Arquivo do mês: março 2010

J.G. de Araujo Jorge (A Poesia Popular)

Somos felizmente um povo inteligente e de grande sensibilidade. Se querem um exemplo da inteligência do povo brasileiro, de sua filosofia, do seu senso de humor, procurem observar as frases que comumente se encontram escritas nos parachoques ou na própria carroceria dos caminhões que trafegam pelas estradas.

São de uma graça e de uma acuidade, às vezes profundas, em sua simplicidade. Sozinhos, viajando durante dias, longe do lar e de seus amores, os motoristas de caminhões são como os marinheiros. Mas a permanente presença da terra, tira-lhes á saudade aquele tom de grande lirismo do homem do mar, realmente desligado de tudo, cercado de silêncios e horizontes. E espouca em seus espíritos a sátira, a alegria boemia dos que fazem a vida de aventuras, em prazeres de cada momento.

Já pensei em comprar um caderninho para anotar as frases que leio nos parachoques dos caminhões. Tenho a convicção de que acabaria por ter um verdadeiro retrato do espírito popular, um verdadeiro “compêndio” dessa filosofia de vida, tão interessante e cheia de sutilezas, do homem da rua.

Uma das trovinhas que compõem o meu “Cantigas de Menino Grande” eu a fiz, aproveitando um pensamento de uma dessas frases que vi num caminhão, quando dirigia meu carro rumo a Friburgo. Dizia o seguinte

“Eu dirijo, Deus conduz”.

Nada mais, simples e profundo. E pensando no que acabara de ler fui arrumando mentalmente os outros versos, já que o pensamento vinha num verso de sete sílabas. No meio da serra a quadrinha estava pronta:

“No meu carro vou tranqüilo
tenha a estrada sombra ou luz,
pois bem sei que ao dirigi-lo:
– eu dirijo, Deus conduz.

Numa crônica que preparei para volumes anteriores desta coleção, afirmei:

“Do mesmo modo que os provérbios e adágios representam o pensamento do povo que se vai cristalizando através do tempo, as trovas, são a sua alma. E os poetas, tocados pela “graça” das trovas, os intérpretes dessa alma.”

O povo fala em versos, sem sentir e, instintivamente, nos seus provérbios e sentenças, procura a rima, que é um elemento oral de enfeite e de memorização mais fácil. Observem os provérbios. este, por exemplo, bem conhecido:

“Água mole em pedra dura
tanto bate até que fura.”
Dois. versos de sete sílabas, rimando.

E este outro:
“Ha sempre um chinelo velho
Pra um pé doente e cansado.”

Glosei, também, numa trova:

O tal ditado é um conselho,
não te mostres desolado…
“Ha sempre um chinelo velho
Pra um pé doente e cansado…”

Nem tal fato é de se estranhar, quando sabemos que as línguas neolatinas esgalharam-se do tronco secular do velho latim, na língua poética, dos trovadores medievais, nas suas cantigas.

Sobre trovas populares e anônimas, escrevi, na crônica citada :

“Uma trova, (ou como a chamam também, uma quadrinha) é tanto mais expressiva quanto maior o grau de fidelidade ou de identidade do poeta com o sentimento popular. Cai então, pode-se dizer, no gosto do povo, que a recolhe, decora e divulga, e sua expansão se faz de modo permanente, extenso e profundo.

Seu processo de popularização é tamanho, que ela acaba desgarrada de quem a criou, filha de ninguém. Ou melhor: lhe arranjam um pai, lhe atribuem uma paternidade, ou várias, o que vem a ser a mesma coisa. É uma trova anônima.

Glória efêmero e paradoxal. No momento mesmo em que a atinge, o trovador a perde. E são quase sempre, as maiores trovas, aquelas que acabam no anonimato, emaranhadas em meio a dúvidas e suposições. Tratando-se de pequenas composições poéticas, facilmente reproduzíveis, acontece com as publicações o mesmo que se dá com a difusão oral. Jornais e revistas de toda a parte, álbuns e cadernos de poesia as divulgam com autores diversos, tornando cada vez mais difícil a identificação, e mais penosa a pesquisa.”

“A Ilíada” e a “Odisséia”, memorizadas durante séculos pelo povo grego, e mandadas escrever por Psístrato, guardaram a glória de Homero, ainda que lendária, intacta. Eram grandes poemas. Mas as pequeninas trovas, estilhaçam qualquer glória, e torna-se impossível identificar através dos tempos, os nomes dos seus verdadeiros autores, quando elas caem “na boca do povo”
* * *

Mas, trovas populares e anônimas, não são apenas as trovas “eruditas” dos grandes poetas, as trovas literárias, que um dia se perdem no rio da grande popularidade, afogando seus autores. São também as trovas rústicas e imperfeitas que nascem da alma do povo, na boca dos cantadores, dos violeiros, dos sanfoneiros, dos poetas populares anônimos que enxameiam pelo interior do Brasil e de Portugal. Verdadeiros filões de ouro de nossa sensibilidade e de nosso espírito.

Na sua obra, farto acervo de folclore e poesia, “Mil quadras brasileiras”, ( “Mil quadras populares brasileiras” (Contribuição ao folclore). Recolhidas e prefaciadas por Carlos Góis. (Catedrático do Ginásio Mineiro, membro da Academia mineira de Letras). F. Briguet & Cia., Editora. Rio de Janeiro. 1916).

Carlos Góis observa:

“É no interior do país, longe do bulício convencional e cerimonioso das grandes cidades, onde mais intensamente floresce a poesia popular.
Quem se internar no sertão do Brasil, verá, na razão direta da distância dos grandes centros populosos, a expandir-se a alma do povo em expressões rítmicas de um cunho espontâneo, subitâneo, flagrante. Só quem como nós já assistiu de viso, aos descantes ao som da viola e do violão, poderá aquilatar do grau de fluência e espontaneidade que jorra da musa popular”.

Ainda recentemente, aqui no Rio, tive a oportunidade de conhecer os irmãos Batista, (Otacílio e Dimas), exímios cantadores e improvisadores do Nordeste (de Campina Grande), e outros violeiros e repentistas, alagoanos e baianos. Durante horas, com seus violões ao peito, lançam-se reciprocamente desafios, e os versos vão brotando em catadupas, com uma espantosa facilidade, ricos de verve e imaginação.

Rodolfo Cavalcanti, que é, na Bahia, o Presidente do Grêmio Brasileiro de Trovadores, é um poeta popular típico do Norte. Homens simples, emotivos, sem quase instrução, com uma poesia fácil e “bem falante”, compõe longos poemas a propósito de tudo. Publica-os em folhetos que ele mesmo vende nas ruas de Salvador. E vive disto, como verdadeiro trovador de seu tempo.

Já se começa a dar valor também a essa manifestação literária do povo brasileiro. Os próprios críticos de gabinete, desligados até agora das raízes de nossa formação literária voltam-se para o estudo e a observação de extraordinário manancial de riquezas. O atual surto de trovadores, verdadeiro movimento ,de incentivo à poesia popular, obriga-os a reconsiderarem suas atitudes puramente intelectuais, e a perceberem o que há de autêntico e real nessa manifestação -de nossa sensibilidade e de nossa cultura.
Não foi sem razão, que defini:

Ó trovador: professor
de poesia popular!
Com suas trovas de amor
o povo aprende a cantar!

Fonte:
J. G. de Araújo Jorge. Cem trovas populares. Coleção Trovadores Brasileiros.

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Márcia Maia (Cristais Poéticos)

CARTA DE NAVEGAÇÃO

romper cadeias e escrever além dos códices
e dos modismos da vanguarda — além do cânone
ultrapassar a concisão do verso mínimo
compor sonetos no rigor de rima e métrica
tentando ingleses portugueses e simétricos
aventurar-se do insensato ao ultra-lúcido
do social ao pornográfico e ao lírico
e ainda ousar o verso livre e — sem metáforas
desembocar meio a haicais belos e herméticos
e retornar a esgrimir o econômico
minimalismo da palavra exposta ao máximo
usufruir a criação de modo ávido
na liberdade de dizer-se o que é legítimo
fiel apenas à poesia em si e à ética

(BARR)OCO

um oco mais oco que o oco
do coco esquecido da água
que escorre do oco do coco
e um oco mais oco que o oco
no corpo do coco destrava

um oco mais oco que o oco
um oco sem corpo e sem coco
um oco mais copo que corpo
repleto do oco mais oco
que o oco do oco — nonada

ÔMEGA

voem os peixes sobre as árvores de enforcados
e no escuro mais profundo do oceano possam
os pássaros finalmente erguer seus ninhos

teça o vento tsunamis de estrelas de napalm
que derramem-se e derretam todo olho toda pele —
salgue o sangue o que era leite o que era rio

e da terra que era terra e que ora nada nenhuma
vida rebente até que em frio faça-se o quente
até que o que era consciência seja caldo elemental

até que um deus qualquer desperte e o ciclo todo recomece

O QUADRO

complacente ela se aquieta e espia
não o toca nada neles diz intimidade

estão ali há séculos imóveis sentados
o silêncio retumbando em cores vívidas

SEQUÊNCIA

toco a teia de ausência nesta tarde
que semelha mais outono
que verão

e o silêncio se me gruda à pele e arde
qual lamento de sem dono
gato ou cão

colhendo fado e infância em cada parte
deste réquiem de abandono
sem perdão

que ora entoo

QUASE UM FREVO-CANÇÃO

era a noite era o pátio era o frevo
era o povo era o passo era a rua

a cerveja esfriava na mesa
e uma a uma as orquestras passavam

se uma história doída findava
(sem sequer revelar-se à tevê
cuja luz bem ali se acendia)
uma nova se já pressentia
(só a lua sabia o porquê)
quando spok edgar jazzeava

e as canções do coral evocavam
do passado o valor e a beleza

nos despiram depois noite e lua
e mais nada direi — não me atrevo
============

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Márcia Maia (1951)

Márcia de Souza Leão Maia nasceu em Recife em 1951. Médica e poeta.

Teve seus poemas primeiramente publicados na Revista Poesia Sempre nº 15, da Fundação Biblioteca Nacional, em novembro de 2001. Apesar de ter começado a publicar recentemente Márcia é uma das poetas recifenses que vem ganhando destaque na cena literária pernambucana e o seu talento vem sendo reconhecido e seus livros premiados em vários concursos de poesia.

Em 2002, Espelhos foi premiado no 3º Concurso Blocos de Poesia; Cotidiana e virtual geometria ganhou o Prêmio Violeta Branca Menescal, concedido pelo Conselho de Cultura de Manaus, em 2007 e em 2008 o livro Onde a Minha Rolleiflex? venceu o Concurso de Poesia Eugênio Coimbra Júnior, promovido pelo Conselho de Cultura da Cidade do Recife.

Ainda nesse ano seu poema quase um réquiem obteve o segundo lugar no Prêmio Off-Flip.

Poeta articulada na intenet edita com regularidade os blogs tábua de marés e mudança de ventos e faz parte do site escritoras suicidas.

Livros:
Espelhos – Livro Rápido/Recife, 2003;
um tolo desejo de azul – Livro Rápido/Recife, 2003;
Olhares/Miradas – coleção Poetas de Orpheu, Livraria e Editora do Maneco, RS, 2004;
em queda livre – Edições Bagaço/Recife, 2005;
cotidiana e virtual geometria – Editora Muiraquitã/ Manaus, 2008.

Participação em coletâneas:
Antologia Poetrix – Editora Scortecci;São Paulo, 2002;
Antologia Escritas – Edição dos autores, 2004;
Poesia do Nascer (organizada por Mário Cordeiro), editada em Lisboa/Portugal, 2005;
Pernambuco, terra da poesia (organizada por Antônio Campos e Cláudia Cordeiro) – IMC/Escrituras, 2005;
Poesia nos Blogs, editada em Portugal – Apenas Livros Ltda, 2006;
Saboreando Palavras – SESC/MG, 2006.
Livro da Tribo – Editora da Tribo, 2004, 2005, 2007, 2008 e 2009.

blogs da poeta
http://tabuademares.blogger.com.br
http://mudancadeventos.blogger.com.br

Fonte:
http://www.interpoetica.com/

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Trova 135 – Pedro Mello (São Paulo)

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31 de março de 2010 · 01:00

II Jogos Florais de Caxias do Sul – 2010 (Classificação Final)

UBT SEÇÃO DE CAXIAS DO SUL E ACADEMIA CAXIENSE DE LETRAS

TROVAS PREMIADAS

ÂMBITO NACIONAL = TEMA “TREM”

VENCEDORES

O trem da vida ao destino
chega no horário marcado:
– Por que não desce o menino
que embarcou tão animado?
Olympio Coutinho – Belo Horizonte/ MG

Na ferrovia do ardor…
a paixão dita o preceito:
sou trem que conduz… o amor,
sobre os trilhos do teu leito!G
Ailto Rodrigues – Nova Friburgo/ RJ

MENÇÃO HONROSA

Prevendo a grande viagem
a qual farei qualquer dia,
reservei uma passagem
para o trem da poesia.
Adilson Galvão – Nova Friburgo/ RJ
O “te esquecer” me conflita
e a razão manda que eu tente
mas…quando a saudade “apita”,
cresce um “trem” dentro da gente!
José Ouverney – Pindamonhangaba/ SP
MENÇÕES ESPECIAIS

Na estação do meu anseio,
nos perdemos de nós dois…
-Não foi o trem que não veio:
fui eu que cheguei depois…!
Pedro Mello – São Paulo/ SP

Lá vai o trem ofegante
montanha acima, e um véu
de fumaça esvoaçante
falseia nimbos no céu!
Francisco José Pessoa – Fortaleza/ CE

ÂMBITO ESTADUAL = TEMA “TRILHO”

VENCEDORES

Penso que assim como os trilhos
levam e trazem o trem,
o pai conduz os seus filhos
pelo caminho do bem.
Clênio Borges/ Porto Alegre -RS

Caminhando pelos trilhos
em noites enluaradas,
as estrelas lançam brilhos,
que salpicam as estradas!
Delcy Canalles/Porto Alegre -RS

MENÇÕES HONROSAS

Quando o percurso é distante
e os trilhos correm sem fim,
é bem nesse exato instante,
que Deus alia-se a mim!
Lisete Johnson/Porto Alegre -RS

Doces lembranças guardadas,
no peito, quem não as tem?
de caminhar de mãos dadas
pó sobre os trilhos do trem.
Neoly de O. Vargas/Sapucaia -RS

MENÇÕES ESPECIAIS

Belos gestos de inocência,
bênçãos de amor despertaram,
e, nos trilhos da existência,
só saudade carregaram…
Olga Maria Dias Ferreira/ Pelotas-RS

Quando um filho perde a trilha
perseguindo falsos brilhos,
toda a vida da família,
geralmente, sai dos trilhos.
Milton Sousa/Porto Alegre-RS

ÂMBITO MUNICIPAL = TEMA “COLHEITA”

VENCEDORES

Enquanto a vida se enfeita
com sorrisos e amizades,
vou preparando a colheita
das lembranças e saudades.
Alice Brandão

Cada semente lançada,
com amor e com cuidado,
traz a colheita sagrada
do sonho mais esperado.
Amália Marie Gerda Bornheim

MENÇÃO HONROSA

No momento da partida
queira Deus, Nosso Senhor,
que a colheita desta vida
seja só frutos do amor.
Lucí Barbijan

A nossa farta colheita
árduo trabalho revela:
uma estrada tão estreita
tornou-se fértil e bela!
Jussára C. Godinho

MENÇÃO ESPECIAL

A colheita da estação,
junto aos vastos parreirais,
traz a marca e o coração
dos mais nobres ancestrais…
Amália Marie Gerda Bornheim

Desde o plantio à colheita
quanto trabalho e beleza!
A família satisfeita
alegra de uva a mesa!
Jussara C. Godinho

———

Fonte:
Colaboração de Giuseppe Stromboli Barbosa

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Tatiana Belinky (O Diabo e o Granjeiro)

Um pobre lavrador precisava construir a casa de sua pequena granja, mas não conseguia realizar esse sonho, pois o que ganhava mal dava para alimentá-lo, junto com sua mulher. Por mais economia que fizesse, não conseguia juntar o necessário para começar a construção.

Um dia, estando a caminhar pelo seu pedaço de chão, mergulhado em tristes pensamentos, deu com um velho esquisito que lhe disse com voz desagradável:

— Pára de preocupar-te, homem. Eu posso resolver o teu problema antes do primeiro canto do galo, amanhã cedo.

— Como assim? — espantou-se o lavrador.

— Tu precisas construir a casa da granja, certo? Pois eu me encarrego de construir e entregar-te essa obra, antes do canto do galo, em troca de uma pequena promessa tua.

— Que promessa? Não tenho nada para te oferecer em troca de tal serviço.

— Não importa: o que quero que me prometas é um bem que tu tens mas ainda não sabes. É topar ou largar.

O pobre granjeiro pensou com seus botões “o que é que eu tenho a perder?” e, sem hesitar
mais, respondeu ao velho que aceitava o trato e fez a promessa.

— Só que quero ver a casa da granja construída, amanhã, antes do canto do galo — observou
ele, ainda meio incrédulo.

E voltou correndo para casa, para comunicar à esposa o bom negócio que acabara de fechar.

A pobre mulher ficou horrorizada:

— Tu és um louco, marido! Acabas de prometer àquele velho, que só pode ser o próprio diabo, o nosso primeiro filho, que vai nascer daqui a alguns meses!

O homem, que não sabia da gravidez, pôs as mãos na cabeça, mas não havia mais nada a fazer: o pacto estava selado.

A mulher, porém, que não estava disposta a aceitá-lo, ficou pensando num jeito de frustrar o plano do diabo.

E naquela noite, sem conseguir dormir, ficou o tempo todo escutando apavorada o barulho que o demônio e seus auxiliares infernais faziam, ao construírem a tal obra, com espantosa rapidez. A noite ia passando, aproximava-se a madrugada.

Mas, pouco antes de o céu clarear, quando faltavam só umas poucas telhas para a conclusão da obra, a atenta mulher do granjeiro pulou da cama e, rápida e ágil, correu até o galinheiro, onde o galo ainda não despertara.

Tomando fôlego, imitou o canto do galo, com tal perfeição que todos os galos da vizinhança, junto com o seu próprio, lhe responderam com um coro sonoro de cocoricós matinais, momentos antes do romper da aurora.

Como um trato com o diabo tem de ser estritamente observado, tanto pela vítima como por ele mesmo, a obra em final de construção teve de ser parada naquele mesmo instante, por quebra de contrato “antes do primeiro canto do galo”.

E o diabo, espumando de raiva por se ver assim ludibriado e espoliado, se mandou de volta para o inferno, junto com seus acólitos, para nunca mais voltar àquele lugar.

Mas a casa da granja permaneceu construída, para alegria do granjeiro, faltando apenas umas poucas telhas que jamais puderam ser colocadas.

Fonte:
O diabo e o granjeiro. In: Revista Nova Escola, BELINKY, Tatiana. São Paulo, n. 84, mar. 1995.

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Tatiana Belinky toma posse na Academia Paulista de Letras

Dia 15 de abril de 2010, às 19,00 horas, no Colégio Dante Alighieri, haverá a solenidade de posse de TATIANA BELINKY, a grande dama da Literatura e da TV e tradutora das obras russas no Brasil, na ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS, com saudação do acadêmico FRANCISCO MARINS.

Tatiana Belinky é uma das escritoras de livros infantis mais conhecidas no Brasil. Curiosamente, ela nasceu na Rússia, em 1919, e veio pequena ao Brasil, com apenas dez anos de idade. Além dos livros infantis, Tatiana ficou famosa por ter sido responsável pela primeira adaptação do “O Sítio do Pica-Pau Amarelo”, de Monteiro Lobato, para a televisão. Já recebeu muitos prêmios pelas suas histórias e trabalhos realizados na televisão e no teatro. Nesta entrevista concedida ao CRE, a escritora reafirma a importância do hábito da leitura para as crianças.

“Capitu que me desculpe, mas a Emília é a maior heroína literária brasileira”. Esta declaração já virou marca registrada de Tatiana Belinky, que acaba de completar 91 anos e também de entrar para a Academia Paulista de Letras. “Nunca imaginei que fossem me indicar, fiquei até um pouco assustada. Mas fui eleita e agora vou à festa da posse. Estou pensando em quem convidar”, diverte-se a escritora com o entusiasmo infantil que nutre desde menina, quando queria ser bruxa para praticar travessuras sem receio. Ruth Rocha, sua amiga e membro da Academia, participou do convite, o que a deixou ainda mais lisonjeada.

Ainda hoje, Tatiana é apaixonada por Monteiro Lobato e o coloca acima de todos os outros escritores que se dedicaram ao universo da criança, inclusive estrangeiros. O amor surgiu logo no primeiro contato, quando se mudou de São Petersburgo, à época parte da União Soviética, para São Paulo com sua família. Ela vinha munida de toda a cultura cultivada em casa – a mãe cantava, o pai escrevia poesia – e de três idiomas na ponta da língua (russo, alemão e letão). Logo aprenderia muito bem o português, e o adotou como a língua oficial de sua escrita.

Outra novidade de Tatiana são seus contos, entre eles “A coruja e a onça”, republicados na coleção Ciranda Cirandinha, da Editora Paulus, que reúne grandes autores da literatura infanto-juvenil. Os volumes vêm engrossar a lista já impressionante de mais de 100 livros publicados, sem contar com as muitas traduções de obras-primas assinadas por ela, como dos contos de Hans Christian Andersen e dos Irmãos Grimm. Tatiana foi responsável, ainda, pela primeira adaptação de “O Sítio do Picapau Amarelo” para a TV, veiculada na década de 1950 pela Tupi. Seu marido, Júlio Gouveia, dirigia os episódios. Ganhou, mais tarde, o Prêmio Jabuti de Personalidade Literária do Ano em 1989. Além disso, ao longo de sua carreira, traduziu muitos compatriotas, entre os quais Gogol, Tchekhov e Tolstoi, mas a criança sempre foi seu público favorito. “Tomei conta do meu irmãozinho, que me ensinou metade de tudo que sei sobre crianças. Desde então, minha preferência é falar com os pequenos, e sei falar com eles”, declara.

