear sua cidade natal, a piemontesa Alessandria. Enquanto “O nome da Rosa”, seu livro mais famoso, recria o clima soturno da Inquisição, “Baudolino” gravita em torno dos prazeres da corte de Federico Hohenstaufen, conhecido como Barbarossa, à época da Terceira Cruzada. A história engloba justamente o período entre 1152 e 1204, começando com a ascensão de Barbarossa ao trono e terminando com a conquista de Constantinopla pela temida ordem dos cavaleiros templários.

A trama é protagonizada por Baudolino – adolescente, criativo e mentiroso que dá título à obra – e Niceta Coniate, personagem inspirado em um historiador e orador que viveu na corte de Constantinopla. A narrativa retrocede, enquanto Baudolino conta a Niceta suas aventuras e desventuras, numa mistura de fantasia e realidade, História e faz-de-conta. Tudo isso temperado por inúmeras situações cômicas. No intervalo, Eco embaralha os seus personagens inventados e produz o mais recorrente efeito de seu texto: interferir em acontecimentos históricos conhecidos por meio de atos ou circunstâncias vividas pelos personagens fictícios. “Através deste romance,” explica Eco, “releio o período medieval como fruto das invenções de um jovem.”

Numa pequena aldeia do baixo Piemonte, onde mais tarde se fundará Alessandria, Baudolino, camponês fantasioso, cai nas graças de Federico Barbarossa e se torna seu filho adotivo. Mentiroso compulsivo, Baudolino tem a sorte que só os sonhadores possuem: tudo o que inventa e cria miraculosamente produz História. Assim, ele constrói uma carta fictícia de um padre que fala sobre um reino no Oriente, governado por um cristão. A missiva impressiona até mesmo o aventureiro Marco Pólo e instiga Barbarossa. Impelido por essa invenção, Federico parte em busca desse sonho.

Entre monstros que habitam o inconsciente medieval – como quimeras, unicórnios e dragões -, a história sofre reviravoltas inesperadas, a cada vez que Baudolino conta um pedaço de sua vida. “Baudolino” é uma aventura picaresca, um romance histórico no qual emergem os problemas da Itália contemporânea. Com sua narrativa fantástica, teatro de invenções lingüísticas, Umberto Eco celebra a força do mito e da utopia.

Fontes:
http://www.submarino.com.br
http://www.americanas.com.br

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Álvares de Azevedo (Noite na Taverna)

Análise da professora Célia A. N. Passoni

Em 1853-1855, surgiu a edição póstuma que recolheu as publicações esparsas de Álvares de Azevedo sob o título de Poesias. Foram sendo acrescentadas às sucessivas reedições, obras em prosa, cujos exemplos mais destacados são: Macário, narração dialogada. Próxima de escritos teatrais, e Noite na Taverna, coletânea de narrativas curtas que constitui a mais original produção de prosa de Álvares de Azevedo, ao mesmo tempo é a mais bem-sucedida obra em que se destaca a influência do clima romântico imposto pelo poeta inglês Lorde Byron.

Movido pela imaginação exacerbada, o volume apresenta os desvarios do poeta envolvido por uma conturbação febril, na qual se deixa influenciar por quase todas as grandes características das novelas mórbidas do século XIX. Visivelmente artificiais, as narrativas que constituem o cerne desta obra recebem certa dose de magia e coerência por envolver o leitor, prender-lhe a atenção, dirigi-lo ao final. E se as história relatadas não são verossímeis, pelo menos disfarçam suas incoerências pela atração com que o autor conduz sua imaginação, de modo que quase parecem reais, colocando-as envolvidas por uma onda infindável de orgias deboches, sátiras, paixões transfiguradas, relatadas pela pequena galeria de personagens boêmios que vão tomando a palavra. Das páginas de Noite na Taverna vão surgindo relatos impregnados de um clima inumano e anormal.

A indefinição percorre as páginas do volume. O leitor que procurar conhecer os limites do tempo e do espaço nada encontrará de seguro ou de definitivo. Os fatos acontecem em alguma taverna, em algum lugar, em algum tempo, tudo muito vago. Só uma coisa parece real: o vinho que enche as taças logo esvaziadas, em rodadas orgíacas de um grupo de jovens, já bastante bêbados, semi-inconscientes. Reunidos, eles contam histórias embaladas por assuntos diversos, mas com um elo comum: todas são trágicas, impregnadas de vícios, de crimes hediondos que vão de assassinatos a incestos, de infanticídios e fratricídios. Todos os casos são repassados de amor, pervertido, cujos pares se envolvem em relações delirantes absurdas e pouco reais.

Composto de sete quadros intitulados: “Uma noite do século”, “Solfieri”, “Bertram”, “Gennaro”, “Claudius Hermann”, “Johann” e “Último beijo de amor”.

O primeiro constitui uma espécie de apresentação do ambiente da taverna, da roda de bebedeira, de devassidão em que se encontram os personagens, do clima notívago e vampiresco. O tom declamatório anuncia a noitada e as história que estão por vir.

Silêncio, moço! acabai com essas cantilenas horríveis! Não vedes que as mulheres dormem ébrias, macilentas como defuntos? Não sentis que o sono da embriaguez pesa negro naquelas pálpebras onde a beleza sigilou os olhares de volúpia?

– Cala-te, Johann! enquanto as mulheres dormem e Arnold – o loiro – cambaleia e adormece murmurando as canções de orgia de Tieck, que música mais bela que o alarido da saturnal? Quando as nuvens correm negras no céu como um bando de corvos errantes, e alua desmaia como a luz de uma lâmpada sobre a alvura de uma beleza que dorme, que melhor noite que a passado ao reflexo das taças?

– És um louco, Bertram! não é a lua que lá vai macilenta: é o relâmpago que passa e ri de escárnio às agonias do povo que morrem aos soluços que seguem as mortualhas do cólera!

As primeiras páginas deixam antever o clima das geração do mal do século, a irreverência incontida, a tendência a divagações literário-filosóficas, a vivência sôfrega e, principalmente, a morbidez e a lascívia.

Estás ébrio, Johann! O ateísmo é a insânia como o idealismo místico de Schelling, o panteísmo do Spinoza – o judeu, e o histerismo crente de Malebranche nos seus sonhos da visão de Deus. A verdadeira filosofia é o epicurismo. Hume bem o disse: o fim do homem é o prazer. Dai vede que é o elemento sensível quem domina. E pois ergamo-nos, nós que amarelecemos nas noites desbotadas de estudo insano, e vimos que a ciência é falsa e esquiva, que ela mente e embriaga como um beijo de mulher.

A vivência que o escritor demonstra é mais cultural que real, daí buscar constantemente o reforço nas idéias de filósofos e literatos. De Álvares de Azevedo sabe-se que escreveu todas as suas obras sob o impacto de leituras diversas que vão da Bíblia a Byron, sendo as influências recebidas uma clara demonstração de toda conturbação que sua obra deixa transparecer.

Voltemos à taverna. Entre os “brados” e as taças que circulavam, são apresentados os personagens, e alguns deles tomas a palavra. Em primeira pessoa, relatam histórias pessoais. O primeiro a tomar a palavra é Solfieri que faz suas evocações, remontando-as a Roma, a “cidade do fanatismo e da perdição“, onde “na alcova do sacerdote dorme a gosto a amásia, no leito da vendida se pendura o crucifixo lívido“. Certa noite, Solfieri vê um vulto de mulher. Segue-a até um cemitério; o vulto desaparece e o personagem adormece sob o frio da noite e a umidade da chuva. A visão deste vulto de uma mulher atordoou o personagem durante um ano, nada o satisfazia na troca de amores com mundanas. Uma noite, após prolongada orgia, saio vagando pelas ruas e acaba entre “as luzes de quatro círios” que iluminavam um caixão entreaberto. Lá estava a mulher que lhe provocara tantas alucinações e insônias. Era agora uma defunta. O homem tomou o cadáver em seus braços, despiu-lhe o véu e…

Mas, para disfarçar o caso de necrofilia, a mulher não estava morta, apenas sofrera um ataque e catalepsia. Ao perceber que a mulher não havia morrido, Solfieri levou-a para seu leito, contemplou-a e ela, depois de breve delírio, vaio a falecer. Solfieri mandou fazer uma estátua de cera da virgem, guardou-a em seu quarto, conservou com uma grinalda de flores.

Bertram é o segundo personagem a tomar a palavra. Rapaz de cabeleira ruiva, tez branca que, com as mãos alvas na barba e olhos verde-mar fixos, pôs a falar de uma mulher o levara a perdição. Cadiz, na Espanha, é o cenário. Enamorado de Ângela, Bertram com elas se casaria se não fosse chamado para a morte do pai. Voltou após algum tempo e reencontrou Ângela, casada e com um filho. Mas o amor de ambos ainda era enorme e tornaram-se amantes. O marido descobriu a traição, quis se vingar, mas Ângela o mata. Com a mesma frieza que matou o marido, assassina o filho:

Sobre o peito do assassinado estava uma criança de bruços. Ela (Ângela) ergueu-a pelos cabelos… Estava morta também: o sangue que corria das veias rotas de seu peito se misturava com o do pai!

Fugiram ambos, numa vida insana, a vagar libertinos, até que Ângela partiu, deixando

os lábios ainda queimados doe seus e o coração cheio de verme de vícios que ela aí lançara. Partiu; mas sua lembrança ficou como um fantasma de um mau anjo perto de meu leito.

Para esquecê-la, tornou-se um libertino. Ébrio, machucado, perdido, foi recolhido por um velho e uma jovem de 18 anos. O velho acolheu-o, a jovem amou-o e por ele se perdeu. Fugiram. Confessa Bertram que se enjoou da mulher e

uma noite em que eu jogava com Siegfried – o pirata, depois de perder as últimas jóias dela, vendi-a. A moça envenenou Siegfried logo na primeira noite e afogou-se…”

Bertram se envolve em outra aventura. Após querer se matar, é salvo por um bondoso comandante. Em troca da acolhida, apaixonou-se pela mulher do benfeitor e teve seu amor retribuído. Mas o navio foi atacado por piratas e após sangrentas batalhas foi reduzido a uma jangada perdida no mar com quatro ocupantes além do narrador: o comandante, sua mulher e dois marinheiros. A comida tornava-se escassa e…

Dois dias depois de acabados os alimentos restavam três pessoas: eu, o comandante e ela.

Cumpria-se a lei do náufrago, a antropofagia. Mais um deveria morrer. Fez-se um sorteio e o comandante perdeu. Implorou por mais alguns dias, mas Bertram foi implacável, tinha fome e não hesitou em matá-lo. O cadáver serviu de alimento aos dois náufragos por mais dois dias. Outro dois dias de fome se passaram. A mulher lhe propôs morrerem juntos, e nesta última agonia amaram-se, deliraram, e ela enlouqueceu. Bertram apertou-a aos braços, convulsivo, e sufocou-a. Uma solidão modorrenta se apoderou dele, e quando acordou do pesadelo estava a bordo de um navio que o salvara.

O quarto episódio é relatado por Gennaro, o pintor. Ele entra como aprendiz do velho Godofredo Walsh, casado em Segunda núpcias com Nauza, uma jovem de vinte anos que lhe servia de modelo. Com Godofredo vive também Laura, de quinze anos, filha de seu primeiro casamento. Os acontecimentos narrados são de trinta anos passados.

Por circunstâncias alheias à vontade do narrador, Gennaro seduz Laura, que durante três meses freqüenta o quarto do rapaz. Grávida, Laura implora para Gennaro pedi-la em casamento e diante de sua recusa, a moça percebe que ele não a amava. O motivo era simples, Gennaro apaixonara-se por Nauza. Laura, por sua vez, enfraquecia e

Uma noite… foi horrível,,, vieram chamar-me: Laura morria. Na febre murmurava meu nome e palavras que ninguém podia reter, tão apressadas e confusas lhe soavam. Entrei no quarto dela: a doente conheceu-me. Ergueu-se branca, com a face úmida de um suor copioso: chamou-me. Sentei-me junto do leito dela. Apertou minha mão nas suas mãos frias e murmurou em meus ouvido:

– Gennaro, eu te perdôo: eu te perdôo tudo… Eras um infame… Morrerei…. Fui uma louca… Morrerei… por tua causa… teu filho… o meu… vou vê-lo ainda… mas no céu… meu que filho matei… antes de nascer…

Após um ano da morte de Laura, Gennaro torna-se amante de Nauza.

E as noites que o mestre passava soluçando no leito vazio de sua filha, eu as passava no leito dele, nos braços de Nauza.

Certa noite fria e escura saíram o mestre e o aprendiz. Godofredo pôs-se a contar um a história (a real) de sua vida, expondo o conhecimento que tinha dos fatos, sabendo que Gennaro fora amante da filha e agora é amante da mulher. Musculoso e forte, em contenda, Godofredo prostrou Gennaro que caiu de um despenhadeiro e só não morreu porque ficou preso nos ramos de uma “azinheira gigantesca que assombrava o rio“. Após um dia e uma noite de delírios, acordou na casa de camponeses que o haviam salvado e logo que sarou, partiu. Encontrou no caminho o punhal com que o mestre tentara matá-lo. Munido da arma, procurou a casa de Godofredo que parecia abandonada, entrou pelos quartos escuros, tateando até a sala do pintor e daí dar vazão à sua vingança. Encontrando-a vazia, dirigiu-se ao quarto de Nauza e encontrou-a morta, envenenada pelo marido, que jazia morto também e de sua boca “corria uma escuma esverdeada“…

Claudius Hermann é o quinto conto do volume. Claudius Hermann, após preâmbulos em que discursa com os amigos de orgia acerca de diversos temas, expõe sua história. Viciado em jogo, Claudius Hermann chegou a apostar toda sua fortuna. Em uma das corridas, viu uma mulher passar a cavalo.