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Tatiana Belinky em Xeque

Entrevista concedida a Carlos Moraes, para a Revista da Cultura.

Tem mulher mais brasileira que aquela cujo primeiro texto literário que leu em português foi uma história de Monteiro Lobato no verso de um folheto do Biotônico Fontoura? E cujo primeiro êxtase foi ver um cacho de bananas? Escritora, tradutora, educadora, roteirista pioneira de programas de TV para crianças – e russa. Cada vez que se fala de Tatiana Belinky a toada é sempre a mesma. Mais de 70 anos de Brasil, vários prêmios, mais de cem livros escritos em bom português (entre os mais recentes estão O Cão Fantasma e Histórias de Bulka), jeito brasileiro, maroto, de viver e falar, mas russa, todo mundo acrescenta. Então não tem jeito mesmo, é pela Rússia que vamos começar.

CM: A Rússia é grande. Onde mesmo a senhora nasceu?
Em São Petersburgo, que já foi Petrogrado, virou Leningrado e hoje é São Petersburgo outra vez. Uma cidade que surgiu do nada, como Brasília, com Pedro, o Grande trazendo arquitetos e artistas da Itália, da França. Meu pai estava lá completando seus estudos.

CM: Como foi sua infância?
Minha infância foi em Riga, na Letônia. A cidade é banhada pelo Rio Dángava, por onde os navios não paravam de passar a caminho do Mar Báltico. Da janela do nosso apartamento a gente via três grandes pontes, a dos carros, a dos trens e uma que os alemães construíram durante a guerra. No inverno o rio ficava congelado e pelo seu leito passavam pessoas, trenós puxados a cavalo… Na primavera, grandes blocos de gelo começavam a estourar, a explodir. Um barulho infernal, parecia um bombardeio. Um dia vi uma vaca desesperada em cima de um grande bloco de gelo a caminho do mar. As quatro estações eram dramaticamente bem definidas. Os crepúsculos eram lentos. Fui rever São Petersburgo quando fiz 9 anos. E sabe qual foi meu presente de aniversário? Uma visita ao Museu Hermitage. Nunca vou esquecer. As obras famosas, os grandes corredores, e eu ali, deslumbrada com tanta beleza.

CM: Os livros já faziam parte da sua vida?
Se faziam! Eu tinha uma estante bem provida. Nunca me lembro de mim sem livros. Meu pai lia ou me contava histórias. Aos 4 anos eu já sabia ler, primeiro em russo, depois em alemão. Em Riga, as placas das ruas eram em três línguas. Russo, alemão e letão, a língua da terra. Eu morava na Rua dos Navios.

CM: Por que a decisão de emigrar?
Por vários problemas sociais e políticos. A Letônia sempre foi um ponto de passagem. Volta e meia alguém pisava lá e tomava conta. Chegamos como imigrantes, em 1929. Sem nada. Minha mãe já era dentista formada havia dez anos, veio com seus instrumentos. Eu cheguei com uma correntinha no pescoço e um livro na mão. A correntinha tinha medalha do Moisés, o da Bíblia, que eu achava muito parecido com meu avô. O livro era do Turguêniev, de contos. Que tenho até hoje. Está ali, se desmanchando. Precioso, cheiroso. É o próprio cheiro do passado.

CM: E a chegada ao Brasil, como foi?
O navio aportou no Rio e foi um assombro atrás do outro. Minha primeira estranheza no Brasil foi ver o sol se apagar de repente, como uma lâmpada. As pessoas todas de branco e chapéu de palha. Mas sabe qual foi o meu maior susto? Quando vi lá no porto um cacho de bananas. Em Riga a gente só via banana uma a uma, e uma vez por ano. Meu pai trazia de longe. Ela era repartida entre os três irmãos. E, de repente, lá embaixo, aquele cacho enorme. A gente não sabia nada do Brasil, o máximo que imaginava da América eram os arranha-céus de Nova York. Mas aquele cacho de banana ali solto, imenso, de vários andares… Eu disse: “mãe, acho que estamos em Cocanha, aquele país imaginário onde é tudo fácil e a comida chega do céu…” Mais tarde aprendi que o nome científico da banana é Musa Paradisíaca. Por isso acho que, no Paraíso, não foi maçã coisa nenhuma, foi banana…

CM: Como foi sua transição do russo para o português?
Natural. Criança aprende as coisas naturalmente. Mas não perdi o contato com as minhas outras línguas. Logo que nos estabelecemos na Rua Jaguaribe (SP), onde minha mãe abriu seu consultório, nós nos inscrevemos e passamos a alugar livros em duas bibliotecas circulantes, uma russa e outra alemã. Dona Eva Herz, mãe dos fundadores da Cultura, era dona de uma dessas imprescindíveis bibliotecas.

CM: E sua descoberta de Monteiro Lobato?
O primeiro texto que me caiu nas mãos foi um folheto do Biotônico Fontoura com uma história dele no verso. Era uma história do Jeca Tatuzinho. Eu tinha pouco mais de 10 anos e gostei muito, já lia em português com fluência. Mais tarde, tive um sério problema na biblioteca do Colégio Mackenzie, onde estudava. É que não me deixavam pegar os livros que queria. Só podia ler livros para – meninas! Eu tinha uns 12 anos e fiquei escandalizada. Como uma escola pode ter livros para meninas e livros impróprios? Nem sabia direito o que era impróprio, mas já não gostei. Fui me queixar para meu pai. Minha mãe era feminista e comunista, mas, nesses casos, não intervinha. O poeta e contador de histórias era meu pai. Ele foi, sentou na escrivaninha e, em bom português, escreveu dois bilhetes, um para a diretora e outro para a bibliotecária, nos seguintes termos: “Minha filha Tatiana tem a minha autorização para retirar da biblioteca os livros que ela quiser ler”. Foi um escândalo. Então uma fedelha dessas pode ler qualquer coisa? Mas como o pai era a última instância, passei a ler o que quisesse.

CM: Dizem que até no seu casamento com o psiquiatra e escritor Júlio Gouveia os livros foram importantes.
Nosso casamento foi também um encontro de nossas estantes. Tem uma história engraçada. Éramos namorados, durante o dia ele estudava e eu trabalhava, de forma que a gente se encontrava à noite. Eu morava na Rua Itacolomi e depois do jantar íamos passear ali perto, na Praça Buenos Aires. Uma noite, lá estávamos nós conversando num banco quando de repente chega um guarda e pergunta: “mas vocês são namorados mesmo?” Respondi, irritada: “somos sim, e daí? Não pode?” E ele: “não, tudo bem, é que nunca vi namorado falando tanto, vocês só falam”. E a verdade é que tínhamos sempre muito assunto. Júlio era poeta, lia livros diferentes dos meus e tínhamos muitas convergências, mas também muitas divergências. É claro que a gente não só falava, mas aquela noite calhou de ter muito assunto e as discussões foram ficando muito acesas, para o espanto do guarda.

CM: Como começou, por volta de 1952, o trabalho de vocês no teatro?
Na festa de aniversário de uma menina de 4 anos, filha de amigos. Júlio gostava muito de teatro. Ele chegou e disse: “por que, em vez de uma boneca, a gente não dá de presente um teatrinho para essa menina?”. Ele foi e adaptou um trecho do Peter Pan, reunimos os irmãos, os amigos e, na festa, apresentamos o espetáculo. Foi um sucesso. Um funcionário da Secretaria de Cultura sugeriu que a peça fosse aumentada e apresentada no Teatro Municipal, em benefício de uma escola. Outro sucesso. Naquela época, não existia um teatro para crianças. Durante quase três anos fizemos isso. Foi assim que começou o nosso Teatro Escola de São Paulo, num aniversário de criança.

CM: E a televisão?
Nosso grupo foi ficando conhecido e a TV Tupi nos convidou para apresentar algumas peças. Era um teatro meio cinema. Com três câmeras se aproximando, se afastando… O público adorou e o telefone da emissora não parava de tocar: eram pais pedindo mais programas para criança na TV. Começamos com Fábulas de Esopo, fábulas alemãs, peças curtinhas, de uns dez minutos. O nome era Fábulas Animadas. Depois de algumas semanas, a Tupi nos pediu algo brasileiro. Foi então que entrou a adaptação do Sítio do Picapau Amarelo. O primeiro foi o Júlio quem escreveu. Ele tinha experiência, era diretor do teatro amador do Sesc. No segundo espetáculo ele disse: “agora é com você”. E foi assim que virei roteirista.

CM: O espetáculo, claro, era ao vivo. Como faziam em caso de falhas?
O grupo ensaiava muito, horas e horas, às vezes até tarde da noite. Eu já tinha sacado bem o funcionamento das três câmeras, mais o som, a iluminação. Às vezes a câmara passava de um cenário para o outro. Algum problema, o que era raro, a gente simplesmente trocava de cenário. Foi tudo muito heróico e maluco durante… doze anos! E tudo sem contrato. Não queríamos que ninguém interferisse. Comerciais, só antes e depois do espetáculo. O livro, donde saía a história, era mostrado para o telespectador.

CM: A senhora conheceu Monteiro Lobato?
Uma vez, bem antes da TV e mesmo do teatro, ele nos procurou. Eu já estava casada, tinha dois filhos. Uma noite o telefone toca e uma voz meio áspera lá do outro lado pergunta: “Aí é a casa do Júlio Gouveia?” “É, quem quer falar com ele?” “Aqui é o Monteiro Lobato”. A minha reação: “Ah é? Pois então eu sou o rei Jorge da Inglaterra?” Ele riu, me explicou que era ele mesmo, que havia lido um texto do Júlio sobre sua obra e perguntou se podia nos visitar. Às nove horas tocou a campainha. Júlio abriu a porta e ele foi logo dizendo: “Na sua idade, eu tinha a sua cara”. Engraçado que o meu pai disse a mesma coisa quando conheceu o Júlio. Todos queriam ser bonitos como ele!

CM: Como foi a visita?
Conversamos por umas duas horas. Na hora de fazer o café, telefonei para meu irmão Benjamin, pedi que viesse correndo conhecer Monteiro Lobato em pessoa. Tínhamos todos os seus livros, ele era objeto da nossa suprema admiração. Tanto que Benjamin me respondeu: “Isso é hora de trote?” Depois veio correndo e ficou meio paralisado diante da figura do Lobato. Quando apertou sua mão, como que se esqueceu de retirar. Depois me cochichou: “Nunca mais lavo esta mão”.

CM: Cinema, televisão e, agora, Internet. Que será do livro?
Nada jamais vai substituir o livro. O livro é algo seu, você leva aonde quer, lê, relê, é um amigo mesmo. Nada como ele para estimular a cabeça, a imaginação. Um mesmo livro é quantos leitores ele tiver. Porque cada um deles vai entender do seu jeito. Outro milagre: em cada releitura o livro é diferente para a mesma pessoa. O livro que alguém relê aos 40 anos vai dizer coisas diferentes daquelas da primeira leitura, aos 20… Um bom livro não tem começo nem fim, é infinito.

CM: Como os pais podem estimular a leitura?

Lendo, tendo livros em casa. Criança é curiosa, graças a Deus. Se vê um livro ali, fechado, ela vai abrir. Mas tem de ter o livro. O Ziraldo diz que ler é mais importante que estudar. Porque para a criança o importante não é estudar, é aprender. E ela aprende o tempo todo. Profissão de criança é aprender, mesmo quando está brincando. Especialmente quando lê, está aprendendo.

CM: O que é um livro bom para as crianças?
Minha neta disse uma vez: “Sabe, Tati, livro que não dá pra rir, que não dá pra chorar e não dá pra ter medo não tem graça”. É isso aí.

CM: O que um escritor de livros infantis deve levar em conta?
Senso de humor é importante. E não se preocupar muito com a moral da história. Com esse negócio de isso pode, isso não pode, isso é bonito, isso é feio, isso é de menino, isso é de menina… Desde pequena gosto de fábulas, mas sempre achei que a tal moral da história é um desaforo. A boa história é a que se explica por si mesma. E se a criança quiser entender de uma forma diferente? Mais original, mais bonita, mais dela? A criança sabe tirar suas conclusões. Ética é bom, mas não deve ser imposta. Criança tem muito senso de justiça.

CM: Dentre seus muitos livros, Coral de Bichos, O Grande Rabanete, tem um que se chama Limerique das Coisas Boas. O que vem a ser um limerique?
O limerique é um estilo de verso inspirado numa cidade da Irlanda, Limerick, e desenvolvido pelo poeta Edward Lear. São cinco linhas, três versos rimando, o primeiro, o segundo e o quinto; o terceiro e o quarto, mais curtos, rimam entre si. Isso dá ritmo, é ótimo para fazer algumas brincadeiras. Aprendi na Playboy americana. Claro que o autor lá se valia do limerique de uma forma maliciosa. Mas aí eu pensei: posso brincar com isso de outra maneira. A idéia é ressaltar uma coisa que é o contrário do que penso, e a criança, que não é nada boba, vai entender direitinho. Olha este exemplo aqui:
“Quem pensa que eu sou uma ogra
No seu pensamento malogra.
Língua bifurcada?
Só quando enfezada.
Porque eu sou mesmo é sogra.”

CM: A senhora é escritora de sucesso, foi pioneira na televisão e uma guerreira do livro. Qual é, na sua visão, a grande figura feminina da literatura brasileira?
Capitu e Machado de Assis que me perdoem, mas é a Emília, do Monteiro Lobato, por sua impertinência e sua independência. Ele conta que, quando estava ali, formatando seus textos, a Emília ficava ao seu lado, dando palpites, cobrando. Um dia ele perguntou: “Quem é você, afinal?” Ela respondeu: “Eu sou a independência ou morte

Fonte:
Revista da Cultura – edição 3 – outubro de 2007.

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Trova 134 – Nei Garcez (Curitiba/PR)

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27 de março de 2010 · 22:10

Hilda Persiani (Antigamente era assim…)

Confeitaria Colombo (Rio de Janeiro)
Depois do cochilo costumeiro da tarde,
Diante do espelho, as vaidosas mocinhas,
Davam seu último retoque e com alarde,
Saiam com as amigas . Nunca sozinhas …

Na esperança que na Confeitaria elegante,
Como naquele tempo era de costume,
Encontrassem um belo rapaz galante,
Que ao vê-las belas, sentindo seu perfume,

Entre todas, por uma delas se encantasse
E se aproximando, com o peito a ofegar,
Com a voz embaraçada, lhe dissesse :

Você é a moça que elegi para minha rainha,
Com os seus lindos olhos vivo a sonhar,
Se você quiser, serei seu e você, será minha! …
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O Teatro no Brasil

Teatro Brasileiro de Comédia
O teatro no Brasil surgiu no século XVI, tendo como motivo a propagação da fé religiosa. Dentre uns poucos autores, destacou-se o padre José de Anchieta, que escreveu alguns autos (antiga composição teatral) que visavam a catequização dos indígenas, bem como a integração entre portugueses, índios e espanhóis. Exemplo disso é o Auto de São Lourenço, escrito em tupi-guarani, português e espanhol.

Um hiato de dois séculos separa a atividade teatral jesuítica da continuidade e desenvolvimento do teatro no Brasil. Isso porque, durante os séculos XVII e XVIII, o país esteve envolvido com seu processo de colonização (enquanto colónio de Portugal) e em batalhas de defesa do território colonial. Foi a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, em 1808, que trouxe inegável progresso para o teatro, consolidado pela Independência, em 1822.

O ator João Caetano formou, em 1833, uma companhia brasileira. Seu nome está vinculado a dois acontecimentos fundamentais da história da dramaturgia nacional: a estréia, em 13 de março de 1838, da peça Antônio José ou O Poeta e a Inquisição, de autoria de Gonçalves de Magalhães, a primeira tragédia escrita por um brasileiro e a única de assunto nacional; e, em 4 de outubro de 1838, a estréia da peça O Juiz de Paz na Roça, de autoria de Martins Pena, chamado na época de o “Molière brasileiro”, que abriu o filão da comédia de costumes, o gênero mais característico da tradição cênica brasileira.

Gonçalves de Magalhães, ao voltar da Europa em 1867, introduziu no Brasil a influência romântica, que iria nortear escritores, poetas e dramaturgos. Gonçalves Dias (poeta romântico) é um dos mais representativos autores dessa época, e sua peça Leonor de Mendonça teve altos méritos, sendo até hoje representada. Alguns romancistas, como Machado de Assis, Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar, e poetas como Álvares de Azevedo e Castro Alves, também escreveram peças teatrais no século XIX.

O século XX despontou com um sólido teatro de variedades, mescla do varieté francês e das revistas portuguesas. As companhias estrangeiras continuavam a vir ao Brasil, com suas encenações trágicas e suas óperas bem ao gosto refinado da burguesia. O teatro ainda não recebera as influências dos movimentos modernos que pululavam na Europa desde fins do século anterior.

Os ecos da modernidade chegaram ao teatro brasileiro na obra de Oswald de Andrade, produzida toda na década de 1930, com destaque para O Rei da Vela, só encenada na década de 1960 por José Celso Martinez Corrêa. É a partir da encenação de Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, que nasce o moderno teatro brasileiro, não somente do ponto-de-vista da dramaturgia, mas também da encenação, e em pleno Estado Novo.

Surgiram grupos e companhias estáveis de repertório. Os mais significativos, a partir da década de 1940, foram: Os Comediantes, o TBC, o Teatro Oficina, o Teatro de Arena, o Teatro dos Sete, a Companhia Celi-Autran-Carrero, entre outros.

Quando tudo parecia ir bem com o teatro brasileiro, a ditadura militar veio impor a censura prévia a autores e encenadores, levando o teatro a um retrocesso produtivo, mas não criativo. Prova disso é que nunca houve tantos dramaturgos atuando simultaneamente.

Com o fim do regime militar, no início da década de 1980, o teatro tentou recobrar seus rumos e estabelecer novas diretrizes. Surgiram grupos e movimentos de estímulo a uma nova dramaturgia.

Fonte:
Wikipedia

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Alex Giostri (O Ator e a Palavra)

A distância entre o ator e a palavra é tão mínima que nem se quiséssemos nós conseguiríamos separá-los para uma análise mais profunda. É – das profissões, a que mais requer o bom uso e o pleno conhecimento da própria palavra, de seu significado e significante, assim como também de sua simbologia – valor mágico – e de sua identificação com a massa, que é o público.

Um dos exercícios mais importantes e fundamentais para um ator é estar sempre em contato com a boa leitura, com bons livros, bons autores. É prioridade na vida do ator a intimidade com a palavra. E intimidade no sentido pleno mesmo. O ideal é que o ator estude primeiro a sua língua e a sua cultura para então estudar as técnicas de interpretação, ou então que faça as três coisas ao mesmo tempo, em horários diferentes para aproveitar todas as informações oferecidas.

O conhecimento da palavra multiplica a força do ator. Sua habilidade em conduzir uma frase, em pausar no momento correto, em dar a inflexão exata é fundamental para transformá-las, as palavras, em impressões.
É fundamental que as palavras na boca do ator sejam transformadas em impressões. Os espectadores querem ser impressionados por algo, não importa se por algo bom ou ruim, mas quando se deixam levar por uma obra de ficção, o que querem é serem impressionados. E é do ator essa responsabilidade.

Nota-se, portanto, que as palavras são fundamentais para qualquer relação, seja profissional ou pessoal. Não há comunicação sem a existência da palavra, seja falada, pensada, desenhada, enfim. Todas as emoções são emoções, mas também são palavras. Mesmo o silêncio, o silêncio é ausência, mas também é palavra.

É interessante se observarmos que só podemos oferecer um novo mundo a alguém se nós o tivermos desenhado de modo concreto, para nós mesmos. Não importa se o que oferecemos é invisível à maioria, se o que oferecemos não existe de fato; o fato é que se o que oferecemos para uma platéia está construído de modo concreto; se o que oferecemos é fruto de uma vivência interna muito bem elaborada, com recordações emocionais sólidas, todos, sem exceção, abarcarão em nossas sensações e buscarão – cada um com a sua subjetividade e suas palavras, adentrar na nossa experiência e respirá-la como se estivesse lá, concretamente.
——–

Fonte:
Alex Giostri.
http://www.alexgiostri.com.br/

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Qorpo Santo (Hoje Sou um, e Amanhã Sou Outro)

Personagens
Fernando e Carlos, guardas
Eulália e Tibúrcia, damas do Paço
4 Oficiais
Criado
Soldado da Guarda Imperial

ATO PRIMEIRO

Cena Primeira

O REI – (para o Ministro) Já deste as providências que te recomendei ontem sobre os indigitados para a nova conspiração que contra mim se forja!?

MINISTRO – Não me foi possível, Senhor, pôr em práticas vossas ordens.

O REI – Ludibrias das ordens de teu Rei? Não sabes que te posso punir, com uma demissão, com baixa das honras, e até com a prisão!?

MINISTRO – Se eu referir a V. M. as razões ponderosas que tive para assim proceder, estou certo, e mais que certo que V. M. não hesitará em perdoar-me essa que julga uma grave falta; mas em verdade não passa de ilusão em V. M.

O REI – Ilusão! Quando deixas de cumprir ordens minhas?

MINISTRO – Pois bem, já que V.M. o ignora, eu lhe vou cientificar das cousas, que me obrigaram a assim proceder.

O REI – Pois bem: refere-as; e muito estimarei que me convençam e persuadam de que assim devemos proceder.

MINISTRO – Primeiramente, saiba V . M. de uma grande descoberta no Império do Brasil, e que se tem espalhado por todo o mundo cristão, e mesmo não cristão! Direi mesmo por todos os entes da espécie humana!

O REI (muito admirado) Oh! Dizei; falai! Que descobriram – é erro!?

MINISTRO – É cousa tão simples, quanto verdadeira:

1.ª – Que os nossos corpos não são mais que os invólucros de espíritos, ora de uns, ora de outros; que o que hoje é Rei como V. M. ontem não passava de um criado, ou vassalo meu, mesmo porque senti em meu corpo o vosso espírito, e convenci-me, por esse fato, ser então eu o verdadeiro Rei, e vós o meu Ministro! Pelo procedimento do Povo, e desses a quem V. M. chama conspiradores persuadi-me do que acabo de ponderar a V.M.

2.ª – Que pelas observaç5es filosóficas, este fato é tão verídico, que milhares de vezes vemos uma criança falar como um general; e este como uma criança. Vemos por exemplo um indivíduo colocado no cargo de presidente de uma Província; velho, carregado de serviços; com títulos, dignidades; e mesmo exercendo outros empregos de alta importância ter medo, Senhor: não poder abrir a boca diante de um homem considerado talvez pelo Povo, sem um emprego pessoal, sem mulher, talvez mesmo sem o necessário para todas as suas despesas, finalmente um corpo habitado por uma alma. Que quer dizer isto, Senhor? Que esse sobrecarregado de cargo e dignidades humanas é zero perante este protegido ou bafejado das dignas leis Divinas. Eu, pois, ontem estava tão acima de Vossa Majestade, porque sentia em mim o dever de cumprir uma missão Divina, que me era impossível cumprir ordens humanas. Podeis fazer agora o que quiserdes!

O REI – Estou pasmo – com a revelação que acabo de ouvir. Se isto se verifica, estou perdido!

MINISTRO – Não temais, Senhor… Todo o Povo vos ama, e a Nação vos estima; mas desejo que aprendais a conhecer-vos, e aos outros homens. E o que é o corpo e a alma de um ente qualquer da espécie humana: isto é, que os corpos são verdadeiramente habitaç5es daquelas almas que a Deus apraz fazer habitá-los, e que por isso mesmo todos são iguais perante Deus!

O REI – Mas quem foi no Império do Brasil o autor da descoberta, que tanto ilustra, moraliza e felicita – honrando!?

MINISTRO – Um homem, Senhor, predestinado sem dúvida pelo Onipotente para derramar esta luz divina por todos os habitantes do Globo que habitamos.

O REI – Mas quais os seus princípios, ou os de sua vida?

MINISTRO – É filho de um professor de primeiras letras; seguiu por algum tempo o comércio; estudou depois, e seguiu por alguns anos a profissão de seu Pai, roubadO~lhe pela morte, quando contava apenas de 9 a 10 anos de idade. Durante o tempo do seu magistério, empregou~Se sempre no estudo da História Universal; da Geografia; da Filosofia, da Retórica – e de todas as outras ciências e artes que o podiam ilustrar. Estudou tAMbém um pouco de Francês, e do Inglês; não tendo podido estudar também – Latim, conquanto a isso desse começo, por causa de uma enfermidade que em seus princípios o assaltou. Lia constantemente as melhores produções dos Poetas mais célebres de todos os tempos; dos Oradores mais profundos; dos Filósofos mais sábios e dos Retóricos mais brilhantes ou distintos pela escolha de suas belezas, de suas figuras oratórias! Foi esta a sua vida até a idade de trinta anos.

O REI – E nessa idade o que aconteceu? Pelo que dizes reconheço que não é um homem vulgar.

MINISTRO – Nessa idade, informam-me… isto é, deixou o exercício do Magistério para começar a produzir de todos os modos; e a profetizar!

O REI – Então também foi ou é profeta!?

MINISTRO – Sim, Senhor. Tudo quanto disse que havia acontecer, tem acontecido; e se espera que acontecerá!

O REI – Como se chama esse homem!?

MINISTRO – Ainda não vos disse, Senhor, – que esse homem viveu em um retiro por espaço de um ano ou mais, onde produziu numerosos trabalhos sobre todas as ciências, compondo uma obra de mais de 400 páginas em quarto, a que denomina E… ou E… de. .. E aí acrescentam que tomou o titulo de Dr. C… s…. – por não poder usar o nome de que usava – Q… L…, ou J… J… de Q. .. L…, ao interpretar diversos tópicos do Novo Testamento de N. s. Jesus Cristo, que até aos próprios Padres ou sacerdotes pareciam contraditórios!

O REI – Estou espantado de tão importante revelação!

MINISTRO – Ainda não é tudo, Senhor: Esse homem era durante esse tempo de jejum, estudo, e oração – alimentado pelos Reis do Universo, com exceção dos de palha! A sua cabeça era como um centro, donde saíam pensamentos, que voavam às dos Reis de que se alimentava, e destes recebia outros. Era como o coração do mundo, espalhando sangue por todas as suas veias, e assim alimentando-o e fortificando-o, e refluindo quando necessário a seu centro! Assim como acontece a respeito do coração humano, e do corpo em que se acha. Assim é que tem podido levar a todo o mundo habitado sem auxílio de tipo – tudo quanto há querido!

O REI – Cada vez fico mais espantado com o que ouço de teus lábios!

MINISTRO – É verdade quanto vos refiro! Não vos minto! E ainda não é tudo: esse homem tem composto, e continua a compor, numerosas obras: Tragédias; Comédias; poesias sobre todo e qualquer assunto; finalmente, bem se pode dizer – que é um desses raros talentos que só se admiram de séculos em séculos!

O REI – Poderíamos obter um retrato desse ente a meu ver tão grande ou maior que o próprio Jesus Cristo!?

MINISTRO – Eu não possuo algum; mas pode se encomendar ao nosso Cônsul na cidade de Porto Alegre, capital da Província de São Pedro do Sul, em que tem habitado, e creio que ainda vive.

O REI – Pois serás já quem fará essa encomenda!

MINISTRO – Aqui mesmo na presença de V . M. o farei. (Chega-se a uma mesa, pega em uma pena e papel, e escreve:)

“Sr. Cônsul de…

De ordem de Nosso Monarca, tenho a determinar a V. Sa. que no primeiro correio envie a esta Corte um retrato do Dr. Q… S…, do maior tamanho, e mais perfeito que houver.

Sendo indiferente o preço.

O Primeiro Ministro
DOUTOR SÁ E BRITO”

Corte de…, maio 9 de 1866.

(Fechou, depois de haver lido em voz alta; chama um criado; e manda por no correio – para seguir com toda a brevidade, recomendando.)

ATO SEGUNDO
A RAINHA E SUAS DAMAS – (entrando) Não é esta, Senhor (para o Rei) a primeira vez que sabendo haverdes querido encadear ou condenar à morte homens a quem julgo inocentes, venho perante vós impetrar o seu perdão! Chegou ao meu conhecimento que desconfiastes da fidelidade de vossos maiores e mais sábios Amigos, Henrique e Gil Gonzaga! É por estes sábios vassalos, e que tantas vezes têm ocupado os mais importantes cargos do Estado, que vos venho pedir; é a liberdade, ou não perseguição de suas pessoas que desejo!

O REI – Bem conheço, Senhora, o interesse que tomais em tudo quanto diz respeito à minha, à vossa e à felicidade do Estado que por herança ou Vontade Divina – governo: ora com sábios conselhos; ora com vossas felizes lembranças; ora com as mais justas – vossas reflexões! Estais portanto servida, Senhora, em vosso pedido; mesmo que o não fizésseis, a conversação que acabo de ter com um dos nossas mais distintos políticos, e atualmente na primeira pasta do Governo, seria bastante para perdoar a esses, de quem tive denúncia de que conspiram contra o nosso Governo!

A RAINHA – Quanto me apraz, Senhor, ouvir de vossos lábios, doces e salutares palavras! Estou tranqüila, e volto feliz aos trabalhos em que sempre me costumo ocupar! (Para o Ministro:) Senhor Ministro, continuai com vossos sábios conselhos a ilustrar vosso Grande Rei, e contai sempre com a proteção de vossa assaz afetuosa Rainha! (Sai com as Damas.)

OS GUARDAS – (entrando) Senhor! Senhor! (Fatigados e cheios de temor) Aproximam-se de nossas praias alguns vasos de guerra com bandeira de uma Nação com que estamos em guerra! Houveram alguns tiros entre os de guerra Nacionais e esses que se aproximam de nossa barra: é portanto mister pôr tudo em armas para repelir a audaz invasão!

O REI – (para o Ministro) É preciso darem-se as mais terminantes ordens a fim de que não sofra a cidade o menor mal! Escrevei já as seguintes ordens para o General comandante da Guarnição: (o Ministro senta-se e escreve) De ordem de s. M. nosso Rei, determino a V. Exa. que imediatamente ponha em armas, e pronta para repelir qualquer tentativa estrangeira, toda a tropa que faz a guarnição desta cidade! Mande tocar tambores pelas ruas para que se reúna não só toda a Guarda Nacional ativa, como também a reserva, dividida toda a tropa em colunas por todo o litoral da cidade, principalmente por suas praias mais vulneráveis, ou despidas de Fortalezas! (O Rei entrega o ofício a um, sai acompanhado de Guardas e volta imediatamente.)

O MINISTRO – (para outro) Parte imediatamente (depois de haver feito outro ofÍcio), leva este à Fortaleza da Laje; dizei ao respectivo Comandante que igual resolução comuniquei a todos os outros comandantes! (Sai o Guarda. [O Ministro] para o Rei:) Peço licença a Vossa Majestade para ir em pessoa dar as mais providências que em tão melindrosas circunstâncias são necessárias.

O REI – Vai, e não te demores a vir dar-me parte do que ocorre; pois se for necessário, quero ir eu mesmo em pessoa, com a minha presença, animar as tropas; exortar o Povo; e fazer, como me cumpre, quanto em mim cabe em proveito dele, e da Nação! (O Ministro parte.)

O REI – (passeando) Por mais saber que se tenha; por mais previdente que seja um monarca; por mais benefícios que derrame sobre seus Povos, e mesmo sobre os estrangeiros, com sua ciência, e com seu exemplo; sempre lhe sobrevém males inevitáveis, que o dever, e a honra, e a dignidade obrigam a repelir! E às vEzes com que dureza ele é obrigado a fazê-lo! Com que doR em seu coração Ele prevê os numerosos cadáveres juncando os campos da batalha! Céus! eu estremeço, quando vejo diante de meus olhos o horrível espetáculo de um açougue de homens! E se fossem só estes os que perecem; mas quantas famílias desoladas! Quantas viúvas sem marido! Quantas filhas sem Pai; quanta orfandade!… Quanto pesa o Cetro na destra daquele que o empunha com os mais inocentes desejos; com as mais sãs intenções! (Tomando um aspecto resoluto.) Tudo isto é verdade; mas quando a Pátria periga! Quando o inimigo audaz se atreve a insultá-la; quando pode tudo gemer, se o Rei fraquear; não deve ele reflexionar sobre as conseqüências; tem uma única resolução a tomar: Ligar-se ao Povo, ao Estado ou à Nação; identificar-se com eles, como se fora um só Ente, e debelar aquele, – sem poupança de forças, dinheiro, e tudo o mais que possa concorrer para o mais completo, e glorioso triunfo! Vamos pois em pessoa dar todas as ordens, dispor tudo, e expor se for necessário este peito às balas; este coração ao ferro insultante! Guarda! prepara-me um dos melhores cavalos em que eu cinja esta espada.

O GUARDA – Pronto, Senhor. (Sai.)

O REI – (veste a sua farda de General, depois de haver despido a capa com que se achava, e parte apressadamente. Ao sair, ouve um tiro de peça; desembainha a espada, dizendo:) São eles! (e segue.)

A RAINHA – (acompanhada das Damas) Não sei que mau influxo, destino, ou planeta, acompanha, guia, e muitas vezes transtorna as mais sábias administrações do Estado! Por quão pouco tempo gozam estes daquela paz que os tranqüiliza e felicita! Daquele progresso que a todos eleva; que a todos anima; que a todos enche de bens, e de venturas! Havia ainda tão pouco tempo que a Providência divina nos havia dado o triunfo contra os inimigos internos que pretendiam debelar-nos; e quando acaba de tranqüilizar os nossos corações, envia-nos talvez a mais cruel guerra estrangeira! Enfim, como não há mal algum, que não traga algum bem, devemos contar e esperar que este, como todos os outros, nos felicitará. (Ouvem-se numerosos tiros de peça e de fuzilaria. A Rainha, para as Damas:) Enquanto, Damas, os nossos canhões marítimos destroem os nossos inimigos, vamos desta janela animar as nossas tropas de terra com nossa presença, a fim de que se houver algum desembarque, eles conheçam que seríamos capazes de os acompanhar com uma arma em punho! (Aproximam-se de uma janela.)

UMA DAS DAMAS – V . M. vê? Lá se incendia um vaso inimigo! Lá caiu um mastro de uma galera!

A OUTRA – Ih!… Como a metralha varreu o convés daquela nau! Se continua assim, deste instante a duas horas, está o combate terminado, triunfando as nossas armas!

A RAINHA – Vocês vêem as tropas que estão desembarcando lá naquela ponta de península Anglicana?

AS DAMAS – Vemos; vemos! Que bicharia! Parecem corvos, ou nuvens de outros bichos! E quem sabe se as nossas ainda não viram esse desembarque!? Seria bom avisá-las! É lugar algum tanto escondido. Convém mandar saber!

A RAINHA – Dá cá o meu apito!

O CRIADO – (dando uma espécie de trombetinha) Eis, Senhora.

A RAINHA – (apita; um soldado da guarda imperial ou real responde com um toque de cometa; ela torna a apitar; ele fala.) Corre; voa onde está o Rei, e dize-Lhe que desembarcaram tropas inimigas na península! (O Guarda parte a todo o galope. A Rainha, olhando por um Óculo, e muito atentamente:) Ainda agora é que reparo! A fumaça não Me deixava ver bem! Os nossos vasos (dois) partem cheios de tropas para o lugar do desembarque! Numerosas lanchas os acompanham; daqui por cinco minutos, deve estar toda a tropa inimiga debelada! Embalde os traidores procuraram uma posição tão importante para destruir-nos… Serão destruÍdos e completamente aniquilados! Como saltam cabeças, pernas braços pelos ares! Que carnificina horrível se observa!? Como se matam; como se destroem entes humanos!

UMA DAS DAMAS – V. M. vê? Lá vem o Rei a galope! Seu cavalo vem banhado de suor; seu rosto é carmesim! Sua espada, ainda desembainhada, vem tinta de sangue! Céus! quão grande deve ser o triunfo conquistado hoje por nossas felizes armas!

O REI – (entrando banhado em sangue e suores; para a Rainha) Senhora, mandai-me vir outro fardamento limpo para mudar.

RAINHA – Entremos nesta câmara. (Entram, e passados alguns minutos, ele se apresenta com nova farda, calças, etc.) Adeus! Volto ao combate; e juro-vos que antes de pôr-se o sol, não ficará um soldado inimigo em território nosso. (Parte.)

A RAINHA – Deus abençoe os nossos projetos; e proteja os nossos esforços! (Acompanha-o até à porta; voltam à cena [a Rainha e as Damas)).

UMA DAS DAMAS – São horas, minha Senhora e Rainha, de tOmar os alimentos de costume com que reparais as forças que gastais em minha, e em utilidade de todos os vossos criados.

A OUTRA – Sim; até se não fora hoje um dia tão extraordinário, por certo teríamos faltado a um dos nossos mais importantes deveres. Pois o relógio marcou já uma hora da tarde; e o que agora oferecemos, devia ter sido apresentado a V. M. ao meio dia!

A RAINHA – Eu não trato, nem tenho disposição, ainda, disso; vamos. (Saem.)

ATO TERCEIRO
O REI – (distribuindo prêmios aos numerosos guerreiros que o auxiliaram no triunfo dos combates; conversando ora com um, ora com outro) Eis, Senhores, a recompensa daqueles, que sabem cumprir bem seus deveres, defendendo os interesses da Pátria, e com eles suas próprias fortunas. Estes recebem o saboroso prêmio de suas fadigas; a recompensa de seus trabalhos. Assim como os usurpadores recebem a morte, e tudo o mais que os pode inutilizar e destruir, quando tentam roubar, matar, ou de qualquer outro modo apossar-se, e fruir os bens que só a outrem pertencem, que só a outrem é permitido gozar! (Pegando uma medalha, e pendurando ao peito de um oficial-general:) Eis como revelarei ao Mundo a tua coragem e valentia. (Pondo outra em outro:) Eis com que despertarei no espírito de vossos concidadãos, a lembrança de milhares de cadáveres, com que a meu lado fizestes juncar o campo da batalha. (Pondo em outro:) Eis a prova mais evidente de meu amor por aqueles que me auxiliam no mais importante cargo que se pode exercer sobre a Terra o de governar os Povos, bem como do reconhecimento de vossos raros merecimentos! (Para outro:) É quanto basta para que o Mundo vos olhe com respeito; vossos Irmãos de armas com prazer, se não com emulação. (Pegando em umas caixinhas:) As gratificações que dentro encontrardes (dando a um dos oficiais) deveis cada um de vós entregar aos oficiais superiores e subalternos, que debaixo do meu e do vosso comando praticaram atos da maior bravura e valor. Para os soldados, outras distinções serão feitas, que atestam por toda a sua vida seus meritórios serviços; a recompensa da Pátria; e o afeto e gratidão do Rei! Transmiti-lhe entretanto este apertado abraço que a todos vós dou. (Abraça os quatro oficiais.)

ELES – (beijando a mão) Gratos e reconhecidos aos altos, nobres e elevados sentimentos de Vossa Majestade, protestamos perante Vós, Deus e as Leis, (arrancando um pouco as espadas) desembainharmos… (arrancando todas) estas espadas e com elas – defender-vos e a Nossa mais que todas virtuosa Rainha, fazendo cair cadáveres quantos se lhe opuserem; ou cairmos por terra banhados em nosso próprio sangue. (Fazem profunda reverência, e saem.)

A RAINHA – (e um pouco depois as Damas, entrando apressadamente e atirando-se nos braços do Rei) Meu querido esposo, quanto me fizeste pensar sobre a tua existência, sobre o teu futuro! Sobre a paz e felicidade do nosso Reino! (Desprendendo-se mui devagar de seus braços:) Sim, caro amigo! Quando milhares de feras tentavam lançar-nos talvez fora de nossos territórios deles se apossarem, destruir nossos bens, aniquilar nossa Pátria e fazerem destarte a desgraça geral não era para menos que para sentir-se o maior receio por tantos males de que nos achávamos ameaçados. Felizmente houve um triunfo completo. Os mares repletos de cabeças, de corpos que boiavam dos nossos inimigos, como se uma peste houvesse destruído a vida de milhares de peixes, como algumas vezes havemos observado. Na península em que tentaram um desembarque, eram tantos que bem se podia dizer que era um matadouro público de carneiros para alimentar uma grande cidade. Felizmente, viveremos, continuaremos a viver tranqüilos e felizes!

O REI – É tudo isso verdade minha muito querida esposa. Agora. porém, só nos cumpre continuar a velar sobre quanto diz respeito aos interesses públicos d’outra ordem. Eu continuarei a pensar; a meditar; a estudar; a cogitar quanto possa fazer a felicidade dos homens. Tu que és mulher, de igual modo procederás a respeito das de teu sexo. Combinaremos depois, e todos os dias por duas horas pelo menos de cada um, sobre tais assuntos; o que for julgado melhor, isso se porá em prática.

A RAINHA – Com muito prazer vos acompanharei em vosso modo de pensar e futura disposição. São horas de descanso, não quereis acompanhar-me?

O REI – Tenho ainda alguma cousa a fazer nesta sala. Não estou bem certo do que é; porém sei que me falta não sei o quê.

A RAINHA – Vede o que é; e se eu vos posso auxiliar.

O REI – Não me recordo; iremos portanto dar um passeio ao jardim, e depois se me lembrar voltarei. Ah! agora me lembro: é o rascunho da participação que cumpre fazer a todos os governadores que nos auxiliam em nosso importante Governo. (Senta-se; pega a pena, e escreve:) “Meus muito amados súditos e Governadores das diversas Províncias do meu importante Reino! Participo-vos, e sabei que quase inesperadamente fui surpreendido por numerosos traidores, ladrões e assassinos, mas que em um dia, hoje cercado dos meus generais e dos mais valentes, denodados soldados, obtive o mais completo triunfo sobre eles. É sempre a Providência Divina que auxilia nossas Armas e que, se por alguns momentos, como para experimentar a nossa crença, nos envia alguns flagelos, estes desaparecem logo, como as sombras da noite aos raios da loura Aurora. Publicai este fato glorioso de nossos concidadãos; de nossa fé; de nossa religião;. de nossa moral; e de nossa valentia. E conservai-vos, como sempre, no desempenho tão honroso, quão importante do Governo que vos conferiu O vosso Rei Q… s, – m. – Palácio das Mercês, Abril 9 de 1866.”

O REI E A RAINHA – (para o publico) Sempre a Lei, a Razão e a Justiça triunfam da perfídia, da traição e da maldade!

Desce o pano, e termina o 3.º ato, e com ele a comédia.

Produzido em 15 de Maio de 1866, por José Joaquim de Campos Leão Qorpo-Santo, no beco do Rosário, em Porto Alegre, sobrado por cima do número 21.