Víssei-la como eu, no cavalo negro, com as roupas de veludo, as faces vivas, o olhar ardente entre o desdém dos cílios transluzindo a rainha em todo aquele ademane soberbo!… víssei-la bela na sua beleza plástica e harmônica, linda nas usas cores puras e acetinadas, nos cabelos negros e a tez branca da fronte, o oval das faces coradas, o fogo de nácar dos lábios finos, o esmero do colo ressaltando nas roupas de amazona!… víssei-la assim, e à fé, senhores, que não havíeis rir de escárnio como rides agora!

Tal foi o fascínio que a dama exerceu sobre o rapaz que ele, quase com obsessão, perseguiu-a. Descobriu que a mulher misteriosa era a duquesa Eleonora.

(…) seis meses de agonia e desejo anelante, seis meses de amor com a sede da fera! seis meses! como foram longos!

Um dia, encorajado, abordou-a da forma mais vil possível. Eleonora era casada. Uma noite, após um baile, aproveitou-se do cansaço e sonolência da mulher e, com a chave comprada de um criado, entrou em seu quarto e lhe deu um narcótico misturado ao vinho. Em seguida, seduziu a inconsciente.

Uma semana se passou assim: todas as noites eu bebia nos lábios à dormida um século de gozo. Um mês! o mês delirantes iam os bailes do entrudo, em que mais cheia de febre ela adormecia quente, com as faces em fogo...

O marido, o belo e jovem Maffio, uma noite prometeu visitá-la em seu leito. O amante, corroído de ciúme, resolveu fugir com a mulher. Após ministrar-lhe o narcótico, saiu com a inconsciente pelos corredores, e partiram de carruagem. Ao acordar, Eleonora percebeu que estava em um local estranho, com um desconhecido, e ficou desesperada. Claudius decidiu revelar-lhe o segredo.

Escutai. – o libertino amou pois o anjo, voltou o rosto ao passado, despiu-se dele como de um manto impuro. Retemperou-se no fogo do sentimento, apurou-se na virgindade daquela visão – porque ela era bela como uma virgem, e refletia essa luz virgem do espírito, nesse brilho d’alma divina que alumia s formas – que não são da terra, mas do céu. (…)

A mulher argumentou ser impossível amá-lo, ele contra-argumentou dizendo-lhe não ser mais possível a vida dela nos padrões da normalidade, uma vez que estava desonrada. Ninguém a perdoaria. Inicialmente a mulhr concordou viver com ele, mas

(…) um dia Claudius entrou em casa. Encontrou o leito ensopado de sangue e num recanto escuro da alcova um doido abraçado comum cadáver. O cadáver era o de Eleonora: o doido nem o poderíeis conhecer tanto a agonia o desfigurava. Era uma cabeça hirta e desgrenhada, uma tez esverdeada, uns olhos fundos e baços onde o lume da insânia cintilava a furto, como a emanação luminosa dos puis entre as trevas…

Mas ele o conheceu… era o Duque Maffio…

Envolvidos pela história, ébrios e sonolentos, embalados pela lascívia e pela podridão da noite, os convivas da reunião orgíaca acabam por adormecer.

O mais desgraçado dos companheiros de conversa é Johann, personagem-narrador do sexto episódio do livro. O cenário é Paris. Johann e Artur jogavam num bilhar. Ao faltar um ponto para Artur ganhar e ao narrador muitos, houve um desvio de bola e Johann exaltou-se, provocando o adversário para um duelo de morte. Artur aceitou, mas antes de partirem para a morte, pediu ao adversário de jogo que o acompanhasse ao hotel. Lá, escreveu algumas linhas, depois pediu para Johann entregá-la a… juntamente com um anel, caso viesse a ser vítima. Antes do duelo, os contendores brindaram.

Artur foi à secretária, tirou duas pistolas, uma carregada e a outra não. Estava lançada a sorte. No duelo morreu Artur. Johann, como havia prometido, tirou o anel do defunto, recolheu dois bilhetes. O primeiro era uma carta para mãe; o segundo, apenas dizia:

À uma hora da noite na rua de …nº 60, 1º andar: acharás a porta aberta.

e a assinatura era apenas um G. Johann teve uma idéia infame. Ele foi ao encontro.

Era escuro. Tinha no dedo o anel que trouxera do morto… Senti uma mãozinha acetinada tomar-me pela mão, subi. A porta fechou-se.

Ele seduziu a virgem. Ao sair, topou com um vulto à porta, voz levemente familiar. Desceu as escadas e sentiu uma lâmina resvalar-lhe os ombros. Uma luta horrível foi travada e houve mais um assassinato.

“Ao sair tropecei num objeto sonoro. Abaixei-me para ver o que era. Era um lanterna furta-fogo. Quis ver quem era o homem. Ergui a lâmpada…

O último clarão dela banhou a cabeça do defunto… e apagou-se…

Eu não podia crer: era um sonho fantástico toda aquela noite. Arrastei o cadáver pelos ombros… levei-o pela laje da calçada até o lampião da rua, levantei-lhe os cabelos ensangüentados do rosto… (…)

Aquele homem – sabei-lo!?… era do sangue do meu sangue, filho das entranhas de minha mãe como eu… era meu irmão!

Mas a desgraça maior ainda estava por lhe ser revelada: Johann havia possuído sua própria irmã.

Com Último beijo de amor, Álvares de Azevedo fecha o volume Noite na Taverna. Ao contrário dos outros,, traz a narrativa em 3ª pessoa. A noite ia alta e a orgia findara, pois os convivas dormiam embriagados. Entrou na taverna um a mulher vestida de negro, procurando um rosto conhecido. Quando a luz bateu em Arnold, a mulher ajoelhou-se, mas ergueu-se e dirigiu-se a Johann.

(…) A fronte da mulher pendeu e sua mão pousou na garganta dele. Um soluço rouco e sufocado ofegou daí. A desconhecida levantou-se. Tremia; ao segurar na lanterna ressoou-lhe na mão um ferro… era um punhal… Atirou-o no chão. Viu que tinha as mãos vermelhas, enxugou-as nos longos cabelos de Johann.

Voltando-se para Arnold, fez-se reconhecer. Era Giórgia que voltava depois de cinco anos. Arnold pediu para que o chamasse como antes – Artur – e pede-lhe beijos, enquanto ambos lamentam a sorte. A mulher somente vinha para dizer-lhe adeus e depois fecharia as portas de sua própria sepultura. Ante, porém, pede ao homem para que veja Johann morto. Confessa tê-lo matado e vingado aquele que a havia prostituído.

Geórgia a prostituta! vingou nele Geórgia – a virgem. Esse homem foi quem a desonrou! desonrou-a… a ela que era sua irmã!

Completando a cena de horror, entre Arnold e Giórgia aconteceu inevitáveis mortes que, de certa maneira, refletem a visão da geração de Álvares de Azevedo, o mal do século.

A mulher ajoelhou-se a seus pés.

– E agora adeus! adeus que morro! Não vês que fico lívida, que meus olhos se empanam e tremo… e desfaleço?

– Não! eu não partirei. Se eu vivesse amanhã haveria uma lembrança horrível em meu passado…

– E não tens medo? Olha! é a morte que vem! é a vida que crespucula em minha fronte. Não vês esse arrepio entre minhas sobrancelhas?…

– E que me importa o sonho da morte? Meu porvir amanhã seria terrível: e à cabeça apodrecida do cadáver não ressoam lembranças; seus lábios gruda-os a morte; a campa é silenciosa. Morrerei!

A mulher recuava… recuava. O moço tomou-a nos braços, pregou os lábios no dela… Ela deu um grito, e caiu-lhe das mãos. Era horrível de ver-se. O moço tomou o punhal, fechou os olhos, apertou-o no peito, e caiu sobre ela. Dois gemidos sufocaram-se no estrondo do baque de um corpo…

A lâmpada apagou-se.

Fontes:
http://www.portrasdasletras.com.br

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Nilto Maciel (Leste da Morte)

A trama das narrativas de Nilto Maciel freqüentemente se expressa em linguagem poética: “Abriu a porta e o som do piano inundou o mundo. (…) Tateou espaldares de cadeiras. Tocos os dedos numa orelha. Ouviu um muxoxo feminino. (…) Conhecia a música. Talvez de Haendel. Ou seria de Grieg? (…) As mãos do artista. Não, não podiam ser mãos. (…) Sim, eram garras, jamais mãos humanas. Seriam de lobo?” Atmosfera semelhante pode ser encontrada em vários outros momentos do livro. Trata-se de um cadáver ensangüentado, “levado, às escuras, para os confins do cemitério. (…) E o enterraram numa cova aberta às pressas. A leste da morte” (p. 39). Ao escrever sobre incêndio ocorrido num espigão de cimento armado, o salto de uma pessoa para o abismo é visto deste modo pelo autor: “Súbito um corpo apareceu entre a parede do edifício e a eternidade, rodopiou no espaço, na direção da terra”. Para espanto da platéia, o suposto cadáver ergueu-se do chão e saiu andando (p. 43).

Num conto em que narra as peripécias de um mágico supostamente dinamarquês, a cosmovisão do ficcionista desenha poeticamente as façanhas saídas das mãos do prestidigitador: “Uma pombinha surgia trêmula nas mãos do estrangeiro. Batia as asinhas, voava, voava e sumia no céu. Um coelhinho saltava da cartola, olhinhos vermelhos de espanto, focinho inquieto, e as primeiras mãos do povo o agarraram sangrentas” (p. 67).

“Menino Insone” (p. 76) é outra página com todas as peculiaridades de um poema. Os ritmos da narrativa parecem confundir-se com os ritmos da respiração dos personagens. Não se sabe ao certo se o menino está dormindo ou acordado sob “a luz da lamparina (que) bruxuleia”. O irmão menor do menino levanta-se da rede e perambula pela casa, como se acometido de uma crise de sonambulismo. “Permanece de olhos abertos, atento à luz da lamparina, às sombras, aos pequenos ruídos”. É como se um fantasma, expulso dos subterrâneos de um pesadelo, vagasse por aposentos desertos à procura de reminiscências de vidas passadas em outros planetas.

Contos dessa natureza não são raros na ficção de Nilto Maciel. Levam necessariamente o leitor às raízes da chamada literatura do absurdo, na qual se destacam celebridades da estatura de Kafka e de outros mestres do gênero. “Chovia fininho. Um arco-íris enorme cobria a praça, a cidade, a serra, o mundo. (…) Na rede ao lado, o outro menino dormia. Pareceu-lhe ouvir um galo cantar” (p. 77). Em “Chão Pintado de Sangue”, algumas pessoas aplaudiam ou vaiavam “um rapaz de roupas exóticas”, que declamava versos herméticos para uma platéia irreverente: “O poema é um punhal que brilhará na carne dos condescendentes. Seus reflexos parirão estrelas que habitarão o céu. Marinas cintilarão como ametistas nas bocas dos desvalidos. Imensas pérolas de enfeites da grande festa anunciada” (p. 63).

Poderia citar vários outros exemplos da riqueza semântica encontrada no contexto das narrativas de Nilto Maciel. Não o faço por estar convencido de que ao leitor deve caber o privilégio de descobri-los por si mesmo. Até porque, segundo Montaigne, certos leitores são capazes de detectar nos escritos alheios virtudes e perfeições não percebidos pelos próprios autores. Gosto sempre de repetir frase de Drummond, segundo a qual “o romance é a arte de destelhar casas sem que os transeuntes percebam”.

Nilto Maciel é, sem dúvida, um mestre consumado do conto moderno. Não apenas pelo requinte no uso de todas as gradações e alternativas morfológicas da escrita literária. Como também, e sobretudo, pela maneira engenhosa com que disserta sobre tendências e conflitos da subjetividade que navega “a leste da morte”.
Fortaleza, 3 de agosto de 2006.

Narrativa polifônica caracteriza os contos do novo livro de Nilto Maciel
Ronaldo Cagiano • Brasília – DF

Autor de mais de duas dezenas de livros que cobrem diversos gêneros, Nilto Maciel percorre com desenvoltura várias temáticas, sempre se valendo de uma grande flexibilidade de linguagem, técnica e forma e da manipulação de cenários distintos para construir seus personagens e histórias. Em seu novo livro, A leste da morte, ele reúne 47 contos, matizando universos que extrapolam os territórios geográficos, porque são ressonâncias fiéis do psicológico, da memória, das lembranças e imagens ancestrais, que constituem as experiências afetivas, sociais e humanas que habitam a imaginação e são as referências que sustentam o vasto espectro criativo do autor.

Alternando textos breves ou longos com uma prosa que mantém um pé na tradição e outro na modernidade, Maciel consolida sua força narrativa em histórias que filtram a vida, principalmente a vida do interior, onde o autor colhe matéria para uma artesania literária que incorpora, na maioria das vezes, um vezo de surrealismo. Alguns textos têm a duração de um curta-metragem e trazem, nesse breve arcabouço, um mundo coroado de mistério e misticismo, de sagrado ou de profano, de lenda e de folclore, revelando sutilmente a alma sertaneja, distanciando-se dos clichês da escritura regionalista. Não obstante a cor local de seus contos, a dicção niltoniana ultrapassa as fronteiras dessa geografia carregada de mitologias, porque os dramas e acontecimentos retratados são próprios do homem em qualquer circunstância ou lugar, daí a universalidade de seus relatos.

Trem fantasma, texto que nos faz embarcar no conjunto dessas histórias, revela, tanto pela síntese quanto pelo inusitado e pela surpresa, a tendência fabulatória encontrada em muitos textos do autor, que busca na fantasia, no absurdo, na alegoria ou na caricatura um artifício para compreender a realidade. A exatidão minimalista e fotográfica de alguns contos também nos remete a perceber a influência da instantaneidade, peculiar à oralidade e ao coloquialismo encontradiços na rica cultura popular nordestina.