Fonte:
www.biblio.com.br

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Antonio Brás Constante (Cenas de um teatro em papel: Homenagem ao dia mundial do teatro)

Teatro del Principe (Espanha)
O pano sobe soberbo, parindo de suas entranhas um novo jogo de cenas. O mistério aos poucos vai sendo desvendado, drama profundo, tema engraçado. Mentes envolvidas pelas histórias ali oferecidas;

O ator é ser pulsante de muitos nomes, de várias vidas. Criatura de sonhos delirantes. Dono da arte ali estabelecida. Figura feita de textos, costurados no tecido da fantasia. Ente fictício e forjado na emoção, que revive no tempo de uma apresentação;

Cada ato é uma mentira consciente que toca os sentimentos do público de forma displicente. A imaginação transborda empurrada pela ilusão. A realidade lá fora não mais existe, pois agora tudo é doce utopia;

E segue a viagem imóvel em busca de distração, onde a encenação é placebo que se toma como verdade, feita de palavras, sons, gestos mudos. Belos mundos;

O palco é caixa profunda e rasa, tela sem vidro, janela sem paredes, caminho sem estrada. E uma energia vital e sem tomada, vai dançando dentro de si. Vazio transformado em espetáculo, pois da simbiose entre ator e palco um novo show nasce em esplendor teatral;

Enfim, mas não menos importante por ser fundamental, encontra-se a platéia ali presente. Mar murmurante em ondas de aplausos, impulsionados pelos movimentos apaixonantes dos gestos feitos na boca de cena sobre um tablado. Baixa o véu, termina o enredo, que agora repousa em segredo nas lembranças do espectador. Para encerrar esta obra textual, lhes digo um último fato: A arte quando chamada pelo nome é conhecida como TEATRO.

Fonte:
Colaboração do autor.

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Carlos Leite Ribeiro (O Teatro)

Ninguém sabe ao certo como e quando surgiu o teatro. Provavelmente nasceu junto com a curiosidade do homem, que desde o tempo das cavernas já devia imaginar como seria ser um pássaro, ou outro bicho qualquer. De tanto observar, ele acabou conseguindo imitar esses bichos, para se aproximar deles sem ser visto numa caçada, por exemplo.

Depois, o homem primitivo deve ter encenado toda essa caçada para seus companheiros das cavernas só para contar a eles como foi, já que não existia ainda linguagem como a gente conhece hoje. Isso tudo era teatro, mas ainda não era um espetáculo.

Egito Antigo, Índia, China, Creta e a própria Grécia possuíam um teatro, antes mesmo do então chamado teatro grego. Tinha como característica principal sua estruturação toda baseada na religião, podemos, portanto, apontar o teatro apenas litúrgico. Este mesmo aspecto é o que de fato diferencia os egípcios, hindu, chinês, cretense e o teatro apenas litúrgico grego do teatro grego.

No século VI a.C., a mistificação na Grécia em relação aos seus deuses e crenças extrapolava o campo religioso e passava a fazer parte da rotina das pessoas. Essa religião politeísta dava um panorama ao homem grego de todas as ocorrências inexplicáveis do mundo sem a ajuda da ainda arcaica ciência ocidental. Os deuses eram os benfeitores ou malfeitores da Terra e possuíam um poder sobre o homem, sobre o céu e sobre a terra. Assim surgiram lendas que, divulgadas por mecanismo de oralidade primária, ou seja, oralmente, de pai para filho, procuravam instruir toda a civilização para que essa atuasse em detrimento da subjectividade daquela sociedade e do bem em comum, seguindo regras de comportamento e um padrão paradigmático que não podia jamais ser quebrado.

Só para ter uma ideia da grandeza dessa credulidade, quando o Colosso de Rodes foi parcialmente destruído por um terremoto, em 248 a.C., o rei egípcio Ptolomeu se propôs a reconstruir a enorme estátua (que homenageava o Deus Apolo, o Deus do Sol), sofrendo porém a recusa da população de Rodes, que ao consultar um dos oráculos (que segundo os gregos, eram homens que representavam os deuses na Terra) foi desmotivada a permitir a reconstrução, pois, segundo o oráculo, o terremoto havia sido um recado do Deus que não tinha gostado da homenagem. Assim, o Colosso de Rodes, até hoje reconhecido como uma das sete maravilhas do mundo, ficou aos pedaços, sendo completamente destruído pelos árabes, na invasão em 654 d.C.

Como a vida dos deuses estava diretamente relacionada à vida dos homens na Grécia antiga, a ciência e a arte tenderam a seguir esse mesmo percurso, de forma que os deuses influenciavam até mesmo as guerras dos homens, como a Guerra de Tróia, que foi narrada pelos gregos com um misto de fábula e realidade, com um laço muito tênue entre a mitologia e o acontecimento real, de forma que os historiadores nunca souberam muito bem o que realmente aconteceu durante essa famosa guerra entre gregos e troianos. A arte por si própria não deixa de ser mítica, ou até mesmo mística, pois é elevada pelo homem como elemento fundamental para a relação humana, em seu sentido mais amplo, no tocante às emoções, ao sentimento humano, ao caráter, à personalidade, cultura e expressão do homem social. A ciência é a busca do bem comunitário, das inovações, da quebra incessante de barreiras que impedem o crescimento humano. A ciência e a arte tornam-se elementos biunívocos, ou seja, ligados entre si, pois o homem possui a vontade de exteriorizar todas as suas curiosidades, a fim de desenvolver métodos para criar, construir, transformar, unir, pesquisar, compreender e finalmente explicar.

A cultura na Grécia antiga era restrita à louvação dos deuses, em festas e cultos religiosos, de forma que, as pessoas reuniam-se para aclamar aos deuses, agradecê-los ou fazer oferendas. As festas em respeito a Dionisio, o Deus da Alegria e do Vinho, realizava-se sob rígida fiscalização do legislador, que não permitia sacrilégios e manifestações cuja retórica fosse avessa à concepção religiosa da sociedade. Porém, para entreter a massa, Sólon, o legislador da época (Séc. VI a.C.) permitiu em certa ocasião que um homem, que possuía um talento especial para imitar os outros, fizesse uma apresentação para o público. Eis que esse homem, a quem chamavam de Tespis, subiu em uma carroça diante do público afoito por novidades, colocou uma máscara, vestiu uma túnica e, impondo-se dramaticamente, expressou: “eu sou Dionísio, o Deus da Alegria”. A forma como o homem postou-se diante de todos, como um Deus, causou revolta e medo em alguns, porém muitos viram essa postura como um louvor ao Deus do Vinho. Sólon impediu a apresentação, mas o público queria mais, pois era fascinante e surpreendente a forma como aquele homem demonstrava seu talento. Durante um bom tempo foi proibido esse tipo de apresentação, julgada como um grande sacrilégio, de forma que a proibição perdurou até o começo da era mais brilhante da Grécia: a era democrática. Sem restrições e maior opressão ao livre arbítrio da sociedade (salvo mulheres e escravos), as pessoas tomaram gosto por essa arte tão criativa de se imitar, de forma que, com a democracia, os governantes começaram a incentivar aqueles que, por ventura se interessavam em entreter o público nas festas que homenageavam os deuses, realizando competições e distribuindo prémios diversos para aqueles que imitassem melhor pessoas e deuses.

No começo, a arte dramática restringiu-se apenas às festas dionisíacas, passando a ocupar um espaço maior na cultura grega com o passar dos anos, tornando-se mais acessível e mais aceita pelos gregos, que começaram a elaborar no Séc. V a.C. melhores formas de entretenimento pelo viés da arte cênica. Assim, constituíram fábulas e histórias diversas a serem encenadas para o público. Essa forma inovadora de se passar mensagens através de histórias dramáticas ficou conhecida como Tragédia Grega, onde os atores utilizavam máscaras e túnicas para interpretar seus personagens. A tragédia se passava em uma ampla plataforma chamada proskénion, situada na costa sudeste de Acrópole, local sagrado de Dioniso, no théatron (“local onde se vê”), cuja plateia era reservada para os espectadores. As apresentações cênicas eram compostas por um coro que narrava e tecia comentários a respeito da história principal que era interpretada pelos actores principais.

As Tragédias foram escritas por homens que marcaram seus nomes na história da humanidade. Os mais conhecidos são Eurípedes (485 – 406 a.C., autor de “Alceste” e “Ifigênia em Tauride”), Ésquilo (525 – 456 a.C., autor de “Os Persas”), Sófocles (496? – 406? a.C., autor de “Édipo Rei”, “Antígona” e “Electra”) e Aristófanes (autor de “As Nuvens”, “Plutão” e “As Rãs”). Esses autores buscavam passar para o público a visão divina da natureza, expressavam a imagem dos deuses e as crenças do povo.

O respeito pelo théatron começava a fazer um efeito que perdura até hoje: a arte cénica tornou-se uma forma de ritual, onde quem encenava no proskénion pretendia passar uma informação de grande necessidade para a sociedade, com um trabalho corporal, com voz e interpretação, submetendo-se à catarse, cuja explicação advém de Aristóteles (384 – 322 a.C.), o primeiro filósofo que proferiu teses sobre a arte dramática. Segundo Aristóteles, a catarse faz com que as emoções do intérprete sejam liberadas numa construção fictícia. Aristóteles constituiu a primeira estética da arte dramática, cujo nome era bem apropriado: “Poética”. As Tragédias seguiam causando furor, em espetáculos longos, com poesias e grandes textos que pretendiam mostrar um enredo. Para maior receptividade do público, que demandava de tramas bem articuladas e enredos intrigantes, os gregos criaram dois elementos até hoje reconhecidos: o protagonista (o herói) e o antagonista (o vilão), de forma que as tragédias falavam a respeito da realidade e da mitologia, versando contextos de conhecimento de todos. Os temas eram atribuídos a grandes heróis, aos deuses, sob argumento fundamental de expor uma ética, uma lição de vida e a moralidade

Fonte:
Colaboração de Carlos Leite Ribeiro

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Artur de Azevedo (Elefantes e Ursos)

Era uma delícia ouvir o coronel Ferraz contar as suas façanhas de caça; mas ele só vibrava, e só era verdadeiramente genial a inventar carapetões quando tinha um bom auditório, quando via em volta de si olhos espantados e bocas abertas.

Dizem que na intimidade, conversando com um amigo, ou mesmo dois, era incapaz de pregar uma peta.

Ora, uma ocasião estava ele no meio de um grupo de vinte pessoas, em que estavam representados ambos os sexos e todas as idades.

As palavras do coronel, proferidas com aquela voz reboante e áspera, feita para comandar exércitos, eram avidamente bebidas. Apenas um rapaz do grupo, o Miranda, o maior estróina que Deus pusera no mundo, tinha na fisionomia um ar de mofa e parecia não tomar a sério as proezas cinegéticas do nosso herói.

Mas isso não foi nada – dizia este retorcendo as pontas dos seus enormes bigodes grisalhos. – Isso não foi nada à vista do que me aconteceu numa aldeia do Ganges, aonde me levou a minha vida aventurosa. Um casal de elefantes corria atrás de um moço que lhes maltratara o filho, um elefantinho deste tamanho (e o coronel indicou o tamanho de um elefantão). O macho ia atingir o moço com a tromba, quando o abati com um tiro da minha espingarda, que nunca falhou. Mas restava a fêmea… A arma estroa descarregada, mas eu, carioca da gema, lembrei-me do nosso jogo de capoeira, e passei-lhe uma rasteira tão na regra, que a prostrei por terra! Antes que se erguesse aquela pesada massa, tive tempo de carregar a espingarda e mandá-la passear no outro mundo. O moço estava salvo.

Houve no auditório um murmúrio de admiração. O coronel continuou:

– O moço, mal o sabia eu, era um príncipe, filho de um rajá, ou coisa que o valha, muito estimado na localidade: por isso, ergueram sobre o corpo do elefante macho uma espécie de trono em que me colocaram, deram-me a beber um licor sagrado, investiram-me não sei de que dignidade oficial, e fizeram-me assistir a umas danças intermináveis. Foi uma festa a que concorreram mais de vinte mil pessoas.

Passado o frêmito do auditório, o Miranda tomou a palavra:

– O coronel foi mais feliz no Ganges do que eu em Ceilão.

– Você já esteve em Ceilão? – perguntou o coronel.

– Ora! Onde não tenho estado? Um dia, estando a caçar – sim, porque também sou caçador! – saiu-me pela frente um enorme urso, que avançou para mim. Quis levar a mão à espingarda, mas tremia tanto, que não consegui pegá-la. E o urso a avançar! Nisto, senti um bafo no meu cachaço. Olhei para trás: era outro urso, de goela aberta e dentes arreganhados!

– E que fez você? – perguntou o coronel, interessado deveras.

– Não fiz nada – respondeu o Miranda. – Fui comido!

Fonte:
http://www.biblio.com.br/

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Neida Rocha (Mundo (i)mundo)

Caos!
Negação da ordem.
Mundo imundo,
desordenado,
sem sentido.
Organizo meu mundo
e tiro o caos emocional.
Recrio o mundo
e harmonizo os sentimentos.
Faço do adjetivo o subjetivo.
Imundo > MUNDO.
Sou meu próprio sujeito.
Sou livre para Amar.
Recrio meu próprio mundo.
==================

Fonte
Colaboração da poetisa

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Iara Melo (Caminhos)

Quantos caminhos percorremos
Quantos caminhos tropeçamos
Quantos caminhos almejamos
Quantos caminhos sofreamos,
Quantos percalços
encontramos…

Quantos viajantes expulsamos
Quantas almas alentamos
Quantos beijos doamos
Abraços que não nos aquecem
Palavras ao vento jogamos…

Ah, alma cansada
Não desalentes a falha
Dos que ignoram o amor
Luta é a tua máxima
Vês diamante em pedra bruta
Fabricas pedras de amor
Não virarás as costas aos percalços
Encontrados no teu caminho
Seguirás mente e corpo
Sofreando e vencendo a dor.

Tua alma reluzente
Dorme no alento da calmaria
Acorda no sorrir do orvalho
Caminha na relva da mansidão
Recebe o abraço da alvorada
Teus dias são de glória
Tua vida é retidão.

Segues nas flores
da tua alma
Na luz do sol nascente
No luar que te ilumina
Na brisa que te reluz
No espelho que te flameja
Cintila o teu esplendor
Demonstres, irradies,
Apontes…
Recebas…
Meu manancial de Amor!
============

Fonte:
Colaboração da poetisa

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Trova 133 – Soares da Cunha (Governador Valadares/MG)

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27 de março de 2010 · 00:07

Soares da Cunha (Baú de Trovas)

Eu nunca pedi um beijo,
Não gosto de beijo dado:
Pra matar o meu desejo
Tem que ser beijo roubado.

Ó canarinho de outrora,
Meu canarinho querido,
Parece que eu te ouço agora
Cantando no meu ouvido!

Nem mesmo a jóia mais cara
Prova toda a gratidão:
Tem algo que só se paga
Dando o próprio coração.

Quem perdeu a namorada,
Não se queixe nem reclame:
Se não tem mais a que amava,
Procure outra a quem ame.

Se quer cativar alguém,
Use palavras de mel.
Que nem as moscas, ninguém
Costuma gostar de fel…

Não gosto de fazer contas,
A conta sai sempre errada.
Por isto virei poeta,
Não faço conta de nada …

Pecados de amor, só são
Pecados de dar horror,
Se forem, na ocasião,
Praticados sem amor.

O lampião, noite escura,
Lá no fundo do sertão,
Filtra uma luz doce e pura
Que enternece o coração.

Não ter amor e fingir
É difícil a valer;
Mas acho que é mais difícil
Ter um amor e esconder.

Aquele olhar suplicante
Penetra em nossos refolhos:
Sem dar sequer um latido,
O cão implora com os olhos!

Abraços, beijos de fogo,
Em vez de aplacar o amor
Que anseia por desafogo,
Mais aumentam seu furor.

Abro os meus olhos e vejo
Que a manhã radiosa avança,
Borrifando a natureza
Com o orvalho da esperança!

Olho o céu, olho as montanhas,
Olho uma nuvem passar…
E acabo me convencendo
Que a alma é função do olhar.

Ao lado da manjedoira,
No nevoeiro matutino,
Eu vejo o bafo do boi
Aquecendo o Deus – Menino

Ó sino de alma de bronze,
Indiferente da sorte,
Tanto celebras a vida
Como celebras a morte.

Quizera, sem ter morrido,
No éter viver disperso,
E ser simplesmente o ouvido
Que escuta a voz do Universo

Às vezes, durante a missa,
Voando vinha de fora
Uma veloz andorinha
Visitar Nossa Senhora.

Toda a água que existia
Sumiu dos sertões distantes,
Para brotar, em seguida,
Dos olhos dos retirantes!

Em qualquer lugar que estejas,
Entre flores ou abrolhos,
A mesma distância, ó vate,
Separa do céu teus olhos!

Em travesseiro de nuvens
Repouso a minha cabeça:
Na companhia dos anjos,
Queira Deus que eu adormeça.

O poeta é uma pessoa
Que vive sempre ocupada:
Faz versos andando à toa,
Mas julgam que não faz nada.

A flor que eu contemplo agora,
Em meu ser quer pendurar,
Insiste em ficar no foco
Do meu deslumbrado olhar.

Ó chá de malva cheirosa,
– Folha com nome de flor –
Cujo perfume de rosa
Se transfigura em sabor.

Eu amava uma palmeira,
Lá longe, no entardecer…
Veio a noite traiçoeira,
Não vi mais meu bem-querer!

Nesta casa com janelas
A minh’alma fez morada:
Mas a casa não é dela,
É só uma casa alugada.

Todo mundo quer ser nobre,
Ter parentesco com os ricos.
Só um era irmão dos pobres:
Chamava-se São Francisco.

Cresceu demais minha aldeia,
Meu Deus, que desilusão:
Hoje, tão grande e tão cheia,
Não cabe em meu coração.

O nosso amor à justiça
Vem do medo que se sente
De que algum dia a injustiça
Possa sobrar para a gente.

Os profetas, com ameaças,
Ganham fama onde aparecem,
Já que não faltam desgraças,
Que todo dia acontecem.

Nenhum valor ia ter,
Para nós, a gratidão,
Se não se pudesse ser
Ingrato sem punição.

Se solto alguma tolice,
Eu mesmo, depois de tudo,
Me envergonho do que disse,
Melhor ter nascido mudo.

Ele recusa comida,
Ainda que seja pouca,
Para não ter o trabalho
De ter que levá-la à boca …

Tenho um punhado de netos
Que acho o maior dos baratos:
São lindos quando estão quietos
E sorrindo nos retratos …

A mulher e sua saia
Não conseguem combinar:
A mulher vai se assentando,
A saia quer levantar…

Provérbios temos aos centos,
Este é dos mais verdadeiros:
– Deus criou os alimentos
E o Diabo, os cozinheiros …

Os quadros que foi juntando
Ao pintor devem pesar
Talvez mais que as obras primas
Que ele deixou de pintar …

A gente em geral tropeça
Naquilo que há de través:
Mas aquele que tem pressa,
Tropeça em seus próprios pés.

É uma troca de carinho
A amizade: basta ver
Um burro coçando o outro,
Como tremem de prazer.

O cão, teu fiel amigo,
Mostra mais satisfação
Ao ver que trazes contigo
Um bom pedaço de pão.
—————

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Oswaldo Soares da Cunha (1921)

Oswaldo Soares da Cunha nasceu em Baguari, município de Figueira do Rio Doce, hoje Governador Valadares, em 25-02-1921.

Fez o curso ginasial no Colégio Arnaldo, de Belo Horizonte, tendo se formado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, na capital mineira.

Mais conhecido como cultor exímio da arte das trovas, é também autor de poemas e sonetos, alguns dos quais figuram em antologias de poetas brasileiros.

Casado com Ivelyse Carmelita Sigismondi Lobo (artista plástica).

Se, como escreveu certa ocasião Eloy Pontes, as trovas constituem a prova de fogo dos poetas, Soares da Cunha venceu galhardamente essa prova… O seu livrinho “MARIA” é a prova irrefutável desta afirmação. O delicado poeta, residente em Belo Horizonte, é um trovador rico espontâneo, cheio de lirismo e emoção.” Escrevi estas palavras há quase dezessete anos, em 7 de setembro de 1946.

Quatro anos depois, numa crônica: “Um trovador das Alterosas”, dizia eu: “…Graça, simplicidade, malícia, sentimento, espírito de síntese, são, entre outras, as virtudes que se destacam das belas trovas de Soares da Cunha.”

Quando organizava “Meus Irmãos, os Trovadores”, Coletânea de duas mil trovas de autores brasileiras e divulgava pela imprensa do Brasil e Portugal quadras de centenas de trovadores, escrevi numa página mimeografada: “Oswaldo Soares da Cunha. forma com Djalma Andrade e Nilo Aparecida Pinto um trio magnífico de trovadores de Belo-Horizonte. E’ natural de Minas Gerais, advogado e muito jovem. Em 1943 estreou com o livro “Estrela Cadente”; no ano seguinte publicou um belo e raro conjunto de trovas “Maria” e a seguir: “Rosa dos Ventos” e “Quadras”. Sua especialidade é a trova, e, aí, poucos o podem igualar. E’ um trovador esplêndido, de um lirismo e graça que encantam. Muitas de suas trovas quer sejam líricas, filosóficas, mordazes ou regionais, são dignas de Antologia. Suas quadras já estão bem espalhadas pelo Brasil e Portugal.” (Rio, 14-1-1951)

No entanto, Soares da Cunha não é apenas trovador. Em 1952 quando publicou “Sonetos e Poemas”, escrevi uma crônica sobre seu livro e entre outras coisas dizia: “A primeira parte é composta. de vinte sonetos feitos com arte e bom gosto, todos dignos de atenção.”
Em 1954 comentei em outra crônica: “Soares da Cunha, trovador mineiro, envia-nos de Belo Horizonte “Quadras e Pensamentos” – da Editora Acaiaca. O poeta, já bastante conhecido e apreciado, é, sem dúvida alguma, um grande trovador.”

Finalmente, em 1962, enviou-me o trovador seu último livro “Mínimas” composto de pensamentos e trovas. Que poderia dizer mais? Pelas linhas que acabaram de ler podem aquilatar a sincera e antiga admiração que tenho pelo trovador Soares da Cunha. As minhas palavras não devem ser tomadas como uma, apresentação, pois o autor é bastante conhecido e dela não necessita. Apenas, como um dos organizadores da Coleção “Trovadores Brasileiros”, amigo e admirador do poeta focalizado, senti-me honrado de escrever esta pequena introdução.

Veterano e fértil trovador, Soares da Cunha é dono de muitas outras quadras que mereceriam figurar entre as cem deste volume. Esta, por exemplo:

“Feliz aquele que ainda
não te viu, formosa Inês:
– A mulher nunca é tão linda
como da primeira vez.”

ou esta outra:

“Se no ver-te eu me apaixonei,
não ponhas a culpa em mim:
culpado é quem me deu olhos
e te fez tão linda assim.”

E, entre outras mais que poderia citar, transcrevo esta, repleta de tédio e de melancolia:

“Quero sair pelo mundo,
cansei-me deste lugar,
quero partir para longe
e nunca mais regressar!…”

(LUIZ OTAVIO – Rio, 12-11-1963 )

LIVROS

Sangue da Alvorada (poemas)
Rosa dos Ventos (poemas)
Maria (trovas)
Pastor das Nuvens (trovas)
Lua no Poço (trovas)
Torre Sondra (trovas)
Mínimas (pensamentos)
Canção dos Condenados da Mina (poemas)
Livro das Trovas (coletânea)
Trovas de Sêneca (no prelo)

Fontes:
– J. G. de Araujo Jorge e Luiz Otávio. 100 trovas de Soares da Cunha. Coleção trovadores brasileiros.
– Academia Mineira de Letras.

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João Felinto Neto (O Galo)

O galo canta ao azular do céu, de sobressalto eu me acordo. Quantos dias mais terei pela frente com esse madrugador barulhento?

Ele continua lá fora com o seu cocoricó irritante que irá até o sol aquecer suas penas.

Gosto de coisas antigas; sou saudosista. No entanto, em matéria de despertador, prefiro os modelos atuais. Os de corda ou pilha é só arremessá-los contra a parede e os a energia elétrica, desconectá-los da tomada. Contudo, o diabo do galo, só torcendo-lhe o pescoço; só há um pequeno problema, o galo é do vizinho. Resolvi escrever no jornal pedindo conselhos sobre o que devia fazer a respeito.

Recebi diversas correspondências, algumas bem interessantes.

Havia uma, em que o meu conselheiro mandava-me colocar uma venda nos olhos do galo, com isso ele não veria o sol e, portanto, adeus problema.

Outra, me aconselhava extrair da pobre ave, todos os órgãos responsáveis pelo seu canto.

Dê uma raposa de presente ao seu vizinho, dizia uma terceira.
Ponha fone de ouvido e engula um comprimido controlado bastante forte, já que você é o incomodado; eis uma quarta.

Acorde antes que o galo, e dessa forma ele jamais o acordará.

Compre um galo mudo e faça a troca com o do vizinho, ele não perceberá a troca, pelo menos até de madrugada.

Aproveite a oportunidade para ganhar dinheiro, grave o canto do galo e produza um CD com o título “Despertar do campo”, para as pessoas que adoram a vida rural. O seu vizinho, com certeza, compraria um.

Tire todas as penas do galo, ele sentirá tanto frio de madrugada, que não terá coragem de cantar, além do mais, terá vergonha de ficar pelado na frente das galinhas.

Faça um abrigo antinuclear e você não ouvirá o galo cantar; pode não ser uma boa idéia, mas rima.

Implante um chip no cérebro do galo e programe-o para cantar ao por do sol.

Convide o galo para um banho-de-cheiro, em vez da banheira, use uma panela de pressão.

Pelo visto, é apelar para o bom senso do vizinho. E que ele me convide para um almoço de confraternização, onde o cardápio seja galo com tucupi.

Fonte:
João Felinto Neto. Cronicas dispersas. Edição do Autor. 2007.

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João Felinto Neto (Antologia Poética)

CABAZ

Um cesto envernizado
no qual eu guardo os frutos do meu delírio.
Um livro anunciado
e nunca editado,
intitulado de cabaz.
Um sonho engavetado e esquecido.
A cada dia acrescido de uma página,
uma a uma,
em poemas despertos pela inspiração.
Depois de escritos,
adormecidos no escuro de uma gaveta,
iluminados pela luz da imaginação.
Quem sabe ao amanhecer
possa me surpreender,
e agradar-me o resultado.
As páginas que eram antes separadas,
estejam editadas
em um livro encapado.

AUTO-RETRATO

Sou de nascimento,
humano.
De substância,
eterno.
Na poesia,
anônimo.
No comportar-se,
lépido.
De índole,
excessivo.
De convivência,
sentimental.
Na multidão,
passivo.
No aspecto,
normal.
De opinião,
inverso.
De ambição,
um pouco.
Na devoção,
incrédulo.
No pensamento,
um louco.

GRAMATICAL

Só em letras imprimo minha alma.
Mais do que texto
sou contexto indecifrável.
Meu sinônimo é antônimo de si mesmo.
Um sujeito indefinido
que é objeto de um erro
gramatical.
Entre modos e tempos,
triste verbo
que ecoa na forma nominal.
Orações que são subordinadas
aos meus vícios de linguagem.
Um início em letras ordenadas
e um fim
numa expressão oral.

AFLORA UM POETA

Assim se fez um poeta.
Como talhe na madeira
esculpi minha poesia.
De uma maneira fria
infundi minha alma no papel.
Nas costas de um corcel
cavalguei por entre versos;
muitas vezes sem regresso,
o poema, me tornei.
De um sono despertei
enquanto escrevia,
da caneta então flua
as idéias que sonhei.
Quem sabe se eu errei?
Foram mais de trinta anos,
foram tantos desenganos
que poeta, me tornei.

ABSTRAÇÃO

Meu paradeiro,
não me pergunte,
é ermo.
Meu erro,
um desengano.
Meu abstrato querer
é verdadeiro.
O meu agora,
é quando.
Por ser em parte,
não sou inteiro.
O meu tinteiro
é preto e branco.
Apenas passo pelo primeiro,
mas sou o último plano.

IMAGINAÇÃO

A metade de mim
é sonho.
Do que sonho,
metade sou.
Eu não sou
metade do sonho
da metade
que não sonhou.

SOU EU

Estou eu no mundo
em um lugar em que ninguém me entende.
Movo os lábios e parece
que ninguém me escuta,
somente um louco que para mim sorri
parece entender o que eu digo.
Ao reconhecer que o único que me entende
é um louco,
aproximo-me um pouco,
maior é meu espanto
ao descobrir que o louco
agora em pranto
sou eu.

VIVO

Viver
é para mim
distanciar-me
dos que são como eu
distantes.
É não procurar ombro.
É simplesmente chorar
por alguns instantes,
por não ficar.
É querer então estar
em mim presente,
para ver em seus olhos
que não estou ausente
da eterna ilusão
de que vivo.
Viver
é para mim,
seu riso.

EU POETA

Eu, poeta, choro agora,
as lágrimas de outrora,
de hoje e de amanhã.

Eu, poeta, sou inteiro.
Sou último e primeiro
em minha poesia vã.

Eu, poeta, sou reverso.
Sou verso do anverso
de ilimitadas versões.

Eu, poeta, sou um homem.
Minhas ambições somem
quando perco as ilusões.

Eu, poeta, não existo.
Sou um ato fictício
de minha própria criação.

INGÊNITO

Seguir os passos
a um lugar perdido na distância;
entrar na dança
de um ritual de acasalamento;
sentir nas mãos
o instintivo dom
que vem de dentro;
ouvir o som
de vozes ecoadas;
e nas entonações
das poesias declamadas,
revelar-se poeta.

DIMENSIONAL

No meu olhar
está o meu desfecho.
Sendo eu meu próprio eixo,
não consigo me deter
no movimento circular
do ser.
Volto a me ver
numa rua sem fim,
numa curva enfim,
volto ao mesmo lugar.
Olho as paredes sólidas,
diviso uma janela,
vejo-me nela
numa visão secular
como figura temporal
traçada no esboço do anormal.
Sou assim,
em mim,
dimensional.

DOR DE CABEÇA

Não consigo decifrar-me no enigma da vida.
Desconheço a mim
no escuro sono inconsciente da noite.
Talvez meus sonhos
tentem revelar-me ao meu próprio eu.
Estou sempre questionando
se são minhas as verdades ou as mentiras.
Descobrir-me
é meu eterno problema,
é minha dor de cabeça.
Serei culpa de um mundo avesso
no qual devemos todos ser direitos.
Posso até estar do lado errado.
Mas qual seria o certo
se errado não houvesse?
Sou uma língua estranha.
Não consigo traduzir-me.

VERSÃO DE MIM

Falo de mim,
ao mesmo tempo
diante de mim,
eu me calo.
Meus olhos me vigiam com vagar,
e devagar,
a divagar sobre um princípio
chego ao meu fim.
Começo a me despir de mim,
sem embaraço,
falando que enfim
eu me pareço
com o que eu mesmo sou,
antagonicamente pessoal.

AMPLIDÃO

Meu rosto já não cabe em minhas mãos
por ser meu pranto
bem maior que minha face.
Eu sou em parte,
parte de mim
que em mim não cabe;
sou amplidão.
Ponho na mão
o mundo que nela não cabe.
Peço perdão
à parte que ainda cabe em mim,
por meu sorriso,
é por saber que nada sabe.

ATRAVÉS DOS OLHOS

Inquieto,
meu pensamento
movimenta-se por trás dos olhos fixos.
Compenetrado,
absorto em uma ampla sala,
guarda minhas recordações.
Volta
no piscar dos olhos castanhos claros
e percebe o mundo à sua volta,
desordenado
pela ordem natural do caos.
E torna-se real
no obscuro mundo das idéias,
a síntese de tudo
que sou.

APELOS

O que desejo,
acaba sempre em lágrimas.
Meus beijos,
em despedida.
Ainda não vejo
para minhas mágoas
uma saída.
Os meus apelos,
que o mundo não saiba.
Nunca deixei de amar
por um só dia.
Já que a voz
no tempo em mim se cala,
que minha dor
não dure a minha vida.

ILUSÃO

Não abdico de quem sou,
não por que sou,
mas por me acostumar a ser.
Esta é a forma que o mundo me ver,
não a maneira de saber quem sou.

Sou por extenso e rubricado.
Sou um grande número cadastrado
em um pequeno pedaço de papel.
Sou uma foto três por quatro
resguardada por um véu
de plástico.

Uma imagem revelada
do negativo de um sobrenome.
Uma figura desbotada
com o passar dos anos.

Sobre as linhas de minhas digitais,
rabisquei demais
meu nome.

Sendo assim,
tornei-me enfim,
a ilusão de acreditar
quem sou.

FRACOS, FORTES E LOUCOS

Os fracos se suportam
por serem fracos,
os fortes se sufocam
tentando superar
uns aos outros,
e os loucos
toleram a ambos.
Pois os loucos sabem
que na solidão
a saudade é companhia lúgubre,
as horas se intensificam,
e os amores se distanciam.
Sou um fraco na dor,
sufocar-me-ia sem amor,
sou um louco.

CORES

Foram pedaços de lápis
que pintaram minha vida.
Em preto,
em branco,
pintaram meu pranto.
Em vermelho,
minha ideologia.
Em verde,
o interesse pelo campo.
Em amarelo,
um sol que brilha.
Em azul,
um mundo em céu
com um arco-íris
de utopia.

Em cores vivas,
em cores mortas,
são minhas dores.

Não há borracha
de tempo
que apague
minhas cores.

EXPOSTO

Eu pedi
que meu sorriso
fosse exposto,
mesmo a contra-gosto,
no caderno de tristeza.

Que servissem à mesa
com o meu cardápio,
mesmo que meu gosto
fosse amargo.

Que meus lábios
fossem lidos
pelos ouvidos
que não me escutam.

E que tudo que pedi
me fosse negado.

INCOMPREENSÃO

Pensei encontrar uma brecha,
um buraco,
uma fresta
no lençol de estrelas,
e espiar para fora
dessa redoma de cor.
Rasgar o céu
como uma folha de papel
azul.
Rasgar o véu
para ver a forma
de seu corpo nu,
num branco virginal
de flor.
Iluminando caminhos,
hei-me facho de luz.
Na dor,
sacrificar-me-ei por nós.
Suas datas
são minhas lições de casa.
Suas falas
são meus verbos perdidos.
Na ausência do ser,
não sou.
————

Fonte:
João Felinto Neto. Cabaz.

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Arquivado em O poeta no papel, Poesias

João Felinto Neto (1966)

No dia 04 de outubro de 1966, nasce João Felinto Neto, em Apodi, Rio Grande do Norte. São seus pais Maria Dália Pinto, natural de Apodi e Francisco Felinto Neto, natural de Pombal.

Em 1969, parte com sua família para Tabuleiro do Norte no Ceará. No mesmo ano passa a residir em Limoeiro do Norte, sua pátria emotiva e ponto de partida de uma fase migratória que duraria toda a sua infância, e o levaria até Santa Isabel/PA (1971), Limoeiro do Norte/CE (1973), e Mossoró/RN (1974), onde ingressa, no Instituto Dom João Costa no ano de 1975.

Retorna novamente a Limoeiro do Norte (1977), onde permanece até 1982, ano em que conclui o 1º grau no Liceu de Artes e Ofícios.

Retorna definitivamente, com sua família à cidade de Mossoró. Conclui em 1985 o 2º grau na Escola Estadual Prof. Abel Freire Coelho.

Em 1986 ingressa no serviço público, como técnico de Laboratório do Hospital Regional Tancredo Neves, atual Tarcísio Maia.

Conclui o curso de Ciências Econômicas, pela UERN, em 1991, ano em que se casa com Lucineide Régis Felinto. O primeiro filho do casal, João Vítor Regis Felinto, nasce em 1997.
Somente aos 34 anos, começa escrever e catalogar poemas e crônicas. Até então seu mundo literário se resumia à leitura e ao pensamento.

Poesia:

Por minhas mãos (2003) – Fundação Vingt-um rosado (Coleção mossoroense)
Opalina (2004) – Fundação Vingt-un Rosado (Coleção mossoroense)
Reticências desfeitas (2006) – Litteris – Quártica editora
Olhos de guri (2006)- Infanto-juvenil – Editor/Autor
Alguns degraus (2007) – Editor/Autor
Poesia no lixo (2007) – Editor/Autor
Páginas de ontem (2007) – Editor/Autor
Cálice (2007) – Editor/Autor
Pax – vóbis (2007) – Editor/Autor
Megalíticos (2008) – Editor/Autor
Espinhos do deserto (2008) – Editor/Autor
Composições sem cifras (2008) – Editor/Autor
Árvore morte (2009) – Editor/Autor

Narrativa em verso:

O herege (2006) – Editor/Autor
A caveira & a rosa (2007) – Editor/Autor
Um pedaço de pangéia (2007) – Editor/Autor

Crônica:

Estranhas narrativas (2007) – Editor/Autor
Crônicas dispersas (2007) – Editor/Autor
———

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Trova 132 – Nilo Aparecido Pinto (Caratinga/MG)

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25 de março de 2010 · 23:43

Bueno de Rivera (Antologia Poética)

A CABEÇA

O mágico equilíbrio
da cabeça no espaço!
Meus olhos me fitam,
se espraiam no corpo,
mas roupas, botões,
nos longos sapatos.
Neus olhos na febre
me buscam, não estou.
Mas vejo a cabeça
tão vaga, distante,
tão minha, tão próxima!
O universo em síntese
no pescoço-base.

Ai! como sofrem
os meus pensamentos!
O suor nas pálpebras
ou na testa infinita
de que fonte virá?
Da fonte das lágrimas?
Dança a cabeça,
agita-se em sonhos
mas cai desolada

nas mãos inocentes.
E cabeças há tantas
expostas ao luxo,
brinquedo de fígaro;
o pente nas ondas,
o mar de loções,
tesouras voando
como aves marinhas
nos claros espelhos.

Tão longe vivo,
tão distante vou,
que o resto é apenas
abstração… –
A gravata louca,
as meias de cores,
as solas macias
tão simples enfeites.
Meus olhos aflitos
me buscam, não estou.
Irmãos, eu vos digo,
Meu corpo não há.

Apenas a cabeça
como estranha lâmpada
na imensa torre
vela os tormentos.
Sinto a tragédia
do irmão do mundo.
Triste mensagem
chega, abafada
pelos gemidos
de alguém pedindo
pão e calor.

Cabeça inquieta,
mundo pequeno
em vão pousado
na paina quente.
Insônia amarga
que espera ansiosa
a luz tranqüila
da aurora próxima.

O beijo amoroso
da mãe ou da amiga
pergunta em silêncio.
A cabeça, no entanto,
não pode dizer.
Na sombra do quarto
acende-se em febre
no doce delírio
de um mundo melhor.

NOTURNO MINEIRO

Boa Viagem
dos velhos tempos de Minas.

0 alvo carregador
põe as lembranças no ombro,
recebe o abraço e a gorjeta.
0 chefe apita com força.
Não há lenços, há. camisas
rôtas, meninos e fraldas
acenando nos quintais.

As estrelas da vidraça
e a cara do itinerante
dançam nos óculos
do bacharel disponível.

Na luz morna do carro
a memória acende o olho.
Sinto a primeira viagem,
o trem do oeste, as vacas
descendo a serra, a fazenda
com gente amável no alpendre
e as lavadeiras no vale
como aves mansas pousadas
no córrego claro.

Congonhas do Campo. A cabeça
na janela espia o templo.
Os profetas do Aleijadinho
viajam na segunda classe
mas os museus não percebem.

A madrugada no túnel
acorda os heróis.
A tarde traz a fumaça do
mar. Um homem sozinho.
O mineiro pensa na vida
sentado no cais.

POEMA SIMPLES PARA O ÓRFÃO

Chora. A tua mãe levou nos olhos mortos
a tua madrugada.

Sentirás saudades do carinho perdido
e olharás com tristeza o crepúsculo
sobre o mundo vazio.

Tua mãe é tua infância,
não volta mais.

O MICROSCÓPIO

O olho no microscópio
vê o outro lado, é solene
sondando o indefinível.

Dramática a paciência
do olho através da lente,
buscando o mundo na lâmina.

A tosse espera a sentença,
o Ieito aguarda a resposta.
0 tísico pensa na morte.

O silencio é puro e o frio envolve
o laboratório.
Os frascos tremem de susto.

0 infinito dos germes
reflete no olho imenso
que pousa na objetiva.

0 avental se levanta.
Os dedos inconscientes
escrevem a palavra ríspida.

0 resultado terrível
entra nos óculos do medico
e ele diz: positivo.

0 doente tira o lenço.
Aperta a mulher e o filho,
chora no ombro da esposa.

Imagina a reclusão
no sanatório, a saudade
e o vento no quarto branco.

olha o papel: positivo.
Cresce a palavra com a tosse.
A febre queima a esperança.

0 microscopista, no entanto,
conta anedotas no bar.
Esta alheio e feliz.

Não sabe que o olho esquerdo
ditou a sentença e a morte.
Paga o café e caminha.

MANHÃ

O pão entre as flores de janela,
a vasilha de leite sob o orvalho.
As rosas e as crianças nuas
esperando o sol no alpendre.
Leio no jornal a frase mágica
“Glória aos que amanhecem !”

Galo do vizinho, a lua ainda
perdida no céu claro,
A água fresca no rosto

as idéias como espuma
Amanhece no meu espírito.
sinto as alegrias, os afetos
como corolas acesas.
A gravata como um símbolo.
As roupas leves conduzem
o meu corpo pelas ruas.
Vamos apagar o ódio
da face dos semelhantes.
Vamos rasgar a história.
Façamos de conta, irmãos,
que este dia tão puro
é o primeiro de mundo!

Olho o relógio e a folhinha,
A cabeça cai nas mãos.
Não adianta a alegria
amorosa da manha,
nem os eflúvios, os arroubos.
Amanhece no pássaro, na flor,
no trabalho das abelhas,
na pureza dos meninos,
mas cai a tarde nos ombros,
anoitece nos espíritos.
O homem acorda a nao sabe
que a vida espera na esquina.

O HOMEM DO MUNDO

Quando acordei, nao vi mais os tempos de meu pai
a face de minha mãe não falou de orações.
minha avó rezando na tempestade

e o vulto do Monsenhor entre as rosas da praça.
As perdidas casuarinas no crepúsculo vago,
lembrança de mortos no soluço do vento.

Onde estas, vitrola do bilhar deserto?
Onde arquivaste os discursos de quatorze?
Agora, ouço apenas o clamor dos vivos
unindo os continentes.

Não sou mais o homem do interior, sou o homem do mundo.
Hoje, o meu coração é um alfinete no mapa,
aceso também na hora solidária.

Adeus, alegrias inúteis! A dor bateu às nossas portas.
Temos os olhos enxutos, estamos conscientes.

A DISCOTECA

0 passado surge nos discos,
a voz profunda ressuscita.
Há cavatinas gemendo,
melodias brancas, soluços
do violino em conserva.

A mão nervosa, a batuta
dança no estúdio. Silencio.
A pauta sugere as notas.

Schubert morrendo tísico,
Patápio nas serenatas.
Caruso da um suspiro
no fundo da cera mágica.

A agulha fere o mistério.
Um beijo de lua desce.

Catulo abraça Beethoven
e o luar a doce a limpo
na modinha e na sonata.

Contralto em gestos macios,
sopramos em amplos lamentos.
A tristeza envolve o rosto
do tenor com a flor no peito.

Cansado das vozes mortal
da minha vitrola dócil,
abro a janela, recebo
o forte rumor da noite.
Pregões, gritos na praça,
casal lutando no alpendre
crianças chamando a mãe

O céu grava em cera virgem
o choro vivo do mundo.
________

Fonte:
J.G . de Araujo Jorge. Antologia da Nova Poesia Brasileira. 1. ed. 1948.
– Montagem da imagem = José Feldman

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Bueno de Rivera (1911- 1982)

Odorico Bueno de Rivera Filho, mais conhecido por Bueno de Rivera (3 de abril de 1911, Santo Antônio do Monte, Minas Gerais — 25 de junho de 1982, Belo Horizonte) foi um radialista e poeta surrealista brasileiro

Tendo freqüentado apenas o primário, revelou-se um dos melhores de todo o Modernismo brasileiro. Em busca de futuro foi ainda moço para Belo Horizonte, onde aprendeu tipografia e trabalhou no ramo durante vários anos. Mais tarde foi microscopista no serviço de saúde pública e aí se motivou para escrever o marcante poema “O Microscópio”.