Nilto aproveita a carga metafórica das histórias do mundo anterior que traz no inconsciente e as reinventa, para guiar o leitor por diversas atmosferas. A ambientação da linguagem, embora sem localização territorial, nos faz reconhecer situações presentes no imaginário do homem do interior, em que prevalecem os velhos cacoetes da vida provinciana, dos burgos, do coronelismo e do cangaço, da religiosidade e das crendices, com seus coronéis, suas lutas de poder, em que vida e morte se digladiam em tênue fronteira. Enfim, um esboço típico dos contrastes entre a modernidade e o arcaísmo, aqui amalgamado por um sutil censo de humor e ironia.

O último vôo da rapina, conto em que o personagem principal é o anagrama do abutre, traz como simbologia a luta pela preservação da vida por meio da busca desenfreada da manutenção dos sonhos, num conto de acento hitchcockiano. Outro bom exemplo de tessitura ficcional encontramos em Os urubus e Deus, explícito viés do fantástico. Em outros momentos, Nilto repovoa suas histórias revisitando temas bíblicos, literários e históricos, como em Caim e Abel, O sonho esquecido, O sétimo aniversário de Branca de Neve, Apontamentos para um ensaio e o paradigmático Maneco, futebol e cerveja, reconstrução da decadência de um jogador, numa perfeita analogia sobre a fugacidade da glória e a transitoriedade do infortúnio.

A perícia de Nilto Maciel é marcante na confecção de Águas de Badu, ao utilizar-se da transcriação literária para dialogar com a profundidade narrativa de Guimarães Rosa, invocando os paradigmas de O burrinho pedrês. E no peculiar O livro infinito, uma espécie de conto dentro do conto, transita pela história, pela literatura, pela música, etc., num espectro em que se discute a própria arte. Impende dizer que para atingir o ápice ou convencer o leitor, Maciel não se vale de nenhum recurso estrambótico, como rupturas ou outros artifícios experimentais de linguagem. Sua prosa se revela moderna, mas sua estrutura é clássica, tradicional, porque o que importa para o autor é o domínio do conteúdo e não o extravasamento da forma.

A leste da morte é um caleidoscópio de temas e situações que consolidam a trajetória de Nilto Maciel, um autor que há três décadas vem se dedicando de corpo e alma à literatura e a cada novo livro, com seu timbre, suas vozes e seu sutil censo de observação, se afirma como um habilidoso artista, que conta e reconta as delícias e asperezas da vida, expondo as grandezas e misérias humanas, com inegável destreza literária.

Fontes:
Francisco Carvalho. in http://www.vastoabismo.xpg.com.br
Ronaldo Cagiano in http://www.bestiario.com.br

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William Shakespeare (Otelo, O Mouro de Veneza)

Otelo, o Mouro de Veneza (no original, Othello, the Moor of Venice) é uma obra de William Shakespeare escrita por volta do ano 1603. A história gira em torno de quatro personagens: Otelo (um general mouro que serve o reino de Veneza), sua esposa Desdemona, seu tenente Cassio, e seu sub-oficial Iago. Diferente de outras histórias de tragédias, esta não contém parte cômica. Por causa dos seus temas variados — racismo, amor, ciúme e traição – continua a desempenhar relevante papel para os dias atuais, e ainda é muito popular.

História

Toda história gira em torno da traição e da inveja. Inicia-se com Iago, alferes de Otelo, tramando com Rodrigo uma forma de contar a Brabâncio, rico senador de Veneza, que sua filha, a gentil Desdêmona, tinha se casado com Otelo. Iago queria vingar-se do general Otelo porque ele promoveu Cássio, jovem soldado florentino e grande intermediário nas relações entre Otelo e Desdêmona, ao posto de tenente. Esse ato deixou Iago muito ofendido, uma vez que acreditava que as promoções deveriam ser obtidas “pelos velhos meios em que herdava sempre o segundo o posto do primeiro” e não por amizades.

Brabâncio, que deixara a filha livre para escolher o marido que mais a agradasse, acreditava que ela escolheria, para seu cônjuge, um homem da classe senatorial ou de semelhante. Ao tomar ciência que sua filha havia fugido para se casar com o Mouro, foi à procura de Otelo matá-lo. No momento em que se encontraram, chegou um comunicado do Doge de Veneza, convocando-os para uma reunião de caráter urgente no senado.

Durante a reunião, Brabâncio, sem provas, acusou o Mouro de ter induzido Desdêmona a casar-se com ele por meio de bruxarias. Otelo, que era general do reino de Veneza e gozava da estima e da confiança do Estado por ser leal, muito corajoso e ter atitudes nobres, fez, em sua defesa, um simples relato da sua história de amor que foi confirmado pela própria Desdêmona. Por isso, e por ser o único capaz de conduzir um exercito no contra-ataque a uma esquadra turca que dirigia-se à ilha de Chipre, Otelo foi inocentado e o casal seguiu para Chipre, em barcos separados, na manhã seguinte.

Durante a viagem uma tempestade separou as embarcações e, devido a isso, Desdêmona chegou primeiro à ilha. Algum tempo depois, Otelo desembarca com a novidade que a guerra tinha acabado porque a esquadra turca fora destruída pela fúria das águas. No entanto, o que o Mouro não sabia é que na ilha ele enfrentaria um inimigo mais fatal do que os turcos.

Em Chipre, Iago que odiava a Otelo e a Cássio, começou a semear a sementes do mal, ou seja, concebeu um terrível plano de vingança que tinha como objetivo arruinar seus inimigos. Hábil e profundo conhecedor da natureza humana, Iago sabia que, de todos os tormentos que afligem a alma, o ciúme é o mais intolerável.

Ele sabia que Cássio, entre os amigos de Otelo, era o que mais possuía a sua confiança. Sabia também que devido a sua beleza e eloqüência, qualidades que agradam às mulheres, ele era exatamente o tipo de homem capaz de despertar o ciúme de um homem de idade avançada, como era Otelo, casado com uma jovem e bela mulher. Por isso, começou a realizar seu plano.

Sob pretexto de lealdade e estima ao general, Iago induziu Cássio, responsável por manter a ordem e a paz, a se embriagar e envolver-se em uma briga com Rodrigo, durante uma festa em que os habitantes da ilha ofereceram a Otelo. Quando o mouro soube do acontecido, destituiu Cássio de seu posto. Nessa mesma noite, Iago começou a jogar Cássio contra Otelo. Ele falava, dissimulando um certo repúdio a atitude do general, que a sua decisão tinha sido muito dura e que Cássio deveria pedir a Desdêmona que convencesse Otelo a devolver-lhe o posto de tenente. Cássio, abalado emocionalmente, não se deu conta do plano traçado por Iago e aceitou a sugestão.
Dando continuidade a seu plano, Iago insinuou a Otelo que Cássio e sua esposa poderiam estar tendo um caso. Esse plano foi tão bem traçado que Otelo começou a desconfiar de Desdêmona. Iago sabia que o Mouro havia presenteado sua mulher com um velho lenço de linho, o qual tinha herdado de sua mãe. Otelo acreditava que o lenço era encantado e, enquanto Desdêmona o possuísse, a felicidade do casal estaria garantida. Sabendo disso e após ter encontrado o lenço que Desdêmona perdera, Iago disse a Otelo que sua mulher havia presenteado o seu amante com ele. Otelo, já enciumado, pergunta a sua esposa sobre o lenço e ela, ignorando que o lenço estava com Iago, não soube explicar o que aconteceu com ele. Nesse meio tempo, Iago colocou o lenço dentro do quarto de Cássio para que ele o encontrasse.

Depois, Iago fez com que Otelo se escondesse e ouvisse uma conversa sua com Cássio. Eles falaram sobre Bianca, amante de Cássio, mas como Otelo que só ouviu partes da conversa, ficou com a impressão de que eles estavam falando a respeito de Desdêmona. Um pouco depois Bianca chegou e Cássio deu a ela o lenço que encontrara em seu quarto para que ela providenciasse uma cópia. As conseqüências disso foram terríveis: primeiro Iago, jurando lealdade a seu general, disse que, para vinga-lo, mataria Cássio, mas sua real intenção era matar Rodrigo e Cássio simultaneamente porque eles poderiam estragar seus planos. No entanto, isso não ocorreu conforme suas intenções, Rodrigo morreu e Cássio ficou apenas ferido.

Depois Otelo, totalmente descontrolado, foi a procura de sua esposa acreditando que ela o havia traído e matou-a em seu quarto. Após isso, Emília, esposa de Iago, sabendo que sua senhora fora assassinada revelou a Otelo, Ludovico (parente de Brabâncio) e Montano (governador de Chipre antes de Otelo) que tudo isso foi tramado por seu marido e que Desdêmona jamais fora infiel. Iago matou Emília e fugiu, mas logo foi capturado. Otelo, desesperado por saber que matara sua amada esposa injustamente, apunhalou-se, caindo sobre o corpo de sua mulher e morreu beijando a quem tanto amara.

Ao finalizar a tragédia Cássio passou a ocupar o lugar de Otelo, Iago foi entregue às autoridades para ser julgado e Graciano, uma vez que seu irmão Brabâncio morrera, ficou com os bens do mouro.

Estrutura

A Tragédia Otelo é dividida em cinco atos e cada um deles é subdividido em cenas conforme abaixo:
Ato I – três cenas;
Ato II – três cenas;
Ato III – quatro cenas;
Ato IV – três cenas; e
Ato V – duas cenas.
Essa obra pode ser estruturada da seguinte maneira:

Apresentação

Iago trama com Rodrigo contar a Brabâncio que sua filha casou-se com Otelo, porque o mouro promoveu Cássio ao posto de tenente, posição essa que Iago almejava.

Desenvolvimento

Brabâncio toma ciência de que Otelo casou-se com Desdêmona, e sai à procura de Otelo para mata-lo. Quando se encontram são convocados a uma reunião no senado.

Chegando lá, Brabâncio acusa Otelo de ter enfeitiçado sua filha, mas a própria Desdêmona desmente a acusação e o casal parte para Chipre. Em Chipre Iago trama e executa a desgraça de Otelo.

Clímax

O Clímax da obra se dá no Ato V, cena II, quando Otelo, acreditando que sua esposa havia realmente o traído vai até o quarto onde ela dormia e, após algumas falas carregadas de extrema tensão, acaba tirando a vida de Desdêmona.

Desfecho

Otelo, ao descobrir que matou sua esposa injustamente porque fora enganado por Iago, ficou totalmente angustiado e pôs fim na sua vida. Iago, que matou sua esposa porque ela revelou a todos os seus planos malignos, foi entregue as autoridades para ser julgado. Cássio passou a ocupar o lugar de Otelo e Graciano, herdeiro do mouro, ficou com seus bens.

Temos assim a reafirmação da ordem moral, ou seja, os valores e dignidade são reafirmados.

Análise dos Personagens

Protagonistas

Otelo – General mouro e nobre a serviço da República de Veneza. A sua idade não é revelada na obra, mas são encontradas algumas passagens que nos remetem a idéia de que ele era um homem de idade avançada. Apesar de sua aparência rude, Otelo possuía caráter, atitudes e sentimentos nobres. Entretanto, era ingênuo, pois desconhecia a maldade humana e era incapaz de reconhecer a malícia nas pessoas. Isso é percebido quando ele descobre que fora traído por Iago e acredita que tal atitude não é obra de uma pessoa, mas do diabo. “Procuro ver-lhe os pés. Mas não… É pura fábula. Se fores o diabo, não conseguirei matar-te.” (fere Iago)(p.150). Além disso, Otelo era fraco, ele não acreditou que seu amor era forte o suficiente, bastou que Iago insinuasse que Desdêmona o estava traindo para que ele acreditasse.

Desdêmona – É uma jovem nobre, pretendida por vários jovens das melhores famílias da República, não só por sua beleza, mas também por seu rico dote. Ela era “Uma jovem tão tímida, de espírito tão sossegado e calmo, que corava de seus próprios anseios!…” (p34). Tais características ficam explicitas na atitude de seu pai, que ao saber que ela casou-se com o Mouro, atribuiu tal fato à bruxarias. Em uma época em que os casamentos eram arranjados pelos pais, Desdêmona gozava do privilégio de poder escolher seu próprio marido, porque seu pai confiava muito nela. Todo esse perfil singelo que envolve Desdêmona sofre uma brusca alteração quando ela abandona sua família e, apesar das diferenças de idade e raça, vai viver ao lado de Otelo em sua vida aventurosa de militar.

O fim de Desdêmona é extremamente triste: Além de ter sua imagem de esposa dedicada maculada, ela é abandonada por Deus, ou seja, nos seus últimos momentos de vida, não teve sequer o consolo da religião (p142).

Desdêmona é um personagem que , além de tudo o que já foi dito, nos ajuda a entender um pouco mais do próprio Otelo. Por meio dela nos é revelado os traços morais de Otelo, características essas que contrastam com seu exterior rude.

Antagonista

Iago – Era uma figura mais diabólica do que humana. Ele era alferes de Otelo, no regime militar atual, alferes corresponde ao posto de 2º tenente. Ele era uma pessoa vil, não media esforços para alcançar seus objetivos e todo lado negro de sua alma vem a tona em seus monólogos.

Iago odiava Otelo. Ele não suportou o fato de Otelo ter promovido Cássio ao posto de Tenente, cargo esse que ele acreditava ser seu pelo fato de possuir maior experiência. Iago, não suportando ver outra pessoa ocupando tal posto usou sua mente maquiavélica para articular um plano cujo objetivo era destruir seus oponentes.

Iago era um homem movido pelo interesse pessoal que se colocava sob as ordens de Otelo somente por proveito próprio. Ele dominava a arte de dissimular e manipular as pessoas. Provas disso são os fatos de Otelo chama-lo, com freqüência, de “O honesto Iago” enquanto esse o traía. Quanto a manipulação, podemos citar o exemplo de Cássio ter sido induzido à procurar Desdêmona para que ela intercedesse a seu favor junto a Otelo.