Bueno de Rivera foi também um dos mais famosos speakers de Minas,tendo atuado longamente na histórica Rádio Mineira. Sabe-se que, ouvindo sua voz no rádio, dona Ângela se enamorara do poeta, antes mesmo de conhecê-lo pessoalmente, e viria a ser depois, para sempre, a sua companheira.

Pela editora José Olympio, publicou Mundo Submerso (1944) e Luz do Pântano (1948); pela Imprensa Oficial de Minas Gerais publicou – mais de 20 anos depois – Pasto de Pedra (1971).

Bueno de Rivera viveu 71 anos. Em 25/06/1982 veio a falecer, deixando viúva dona Ângela, os filhos Isaac e Clara, oito netos e sete irmãos.

Fontes:
– J. G. de Araujo Jorge. Antologia da Nova Poesia Brasileira. 1a ed. 1948.
– Wikipedia

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Trova 131 – Arlene Lima (Maringá/PR)

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23 de março de 2010 · 21:38

Rita Elisa Seda (Garimpagem Literária)

Hoje peguei uma linda caixa que normalmente só abro uma vez por mês, ou melhor… algumas vezes por ano (poucas). Ela é toda de madeira texturizada em ocre e na tampa há uma roseta de gesso. Coloquei-a devagar em cima da cama, removi a tampa e vislumbrei os envelopes, de todas as cores, vários tamanhos e selos diversos. Uma alegria. Foi como puxar um fio condutor que nos leva direto ao passado. Tenho uma amiga que diz que sou muito organizada… olhando para aquela montoeira de cartas eliminei essa idéia – não sou assim, tão organizada! Os envelopes deveriam, pelo menos, estarem empilhados cronologicamente. Ainda bem que estavam fora de tempo e num espaço restrito.

Meu Deus! quantas lembranças içadas, várias sensações relembradas, muitas tristezas choradas, inúmeras alegrias conquistadas e o melhor foi reconhecer a evolução das amizades. Li algumas, escondi outras, mas não rasguei alguma. Sei que tudo tem seu momento e que um dia vou querer reler as que deixei de lado.
Foi quando já conseguia ver o fundo da caixa, tirando um enorme envelope pardo, vi a famigerada, a mal-amada, a terrorista das letras, a devoradora de idéias: a senhora dona traça! Lembrei-me do primeiro conselho que recebi quando comecei a escrever – os dois maiores inimigos de uma escritora são: sua morte e a traça. Sendo que a traça leva alguns anos para devorar um livro, mas o viúvo acaba com tudo em 1 minuto. Voltemos à traça! Ela estava gordinha, escura, serelepe se escondeu embaixo da ultima carta. Fui lá, sem dó nem piedade, e zás, esmaguei-a. Adeus corpinho movido por celulose e tinta. Olhei para o lado, encostada na parede, sob a janela, minha mala goiana. E, se nela também estivessem traças? Ainda pior… nos meus baús?! Afinal são vários espalhados em toda casa e dentro deles vários livros, vários é pouco… muitos livros. Verdadeiras preciosidades.

Nessa ciranda onde uma coisa puxa a outra, vieram algumas soluções, coisas simples para serem colocadas nas malas, caixas e baús: laranja sachê espetada de cravos da índia, velas de citronela (apagadas, é claro!), spray mata tudo (apelação) e o golpe final – naftalina. Quem é que agüenta um cheiro desse? Eu, não! mas sei que acaba com a traça, tão sensível, tão culta, com tanta informação em seu corpo, tanta que em sua veia não corre sangue, correm letras. Se duvida, mate uma traça para ver, ou melhor – ler. Decidi apelar, os sprays atuais são ecologicamente corretos; a não ser pelo fato de matar insetos. Chiiiiiiiiiiiiii, por todo canto. E, para que eu não morresse, também, precisei sair de casa.

Aproveitei para ficar no banco Roma, dando nó na ponta dessa ciranda. Como foi que Fernando Pessoa conseguiu eliminar as traças de seu baú? Sim… em Portugal também há traças. A Sônia Gabriel tem uma enorme mala Sheherazade onde podemos ficar mil e uma noites lendo seus contos. Será que por lá apareceu alguma traça? Melhor daqui por diante praticar o que era do feitio de Cora Coralina, a melhor maneira de se guardar livros é… colocando-os na geladeira! Isso mesmo, sempre, a vida toda, a geladeira da poeta era repleta de livros. Uma bela alternativa, economizo luz e tenho uma biblioteca na cozinha. Só sei que a hora que eu puder retornar à minha casa, quando lá o ar estiver respirável novamente, vou fazer algumas mudanças significativas… para as traças!

Fonte:
http://www.entrementes.com.br

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Milton T. Mendonça (O Retrato de Ludmila)

Ao entrar no ateliê para mais uma seção de pintura, hoje pela manhã, a placa com os dizeres: livrai-me senhor dos abestados e dos atoleimados, que peguei emprestado de Hilda Hilst (Os dizeres e não a placa, infelizmente não a conheci pessoalmente), que coloco em cima da porta para espantar os espíritos de porco, olhou-me alerta esperando me pegar desprevenido. Meu sorriso foi inevitável. Imaginei-a sentada na sala, encurvada sobre a mesa de tampo redondo e brilhante, escrevendo seus textos, a lucidez estalando, vibrando a sua volta como uma descarga elétrica, fazendo saltar todos aqueles que raso na suas intenções entravam desavisados em seu horizonte. Meu sorriso se estendeu, senti ímpeto de gargalhar. Por algum motivo, quando percebo aquela placa, que há anos está no mesmo lugar, o dia fica diferente, é como se algo bom fosse acontecer. O dia começara bem.

Alegre voltei meus olhos para a tela sobre o cavalete. Fazem mais de duas semanas que o retrato está sendo elaborado, pensei que terminaria em dez dias como os outros, mas não deu, este é diferente. Faz parte da série de convidadas que estou pintando. É o segundo da série. Convidei-as por serem especiais, são algumas das mulheres que se preocupam com a cultura joséense, todas se esforçam para, de uma maneira ou de outra, deixar o povo menos atoleimado e isso para mim é uma causa muito nobre.

Parei em frente ao cavalete e aqueles olhos verdes, enormes, irradiando inteligência me olharam inquiridores. Faltam apenas algumas pinceladas para terminar. Essa é a parte mais difícil. Como já sei o que fazer, termino rapidamente.

A arte consiste em saber finalizar. O propósito caminha até o ponto da concretização, não podemos ultrapassa-lo ou ele se perde caindo no caos. Assino, está pronto. Não posso mais acrescentar nada. Esta é uma regra que para o bem do meu equilíbrio mental não quebro em hipótese alguma. É a minha gravidade.

Coloquei meus óculos para enxergar de longe e analisei o quadro com cuidado. Fiquei feliz por ter assinado assim que me sento, outra alternativa para construir a mão surge espontânea em minha imaginação, mas não sinto vontade de pegar o pincel. A força descomunal que me fez pintar aquele retrato extinguiu-se. Sinto-me tranqüilo e espantado por ter conseguido terminar. É uma sensação extremamente agradável apesar de contraditórias.

A luz da lanterna que o interlocutor joga sobre o rosto da sacerdotisa que me olha da tela, se espalha para todos os lados chocando-se e refletindo, voltando a chocar-se até criar a imagem que estou vendo, ela é única exatamente por só poder ser vista por mim. Sabemos que a luz só é percebida quando incide diretamente sobre a pupila, somente eu posso vê-la, portanto, preciso ser honesto na hora de retrata-la. Calculo os possíveis ângulos da luz rapidamente, poderia ter colocado mais sombra ali, mais luz acolá, percebo incomodado, mas não sinto vontade de me levantar, está terminado. No próximo acrescento, prometo cansado, sei que este é apenas um estudo.

Quando recebi a foto que ela me mandou, fiquei preocupado, era um close. Como colocar aquele rosto em uma tela cinqüenta por setenta? – perguntei-me ansioso. A sacerdotisa pagã, meio Celta, meio cigana veio a minha mente quase imediatamente. A Ludmila é assim: uma sacerdotisa do século XII, obrigada a viver no século XXI por força do tempo que não para.

Não gosto de fazer retrato baseado em fotografia. A fotografia é uma arte por si só, essa tal de releitura é um negócio que ainda não digeri direito. Sempre imagino estar em frente ao modelo – claro que tem exceção – o primeiro retrato desta série, o da Sônia Gabriel, por exemplo, copiei descaradamente da foto. O fotógrafo, apesar de ter recém entrado na adolescência, conseguiu captar a luz ideal, um verdadeiro olhar de gênio.

Pretendo pintar nove telas, ou quase isso, minhas convidadas são arredias e, como demorei em criar coragem para expor minha arte ao público, sou um senhor desconhecido e isto espanta os colaboradores. Infelizmente o ser humano gosta mesmo é de acompanhar a opinião da maioria. Faz parte da genética acho. Lembranças de aventuras imemoriais. Deu certo com um é provável que de certo com muitos – algo assim.

A calma invade meu corpo e saboreio a visão do retrato por um longo tempo. Será que ela vai gostar? – pergunto-me preocupado mas logo afasto a duvida. Ela me deu carta branca, não poderá reclamar. Mas não creio que emitirá sua opinião, se contentará com um franzir de nariz ou um comentário sarcástico sobre a minha idealização, não espero mais que isso. Estou satisfeito.

Levanto-me e vou a procura da máquina fotográfica. Ela será a primeira a receber a imagem. Uma pequena deferência pelo imenso prazer que me proporcionou.

Fonte:
http://www.entrementes.com.br/

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Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Decisão)

Quero curtir o tempo que me resta,
Deixar de lado a dor que eu senti,
Trazer no peito um coração em festa,
Recuperar momentos que perdi.

Jogar no lixo o resto da saudade,
Que por maldade se apossou de mim,
Fazer as pazes com a liberdade
E não lembrar que tudo tem seu fim.

Quero cantar um canto encantado,
Amar o mundo como nunca amei;
Quero esquecer o tempo já passado
E resgatar a vida que sonhei.

Quero da brisa o toque de frescor,
Sentir no peito toda esperança,
Reconquistar todo aquele amor
Que ainda guardo comigo na lembrança.
—————-

Fonte:
Colaboração do Autor

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Branca Tirollo (Não Brinque com o Fogo)

Notei a porta entreaberta. Não era o vento a tocá-la. O ar estava parado, e as folhas do coqueiro, silenciosa. Levantei-me do sofá e caminhei até a varanda. Então, notei uma luz bem pequenina por trás das montanhas. Não havia estrelas no céu, nem a lua estava exposta. Havia algumas nuvens escuras.

A luz me atraia cada vez mais, e lentamente caminhando, cruzei a avenida.

Do outro lado havia uma arvore pequena e enquanto voltei meus olhos para ela, a pequenina luz desapareceu. De repente tudo escureceu e na negridão da noite eu me senti perdida. Pensava estar caminhando de volta, mas sentia que o caminho de volta ficava mais distante.

Caminhei, caminhei, e quando dei por conta, estava à beira de um grande rio. Quase não enxergava, mas ouvia nitidamente o som das águas que bravas desciam para o mar.

Meus pés estavam machucados. Não tinha colocado os sapatos quando fui atraída pela porta se abrindo.

Eu não reconhecia o rio e tinha certeza de que não estava em minha cidade, pois lá não havia nenhum rio grande.

Mas eu lembrei de um fato muito importante: eu tinha deixado alguma coisa no fogão, acho que estava cozinhando algo. Só não me lembrava o que era.

Cada minuto que passava, sentia que a água daquele rio misterioso subia com muita força. Já estavam molhados, os meus pés. Ainda estava escuro e eu não enxergava nada.

De repente ouço um estouro: PUF!

Nossa! Eu tinha adormecido no sofá que fica na copa, observando o gás aceso.

Lá tinha se ido a minha panela de pressão. Hilariante! Precisei gastar muita água para limpar a sujeira, mas foi bem melhor do que estar perdida num lugar qualquer.

Fonte:
Colaboração da autora.

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21 de Março – Dia Mundial da Poesia

Antonio Manuel Abreu Sardenberg
POESIA – NOSSA MUSA

Seja bem-vinda, poesia!
Desperte como a alvorada
Com seu toque de carinho
No surgir de cada dia
Trazendo a luz que irradia
Nosso mundo, nosso ninho!

Salpique o céu com estrelas,
Cante a imensidão do mar,
Ensine o mundo perdido
Sentir o que é amar…
Mostre o cruzeiro do sul,
Guie o nosso caminhar!

Seja bem-vinda, poesia!
Traga o frescor da aragem,
A brisa leve a soprar…
Seja nossa fantasia,
No bloco do dia-a-dia
Nos ensine a desfilar…

Cante a beleza da rosa,
O perfume do jasmim;
Quero ficar todo prosa
Com você perto de mim.

Seja bem-vinda, poesia!
Traga ao mundo a primavera,
A vida explodindo em cor…
Seja o sonho e a quimera,
Seja, enfim, o que quiser:
A musa, a deusa, a mulher
O nosso caso de amor…
_________

Fontes:
Alma de Poeta.
– Imagem = montagem de José Feldman com pintura do Poeta, de Jonn Herschend

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Mario Quintana (Carta a um Poeta)

Meu caro poeta,

Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola trancada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? – perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: “eu vos trago a verdade”, enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: “eu te trago a minha verdade.” E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!

Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: “O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?” A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.

A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.

Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: “Eu não te largarei até que me abençoes”. Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técnica dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.

Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.

Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convém, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.

Enfim, meu poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a vinte anos. Combinado?

Mario Quintana

———–
Fonte:
Casa do Bruxo

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“A Poesia” pelos Poetas

José Feldman
A POESIA

A poesia é a janela da alma.
É a flor que ainda não nasceu
É a vida que nunca se acalma
A aurora no seu apogeu.

É a luz dos amantes,
Os olhos de uma criança
O bálsamo dos agonizantes,
Da tempestade a bonança.

A poesia é a magia que acalma as tormentas,
que transforma armas em flores,
que transforma almas violentas
ao mundo pintando com mais cores!

A poesia é as cachoeiras e o mar,
O sol, as estrelas, a lua
A casa que sempre estamos a sonhar
A fé que move montanhas que nunca extenua.

A poesia é o fio
que comanda os nosso sonhos!
Z Z Z Z Z Z Z Z Z

Andréa Motta
PEQUENO POEMA

Trovejam em coro as idéias
infusão vermelha
que conspira
e cresce

desabrocha ramo
fino e flexível

conciso mimo
a atar as sílabas
Pó & sias
Z Z Z Z Z Z Z Z
A poesia é a pintura dos ouvidos, assim como a pintura é a poesia dos olhos”.
(Lope de Vega)
Z Z Z Z Z Z Z Z
Fernando Pessoa
AUTOPSICOGRAFIA

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Claudia Sleman
SER POETA

Ser poeta é ser apenas
Nada mais que o vento leva…
É ser a prece que enleva…
É ser a praga que extrema…

É amar sem nunca ter…
É ser mar e ser areia…
Plantador que ora semeia
Sem o tempo de colher…

Ser poeta é ser homem
E ser deus a um só tempo…
E existir em dualidade

Tendo a poesia por alento,
Para os dias que o consomem
O amor, a dor e a saudade…
Z Z Z Z Z Z Z Z
Susana Mendes
POETA E POESIA

Como nasce a poesia na alma de um poeta?
Ah…Sua alma transcende,transmuta a algo divino!
E ele vôa, brincando em seus versos,
dando asas diáfanas às suas palavras!
Sonhando sempre, olhos e coração abertos,
ele atravessa a imensidade…
Suas linhas cintilam e colorem jogando com as estrelas
e com a noite…Num misto de magias, fantasias,
enquanto uma nuvem suspira à voz do vento,
ele manda uma mensagem de amor, ao destino do universo,
envoltos em raios de plenas esperanças.
Bendita sejas, ó alma que verseja na embriaguez da vida,
deixando-se fluir em aromas penetrantes do seu âmago e
se elevando ao ápice dos céus !
Poetas e Poesias…
Seus versos livres são filtrados
no mais recôndito de suas expressivas emoções!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Abílio Terra Junior
SE ÉS POETA

se és poeta
e amas a poesia
cumpre tua meta
entregue-te a ela
te esmeres em cada verso
esperes pelo despertar
da tua alma
chores no frio da madrugada
caminhes solitário pela calçada
ouça a canção da que se entrega
o murmúrio da criança que se perdeu
sintas o olhar do velho
frágil e sério
o afago da tua amada
perscrutes o brilho que se apaga
da estrela anã
a dança da folha seca
que o vento leva
os contornos da jovem
que desperta para o amor
os galhos que buscam o sol
da centenária árvore
a placidez comovente
da lua que te inspira
Z Z Z Z Z Z Z Z
Vinicius de Moraes
O POETA E A LUA

Em meio a um cristal de ecos
O poeta vai pela rua
Seus olhos verdes de éter
Abrem cavernas na lua.
A lua volta de flanco
Eriçada de luxúria
O poeta, aloucado e branco
Palpa as nádegas da lua.
Entre as esferas nitentes
Tremeluzem pêlos fulvos
O poeta, de olhar dormente
Entreabre o pente da lua.
Em frouxos de luz e água
Palpita a ferida crua
O poeta todo se lava
De palidez e doçura.
Ardente e desesperada
A lua vira em decúbito
A vinda lenta do espasmo
Aguça as pontas da lua.
O poeta afaga-lhe os braços
E o ventre que se menstrua
A lua se curva em arco
Num delírio de volúpia.
O gozo aumenta de súbito
Em frêmitos que perduram
A lua vira o outro quarto
E fica de frente, nua.
O orgasmo desce do espaço
Desfeito em estrelas e nuvens
Nos ventos do mar perspassa
Um salso cheiro de lua
E a lua, no êxtase, cresce
Se dilata e alteia e estua
O poeta se deixa em prece
Ante a beleza da lua.
Depois a lua adormece
E míngua e se apazigua…
O poeta desaparece
Envolto em cantos e plumas
Enquanto a noite enlouquece
No seu claustro de ciúmes.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Elisa de Andrade
O POETA

O poeta é….

Um ser que na verdade
Com tamanha maestria
E através da sua poesia
Foge um pouco da realidade !

O poeta é….

A criatura que ao se expressar
Busca no seu sentimento de amor
Uma forma de contar
O que vai no seu interior !

O poeta é…

Aquele que busca no fundo do pensamento
Um sonho que um dia na sua imaginação
Sonhou e traduz naquele momento
O que vai dentro do coração !

O poeta é….

Por Deus grandemente iluminado
Descreve o que vai na sua alma
E quem lê sente-se privilegiado
Sentindo como tudo aquilo o acalma !

O poeta é….

Aquele que faz da arte de escrever
Uma forma de se refugiar
Seus lindos poemas têm o poder
De tanto …. tanto encantar !

O poeta é….

Uma luz que desponta no firmamento
Vinda em nossa direção
Como se fosse um mágico momento
Que ficará para sempre em nosso coração!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Marília Bechara
POETA

A poesia passeava abraçada pelo vento.
Onde passava sem nada tocar perfumava.
Mas sonhador bem acordado a percebeu,
Sentidos em alerta nos braços a prendeu:
Era um poeta!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Lourdinha Biagioni
POETA E POESIA

O poeta faz da poesia
sua terna e fiel companhia.
Junto de alguns a fantasia
acontece de estar sozinha.

A poesia faz do poeta,
vulnerável pedaço de sonho,
enternece, fascina e encanta,
dada palavra pelo caminho.

A poesia e o poeta enaltecem
sentido, métrica e pensamento.
Expressão e forma se enobrecem
de íntimo e latente sentimento.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Nídia Vargas Potsch
O VERSEJAR DO POETA …

Mansa é a noite
em que as lembranças são doces …
E o Poeta viaja em sonhos!
Em sua fantasia cria mundos,
inventa situações,
brinca com as palavras,
retrata o novo,
o banal, o inusitado …
Faz da saudade uma incógnita
remexendo com os sentimentos alheios
e revolvendo suas próprias recordações …
Desvenda sua alma,
de sensações fragmentadas,
como retalhos de uma colcha
velha e inacabada,
que só se completa,
na imaginação
de quem o lê e o compreende …
Porque o Poeta se vai, mas
sua Poesia, permanecerá Eterna!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Marinez Stringheta
TECENDO POEMAS

Idéias na mente,
Desejos no coração.
Palavras e sentimentos se unem.
Lápis e papel trabalham..
A borracha apaga…
A caneta escreve.
Risca e rabisca.
A poesia é moldada
Como escultura
Na mão de seu criador!!

Muitas vezes, o papel (amassado)
No cesto é jogado.
Nesse vai e vem
Os olhos se embriagam
De visões imaginárias.
Os ouvidos percebem
Melodias inaudíveis.
O poeta observa
O mundo que o cerca.
O mundo… do qual ele é parte.
E… com a sensibilidade
Que o torna diferente dos normais
Recomeça….
Sem medo… de lutar com palavras
Por um mundo mais humano…
Sem medo… de ser questionado!!!

O poeta quer, através de seus poemas
Abrir os olhos do leitor
Ou… pelo menos tentar!!!
Contudo… Entretanto…
A alma do poeta jamais se aquieta.
Ele poeta a dor, o sofrimento
Poeta a paixão, o amor
E também…
Seu próprio tormento!!!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Marisa Cajado
O VÔO DO POETA

O poeta com a pena, traça a letra
E à letra dá vida, com a interior consciência.
E deste instante fugaz, uno à divina essência.
Nasce a poesia, que o amor soletra.

Ai, encontra ele o paraíso.
Longe da Terra, onde é prisioneiro.
E voa por ele, num vôo certeiro
Energizado, retorna ao corpo, é preciso.

Sentiu-se por segundos realizado
Provou o néctar da verdade universal.
Então transfere em versos, para a humanidade.
A porção mágica do éter divinal
Z Z Z Z Z Z Z Z
Liane Niremberg
“O POETA”

Será louco aquele…
Que sonha doces palavras
E ao sussurra-las ao vento
Faz brotar esperança ao relento?

Será mesmo loucura
Em versos dizer sentimentos…
Das alegrias e tristezas
Injustiças
Ou solidão?

Será louco aquele…
Peregrino das estrelas
Que na procura da verdade
Une emoção e razão?

Não creio não
Pois aquele…
É o poeta!
Misto de real e etéreo…

Escreve, faz, acontece…
Eterno se faz presente
Com um único refrão:
A paz é minha canção!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Graça Ribeiro
POETEMOS

Poetemos
porque sem a poesia morremos…

Morremos de tédio entre silêncios
morremos na fome de amor do só
morremos na cama de verso triste
morremos na palavra emudecida

Poetemos
porque sem a poesia desistimos…

Desistimos de entender os nãos do tempo
desistimos de olhar a cara no espelho
desistimos de morder a vida sem fome
desistimos de acreditar em outro mundo

Poetemos
porque sem a poesia esquecemos…

Esquecemos de ver com olhos de ouvir
esquecemos de sentir com a língua e voz
esquecemos de gritar o prazer do gozo pleno
esquecemos de SER a vida que vive em nós

Poetemos
porque sem a poesia choramos…

Choramos a morte do amor que não houve
choramos a vida perdida entre os sonhos
choramos a fome de amor que nos mata
choramos o choro dos que amam chorando

Poetemos
porque sem a poesia morremos…

Morremos na palavra que perde os sentidos
morremos no verso que cria asas partidas
morremos na metáfora vermelha do sonho
moremos no inverso de um verso sem rima

Poetemos
porque apenas na poesia renascemos…

Renascemos na ternura de mãos que se entrelaçam
renascemos nos beijos das bocas que beijamos
renascemos no orgasmo das letras que criamos
renascemos no susto e assim… acordamos

Acordamos para entender que a poesia é VIDA
e que a poesia não é o poema que escrevemos
mas a voz que damos às palavras que ouvimos
dentro de um mundo que só nós entendemos.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Paulo Monti
POETA

Poeta desencontrado
Palavras soltas ao vento
Recolhidas e soltas em ouvidos surdos!
Poeta esquartejado
Sonhos desfeitos na madrugada
Feitos e refeitos em uma musa!
Poeta suave
Dormido de nuvens, brisas e luares
Amado pela sua própria essência!
Poeta sofrido
Assim como tu, amigo
Abandonado, mal-amado, porém saudado
Numa réstia de sol!
Poeta amigo
De sua poesia, sua loucura
Espalhada nas ruas, nos risos
De mãos estendidas!
Poeta, poeta…
Por que não seres comum?
Por que poeta?
Para poetares simplesmente?!
Poeta…
Z Z Z Z Z Z Z Z
Rosimeire Leal da Motta
A POESIA

Eu sinto a poesia como se fosse um pedaço da alma, um ser vivo que transmite um sentimento. Ler uma poesia é como abrir um frasco de perfume e aspirar seu aroma… A fragrância é totalmente absorvida por nosso íntimo. Penso que a realização do poeta se faz na alma, pois ele já nasce com este dom, ou seja, não há como participar de um curso para se tornar um profissional da poesia… Ele poderá se inscrever num curso para aperfeiçoar a escrita com base na gramática e somente isto. Ser poeta é um dom que a pessoa tem, que a torna capaz de transformar letras em sentimento
Z Z Z Z Z Z Z Z
Florbela Espanca

Ai as almas dos poetas
Não as entende ninguém;
São almas de violetas
Que são poetas também.’
Z Z Z Z Z Z Z Z
Rachel de Queiroz
POESIA

Eis que temos aqui a Poesia,
a grande Poesia.
Que não oferece signos
nem linguagem específica, não respeita
sequer os limites do idioma. Ela flui, como um rio.
como o sangue nas artérias,
tão espontânea que nem se sabe como foi escrita.
E ao mesmo tempo tão elaborada –
feito uma flor na sua perfeição minuciosa,
um cristal que se arranca da terra
já dentro da geometria impecável
da sua lapidação.

——–
Fontes:
Poetas del Mundo
Cavalgada de Sonhos
Wikipedia
Antologia da Poesia Brasileira

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Trova 130 – Amália Max (Ponta Grossa/PR)

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20 de março de 2010 · 22:58

J. G. de Araujo Jorge (Baú de Trovas I)

” A Trova “

Tão simples, as trovas são
cantigas com que a alma expande
tudo que há no coração
do poeta – um menino grande.
01
Tudo é trova: a flor, a onda,
a nuvem, que passa ao léo…
E a lua… trova redonda
que a noite canta no céu!
02
Cartilhas do coração,
onde o povo se inicia,
os livros de trovas são
um ABC de poesia!
03
A trova, conta de um canto,
poça d’água sobre o chão
– tão pequenina, e entretanto,
reflete toda a amplidão!
04
A trova é como uma conta
de um rosário multicor,
é a cantiga que desponta
do peito de um trovador.
05
Pequeninas e redondas
as trovas são contas, são
como as cantigas das ondas
que se espraiam no coração.
06
Uma quadrinha é uma cova,
onde a poesia é uma flor,
por isso é que numa trova
vou sepultar este amor.
07
Quis tornar-me um trovador
para dizer que ela é minha,
mas tudo em vão, meu amor
não coube numa quadrinha.

” Vida “

01
“Quem canta os males espanta”
Disto, afinal, tenho prova,
pois meu sofrer hoje canta
e se desfaz numa trova.
02
O tal ditado é um conselho,
não te mostres desolado:
– “há sempre um chinelo velho
para um pé doente e cansado…”
03
Na sua inquieta beleza,
sob o mistério de um véu,
sua vida é uma asa presa
que há de soltar-se no céu.
04
Gota d’água transparente
que brilha, cresce… e que cai!
Assim a vida da gente
que num momento se vai…
05
Vida amarga! E na amargura
da vida, eu pensei, querida:
– quem dera a tua doçura
para adoçar minha vida!
06
Pobre alma triste e cativa!
E há quanta gente como eu
a pensar que ainda está viva,
sem saber que já morreu!
07
No carnaval de verdade,
da vida não tive nada…
– Quem dera a felicidade,
nem que fosse mascarada!
08
A vida – mistério vão –
sombra agora, depois luz.
Estranho traço de união
ligando um berço a uma cruz.

“Trovas de Saudades “

01
– “Quem espera desespera….”
– “Quem espera, sempre alcança…”
Ah, meu amor, quem me dera
esperar tendo esperança!
02
Definir a eternidade
é fácil, já a defini:
é o instante de saudade
e eu vivo longe de ti.
03
“Matar saudades”, querida
é uma expressão, simplesmente,
pois, em verdade, na vida,
saudade é que mata a gente
04
Vi teu retrato, – revivo
um velho amor que foi meu…
A saudade é um negativo
de foto que se perdeu…
05
Saudade, – estranha ilusão,
que a solidão recompensa,
presença no coração
maior que a própria presença…
06
Quando estas longe, querida,
na minha angústia sem fim,
saudade é o nome da vida
que morre dentro de mim…
07
A saudade, intimamente,
devagarzinho nos rói;
é uma emoção diferente,
como uma dor que não dói.
08
Nesse jardim de surpresas,
que foi o amor que me deste,
as violetas são tristezas,
minha saudade, um cipreste.
09
No peito dos marinheiros
nasceu , cresceu, emigrou…
Mas nos porões dos “negreiros”
foi que a saudade… chorou!
10
A vida passa e a saudade
passa a ser a vida ausente,
– é uma vaga claridade
de um clarão de antigamente…
11
Partiu com sonhos de glória!
Ficou com a dor e a tristeza!
Eis afinal toda a história
da saudade portuguesa!
12
A saudade é este vazio
que a vida, ao partir, deixou;
rio seco, que foi rio,
porque a água já secou…
13
Sempre fiel, e verdadeira
vigia da nossa dor,
ó saudade, companheira
dos solitários do amor…
14
Misto de pranto e alegria,
sol e chuva, sonho e dor,
a saudade é o sol num dia
de chuva, no nosso amor…
15
Longe o amor, quem pode amar?
Tudo é inquietude, aflição…
A saudade é falta de ar
asfixiando o coração…
16
A saudade me atormenta
e pesa como uma cruz,
– é como a sombra que aumenta
quanto mais se afasta da luz…
17
Persistente e fina dor,
sombra da felicidade,
ânsia e gemido de amor,
lembrança e espera… Saudade.
18
Saudade é fidelidade,
e eis como a imagem se explica:
partem o amor, a amizade,
todos partem… ela fica.
19
A vida passa e a saudade
passa a ser a vida ausente,
– é uma vaga claridade
de um clarão de antigamente…
20
Partiu com sonhos de glória!
Ficou com a dor e a tristeza!
Eis afinal toda a história
da saudade portuguesa!
21
A saudade é este vazio
que a vida, ao partir, deixou;
rio seco, que foi rio,
porque a água já secou…
22
Sempre fiel, e verdadeira
vigia da nossa dor,
ó saudade, companheira
dos solitários do amor…
23
Misto de pranto e alegria,
sol e chuva, sonho e dor,
a saudade é o sol num dia
de chuva, no nosso amor…
24
Longe o amor, quem pode amar?
Tudo é inquietude, aflição…
A saudade é falta de ar
asfixiando o coração…
25
A saudade me atormenta
e pesa como uma cruz,
– é como a sombra que aumenta
quanto mais se afasta da luz…
26
Persistente e fina dor,
sombra da felicidade,
ânsia e gemido de amor,
lembrança e espera… Saudade.
27
Saudade é fidelidade,
e eis como a imagem se explica:
partem o amor, a amizade,
todos partem… ela fica.

“Esperança”

01
– “Crê na vida!” – eis o conselho
da Esperança, ante a desgraça…
A face fria do espelho,
de calor ainda se embaça…
02
A vida – uma onda que avança
e volta – vai-vem do mar…
Quando vai, quanta esperança!
Quanta amargura, ao voltar!
03
No meu carro vou tranqüilo,
tenha a estrada sombra ou luz,
pois bem sei que, ao dirigi-lo,
eu dirijo… Deus conduz…
04
Na vida, de vez em quando,
em meio aos meus desatinos,
percebo Deus me falando
nas brônzeas bocas dos sinos.
05
Poesia, velha poesia
que o tempo não esmaece:
– um sino de Ave-Maria…
um por de sol… uma prece…
06
Os sinos, em badaladas,
são, na hora da Ave-Maria,
taças de bronze emborcadas
que entornam melodia…

” Variados “

01
Velhos mastros, a oscilar,
– nos céus, há estranhos violinos
que vossos arcos divinos
vão tocando sobre o mar!
02
Velhos mastros, verticais
como certos pensamentos,
vossas bandeiras de paz
são almas soltas aos ventos.
03
Quem tais acordes te pôs
nas rodas desengonçadas,
ó velho carro de bois,
sanfoneiro das estradas?
04
Obra prima. Adolescência,
como um sopro de alvorada.
Formas que nascem da essência
da beleza irrevelada.
05
Poesia: flor de mistério
que brota do coração,
e abre as pétalas de etéreo
no céu da imaginação.
06
Matemática esquisita
que das suas sempre faz,
somando dois, multiplica!
e são três, são quatro, ou mais!
07
Se a coisa dada, algum dia,
de nós não fosse tirada,
ainda assim, gente haveria
que nunca daria nada.
08
Ó vento, que em ti resumes
tudo quanto a vida tem:
– tu, que trazes perfumes,
levantas poeira também…
=========

Fonte:
Extraído de J.G. de Araujo Jorge. “Cantiga de Menino Grande”. 1962

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Heitor Saldanha (Poesias Escolhidas)

O ACIDENTE DE ONTEM

O menino levava um buquê de flores
e um cartão com endereço.
O bonde matou o menino.
Um horizontes de olhos
reuniu o sofrido instante.
Dentro da manhã de abril
alada em altas bandeiras,
o sangue escorria puro, simples,
sobre os trilhos de ferro
sobre as pedras da rua.
Ninguém leu o endereço do cartão.

ESTRUTURA DAS ÁGUAS
a Moacyr Félix

O mar é um cenário aberto
que derrapou no espaço,
e ancorou-se
de bruços
à espera de si mesmo.
Quando sonha se rascunha
lenta metamorfose.
Às vezes
vem,
é um galgo
com seu arco de triunfo,
Chega,
flue,
e dissuade
sua breve estrutura.
Outras vezes vem armado
duma carranca bovina,
Chega,
muge
e se estira
desarmado,
lascivo
Mas quando se recompõe
em placitude de espera,
é o campo do boi mugindo.

Hoje enquanto tiver dinheiro
beberei
Depois
entregarei ao garçom
meu relógio de pulso
meus carpins de nylon
meus óculos de tartaruga (que nome bonito)
minha caneta tinteiro
e continuarei bebendo
bebendo
sem literatura
sem poema
sem nada.
Só.
Como se o mundo começasse agora.
Estou nesses conscientes estados de alma
em que não posso me salvar
e nem salvá-la.

ANDAMENTO

De que estarei me despedindo hoje?
Há em mim uma clara ressonância de
despedida.
Mas não devo saber,
nem é preciso saber.
Creio que vim
pra dizer um dia
na cara do mundo:
hoje estou me despedindo.
E as criaturas boas do meu sangue
abririam a boca
que lhes cortasse o ímpeto inexpresso.
Claro que estou me despedindo.
Hoje sou mais criança do que nunca.
———-

Fontes:
A Hora Evarista, Instituto Estadual do Livro, Editora Movimento, Porto Alegre, 1974.
Antonio Hohlfeldt (seleção). Antologia da Literatura Rio-Grandense Contemporânea. vol. 2. Cronica e poesia. RS: L&PM, 1979.

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Heitor Saldanha (1910 – 1986)

Heitor Saldanha (Cruz Alta, 1910 — Porto Alegre, 1986) foi um poeta brasileiro.

É considerado um dos maiores poetas do Rio Grande do Sul. Participou, com vários outros autores, do Grupo Quixote, muito importante na década de 1950 em Porto Alegre.

Seus poemas, que mostram uma preocupação nítida com os problemas das classes oprimidas, estão reunidos no volume A Hora Evarista. Entre eles, se sobressaem aqueles reunidos em As Galerias Escuras, em que poetiza a vida dos carvoeiros de Arroio dos Ratos e Minas do Butiá.

Heitor Saldanha era fascinado pela vida dos homens trabalhadores em minas de carvão. Chegou a trabalhar numa dessas minas em São Jerônimo, na década de 1950, por dois anos e meio, segundo ele “na busca da poesia, embora não seja necessário que para se escrever sobre alguma coisa, se participe diretamente dela…” Quando os mineiros souberam que havia sido lançado um livro (As Galerias Escuras), presentearam Saldanha com uma lanterna de mina, ou “a luz que iluminava seus caminhos”.

Casado com a contista gaúcha Laura Ferreira, foi morar no Rio de Janeiro em 1958, permanecendo por doze anos na cidade. Lá tornou-se amigo de Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Ferreira Gullar e Décio Pignatari, entre outros, participando de inúmeros debates, encontros poéticos e muita agitação e boemia.

Participou de várias antologias e teve obras traduzidas para o espanhol.

Fontes:
– wikipedia.
– Desenho do escritor feito pelo artista plástico francês Michel Drouillon. Publicado no fascículo sobre o poeta da série Autores Gaúchos, do Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, 1984.

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Luis Fernando Verissimo (O Nariz)

Era um dentista, respeitadíssimo. Com seus quarenta e poucos anos, uma filha quase na faculdade. Um homem sério, sóbrio, sem opiniões surpreendentes mas uma sólida reputação como profissional e cidadão. Um dia, apareceu em casa com um nariz postiço. Passado o susto, a mulher e a filha sorriram com fingida tolerância. Era um daqueles narizes de borracha com óculos de aros pretos, sombrancelhas e bigodes que fazem a pessoa ficar parecida com o Groucho Marx. Mas o nosso dentista não estava imitando o Groucho Marx. Sentou-se à mesa do almoço – sempre almoçava em casa – com a retidão costumeira, quieto e algo distraído. Mas com um nariz postiço.

– O que é isso? – perguntou a mulher depois da salada, sorrindo menos.
– Isso o quê?
– Esse nariz.
– Ah. Vi numa vitrina, entrei e comprei.
– Logo você, papai…

Depois do almoço, ele foi recostar-se no sofá da sala, como fazia todos os dias. A mulher impacientou-se.

– Tire esse negócio.
– Por quê?
– Brincadeira tem hora.
– Mas isto não é brincadeira.

Sesteou com o nariz de borracha para o alto. Depois de meia hora, levantou-se e dirigiu-se para a porta. A mulher o interpelou.

– Aonde é que você vai?
– Como, aonde é que eu vou? Vou voltar para o consultório.
– Mas com esse nariz?
– Eu não compreendo você – disse ele, olhando-a com censura através dos aros sem lentes. – Se fosse uma gravata nova você não diria nada. Só porque é um nariz…
– Pense nos vizinhos. Pense nos cliente.

Os clientes, realmente, não compreenderam o nariz de borracha. Deram risadas (“Logo o senhor, doutor…”) fizeram perguntas, mas terminaram a consulta intrigados e saíram do consultório com dúvidas.

– Ele enlouqueceu?
– Não sei – respondia a recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos. – Nunca vi ele assim.

Naquela noite ele tomou seu chuveiro, como fazia sempre antes de dormir. Depois vestiu o pijama e o nariz postiço e foi se deitar.

– Você vai usar esse nariz na cama? – perguntou a mulher.
– Vou. Aliás, não vou mais tirar esse nariz.
– Mas, por quê?
– Por quê não?

Dormiu logo. A mulher passou metade da noite olhando para o nariz de borracha. De madrugada começou a chorar baixinho. Ele enlouquecera. Era isto. Tudo estava acabado. Uma carreira brilhante, uma reputação, um nome, uma família perfeita, tudo trocado por um nariz postiço.

– Papai…
– Sim, minha filha.
– Podemos conversar?
– Claro que podemos.
– É sobre esse nariz…
– O meu nariz outra vez? Mas vocês só pensam nisso?
– Papai, como é que nós não vamos pensar? De uma hora para outra um homem como você resolve andar de nariz postiço e não quer que ninguém note?
– O nariz é meu e vou continuar a usar.
– Mas, por que, papai? Você não se dá conta de que se transformou no palhaço do prédio? Eu não posso mais encarar os vizinhos, de vergonha. A mamãe não tem mais vida social.
– Não tem porque não quer…
– Como é que ela vai sair na rua com um homem de nariz postiço?
– Mas não sou “um homem”. Sou eu. O marido dela. O seu pai. Continuo o mesmo homem. Um nariz de borracha não faz nenhuma diferença.
– Se não faz nenhuma diferença, então por que usar?
– Se não faz diferença, porque não usar?
– Mas, mas…
– Minha filha…
– Chega! Não quero mais conversar. Você não é mais meu pai!

A mulher e a filha saíram de casa. Ele perdeu todos os clientes. A recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos, pediu demissão. Não sabia o que esperar de um homem que usava nariz postiço. Evitava aproximar-se dele. Mandou o pedido de demissão pelo correio. Os amigos mais chegados, numa última tentativa de salvar sua reputação, o convenceram a consultar um psiquiatra.

– Você vai concordar – disse o psiquiatra, depois de concluir que não havia nada de errado com ele – que seu comportamento é um pouco estranho…
– Estranho é o comportamento dos outros! – disse ele. – Eu continuo o mesmo. Noventa e dois por cento de meu corpo continua o que era antes. Não mudei a maneira de vestir, nem de pensar, nem de me comportar, Continuo sendo um ótimo dentista, um bom marido, bom pai, contribuinte, sócio do Fluminense, tudo como era antes.
– Mas as pessoas repudiam todo o resto por causa deste nariz. Um simples nariz de borracha. Quer dizer que eu não sou eu, eu sou o meu nariz?
– É… – disse o psiquiatra. – Talvez você tenha razão…

O que é que você acha, leitor? Ele tem razão? Seja como for, não se entregou. Continua a usar nariz postiço. Porque agora não é mais uma questão de nariz. Agora é uma questão de princípios.

Fonte:
Luis Fernando Verissimo. O Nariz e outras cronicas. Ed. Ática, 2003.

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Mario Quintana (O Chalé da Praça Quinze)

O chalé fazia parte da gente. Me lembro do Bilo, com o seu perfil perpendicular de cegonho sábio, o longo bico mergulhado – não no gargalo do gomil da fábula, não propriamente no canecão de chop, que era de fato o que estava acontecendo – mas no poço artesiano de si mesmo.

Me lembro do Reynaldo, redondo, pacato, amável, tão amável, pacato e redondo que parecia um desses personagens de romance policial que ninguém desconfia que seja o autor do último crime da mala.

Me lembro do Cavalcanti com a sua cara silenciosa e receptiva de mata-borrão.

Me lembro de mim, silencioso. Sim, a determinada hora éramos todos silenciosos…essa hora em que não é preciso dizer nada, nem mesmo o verso inesquecível de Valery: “Oh mon bom compagnon de silence”.

Este silêncio era apenas quebrado quando chegava o Athos, o Athos centrífugo e pirotécnico. Mas isso não perturbava o nosso silêncio, nem o próprio silêncio do Athos…Pois havia um profundo e misterioso rio de silêncio que corria subterraneamente a todas as nossas palavras.

Era o rio da poesia?

O rio da harmoniosa confusão das almas?

Agora é apenas o rio do tempo que passou.

Fonte:
Antonio Hohlfeldt (seleção). Antologia da Literatura Rio-Grandense Contemporânea. vol. 2. poesia e crônica. RS: L&PM, 1979.

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Armindo Trevisan (Poesias Escolhidas)

NÃO ESCOLHI A COR DE MINHA PELE
(tradução da poesia, do espanhol, por José Feldman)

Não escolhi a cor de minha pele
que é igual a pele de qualquer homem
ela que me envolve por todos os lados
mas, dentro desta pele estou eu: um negro!