Secundários

Cássio – Micael Cássio era um jovem matemático florentino que “nunca comandou nenhum soldado num campo de batalha e que conhece tanto de guerra como uma fiandeira” (p18). Mesmo assim, foi escolhido por Otelo para ocupar o posto de tenente. Cássio foi o grande intermediário das relações amorosas entre Desdêmona e Otelo e, por isso, gozava da confiança do casal. Ele era amante de Bianca que vivia em Chipre, mas não se importava muito com ela.

Cássio era ingênuo. Não percebeu que Iago tramava sua desgraça, deixou-se embriagar enquanto estava de guarda, envolveu-se em uma briga e, por esse motivo, foi destituído de seu posto. Isso levou-o ao desespero e transformou-o em um verdadeiro marionete nas mãos de Iago.

Cássio pode ser classificado como personagem coadjuvante, uma vez que Iago se apoia em sua figura para executar seus planos.

Brabâncio – Pai de Desdêmona, ocupava um o cargo de senador na República de Veneza. Era um homem rico e mostrou-se ser totalmente contraditório: antes do casamento de sua filha com Otelo, ela convidou várias vezes o Mouro para visitar sua casa. Depois disso, acusou-o de rapto, feitiçaria e teve a intenção de mata-lo. No entanto, quem veio a falecer foi o próprio Brabâncio que não suportou essa união.

Emília – Mulher de Iago e serviçal de Desdêmona. A princípio sua participação na peça é discreta, mas no final ganha importância. Em nome da honra de sua senhora ela enfrenta o marido, revelando a Otelo, Ludovico e Montano que Iago estava os enganando.

Os demais personagens ocupam papéis de pouca importância e, por isso, serão apenas apresentados:
Rodrigo – Fidalgo veneziano, apaixonado por Desdêmona e, como Cássio, também foi usado por Iago;
Doge de Veneza;
Graciano – Irmão de Brabâncio;
Ludovico – Parente de Brabâncio;
Montano – governador de Chipre antes de Otelo;
Bobo – criado de Otelo;
Bianca – Amante de Cássio

Tempo

Na obra “Otelo” existe o predomínio do tempo psicológico. Isso ocorre devido aos vários monólogos existentes na peça. Esse recurso era muito usado no teatro para revelar o que os personagens estavam pensando. A maioria dos monólogos da obra “Otelo” é feita por Iago que nos revela toda interioridade de sua alma tenebrosa.

Quando isso ocorre o tempo ele quebra a cronologia do tempo cuja passagem é marcada pela fala dos personagens e, como isso é feito de forma muito sutil, é difícil identificá-lo.

O primeiro Ato dura uma noite. Entre esse Ato e o seguinte existe um intervalo de cerca de uma semana, tempo que durou a viagem de Veneza a Chipre “…Em companhia ele a mandou do destemido Iago, cuja vinda ultrapassa nossos cálculos de uma semana…”(p50). O segundo ato dura uma noite. Inicia-se quando os navios desembarcam em Chipre e termina na noite desse mesmo dia com Iago incentivando Cássio a procurar Desdêmona para que ela intercedesse a seu favor junto a Otelo. “…logo que amanhecer, vou pedir à virtuosa Desdêmona que interceda a meu favor...”(p71).

O Ato III inicia-se no dia seguinte “Iago – Então não vos deitastes?/ Cássio – Oh, não! Raiou o dia quando nos separamos…” (p76). Acreditamos que esse ato dure um pouco mais de uma semana. Essa idéia é apoiada na fala de Bianca que se dá no final desse ato:
Bianca – E a vossa casa eu também ia, Cássio. Uma semana ausente? Sete dias e sete noites...” (p105). Por meio dessa fala deduzimos que Cássio, quando chegou a ilha, foi visitar sua amante.

Os atos IV e V duram um dia e uma noite. A fala de Bianca no final do Ato III nos da a indicação de que esse ato termina durante o dia. “…acompanhai-me um pouco e declarai-me se ainda vos verei antes da noite.”(p106). Depois disso não há na obra mais indicações de que os dias se passaram, o que existe são apenas trechos que indicam que anoiteceu:
Ludovico- ….é noite alta” (p135);
Desdêmona dorme, no leito. Uma candeia acesa. Entra Otelo.” (p139).
Com base nos dados do levantamento acima, acreditamos que o tempo interno da obra dure aproximadamente 24 dias.

Espaço

O espaço em “Otelo” não é muito relevante. O primeiro Ato da obra ocorre em Veneza e os demais na ilha de Chipre. Em Veneza os espaços são a rua da casa de Brabâncio, uma outra rua não identificada e a Câmara do conselho. Em Chipre, a primeira cena ocorre em uma praça perto do cais, as demais se dão em ruas não identificadas, diante e em quartos do castelo. Na obra existem espaços abertos e fechados, mas as cenas de maior tensão ocorrem em espaços fechados como exemplo podemos citar as mortes de Desdêmona, Otelo e Emília. O espaço também é fechado quando Iago articula seus planos malignos. As vezes isso se dá nas ruas, espaços abertos, mas a escuridão da noite dificulta a visibilidade e esse espaço torna-se fechado. Iago é um ser tão maquiavélico que usa os espaços para executar seus planos. Ele se aproveita dos espaços fechados para induzir Cássio a envolver-se em uma briga. Depois ele usa esse mesmo tipo de espaço para matar Rodrigo e ferir Cássio. Na cena em que Iago faz Otelo ouvir apenas parte de sua conversa com Cássio, dando-lhe a impressão que Desdêmona havia o traído, o espaço é aberto, mas adequa-se perfeitamente a seus planos malignos.

Ideologia

Nessa tragédia são encontradas várias idéias muito interessantes que, em sua maioria, fazem parte do nosso cotidiano:

Preconceito, racial, religioso e contra o estrangeiro

O preconceito racial se faz presente em quase toda obra. É fácil encontrar trechos em que outros personagens zombam de Otelo por causa da sua cor.
Iago – … Agora mesmo, neste momento, um velho bode negro esta cobrindo vossa ovelha branca…”(p21)
Iago – …quereis que vossa filha seja coberta por um cavalo barbere e que vossos netos relinchem atrás de vós?…”(p22)
• O preconceito religioso é percebido na fala de Otelo:
e cuja mão, tal como um vil judeu, jogou fora uma pérola mais rica que toda sua tribo…”(p153)
• O preconceito contra é encontrado na seguinte fala de Rodrigo:
“… destes permissão, mui grave pecado cometeu, unindo o espírito, a beleza, o dever e seus haveres a um estrangeiro andejo e desgarrado daqui e de tôda parte…pela garganta detendo aquele cão circuncidado…” (p153). A circuncisão é uma operação que retirada parte do prepúcio, pele que envolve o pênis. Esse tipo de cirurgia é feita pelos Judeus para serem confirmados na religião. No novo e velho mandamentos, sempre que é usado o termo circuncidado, faz-se referencia ao povo Judeu.

contraste entre a realidade e as aparências
Iago aparentava ser uma pessoa boa e digna de confiança, mas ele mostrou ser justamente o oposto, ou seja, maligno e traidor; •

o ciúme injustificado
Otelo sentia ciúme de sua mulher, sem que ela nunca lhe desse motivos. Foi esse ciúme doentio que permitiu que Iago o enganasse. a união de uma mulher branca com um mouro – isso, para a época, era uma situação pouco comum e que, se ocorresse de fato, escandalizaria a sociedade.

Crítica política
Esse tipo de crítica pode ser visto quando Brabâncio chama Iago de vilão e ele, ironizando, chama-o de senador: “Brabâncio – Sois um vilão / Iago – E vós… um senador

Mensagem

A grande mensagem que “Otelo” nos deixa é a fraqueza humana. Iago e Cássio são pessoas fracas pois não suportaram perder as posições no exercito. O primeiro não suportou ver uma outra pessoa ocupando posto de tenente que ele tanto almejara. Já o segundo ao ser destituído desse mesmo posto entrou em desespero, mostrando assim toda sua fragilidade. Otelo, por sua vez, foi fraco por não acreditar que possuía qualidades para manter ter ao seu lado uma mulher jovem e bonita como Desdêmona.

Além disso, percebemos que em “Otelo” o mal não prevalece. Apesar de Iago ter conseguido o seu objetivo que era destruir a felicidade do mouro, ele foi preso e entregue às autoridades para ser julgado. Com isso, concluímos que o que prevalece na obra são os bons valores morais, percebidos na figura de Cássio que sempre agiu com boa fé e acabou premiado com um posto superior ao que ocupava e que Iago tanto almejara.

Fontes:
Professores:Antônio Carlos Pinho, Adilson Oliveira, Lucas Tavares e Ronaldo Fazam. In
http://www.mundocultural.com.br/
SHAKESPEARE, William. Otelo. SP: Martin Claret, 2006.
Quadro: “Othello e Desdemona em Veneza” por Théodore Chassériau (1819–1856)

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Raduan Nassar (Lavoura Arcaica)

O enredo da obra “Lavoura Arcaica” se constitui numa trama dos costumes de uma família onde é mostrado a fuga de André, um adolescente que sempre fora criado na fazenda sob um duro modelo educativo passado por seu pai, o chefe do modelo familiar. Tal fuga de casa pode ser entendida pelo grande amor que André sentia por Ana, sua própria irmã. Paixão esta que nunca poderia ser compreendida por seu pai. Assim, ele foge para um vilarejo. A reação de Pedro, seu irmão mais velho, foi a de ir até a pensão onde ele estava e tentar traze-lo de volta para sua casa na fazenda, onde sua mãe o esperava com ansiedade, sofria bastante com seu filho longe. Ao achar André, Pedro começou a contar sobre os acontecimentos que estavam ocorrendo na fazenda sem ele. O irmão o recebeu contando lições sobre questões e preceitos da família como a história de um homem faminto que pediu comida. Demostrou seus pensamentos, apesar de pouca idade acreditava que não valia a pena esperar em algum momento, em certas ocasiões era necessário agir, e logo. Contudo, nada disse sobre sua volta à fazenda. Suas irmãs apenas rezavam para sua volta, cumpriam as ordens do pai e da mãe, e esta última apenas cumpria com suas funções de dona de casa.

André acaba voltando para casa, suas idéias não batiam com as dos pais que não entendiam a que se passava com o filho. E ele não aceitava a situação de amar a irmã e nada poder fazer. Porém desabafou ao pai que estava cansado, humilde, entendendo a solidão e a miséria, pedindo o seu perdão e amor. Seu outro irmão, o Lula, acaba dizendo que também queria fugir de casa, que não aguenta mais aquela vida parada da fazenda. No dia seguinte à chegada de André foi preparada uma festa por seu pai. E assim como iniciou a obra sua irmã Ana dança sensualmente para ele. Foi nesta festa que o pai percebeu o que realmente passava com os irmãos. Desesperado o pai sofre um ataque de tristeza e morre.

Fontes:
http://www.coladaweb.com/resumos/lavoura.htm
Imagem
http://sidneypsico.blogspot.com

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Jorge Amado (Dona Flor e seus Dois Maridos)

Modernismo de segunda fase. A história é dividida em 5 partes (cada uma aberta por uma lição de culinária de Flor, que é professora desta arte, com exceção da quarta parte, aberta por um programa para o concerto de Teodoro) e um intervalo.

A primeira começa com a morte de Vadinho em pleno Domingo de Carnaval. Vestido de baiana, Vadinho cai enquanto dançava e seu funeral é muito concorrido. Nele voltam as lembranças de todos sobre o falecido: os amigos de farra, as possíveis (prováveis) amantes, os conhecidos e principalmente da esposa, Flor. Flor lembra do marido infiel, cheio de lábia, espertalhão, jogador e malicioso que era Vadinho, mas ainda assim extremamente adorável. Na definição de um dos presentes no funeral, Vadinho “Era um porreta”. O anteriormente referido intervalo se trata da discussão que ocorreu na cidade sobre a autoria da elegia a Vadinho, poesia anônima picante.

A segunda parte passasse-se durante o período de luto de Flor. Inconsolável com a morte de Vadinho, sua mãe volta para a cidade e a situação piora. Dona Rozilda é o mais perfeito modelo de sogra: odeia o genro, é chata, controladora, exibida e pretende sempre escalar na vida social. Passa a fazer intriga sobre o falecido (“era morte para festa”) com várias beatas, enquanto algumas poucas defendem Vadinho (não seus atos) por ele ser uma pessoa excepcional (no sentido de incomum, não o de maravilhoso ou com deficiência mental).

Assim em flashback é mais detalhado o passado do casal. A mãe de Flor queria que as filhas se casassem com homens ricos, e Vadinho apareceu. Eles se conheceram numa festa chique (Vadinho entrou de penetra, com a ajuda do tio) e começaram o namoro com a benção de Dona Rozilda, até que ela descobriu quem era o genro. Mais tarde Flor sai de casa e se casa (de azul, porque não teve coragem de por o branco) e começa o casamento. Vadinho é um marido ausente, sempre gastando o dinheiro (dos outros) no jogo e nas mulheres.

Certa vez Flor quase adotou um menino que ela achava ser filho de Vadinho (Flor é estéril; o filho era do “xará”). E assim são mostrados os vários acontecimentos, em flashback, da vida matrimonial com aquele adorável cafajeste, generoso gastador, infiel e amantíssimo marido que era Vadinho. O capítulo acaba com Flor pondo flores sobre o túmulo do falecido, superando melhor o passamento dele.

A terceira parte é passada nos meses seguintes. Flor está mais alegre, apesar de manter ainda a fachada de viúva. Todas as beatas competem para achar-lhe um bom pretendente e quem aparece é Eduardo, o Príncipe, calhorda que enganava viúvas para roubar-lhes as economias. Descoberto, Flor passa a se retrair. Seu sono torna-se mais agitado, seu desejo cresce na medida em que ela deixa os homens fora de sua vida pessoal. Mas então o farmacêutico Teodoro Madureira, respeitado solteirão (ele ficara solteiro para cuidar da mãe paralítica, que morreu pouco antes), ele propõe casamento a Dona Flor e eles tem o mais casto dos noivados, nunca ficando juntos sozinhos. O capítulo acaba com o casamento de Flor, desta vez aprovado por sua mãe (que havia saído da cidade no começo do capítulo; nem as outras beatas agüentavam Dona Rozilda).

A quarta parte começa com a lua-de-mel de Dona Flor. Teodoro é diferente do falecido em tudo. Fiel (não compreende mesmo quando uma cliente da farmácia levanta o vestido BEM alto para tentá-lo), regular (sexo às quartas e sábados, bis aos sábados e facultativo às quartas) e inteligente, Teodoro trás a paz de volta à vida de Dona Flor. Teodoro toca fagote numa orquestra de amadores e o maestro compõem uma linda música para ela que Teodoro toca solo (o convite abre o capítulo) e no dia do aniversário de casamento, após os convidados partirem Flor vê Vadinho, nu como o viu na cama no dia de sua morte, a puxá-la e tentá-la. Ela se recusa naquele momento, fiel ao marido. Teodoro vai dormir e Vadinho sai logo depois, qundo Flor ia procurá-lo. Começa aqui a parte do livro que o deixou famoso: Flor, Teodoro e Vadinho, vivendo em matrimônio ao mesmo tempo, Vadinho nu, invisível a todos menos Flor.

A quinta parte, que tornou famoso livro, filme, seriado e tantas quanto foram as adaptações desta obra, começa com o Vadinho vindo de volta dos mortos, tentando Flor. Flor sente-se dividida entre o esposo atual e Vadinho, mas este diz-lhe que não há por que o estar: são colegas, casados frente ao juiz e ao padre. Flor vai aos poucos perdendo a resistência e chega a encomendar um trabalho para mandar Vadinho de volta para onde estava. Enquanto isso se passa Vadinho vai manipulando as mesas de jogo, favorecendo velhos amigos, levando Pellanchi Moulas, rei do jogo em Salvador, ao desespero e a todos os “místicos” da Bahia para se livrar do azar. Vadinho só para quando seus amigos cansam (Mirandão, companheiro seu quando era vivo, para de jogar definitivamente, assustado com o repetir de vezes que caía no 17, número de sorte de Vadinho). Por fim Dona Flor sucumbe a Vadinho e passam a viver harmoniosamente os três uma vida conjugal (mesmo que Teodoro não o saiba). Vadinho chega a fazer o milagre de expulsar a sogra quando ela chega de mala e cuia para ficar.

Vadinho começa então a desaparecer e Flor se dá conta de que era por causa do feitiço por ela encomendado. Há uma batalha entre vários deuses contra Exu (identificado por alguns como sendo o diabo católico), que protege Vadinho. Quando Exu estava perdendo, o amor e a volúpia de Vadinho ganham a batalha. A obra acaba com Flor andando feliz com Teodoro e Vadinho (nu, como sempre) ao seu lado, pelas ruas de Salvador. Esta parte acentua duas características gerais da obra: a religiosidade que mistura ao mesmo tempo o catolicismo e o candomblé, pondo todas as figuras míticas das duas religiões junto e eficientemente simultâneas (algo como é a religiosidade baiana, já que Salvador tem mais igrejas que qualquer outra cidade do Brasil e ainda assim é centro das religiões de origem africana). A outra característica vem a ser o fato de que Vadinho e Teodoro são metáforas para o id e o superego, respectivamente. Vadinho é rebelde, impulsivo, espontâneo e dado ao caos (no seu caso, o jogo); Teodoro é metódico e controlado (“Um lugar para cada coisa e cada coisa em seu lugar” é seu lema, pendurado na farmácia). Assim, a imagem de Flor pacificamente com os dois, totalmente feliz, invoca o ideal de equilíbrio entre os dois.

Fontes:
http://www.coladaweb.com/resumos/flor.htm

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José de Alencar (O Guarani)

(id:MCCXXXV)

Na primeira metade do século XVII, Portugal ainda dependia politicamente da Espanha, fato que, se por um lado exasperava os sentimentos patrióticos de um frei Antão, como mostrou Gonçalves Dias, por outro lado a ele se acomodavam os conservadoristas e os portugueses de pouco brio.

D. Antônio de Mariz, fidalgo dos mais insignes da nobreza de Portugal, leva adiante no Brasil uma colonização dentro mais rigoroso espírito de obediência à sua pátria. Representa, com sua casa-forte, elevada na Serra dos Órgãos, um baluarte na Colônia, a desafiar o poderio espanhol.

Sua casa-forte, às margens do Pequequer, afluente do Paraíba, é abrigo de ilustres portugueses, afinados no mesmo espírito patriótico e colonizador, mas acolhe inicialmente, com ingênua cordialidade, bandos de mercenários, homens sedentos de ouro e prata, como o aventureiro Loredano, ex-padre que assassinara um homem desarmado, a troco do mapa das famosas minas de prata.

Dentro da respeitável casa de D. Antônio de Mariz, Loredano vai pacientemente urdindo seu plano de destruição de toda a família e dos agregados. Em seus planos, contudo, está o rapto da bela Cecília, filha de D. Antônio, mas que é constantemente vigiada por um índio forte e corajoso, Peri, que em recompensa por tê-la salvo certa vez de uma avalancha de pedras, recebeu a mais alta gratidão de D. Antônio e mesmo o afeto espontâneo da moça, que o trata como a um irmão.

A narrativa inicia seus momentos épicos logo após o incidente em que Diogo, filho de D. Antônio, inadvertidamente, mata uma indiazinha aimoré, durante uma caçada. Indignados, os aimorés procuram vingança: surpreendidos por Peri, enquanto espreitavam o banho de Ceci, para logo após assassiná-la, dois aimorés caem transpassados por certeiras flechas; o fato é relatado à tribo aimoré por uma índia que conseguira ver o ocorrido.

A luta que se irá travar não diminui a ambição de Loredano, que continua a tramar a destruição de todos os que não o acompanhem. Pela bravura demonstrada do homem português, têm importância ainda dois personagens: Álvaro, jovem enamorado de Ceci e não retribuído nesse amor, senão numa fraterna simpatia; Aires Gomes, espécie de comandante de armas, leal defensor da casa de D. Antônio.

Durante todos os momentos da luta, Peri, vigilante, não descura dos passos de Loredano, frustrando todas suas tentativas de traição ou de rapto de Ceci. Muito mais numerosos, os aimorés vão ganhando a luta passo a passo.

Num momento, dos mais heróicos por sinal, Peri, conhecendo que estavam quase perdidos, tenta uma solução tipicamente indígena: tomando veneno, pois sabe que os aimorés são antropófagos, desce a montanha e vai lutar “in loco” contra os aimorés: sabe que, morrendo, seria sua carne devorada pelos antropófagos e aí estaria a salvação da casa de D. Antônio: eles morreriam, pois seu organismo já estaria de todo envenenado.

Depois de encarniçada luta, onde morreram muitos inimigos, Peri é subjugado e, já sem forças, espera, armado, o sacrifício que lhe irão impingir. Álvaro (a esta altura enamorado de Isabel, irmã adotiva de Cecília) consegue heroicamente salvar Peri. Peri volta e diz a Ceci que havia tomado veneno. Ante o desespero da moça com essa revelação, Peri volta à floresta em busca de um antídoto, espécie de erva que neutraliza o poder letal do veneno.

De volta, traz o cadáver de Álvaro morto em combate com os aimorés. Dá-se então o momento trágico da narrativa: Isabel, inconformada com a desgraça ocorrida ao amado, suicida-se sobre seu corpo. Loredano continua agindo. Crendo-se completamente seguro, trama agora a morte de D. Antônio e parte para a ação. Quando menos supõe, é preso e condenado a morrer na fogueira, como traidor.

O cerco dos selvagens é cada vez maior. Peri, a pedido do pai de Cecília, se faz cristão, única maneira possível para que D. Antônio concordasse, na fuga dos dois, os únicos que se poderiam salvar. Descendo por uma corda através do abismo, carregando Cecília entorpecida pelo vinho que o pai lhe dera para que dormisse, Peri, consegue afinal chegar ao rio Paquequer. Numa frágil canoa, vai descendo rio abaixo, até que ouve o grande estampido provocado por D. Antônio, que, vendo entrarem os aimorés em sua fortaleza, ateia fogo aos barris de pólvora, destruindo índios e portugueses.

Testemunhas únicas do ocorrido, Peri e Ceci caminham agora por uma natureza revolta em águas, enfrentando a fúria dos elementos da tempestade. Cecília acorda e Peri lhe relata o sucedido. Transtornada, a moça se vê sozinha no mundo. Prefere não mais voltar ao Rio de Janeiro, para onde iria. Prefere ficar com Peri, morando nas selvas. A tempestade faz as águas subirem ainda mais. Por segurança, Peri sobe ao alto de uma palmeira, protegendo fielmente a moça.

Como as águas fossem subindo perigosamente, Peri, com força descomunal, arranca a palmeira do solo, improvisando uma canoa. O romance termina com a palmeira perdendo-se no horizonte, não sem antes Alencar ter sugerido, nas últimas linhas do romance, uma bela união amorosa, semente de onde brotaria mais tarde a raça brasileira…
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O livro inteiro pode ser obtido no site http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/guarani.html
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Fonte:
http://www.netsaber.com.br/
Capa do Livro: Editora Martin Claret

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Jorge Amado (A Morte e a Morte de Quincas Berro D’Água)

(id:MCCXXXIV)

Autor dos mais respeitados na literatura brasileira, desde os anos trinta, Jorge Amado tem pontificado e feito sucesso de crítica e de público. Sua obra explora os mais diferentes aspectos da vida baiana: a posse violenta da terra, com as conseqüências sociais terríveis, como ocorreu na colonização da zona cacaueira do Sul da Bahia, está magistralmente imortalizada em Cacau, São Jorge de Ilhéus, Gabriela, Cravo e Canela e Terras do Sem Fim. Os tipos folclóricos das ladeiras de Salvador estão presentes em Tenda dos Milagres, Capitães da Areia, Mar Morto. A literatura engajada, comprometida com a ideologia política do Autor faz-se presente em Os Subterrâneos da Liberdade, O Cavaleiro da Esperança. Os perfis de mulheres extraordinárias que comovem e seduzem estão em Tieta do Agreste, Dona Flor e seus Dois Maridos, Gabriela e muitos outros…

Primeiro é preciso que se tenha em mente o “descompromisso” do Autor com o registro formal culto, para se entender melhor o comentário que se faz constantemente sobre seu “estilo”. Jorge Amado já se autoproclamou “um baiano romântico e sensual”. É o que a crítica costuma rotular de contador de estórias. Não segue, intencionalmente, o rigor da técnica de construção literária e nem dá a mínima para as normas gramaticais e ortográficas. Incorpora, com a maior naturalidade, à língua escrita, termos e expressões típicas da língua oral e de sua Bahia idolatrada. Não espere o leitor, portanto, defrontar-se com um texto primoroso, regular, pausterizado. Entretanto, quem se aventurar nos meandros de suas páginas, esteja preparado para o deguste de um texto saboroso e suculento que transpira a trópico, a calor, a vida. Suas histórias são tramadas sobre o povo simples e rude, numa língua que esse povo fala e entende.

O texto que serve de suporte a este estudo centra-se na fixação dos tipos marginalizados para, por intermédio deles, analisar e criticar toda a sociedade. A ação dá-se, basicamente, em Salvador e gira em torno da boêmia desqualificada das cercanias do cais do porto.

A Morte e a Morte de Quincas Berro d’Água é uma das melhores narrativas publicadas por Jorge Amado. Veio a lume em 1958 e conquistou desde logo a admiração de quantos dela se aproximaram. Nitidamente imbricada no Realismo Mágico, mistura sonho e realidade; loucura e racionalidade; amor e desamor; ternura e rancor, de forma envolvente e instigante:

Joaquim Soares da Cunha foi funcionário público, pai e marido exemplar até o dia em que se aposentou do serviço público. A partir daí, jogou tudo para o alto: família, respeitabilidade, conhecidos, amigos, tradição. Caiu na malandragem, no alcoolismo, na jogatina. Trocou a vida familiar pela convivência com as prostitutas, os bêbados, os marinheiros, os jogadores e pequenos meliantes e contraventores da ralé de Salvador. Sua sede era saciada com cachaça e seu descanso era no ombro acolhedor da prostituta. Fez-se respeitado e admirado entre seus novos companheiros de infortúnio: era o paizinho, sábio e conselheiro, sempre disposto a mais uma farra ou bebedeira.

Sua opção pela bandalha representa o grito terrível do homem dominado e cerceado por preconceitos de toda sorte e que um dia rompe as amarras e grita por liberdade.

Morreu solitariamente sobre uma enxerga imunda e sua morte detonou todo o processo de reconhecimento/desconhecimento por parte da família real e da família adotada. Os amigos durante o velório se embriagam e resolvem, bêbados, levar o defunto para um último “giro” pelo baixo-mundo que habitavam. O passeio passa pelos bordéis e botecos, terminando em um saveiro, onde há comida e mulheres. Vem uma tempestade e o corpo de Quincas cai ao mar.

Ao renunciar à família, mudar de ambiente e de costumes, Quincas morreu pela primeira vez; na solidão de seu quartinho imundo, envolvido por farrapos e curtindo a última bebedeira, morreu pela segunda vez; ao cair ao mar, não deixando qualquer testemunho físico de sua passagem pela vida, morreu pela terceira vez. A narrativa poderia chamar-se A morte e a morte e a morte de Quincas Berro D’Água, acrescentando-se uma morte ao protagonista, que ficaria bem de acordo com a progressão da trama.

Fonte:
http://www.vestibular1.com.br

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Marcelino Freire (Rasif: mar que arrebenta)

“Eu quero que o leitor tenha a sensação de que está com o fim do mundo nas mãos”. Quem expressa esse desejo apocalíptico é o escritor Marcelino Freire, radicado em São Paulo desde os anos 90, mas natural de Sertânia, cidade do Sertão distante 316 Km do Recife. Autor de Angu de Sangue, Navio Negreiro e outros sucessos de crítica e público, ele é uma das atrações principais deste final de semana da 6ª Bienal Internacional do Livro, que desde ontem ocupa diversos espaços do Centro de Convenções.

Rasif transforma em realizade um sonho antigo de Marcelino Freire: o de publicar algo acompanhado por ilustrações. “Eu semprei gostei das coisas que Caribé fazia para os livros de Jorge Amado ou dos desenhos de Santa Rosa para Vidas Secas. Aí conheci o trabalho de Manu Maltez no Degrau, um bar da Vila Madalena. Esse cara, além de músico, é um ilustrador portentoso!”. O novo livro traz figuras de urubus, corujas, ossos e outros elementos.
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Para Iemanjá
Oferenda não é essa perna de sofá. Essa marca de pneu. Esse óleo, esse breu. Peixes entulhados, assassinados. Minha Rainha.

Não são oferenda essas latas e caixas. Esses restos de navio. Baleias encalhadas. Pingüins tupiniquins, mortos e afins. Minha Rainha.

Não fui eu quem lançou ao mar essas garrafas de Coca. Essas flores de bosta. Não mijei na tua praia. Juro que não fui eu. Minha Rainha.

Oferenda não são os crioulos da Guiné. Os negros de Cuba. Na luta, cruzando a nado. Caçados e fisgados. Náufragos. Minha Rainha.

Não são para o teu altar essas lanchas e iates. Esses transatlânticos. Submarinos de guerra. Ilhas de Ozônio. Minha Rainha.

Oferenda não é essa maré de merda. Esse tempo doente. Deriva e degelo. Neste dia dois de fevereiro. Peço perdão. Minha Rainha.
Se a minha esperança é um grão de sal. Espuma de sabão. Nenhuma terra à vista. Neste oceano de medo. Nada. Minha Rainha.
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Se em Contos negreiros, o escritor Marcelino Freire questionava a noção de igualdade racial no Brasil (a cordialidade como produto de uma síntese feliz e festiva entre índios, negros e brancos estrangeiros), Rasif, mar que arrebenta, sua nova antologia de contos, busca outros territórios. O título rascante do livro carece de alguma explicação.

Recife vem do árabe, Rasif: terreno de lajes, estrada composta de rochedos. Já Pernambuco, origina-se no tupi-guarani, paranã-puca: “onde o mar se arrebenta”. Deste violento embate entre pedra e mar, emerge Rasif, mar que arrebenta.

Dezessete contos, ou melhor, “cirandas, cirandinhas” (assim o autor as nomeou no índice) compõem Rasif, um desnorteio de ritmos bem traduzido na linguagem lírica e ríspida, dura e sutil, bela e grotesca, deste autor que embaralha ainda mais os limites da narração. Cada palavra é ponderada, valendo sílaba a sílaba, aspirando a poemas. Pensemos, por isso, a pertinência da denominação “ciranda” para os contos. Na origem do termo está sarand, palavra hispano-árabe que em sua evolução rumo à forma portuguesa conheceu as formas zaranda e çaranda. Para um livro que mira o oriente, mas que tem Recife, Pernambuco como ponto de partida para pensar o mundo, ciranda aponta para um volteio de temas, escolha, união, dança e embate. Isto porque “ciranda” dá nome a uma peneira grossa, mas também define o canto e a dança de roda adulta ou infantil (e lembremos a profusão de crianças que abarca esta obra).

O livro vai além dos limites de Recife e Pernambuco, já que as fronteiras dos contos se distendem para novos territórios. Partindo da etimologia de Recife, surgem contos que tematizam conflitos e põem em pauta uma Arábia sem mistificação, sem orientalismo. Aqui e lá vivem amores, desejos, estilhaços, guerras, explosões. As Arábias são mais um motivo para olhar o mundo que se vê invadido, que se sente deslocado num mundo cada vez mais vertiginoso. Os árabes invadem Rasif até mesmo na dedicatória (“para Asfora, Benuthe, Hatoum, Nassar, Nazarian, Salomão e Snege”), mas alarga-se em contos como “O meu homem-bomba”, “We speak English”, e está implícita no desejo assassino de menino de “Maracabul”, cujo sonho maior é possuir uma arma. Os estilhaços ferozes e infelizes da violência e da guerra estão também em “Amor cristão” e “Da paz”.

Do mesmo modo que o árabe, a “língua indígena” vai dar no intérprete que traduz, no conto “Tupi-guarani”, as reivindicações dos índios que, furiosos, invadem o teatro Amazonas. As palavras ameríndias guiam o autor, com sua sonoridade, e vão dar numa proliferação de toponímia, nomes de bichos, lugares, costumes e sons, num livro entranhado em contos que dialogam e distendem-se como no conto que abre o livro, “Para Iemanjá”. Nele, o mar (e as águas) é leitmotiv de Rasif e além de ser um canto de louvação à orixá-senhora das águas, denuncia a dessacralização da natureza, o desrespeito e a ação assassina do homem. O lirismo de “Para Iemanjá” é dos mais imensos: “Oferenda não é essa perna de sofá. Essa marca de pneu. Esse óleo. Esse breu. Peixes entulhados. Assassinados. Minha Rainha (…) Não são para o teu altar essas lanchas e iates. Esses transatlânticos. Submarinos de guerra. Ilhas de Ozônio. Minha Rainha. /Oferenda não é essa maré de merda. Esse tempo doente. Deriva e degelo” (…) (p.21).

Muitos reconhecerão no livro a dicção coloquial e urbana dos narradores; o tema da violência; a obsessão pelo solilóquio repleto de ambigüidades. Trata-se de uma linguagem que busca aproximar-se da letra de canção; canção que, na modernidade, vai se irmanar ao sample e ao canto-desafio do rap: “O medo, aqui, não é brinquedo, pode crer. / Pá-pá-pá. / Gostoso roubar e sumir pelos buracos do barraco. Pelo rio e pela lama. Gritar um assalto, um assalto, um assalto. Cercado de PM por todos os lados. Ilhado na Ilha do Maruim. Na boca do guaiamum. /Papai Noel vai entender o meu pedido. Quero um revólver comprido, de cano longo. /Socorro! /Socorro!” (“Maracabul”, p.41).

Marcelino Freire trabalha com uma frase quebrada, que em estilhaços se faz quase versejada, já que se encontra posta no martelo do cordel, sincopada na récita do repente: “Saudades da bernúncia. Saudades da zabumba. Do Zé do Vale e Zé Pereira. Do Zé Limeira. Saudades do violão e da viola. Saudades da graviola. Pitanga, umbu. Cajá, maracujá. /Saudades da Lia. Da lua de Itamaracá. Saudades do Cariri, Sertão do Pajeú. (…)” (“O futuro que me espera”, p. 122).

Em Rasif estão presentes as personagens que se constroem ao narrarem-se. São travestis, pedófilos, miseráveis indignados, assassinos militantes, gays passionais, pais indignados, crianças cruéis, todos unidos (ao lado de outros) para novos cantares. Afasta-se do clichê, da pobreza sofrida e explorada, seus personagens não revidam o que enfrentam, revelam suas carências, são impiedosos e cínicos. Marcelino Freire os constrói por meio da ironia (figura central em sua “poética” do desmascaro), por isso podem ser lidos de formas distintas.

Para traduzir estas personagens, o autor faz uso das “falas-drama” que mimetizam tanto o universo interior quanto o exterior pelo “modo” que elas (aparentemente) diriam-se, conquistado o direito à voz. São “personalidades” que se convertem em trama ao executar o enredo de si mesmas. “Enredar-se”, neste sentido, adquire também o significado de “logro”. Não bastasse isto, o autor – cuja literatura se constrói à revelia do bom gosto e do politicamente correto – elege personagens marginais, seres de exceção, figuras cujo olhar viciado (da sociedade contemporânea) as converteu em “tipos”, “estereótipos”. Marcelino Freire assume o risco de traduzi-las de uma perspectiva interna, modus operandi experimentado (não sem algum constrangimento) por escritores de peso como Graciliano Ramos. A adesão de Marcelino Freire é, contudo, desapaixonada, oposta à perspectiva empática efetuada por João Guimarães Rosa. Adotando a ironia, a contradição, o paradoxo, ele desestabiliza as certezas, inserem singularidade para destroçar a visão pré-concebida. Estigmatizadas pela ordem social, suas personagens humanizam-se pela complexidade de sua paisagem interior. Sua estratégia é o foco narrativo em primeira pessoa, diálogos mais próximos de solilóquios, de monólogos interiores que se alteram para um fluxo de consciência no qual sobressai, pelo não-dito, “personalidades” que ao se contradizerem, revelam-se.

O que poderia resultar numa estratégia narrativa de curto alcance, pelo risco de esgotar-se pela repetição (neste sentido, “Maracabul” é dentre todas a mais fraca, pelo curto alcance da configuração psicológica de menino; o mesmo podendo se dizer do discurso de “We speak English”, reduzido à sátira estilisticamente bem construída), resulta, por vezes, em excelentes contos. “I-no-cen-te”, talvez a narrativa mais arriscada do livro, é exemplo da força desta técnica. Sua trama constrói-se sub-repticiamente, por meio de um depoimento no qual o não-dito configura o crime, um discurso que pretensamente busca a conversão do réu em vítima. “I-no-cen-te”, em sua ambígua, irônica, e amoral tecitura, busca a afirmação e comprovação da inocência do criminoso diante da perversidade de sua vítima: “Aí o povo vai comentar: que é coisa pura. Uma nudez de candura. A maldade está no meu olhar. Eu é que não enxergo. Vejo além. Vejo desonesto. Vejo o que não está. Tenho um coração feio, que não se contém. Algo em mim precisa se exorcizar. Miolo mole, que não bate bem” (p.89).

Rasif possui um tom mais melancólico e satírico do que as obras anteriores; em parte, por trazer personagens ainda mais isolados, desconfortáveis no lugar onde estão. Trata, igualmente, da perda de um olhar ingênuo sobre o mundo, e de falas soltas, incompreendidas, uma algaravia não-comunicativa. O melhor exemplo é “Chá”, sátira corrosiva que põe à roda da mesa, os imortais da academia de Letras cada vez mais surdos e senis. Entre xícaras de chá e torradinhas, eles discutem o destino da cadeira recentemente vaga de um “imortal” gagá: “(…) Deu derrame. A bolacha. Passa. Ficou caduquinho. Tira a roupa. O quê? Não estou ouvindo. Dizem que fica nuzinho. Nu? Nuzinho. Hum, hum. Deve ficar uma graça. Nuzinho. Só tem osso. De quê? Camomila. Hã? Não ouço. Ca-mo-mi-la. Obrigado. É a vida. (…)” (p. 81).

Mesmo abrindo-se ao humor e ao nonsense, Marcelino Freire não arrefece em explicitar, com a ferocidade denunciadora das obras precedentes, que vivemos num mundo mal, atolado em injustiças das mais diversas esferas. Rasif é tudo isso, mas é também um livro de amor, um amor particularíssimo, selvagem, como explicitado no conto-vinheta “Amor cristão”: “Amor é a mordida de um cachorro pitbull que levou a coxa da Laurinha e a bochecha do Felipe. Amor que não larga. Na raça. Amor que pesa uma tonelada. Amor que deixa. Como todo grande amor. A sua marca. (…)” (p. 77).

O nonsense em Rasif comparece em contos como “Junior”, que traz um bebê que surpreende fascinado o pai com um travesti na cozinha de casa; em “Meu último natal”, apresenta-se apenas no insólito desfecho da narrativa sobre um menino, cujo propósito feroz é assassinar e roubar o Papai Noel. Este nonsense pode chegar a extremos de melancolia, como no beckettiano “Ponto.com.ponto”, que traz um sujeito num banco de praça, à espera (cega e interminável) de um possível amor agendado pela internet. As frases curtas, picotadas (ponto a ponto), procuram traduzir ao leitor esperança, impotência e crescente frustração do protagonista: “(…) O meu peito ziguezagueia. Cada passo da cidade de São Paulo. Sinto. Ela não vem. Depois de tanto tempo. Um, dois, três. Marcamos o encontro. Dentro da tarde, neste terceiro banco. A gente vai ser feliz. Depois de tanto tempo, meu amor. No computador. Marcamos. Este encontro real. (…)” (p. 116).

Marcelino Freire esmera-se em tornar mais complexos os enredos de alguns contos de Rasif. “Os atores”, trama que mistura melodrama, suspense e tragédia, ilustra o tema da representação. No conto, um velho ator encena um crime passional. Protagonizando a peça ao lado de seu jovem amante, ele decide substituir a pistola falsa por outra verdadeira, tudo para que o rapaz, o mate diante da platéia. A narrativa inicia com a descrição da cena clímax da peça, seguindo em marcações, rubricas, pontuando intenções: “A última cena é assim: ele tira o revólver da gaveta, dispara à queima-roupa. E eu caio. Como um rei cairia. Ou a Petra. Ou a Phedra. Depois, Leocádio sopra um monólogo sem fim. E chora e ri. As cortinas fecham o espetáculo. E voltamos abraçados para os aplausos” (p. 67).

Amalgamando lirismo e crueza (a exemplo do trecho anterior), Marcelino Freire dá vazão em Rasif a um estranho saudosismo da ingenuidade perdida, da infância, de uma natureza não-corrompida, de uma modernidade sem a vertigem do consumo. É o que se lê no diálogo indignado do motorista de “Sinal fechado”: “- A Guerra na Arábia Saudita, na Conchinchina, sei lá. A culpa é do carro. Do combustível. Do petróleo. Do gás. Da gasolina. (…) – Da guerra. Sim, da guerra. Da carnificina. Por que é que eles brigam, meu caro? Por causa do carro. Entendeu? A roda nos fodeu. Antes a gente vivesse no tempo do jumento. Até o jumento virou moto. Não viu? Um dia saiu na televisão” (p. 109).

Em Rasif estão ainda presentes as zonas de conflitos dos afetos, os campos minados dos desejos; mas há, pela primeira vez nos enredos, finais felizes, saídas para o amor como se os personagens já pudessem aspirar a um futuro possível, menos torpe. É o caso de “Roupa suja”, em que uma empregada de lavanderia narra a uma amiga suas idas e vindas num terreiro feitas para conquistar o cliente executivo pelo qual se apaixonou. Num tom entre o obsceno e humorístico, a narrativa excede em referências ao universo do trabalho da narradora: “(…) Cheiroso, nem olhou para o meu alvoroço. Nem sequer um pensamento. Leve. Ele, dentro de uma bolha. Eu, tão rastejante. Nada, a partir daquela manhã, foi a mesma coisa. (…) Amor, Maria, amor./Sabe o que é isso?/Fragrância de flor. (…)” (p.57).

Apaixonado pela sonoridade das palavras, o autor joga com som e sentido para enredar significados e efeitos novos na expressão. Isto faz com que por vezes, a trama seja o próprio discurso, tornando ainda mais difícil a classificação “contos” para textos como “Para Iemanjá”, “We speak English”, “Amor cristão” e “O futuro que me espera”. Estes funcionariam, à maneira de um álbum musical, como vinhetas para introdução de novos temas, outros andamentos. Isto por que Marcelino Freire deixa circular (cirandar) com rigor, elementos que unificam tematicamente Rasif e fazem ressoar um conto no outro: “Mamãe, este ano eu fui um bom menino, mas ano que vem eu quero ficar rico. Ter um carro-forte, um carro do ano. /Juro que não estou brincando”. (“Maracabul”, p. 43), “Aí o Leco resolveu matar o Papai Noel. De verdade. Dar uma pedrada na cabeça dele assim que ele chegasse. Não pela chaminé, que não havia. Pela janela do barraco.(…)” (“Meu último Natal”, p. 45).

Contraditoriamente, faz uso do “lugar-comum”, de personagens estigmatizados, marginais que põe em primeiro plano e que, ao se expressarem, singularizam-se, ganhando em complexidade psicológica. Humaniza-os, assim, sem escamotear suas falhas de caráter, seus desvios morais, suas obsessões sexuais. Sua perspectiva é interna (daí o uso freqüente da primeira-pessoa), não-distanciada. Não se trata, porém, de uma adesão amorosa (à maneira de um Guimarães Rosa), tampouco amoral (sem julgamento explícito, como num Rubem Fonseca). Eles expressam e em seu próprio discurso explicitam ambiguamente suas contradições.

Como o desfecho em que paisagens, nomes, paladares (termos predominantemente indígenas) fecham o livro com uma declaração de amor a Pernambuco, ao sertão, ao Brasil sem dor. Neste desfecho, há ecos de poemas do poeta Manuel Bandeira (cujos versos fecham o livro), textualmente citado no conto “Amigo do rei”, narrativa de um garoto cuja amor pela poesia faz aflorar o horror homofóbico do pai: “(…)Um pesadelo! Eu mato esse menino. Ah! Se mato. Que desgraça! Ele e esse tal de Manuel Bandeira. Suados e abraçados, em campo. (…)”(p. 98)

Rasif retoma o tom poético em seu desfecho com “O futuro que me espera”, aspiração que soçobra os desencantos com a cidade grande, dissolve angústias, acena para uma felicidade futura resgatada do passado (interiorano?) quando a paz não se fazia reles discurso: “Saudades de tantas coisas. Que eu costurei a mala, levantei as paredes da caixa. Disse olhando os prédios de São Paulo. E a fumaça. Vou-me embora agora mesmo, de hoje não passa. Aqui nunca foi a minha terra”. (p. 123)

Completando este salto, estão as ilustrações de Manu Maltez, gravuras em água forte que não ilustram os contos, mas que traduzem a fluidez do traçado desconcertante do artista, com figuras que oscilam num premente movimento, alterando-se de figuras humanas clássicas a animais e formas grotescas: impuros seres convertidos em mãos, feras míticas, aves que se convertem em onda, como a que ilustra a capa. Fortes águas, vozes de arrebentação. Rasif traz narrativas e formas que não se contém quietas, que precisam saltar, ganhar espaço no mundo.

Rudes e acérrimos, subversivos, bailarinos, radicalmente negros (na contra-corrente da literatura noir), os contos de Marcelino Freire em Rasif, mar que arrebenta não se prestam ao limite do papel. Assentam mal, parecem não pertencer à classe da literatura que se imprime impunemente em nossos dias. Inquietantes, vertem sangue, dançam, batucam, aspiram o trânsito, o salto para fora do objeto-livro que os contêm. Por isso mesmo, faz-se válida a afirmação do autor de que seus contos são para serem lidos em voz alta.

Acatemos essa voz, cantemos e cirandemos, sem pudor, nas águas fortes de Rasif.
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Amor cristão

Amor é a mordida de um cachorro pitbull que levou a coxa da Laurinha e a bochecha do Felipe. Amor que não larga. Na raça. Amor que pesa uma tonelada. Amor que deixa. Como todo grande amor. A sua marca.

Amor é o tiro que deram no peito do filho da dona Madalena. E o peito do menino ficou parecendo uma flor. Até a polícia chegar e levar tudo embora. Demorou. Amor que mata. Amor que não tem pena.

Amor é você esconder a arma em um buquê de rosas. E oferecer ao primeiro que aparecer. De carro importado. De vidro fumê. Nada de beijo. Amor é dar um tiro no ente querido se ele tentar correr.

Amor é o bife acebolado que a minha mulher fez para aquele pentelho comer. Filhinho de papai. Lá no cativeiro. Por mim ele morria seco. Mas sabe como é. Coração de mãe não gosta de ver ninguém sofrer.

Amor é o que passa na televisão. Bomba no Iraque. Discussão de reconstrução. Pois é. Só o amor constrói. Edifícios. Condomínios fechados. E bancos. O amor invade. O amor é também o nosso plano de ocupação.

Amor que liberta. Meu irmão. Amor que sobe. Desce o morro. Amor que toma a praça. Amor que de repente nos assalta. Sem explicação. Amor salvador. Cristo mesmo quem nos ensinou. Se não houver sangue. Meu filho. Não é amor.

(Extraído do livro “RASIF – Mar que Arrebenta”, de MARCELINO FREIRE, Editora Record, 2008)

Fontes:
http://www.bienalpernambuco.com/
http://www.cronopios.com.br/

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Sinopse de Obras Literárias III

Corrida pela herança (Sheldon, Sidney)
Este é mais para o público infanto-juvenil. O magnata Samuel Stone gostava mais de sua fortuna do que do seus herdeiros. Quem quiser se apossar das riquezas do falecido terá que desvendar pistas misteriosas e enfrentar perigos inimagináveis, nesta complicada caça ao tesouro. A viúva vaidosa, o sobrinho ganancioso, o advogado interesseiro e o primo bondoso irão se meter nas mais incríveis situações e recorrer à métodos bastante estranhos para se livrar dos adversários.

Os doze mandamentos (Sheldon, Sidney)
Moisés desceu da montanha com suas tábuas de pedra nas quais estavam os dez mandamentos da lei de Deus, conta a história sagrada. Mas o escritor viaja ao passado para revelar um segredo: na verdade seriam doze os mandamentos. E, ao contrário da punição de quem não cumpre essas leis, os personagens recebem grandes recompensas, tornando-se ricos, famosos e felizes.

Os quatrocentos (Sheppard, Stephen)
Inverno 1872. Quatro jovens aventureiros americanos arquitetam e, mais tarde, executam um grande golpe para lesar o Banco da Inglaterra, em milhares de libras. O desenrolar da história leva o leitor de um continente a outro causando muita ansiedade em querer adivinhar o seu final.

Carta a meu juiz (Simenon, Georges)
Por amor, ou antes, por paixão, um médico sai de seu confortável círculo de valores e se envolve com um lado da vida que desconhecia. Fica muito envolvido, a ponto de cometer um crime, como explica e justifica a longa carta a seu juiz.

Os quatro dias de um pobre homem (Simenon, Georges)
A história deste livro mostra dois momentos distintos da vida de seu personagem central. O pobre homem porém, é o mesmo. Não pode e parece não querer fugir ao seu destino. Não pode modificá-lo e tem consciência do que será o fim de sua trajetória. O autor apoia-se nas lembranças e no rumo que tomou a vida de seu personagem e oferece uma análise psicológica das motivações e da fatalidade de um autêntico pobre homem.

O testamento maldito (Simenon, Georges)
A saga da família Donadieu começa com o desaparecimento do armador Oscar Donadieu e após alguns dias, seu corpo é encontrado boiando junto ao cais. Em La Rochelle, a importante e abastada família é tida como referência na cidade e todos observam seguem seus passos. A exumação do cadáver, a surpresa do testamento e as suspeitas sobre a morte do armador são algumas das muitas passagens reservadas por George Simenon para “O testamento maldito”.

O xangô de Baker Street (Soares, Jô)
Sherlock Holmes vem ao Império do Brasil investigar um crime. E, mesmo tendo vindo a negócios, também passeia no país dos papagaios num carnaval interpretado por Sarah Bernhardt.

Álbum de família (Steel, Danielle)
Romance que conta a carreira e a vida particular de uma atriz, desde sua juventude, quando ainda solteira e depois de seu casamento com um playboy milionário. Relata a vida dos seus filhos, suas alegrias e também suas grandes tristezas.

Viajando com Charley (Steinbeck, John)
Aos 60 anos, John Steinbeck partiu à descoberta de sua terra natal. Para esta viagem batizou seu veículo de Rocinante e levou como companheiro seu poodle francês Charley. Partiram de Nova York e percorram cerca de 40 estados americanos. O livro descreve não só essa aventura, mas também a descoberta que de certo modo vive no coração de todos os homens, principalmente dos que não podem mais fazê-la.

As vinhas da ira (Steinbeck, John)
A trajetória da família Joad, de fazendeiros estabelecidos a quase escravos na Califórnia, nos anos da Depressão. Um clássico americano, em que se juntam o social, o econômico e o humano – que se recusa a ceder.

Lendas do deserto (Tahan, Malba)
Trinta e nove histórias com um mundo moral bem definido, que derivam de lendas árabes, hindus e persas trazendo sempre, em cada uma delas, uma lição de vida e fé.

Inocência (Visconde de Taunay)
Romance de amor passado em meados do século XIX, num lugarejo no interior do Brasil. Inocência, já prometida pelo pai a Manecão, tem um romance com Cirino, amor totalmente impossível. Conflito entre o modo de vida rural e o urbano.

A retirada da Laguna (Visconde de Taunay)
Episódio da Guerra do Paraguai. Narrativa da expedição brasileira em operações no sul de Mato Grosso, no recuo efetuado desde Laguna, na fronteira do Paraguai, até o rio Aquiduana, em território brasileiro. “Trinta e nove léguas percorridas em 35 dias de dolorosa recordação”.

Ciranda de pedra (Telles, Lygia Fagundes)
Infância e adolescência de uma jovem que ao descobrir sua verdadeira origem paterna, torna-se uma pessoa problemática. Suas angústias são contadas, assim como seus amores e suas tristezas.

Venha ver o pôr-do-sol e outros contos (Telles, Lygia Fagundes)
Conto que dá título ao livro – Ricardo é um rapaz misterioso, com idéias mórbidas, que leva sua namorada Raquel para ver o pôr-do-sol no cemitério e o melhor local para isso seria sobre o túmulo da família de Ricardo onde estava sua prima.

O Senhor dos Anéis – I – A Irmandade do Anel (Tolkien, J.R.R.)
Primeira parte da grande obra de ficção fantástica do autor. Esta história cresceu conforme foi sendo contada, até se tornar uma história da Grande Guerra do Anel, incluindo muitas passagens da história ainda mais antiga que a precedeu. Em grande parte, esta obra trata de hobbits, e através de suas páginas o leitor pode descobrir muito da personalidade deles e um pouco de sua história.

A herdeira veneziana (Tomizza, Fulvio)
Romance histórico que se passa no século XVIII. Relato verídico da vida de Paulina Rubi, baseado no livro “Privadas desventuras de uma mulher de verdadeiro espírito” escrito por seu pai, o Conde Gian Rinaldo Carli, que depois de editá-lo, mandou queimar todos os exemplares, menos um , que ficou guardado em uma caixa blindada sob a guarda da Biblioteca de Lucca.

Topázio (Uris, Leon)
1962: a crise dos mísseis em Cuba. Espiões russos infiltrados entre os ministros do General De Gaulle. Agentes secretos norte-americanos e franceses tentando provar a instalação de mísseis, na pequena ilha do Caribe, pelo governo da Rússia. Homens fortes e mulheres apaixonadas lutam desesperadamente para selar o destino das nações. Baseado em fatos reais.

Banana brava (Vasconcelos, José Mauro de)
Aventura de um jovem que pretende ser garimpeiro e se embrenha pelo caminho difícil que leva ao garimpo de Banana Brava. Uma vida mesclada de traição e vingança, de amizade e solidariedade.

O garanhão das praias (Vasconcelos, José Mauro de)
O livro tem como cenário o Araguaia, junto a uma aldeia Xavante, onde em torno de um posto de saúde do serviço de proteção ao índio, desenrola-se toda a história, tendo como protagonista Canário, o garanhão das praias. A explicação dada pelo próprio autor dá idéia da real característica da narrativa:
“O leitor não encontrará neste livro apenas um sentido de diversão. Ao contrário, o livro é de uma aridez doentia, de um desânimo acachapante e sobretudo, de uma contínua solidão mesclada de constantes desencontros”.

Os cavalinhos de platiplanto (Veiga, José)
Dada a simplicidade de sua linguagem, a fluência de sua narrativa e a singularidade dos entrechos que inventa, Veiga é escritor de leitura constante nas escolas. Mas sua ficção não é simplesmente pedagógica. Sua literatura invade o terreno do fantástico, do mistério e do absurdo, e algo característico que talvez explique esse sucesso, é a sua predileção pelos personagens infantis.

Ana Terra (Veríssimo, Érico)
Romance pacifista e humanista em que o autor inclui vários elementos do folclore gaúcho, onde os personagens imaginários misturam-se com personagens reais da história do Rio Grande do Sul. A família Terra, descendente dos tropeiros vindos de São Paulo, se estabelece na antiga província de São Pedro, na segunda metade do século XVIII e início do século seguinte. A protagonista Ana Terra é uma das pioneiras do povoado de Santa Fé, dominado pela família Amaral.

Incidente em Antares (Veríssimo, Érico)
Romance político. Ambientado na fictícia cidade de Antares, no interior do Brasil, esta obra centra-se na defesa dos direitos humanos e na denúncia do fanatismo ideológico.

Olhai os lírios do campo (Veríssimo, Érico)
Romance que conta a vida de um jovem pobre que, a custa de muito sacrifício, forma-se em Medicina. Muito ambicioso, faz um casamento frustrado com uma moça da alta sociedade. Tarde demais dá-se conta do seu verdadeiro amor.

O resto é silêncio (Veríssimo, Érico)
Romance. Numa praça, no centro de Porto Alegre, uma moça cai do alto de um edifício. Das pessoas que assistem a cena, sete interpretam o fato de maneira diversa. Mais importante que a história da suicida é o relato da vida dessas sete pessoas.

O analista de Bagé (Veríssimo, Luis Fernando)
Vinte e sete hilariantes histórias do impagável analista gaúcho, freudiano, machista, que costuma tratar seus pacientes a tapa.

Comédias para se ler na escola (Veríssimo, Luis Fernando)
Textos curtos, fáceis e divertidos, onde o autor, com originalidade e humor, revela suas obsessões, mergulha em lembranças de infância e adolescência, preocupa-se com o social e o ético.

As mentiras que os homens contam (Veríssimo, Luis Fernando)
Luis Fernando Veríssimo, observador bem-humorado do cotidiano brasileiro, reúne um repertório divertido sobre “As mentiras que os homens contam”. O livro traz crônicas do autor sobre o tema, espalhadas em vários de seus livros ou publicadas nos jornais. Este é o primeiro da série de relançamentos da obra completa de Verissimo.

A vida é pra valer (o diário de Fabiana) (Vilela, Antonio Carlos)
Fabiana é uma adolescente que, com a morte dos pais, vê sua vida e de sua irmã gêmea, dar uma grande virada. O livro fala do amadurecimento, de aprender a ter responsabilidade e a direcionar a afetividade. Fabiana passa a viver separada de Mariana, mas faz novos amigos e estes vão lhe dar forças para enfrentar as suas dificuldades.

A cor púrpura (Walker, Alice)
Estuprada pelo padrasto, uma adolescente negra tenta desabafar escrevendo cartas para Deus e para sua irmã que julga morta.

Fonte:
http://www.vestibular1.com.br

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Monteiro Lobato (Urupês)

Urupês não contém uma única história, mas vários contos e um artigo, quase todos passados na cidadezinha de Itaoca, no interior de SP, com várias histórias, geralmente de final trágico e algum elemento cômico. O último conto, Urupês, apresenta a figura de Jeca Tatu, o caboclo típico e preguiçoso, no seu comportamento típico. No mais, as histórias contam de pessoas típicas da região, suas venturas e desventuras, com seu linguajar e costumes.

José Bento Monteiro Lobato nasceu em 18/04/1882 como José Renato Monteiro Lobato e mudou seu nome mais tarde para poder usar a bengala com as iniciais JBML do pai. Bacharel em Direito contra a vontade, dizia sempre o que pensava e defendia a verdade. Escreveu livros para crianças e iniciou o movimento editorial brasileiro. Meteu-se em encrenca ao afirmar que o Brasil tinha petróleo (e estava certo). Editou livros para adultos e, desgostoso, voltou a literatura infantil. Morreu a 04/07/48. Em Urupês aparece pela primeira vez a figura de Jeca Tatu. Seu outro livro de contos muito famoso, que se junta a sua bibliografia de 30 obras é Cidades Mortas. Uma característica única de Monteiro Lobato é sua linguagem, simplificada, mais até do que a atual gramática oficial.

Como se fosse de natural engraçado, vivera até ali da veia cômica, e com ela amanhara casa, mesa, vestuário e o mais. Sua moeda corrente era micagens, pilhérias, anedotas de inglês e tudo quanto bole com os músculos faciais do animal que ri, vulgo homem, repuxando risos ou matrecolejando gargalhadas.” Urupês

Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade!” Urupês
A quem em nossa terra percorre tais e tais zonas, vivas outrora, hoje mortas, ou em via disso, tolhidas de incansável caquexia, uma verdade, que é um desconsolo, ressurte e tantas ruínas: nosso progresso é nômade e sujeito a paralisias súbitas. Radica-se mal. Conjugado a um grupo de fatores sempre os mesmos, reflui com eles duma região para outra. Não emite peão. Progresso de cigano, vive acampado. Emigra, deixando para trás de si um rastilho de taperas.” Cidades Mortas

Há de subir, há de subir há de chegar a sessenta mil réis em julho. Café, café, só café!…” Cidades Mortas

RESUMO DA OBRA
Urupês – Monteiro Lobato

Urupês é basicamente uma série de 14 contos, tendo como ênfase a vida quotidiana e mundana do caboclo, através de seus costumes, crenças e tradições.

Os faroleiros
Dois homens conversam sobre faróis, e um deles conta sobre a tragédia do Farol dos Albatrozes, onde passou um tempo com um dos personagens da trama: Gerebita. Gerebita tinha um companheiro, chamado Cabrea, que ele alegava ser louco. Numa noite, travou-se uma briga entre Gerebita e Cabrea, vindo este a morrer. Seu corpo foi jogado ao mar e engolido pelas ondas. Gerebita alegava ter sido atacado pelos desvarios de Cabrea, agindo em legítima pessoa. Eduardo, o narrador, descobre mais tarde que o motivo de tal tragédia era uma mulher chamada Maria Rita, que Cabrea roubara de Gerebita.

O engraçado arrependido
Um sujeito chamado Pontes, com fama de ser uma grande comediante e sarrista, resolve se tornar um homem sério. As pessoas, pensando se tratar de mais uma piada do rapaz negavam-lhe emprego. Pontes recorre a um primo de influência no governo, que lhe promete o posto da coletoria federal, já que o titular, major Bentes, estava com sérios problemas cardíacos e não duraria muito tempo. A solução era matar o homem mais rápido, e com aquilo que Pontes fazia de melhor: contar piadas. Aproxima-se do major e, após várias tentativas, consegue o intento. Morte, porém inútil: Pontes se esquece de avisar o primo da morte, e o governo escolhe outra pessoa para o cargo.

A colcha de retalhos
Um sujeito (o narrador) vai até o sítio de um homem chamado Zé Alvorada para contratar seus serviços. Zé está fora e, enquanto não chega, o narrador trata com a mulher (Sinhá Ana), sua filha de quatorze anos (Pingo d’Água) e a figura singela da avó, Sinhá Joaquina, no auge dos seus setenta anos. Joaquina passava a vida a fazer uma colcha de retalhos com pedacinhos de tecido de cada vestido que Pingo d’Água vestia desde pequenina. O último pedaço haveria de ser o vestido de noiva. Passado dois anos, o narrador fica sabendo da morte de Sinhá Ana e a fuga de Pingo d’Água com um homem. Volta até aquela casa e encontra a velha, tristonha, com a inútil concha de retalhos na mão. Em pouco tempo morreria…

A vingança da peroba
Sentindo inveja da prosperidade dos vizinhos, João Nunes resolve deixar de lado sua preguiça e construir um monjolo (engenho de milho). Contrata um deficiente, Teixeirinha, para fazer a tal obra. Em falta de madeira boa para a construção, a solução é cortar a bela e frondosa peroba na divisa das suas terras (o que causa uma tremenda encrenca com os vizinhos). Teixeirinha, enquanto trabalha, conta a João Nunes sobre a vingança dos espíritos das árvores contra os homens que as cortam. Coincidência ou não, o monjolo não funciona direito (para a gozação dos vizinhos) e João Nunes perde um filho, esmagado pela engenhoca.

Um suplício moderno
Ajudando o coronel Fidencio a ganhar a eleição em Itaoca, Izé Biriba recebe o cargo de estafeta (entregador de correspondências e outras cargas). Obrigado a andar sete léguas todos os dias, Biriba perde aos poucos a saúde. Resolve pedir demissão, o que lhe é negada. Sabendo da próxima eleição, continua no cargo com a intenção de vingança. Encarregado de levar um “papel” que garantiria novamente a vitória de seu coronel, deixa de cumprir a missão. Coronel Fidencio perde a eleição e a saúde, enquanto o coronel eleito resolve manter Biriba no cargo. Este, então, vai embora durante a noite…

Meu conto de Maupassant
Dois homens conversam num trem. Um deles é ex-delegado e conta sobre a morte de uma velha. O primeiro suspeito era um italiano, dono de venda, que é preso. Solto por falta de provas, vem morar em São Paulo. Passado algum tempo, novas provas incriminam o mesmo e, preso em São Paulo e conduzido de trem ao vilarejo, se joga da janela. Morte instantânea e inútil: tempo depois, o filho da velha confessa o crime.

“Pollice Verso”
O filho do coronel Inácio da Gama, o Inacinho, forma-se em Medicina no Rio de Janeiro e volta para exercer a profissão. Pensando em arrecadar dinheiro para ir a Paris reencontrar a namorada francesa, Inacinho começa a cuidar de um coronel rico. Como a conta seria mais alta se o velho morresse, a morte não tarda a acontecer. O caso vai parar na justiça, onde dois outros médicos velhacos dão razão a Inacinho. O moço vai para Paris morar em Paris com a namorada, levando uma vida boêmia. No Brasil, o orgulhoso coronel Inácio da Gama fala aos ventos sobre o filho que andava aprofundando os estudos com os melhores médicos da Europa.

Bucólica
Andando pelos pequenos vilarejos e sítios interioranos, o narrador fica sabendo da trágica história da morte da filha de Pedro Suã, que morreu de sede. Aleijada e odiada pela mãe, a filha adoeceu e, ardendo em febre numa noite, gritava por água. A mãe não lhe atendeu, e a filha foi encontrada morta na cozinha, perto do pote de água, para onde se arrastou.

O mata-pau
Dois homens conversam na mata sobre uma planta chamada mata-pau, que cresce e mata todas as outras árvores ao seu redor. O assunto termina no trágico caso de um próspero casal, Elesbão e Rosinha, que encontram um bebê em suas terras e resolvem adotá-lo. Crescido o menino, se envolve com a mãe e mata o pai. Com os negócios paternos em ruína, resolve vendê-los, o que vai contra os gostos da mãe-esposa. Esta quase acaba vítima do rapaz, e vai parar num hospital, enlouquecida.

Bocatorta
Na fazenda do Atoleiro, vivia a família do major Zé Lucas. Nas matas da fazenda, havia um negro com a cara defeituosa com fama de monstro: Bocatorta. Cristina, filha do major, morre justamente alguns dias depois de ter ido com o pai ver a tal criatura. Seu noivo, Eduardo, não agüenta a tristeza e vai até o cemitério chorar a morte da amada. Encontra Bocatorta desenterrando a moça. Volta correndo e, junto a um grupo de homens da fazenda, sai em perseguição a Bocatorta. Esse, em fuga, morre ao passar num atoleiro, depois de ter dado o seu único beijo na vida.

O comprador de fazendas
Pensando em se livrar logo da fazenda Espigão (verdadeira ruína para quem a possui), Moreira recebe com entusiasmo um bem-apessoado comprador: Pedro Trancoso. O rapaz se encanta com a fazenda e com a filha de Moreira e, prometendo voltar na semana seguinte para fechar o negócio, nunca mais dá notícias. Moreira vem a descobrir mais tarde que Pedro Trancoso é um tremendo safado, sem dinheiro nem para comprar pão. Pedro, no entanto, ganha na loteria e resolve comprar mesmo a fazenda, mas é expulso por Moreira, que perdeu assim a única chance que teve na vida de se livrar das dívidas.

O estigma
Bruno resolve visitar o amigo Fausto em sua fazenda. Lá conhece a bela menina Laura, prima órfã de Fausto, e sua fria esposa. Fausto convivia com o tormento de um casamento concebido por interesse e uma forte paixão pela prima. Passado vinte anos, os amigos se reencontram no Rio de Janeiro, onde Bruno fica sabendo da tragédia que envolveu as duas mulheres da vida de Fausto: Laura sumiu durante um passeio, e foi encontrada morta com um revólver ao lado da mão direita. Suicídio misterioso e inexplicável. A fria esposa de Fausto estava grávida e deu a luz a um menino que tinha um sinalzinho semelhante ao ferimento de bala no corpo da menina. Fausto vê o sinalzinho e percebe tudo: a mulher havia matado Laura. Mostra o sinal do recém-nascido para ela que, horrorizada, padece até a morte.

Velha Praga
Artigo onde Monteiro Lobato denuncia as queimadas da Serra da Mantiqueira por caboclos nômades, além de descrever e denunciar a vida dos mesmos.

Urupês
A jóia do livro. Aqui, Monteiro Lobato personifica a figura do caboclo, criando o famoso personagem “Jeca Tatu”, apelidado de urupê (uma espécie de fungo parasita). Vive “e vegeta de cócoras”, à base da lei do menor esforço, alimentando-se e curando-se daquilo que a natureza lhe dá, alheio a tudo o que se passa no mundo, menos do ato de votar. Representa a ignorância e o atraso do homem do campo.

Fontes:
http://www.vestibular1.com.br

Capa do livro: http://www.monteirolobato.tur.br

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