Tenho a mesma imagem e semelhança
de homens que possuem outra cor de pele
e eu sei que foi o sol que me queimou
para fazer-me mais resistente e mais formoso.

Como negro, eu habitei um continente
amaldiçoado durante séculos,
fui perseguido por outros homens
e, algumas vezes, também perseguido por homens de minha cor.

Que profundas são as feridas que sangram,
dentro e fora de mim! Pode acaso esquecer
o látego, os suplícios e a morte
daquele tempo em que cobiçavam meu ouro e meu marfim?

Eu sei que nada me serve crucificar-me
em minha propria historia! Nem com fúria selvagem
sonhar a destruição de meus perseguidores.
Antes de ser negro, eu sou simplesmente um homem.

Minha gloria é elevar-me à altura
das palmeiras de meus desertos,
e, quando bradem os leões, deixar-me
ao largo dos rios que inundam minhas florestas.

Não escolhi a cor de minha pele!
Vejo que a noite borbulha de estrelas,
e que a lua, mais que o sol, suaviza
os recantos inacessíveis de minha alma.

Sempre foram brancos vossos Deuses e vossos anjos!
Meu coração sabe que o espírito voa
tão veloz que não se consegue ver sua cor .
Sim! A cor de Deus é a cor do vento.

Eu sou negro e eu sou homem! Agora
que a história abriu aos poucos suas portas
eu posso, pela primeira vez, ser um homem negro.
A humanidade se tornou maior comigo.

Me toca a responsabilidade de perdoar
Eu que não posso tirar, para sempre,
de sobre os ombros de homens vivos: eu com eles
carregar meu fardo até a grande Aurora.

Não escolhi a cor de minha pele
Que é igual a pele de qualquer homem!
Voces também compreenderão que o sangue dos homens
está debaixo da pele, e é um rio de fogo.

Posto que sou um homem livre, me amo
como se ama a vida, que também oferece
a brancura dos dentes para sorrir.
A vida – que nos submerge em sua noite luminosa.

A LUZ DE TUA PELE

À luz de tua pele invento a noite.
Nela me embrenho até à morte alheia.
Ninguém é mais sozinho do que o açoite
que apaga tua luz, e me incendeia.

SOBRE AS PLUMAS

Sobre as plumas da noite quando, amada,
a carne lhe varria o pensamento,

olhou à sua volta, e viu na estrada
os ossos de milhões que a lua ungia:

crematórios, bengalas, dentaduras,
retratos esmaecidos, tristes óculos …

E meditou no sonho e na loucura.
Como podia amar uma outra carne

se a carne, donde lhe nascera o sexo,
era esse fogo que lavrava forte

nos campos e cidades, semeando
vitríolo e estrume com a mão da morte?

QUISERAM HOSPEDAR-SE

Quiseram hospedar-se no silêncio,
que embriaga o amor depois que os corpos lassos
derramam o perfume de seu vinhos.

Mas não puderam. Triste e sozinhos,
falaram de si mesmos como ausentes.

EMBORA TUA CARNE

Embora tua carne seja a mesma:
quem põe no teu braseiro outro carvão,
e irrita a flama que se torna azul
para variar de língua e de bailado?

Quem faz girar o teu robolo, e afia
a lâmina que não te deixa fria?

O TRÂNSITO

Que fica deste trânsito? É a seda
com sua larva dentro do casulo,

cobrindo a solidão. E, no seu músculo,
a forte pontaria de uma flecha

que, no ar gelado e azul, abate e ave,
sem destruir-lhe vôo tão suave.

A QUEM TE ALÇA

A quem te alça às nuvens, desvalida,
doas teu corpo. E apóias tua mão

numa outra mão, ciente de que o coito
é uma aventura de soldado afoito.

Pois essa subita valentia
te reconduz aos pés da noite fria,

onde tua mão é garra de animal:
e vence, de ambos, quem não desconfia.

REFÚGIO

Às praias dão garrafas com mensagens,
ou tábuas em que flutuaram náufragos.

Às praias dão navios com equipagens,
pinguins, baleias que se desnortearam.

Não é diverso o porto de teus lábios:
ali também vão dar tristes suspiros,

Gemidos, alaridos, menoscabos,
e a alegria de giros e regiros

em que te perdes quando amas de fato,
e o teu corpo se rende a um ultimato.

PRIMAVERA

Por que será que penso nos teus lábios
quando avisto, em quintais, limões maduros?

Serão eles, dobrados sobre os muros,
Livreiros que esquadrinham alfarrábios?

Ou hão de perecer polidos cabos
Rumorejando sobre os ares puros?

Eu sempre penso nos limões: dourados,
Guardam-se incorruptíveis, e fechados.

QUEM DIRÁ AOS AMANTES

Quem dirá aos amantes
o caminho
pelo qual os corpos vão
ao termo do que souberam?
E depois foi noção,
espaço, letra,
e não quiseram o retorno?
Quem os aguardará do outro lado
onde o riso,
a aveia, são o preâmbulo
da carícia no seio?

Quem dirá aos
amantes que o amor há de despir
o acontecido
e passará pela mão
como passou o frio
de flor em flor?

POEMA QUE COMEÇA EM SÁBADO

Foi então que as ervas
se dobraram a língua dos cactos enrugou-se
e subiram pelos telhados os pombos

e ambos na medula da noite ao pé do copo
e da lâmpada resolveram amar-se por toda
a eternidade e isto durou até à véspera do sim

e o não reboou
silenciosamente dentro da boca onde um beijo
polia os ossos o homem apalpou-se e por fim
rolaram em cima dessa coisa chamada mundo

e houve um mundo chamado amor.

SALMO NUPCIAL

Sejas visível
Senhor

quando a carne
de outra carne
florescer na minha

e um enxame
de abelhas brancas
beber no umbigo
dela

e nossa escuridão
servir à noite

e erguermos
à altura do mundo

a solidão
dos animais.
—————–

Fontes:
Armindo Trevisan. A Dança do Fogo. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2001.
Armindo Trevisan. Abajur de Píndaro & Fabricação do Real. São Paulo: Edições Quíron; INL, 1975

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Armindo Trevisan (1933)

Nasceu em Santa Maria, RS, em 1933.

Doutorou-se em Filosofia pela Universidade de Fribourg, Suíça, com a tese Ensaio sobre o problema da criação em Bergson (1963).

Nesse mesmo ano, fez curso de aperfeiçoamento em Paris.

De 1969 a 1970, e de setembro de 1974 a fevereiro de 1975, foi bolsista da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Atuou como Professor Adjunto de História da Arte e Estética na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, de 1973 a 1986.

Lecionou, também, no curso de pós-graduação em Artes Visuais da UFRGS até 2000.

Entretanto, é a religiosidade que permeia toda a sua obra, mesmo em seus versos mais sexuais. E é esse criticismo social e político entrelaçado com um sensual lirismo religioso que faz sua obra merecedora de vários prêmios.

E é esse criticismo social e político entrelaçado com um sensual lirismo religioso que faz sua obra merecedora de vários prêmios. Entre eles o Prêmio Gonçalves Dias da União Brasileira de Escritores por seu primeiro livro de poesias, “A surpresa do ser”, publicado em 1967 e em cuja comissão julgadora se incluíam Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e Cassiano Ricardo, o prêmio nacional de Brasília pelo livro “O abajur de Píndaro” em 1972 e o prêmio APLUB de Literatura 1996-1997 pelo livro “A dança do fogo”.

Mas além de poesias, também escreve alguns ensaios ao longo de sua trajetória, bem como contribui com alguns jornais, entre 1967 e 1982, em Brasília (DF), Petrópolis (RJ), Porto Alegre (RS), São Paulo, Rio de Janeiro e Portugal, bem como com algumas revistas em ambos os países.

Este poeta e ensaísta tem obras traduzidas em várias línguas, principalmente alemão, italiano, espanhol e inglês, rompendo as fronteiras geográficas da cultura brasileira.

Foi escolhido como patrono da 47″ Feira do Livro de Porto Alegre.

Poesias:
A surpresa de ser (1967),
A imploração do nada (1971),
Funilaria no ar (1973),
Corpo a corpo (1973),
O abajur de Píndaro / A fabricação do real (1975),
Em pele e osso (1977),
O ferreiro harmonioso (1978),
O rumor do sangue, 1979,
A mesa do silêncio (1982),
O moinho de Deus (1985),
Antologia poética (1986),
A dança do fogo (1995),
Os olhos da noite (1997),
O canto das criaturas (1998),
Orações para o novo milênio (1999).

ENSAIOS
– Essai sur le problème de la création chez Bérgson – Fribourg, Suíça, 1963
– A escultura dos sete povos – Porto Alegre, 1978
– Os sete povos das Missões – Série: Raízes gaúchas, III volume – Porto Alegre, 1980
– Escultores contemporâneos do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, 1982
– Os sete povos das Missões – Porto Alegre, 1984
– A dança do sozinho – uma análise da arte abstrata – São Paulo, 1988
– Como apreciar a arte – do saber ao sabor: uma síntese possível – Porto Alegre, 1990
– Reflexões sobre a poesia – Porto Alegre, 1993
– A sombra luminosa – ensaios de estética cristã – Petrópolis, 1995
– A poesia: uma iniciação à leitura poética – Porto Alegre, 2000

Fontes:
http://revistaentrelivros.uol.com.br
http://www.ufsm.br/literaturaehistoria/armindotrevisan.html

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Caravana da Leitura nas praças públicas de Avaré e Região

O projeto é aberto a estudantes e ao público em geral e consiste na venda de livros por um preço simbólico.

O projeto “Caravana da Leitura” criado pelo escritor Laé de Souza, depois de percorrer mais de 60 cidades brasileiras chega a diversas cidades do interior de São Paulo. Aplicado desde 2004, em parceria com as Secretarias de Educação e de Cultura dos municípios e apoio do Ministério da Cultura, o trabalho acontecerá nos municípios de Itaporanga, Itaí, Piraju, Cerqueira César e Avaré, entre os dias 22 a 27 de março.

Até o final de 2010 o público terá a oportunidade de conferir a passagem da “Caravana” em diferentes praças públicas do país, oferecendo livros para o público infantil, juvenil e adulto, pelo valor simbólico de R$1,99. O projeto reúne uma grande variedade de obras literárias do escritor Laé de Souza, apresentando histórias do cotidiano, em uma linguagem bem-humorada e pontuada por reflexões.

Aos amantes da literatura, a atividade oferece uma ótima oportunidade para rechear a estante e saciar o desejo de boa cultura. De acordo com Laé de Souza, idealizador do projeto, a ação é inédita e tem como objetivo gerar oportunidades de leitura a pessoas de todas as idades e classes sociais. “Buscamos quebrar o estigma que o brasileiro não gosta de ler. O brasileiro gosta de ler sim, o que lhe falta é oportunidade e acessibilidade aos livros que infelizmente custam muito caro no Brasil. O Caravana da Leitura vai na contramão dessa fórmula errada”, esclarece Laé de Souza.

Este ano, o evento deverá passar por mais de 40 cidades dos estados de São Paulo e Bahia com previsão de distribuição de cerca de 120 mil livros. “O objetivo do trabalho é levar cultura e incentivar o hábito da leitura em todo o Brasil. Dessa forma acreditamos que a leitura pode ser democratizada”, destaca Laé de Souza.

Como funciona o projeto?

Para realização das atividades uma tenda é montada em praça pública, com a exposição de muitos livros. Como numa feira livre, além de estudantes convidados para o evento, as pessoas podem circular, pegar e obter orientações de uma equipe multidisplinar que auxilia aos leitores na escolha das obras. A idéia da tenda é aproximar as pessoas de forma livre e sem compromisso, permitindo que elas sintam-se parte integrante desse grande movimento em prol da leitura.

Interessados poderão conhecer outros projetos de incentivo à leitura, de Laé de Souza e o roteiro da Caravana da Leitura, em “Agenda”, no site http://www.projetosdeleitura.com.br/

Fonte:
Colaboração de Laé de Souza.

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II Conferencia Nacional de Cultura

PROPOSIÇÕES APROVADAS NA II CONFERÊNCIA NACIONAL DE CULTURA

II CONFERÊNCIA NACIONAL DE CULTURA ELEGE 32 PRIORIDADES PARA O SETOR

Após três dias de debates, os participantes da II Conferência Nacional de Cultura (CNC), realizada em Brasília, elegeram as 32 prioridades que nortearão as políticas públicas para o setor. As prioridades setoriais foram aprovadas por unanimidade no plenário pela manhã.

Presente ao Centro de Convenções e Eventos Brasil 21 durante os trabalhos na tarde deste domingo, o ministro da Cultura, Juca Ferreira, reafirmou o grande mérito da Conferência: promover o acesso de todos à discussão e formulação das políticas públicas. “A democracia e a inclusão têm sido uma grande preocupação do governo e do ministério da Cultura”.

As prioridades eleitas serão tratadas uma a uma, de acordo com sua natureza. Algumas poderão servir para incrementar políticas públicas já existentes, outras devem se transformar em projetos de lei para envio ao Congresso Nacional ou, ainda, integrarem ações interministeriais de estímulo a áreas afins, como cultura e educação, por exemplo.

Ao todo, foram analisadas 347 propostas pelos participantes da conferência, dentre os quais artistas, produtores culturais, investidores, gestores e representantes da sociedade de todos os setores da cultura e de todos os estados do País. Dos 883 delegados credenciados, 851 votaram por meio de cédulas nas propostas prioritárias.

A aprovação do marco regulatório da Cultura, que já tramita no Congresso Nacional, foi a proposta mais votada (754 votos). O marco é composto principalmente pelo Sistema Nacional de Cultura (SNC), Plano Nacional de Cultura (PNC) e proposta de emenda constitucional (PEC) 150/2003, que vincula à Cultura 2% da receita federal, 1,5% das estaduais e 1% das municipais. A proposta também explicita o apoio à aprovação do Programa de Fomento e Incentivo à Cultura (Procultura), que atualiza a Lei Rouanet.

A Conferência aponta a urgência de se construir um marco regulatório para a cultura brasileira. É uma demanda legítima da sociedade, que prioriza a agenda cultural em todas as esferas de governo. Demos um grande passo para fortalecer definitivamente a importância dessa políticas para o desenvolvimento sustentável do país”, explica a coordenadora executiva da Conferência, Silvana Meireles.

Os debates da Conferência seguiram cinco eixos temáticos: produção simbólica e diversidade cultural; cultura, cidade e cidadania; cultura e desenvolvimento sustentável; cultura e economia criativa; gestão e institucionalidade da cultura.

Entre os destaques estão a formalização do trabalho na cultura, o incentivo ao ensino de arte nas escolas, o reconhecimento de um “custo amazônico” como fator que onera as iniciativas culturais devido a questões geográficas e logísticas da região – a ser incluído em editais de novos projetos -, a ampliação do acesso à internet e a necessidade de reformulação da Lei de Direitos Autorais. O marco legal para os Pontos de Cultura e a Lei Griô Nacional também estiveram entre as propostas mais votadas.

Esse é um momento de afirmação da cultura. Esse tema não será mais subalterno. Claro que todas as outras pastas são importantes, mas nada se realiza sem cultura”, afirma Juca Ferreira, ressaltando que neste ano o ministério terá orçamento recorde, o equivalente a 1% do total de impostos arrecadados pela União.

Pré-conferências

Todos os estados realizaram suas conferências, elegendo 743 delegados ao todo. Mais de 200 mil pessoas estiveram diretamente envolvidas nas etapas estaduais e municipais. Novidade nesta edição, as conferências setoriais – 143 no total – tiveram 3.193 inscrições de candidatos a delegados. Além de deliberar, esses encontros têm o objetivo de estimular a criação e o fortalecimento de redes de agentes e instituições culturais do País.

I CNC

Em sua primeira edição, em 2005, 1.192 municípios realizaram conferências, o que representou 21,42% do total das cidades brasileiras. Nesta segunda Conferência, nas etapas municipais e estaduais, observou-se um significativo avanço no processo participativo, uma vez que, de agosto a outubro de 2009, aconteceram 3.071 reuniões, ou seja, mais da metade do total dos municípios do País estiveram envolvidos.

PROPOSTAS PRIORITÁRIAS

EIXO1: PRODUÇÃO SIMBÓLICA E DIVERSIDADE CULTURAL
SUB–EIXO: 1.1 – Produção de Arte e Bens Simbólicos
1 – Implementar políticas de intercâmbio em nível regional, nacional e internacional entre os segmentos artísticos e culturais englobando das manifestações populares tradicionais às contemporâneas que contemplem a realização de mostras, feiras, festivais, oficinas, fóruns, intervenções urbanas, dentre outras ações, estabelecendo um calendário anual que interligue todas as regiões brasileiras, com ampla divulgação, priorizando os grupos mais vulneráveis às dinâmicas excludentes da globalização, com o objetivo de valorizar a diversidade cultural.
6 – Registrar, valorizar, preservar, e promover as manifestações de comunidades e povos tradicionais (conforme o decreto federal 6.040 de 7 de fevereiro de 2007), itinerantes, nômades, das culturas populares, comunidades ayahuasqueiras, LGBT, de imigrantes, entre outros com a difusão de seus símbolos, pinturas, instrumentos, danças, músicas, e memórias dos antigos, por meio de apresentações ou produção de CDs, DVDs, livros, fotografias, exposições e audiovisuais, incentivando o mapeamento e inventário das referencias culturais desses grupos e comunidades.

SUB–EIXO: 1.2 – Convenção da Diversidade e Diálogos Interculturais
17 – Garantir políticas públicas de combate à discriminação, ao preconceito e à intolerância religiosa por meio de: a) campanhas educativas na mídia, em horário nobre, mostrando as diversas raças e etnias existentes em nosso país, ressaltando o caráter criminoso da discriminação racial; b) demarcação de terras das populações tradicionais (ribeirinhos, seringueiros, indígenas e quilombolas), estendendo serviços sociais e culturais a essa população, a fim de garantir sua permanência na terra; c) campanhas contra homofobia visando respeito a diversidade sexual e identidades de gênero.
18 – Implementar a Convenção da Diversidade Cultural por meio de ações sócio-educativas nas diversas linguagens culturais (literatura, dança, teatro, memória e outras), e as linguagens especificas próprias dos povos e culturas tradicionais, conforme o decreto federal 6.040 de 7 de fevereiro de 2007 dirigidas a públicos específicos: crianças, jovens, adultos, melhor idade.

SUB – EIXO: 1.3 – Cultura, Educação e Criatividade
22 – Articular a política cultural (MINC e outros) com a política educacional (MEC e outros) nas três esferas governamentais para elaborar e implementar conteúdos programáticos nas disciplinas curriculares e extracurriculares dedicados à cultura, à preservação do patrimônio, memória e à história afro-brasileira, indígena e de imigrantes ao desenvolvimento sustentável e ao ensino das diferentes linguagens artísticas, inclusive arte digital e línguas étnicas do território nacional, de matriz africana e indígena, e ao ensino de línguas, inserindo-os no Plano Nacional de Educação,sob a perspectiva da diversidade e pluralidade cultural, nas escolas, desde o ensino fundamental, universidades públicas e privadas com a devida capacitação dos profissionais da educação, por meio da troca de saberes com os mestres da cultura popular nos sistemas municipais, estaduais e federais, bem como (26) Garantir condições financeiras e pedagógicas para a efetiva aplicação da disciplina “Língua e Cultura Local”.
36 – Instituir a lei Griô, que estabelece uma política nacional de transmissão dos saberes e fazeres de tradição oral, em diálogo com a educação formal, para promover o fortalecimento da identidade e ancestralidade do povo brasileiro, por meio do reconhecimento político, econômico e sociocultural dos Grios Mestres e Mestras da tradição oral, acompanhado por uma proposta de um programa nacional, a ser instituído, regulamentado e implantado no âmbito do MINC e do Sistema Nacional de Cultura.

SUB–EIXO: 1.4 – Cultura, Comunicação e Democracia
63 – Garantir que o acesso a internet seja realizado em regime de serviço publico e avançar com a formulação e implantação do plano nacional de banda larga contemplando as instituições culturais e suas demandas por aplicação e serviços específicos.
68. Regulamentar e implementar o capitulo da comunicação social na Constituição Federal, tendo em vista a integração das políticas de comunicação e cultura, em especial o artigo 223, que garante a complementaridade dos sistemas publico, privado e estatal. Fortalecer as emissoras de radio e TV do campo público (comunitárias, educativas, universitárias e legislativas) e incentivar a produção simbólica que promova a diversidade cultural e regional brasileira, produzida de forma independente. Implantar mecanismos que viabilizem o efetivo controle social sobre os veículos do campo público de comunicação e criar um sistema de financiamento que articule a participação da união, estados e municípios.

EIXO 2: CULTURA, CIDADE E CIDADANIA
SUB-EIXO 2.1: Cidade como fenômeno cultural
80 – Estabelecer uma política nacional integrada entre os governos federal, estaduais, municipais e no Distrito Federal, visando a criação de fontes de financiamento, vinculação e repasses de recursos que permitam a instalação, construção, manutenção e requalificação de espaços e complexos culturais com acessibilidade plena: teatros, bibliotecas, museus, memoriais, espaços de espetáculos, de audiovisual, de criação, produção e difusão de tecnologias e artes digitais, priorizando a ocupação dos patrimônios da união, dos estados, municípios e do Distrito Federal em desuso no país.
83 – Criar marco regulatório (Lei Cultura Viva) que garanta que os Pontos de Cultura se tornem política de Estado garantindo a ampliação no número de Pontos contemplando ao menos um em cada município brasileiro e Distrito Federal, priorizando populações em situação de vulnerabilidade social de modo a fortalecer a rede nacional dos Pontos de Cultura.
SUB–EIXO: 2.2 – Memória e Transformação Social
101 – Incluir na agenda política e econômica da União, estados, municípios e no Distrito Federal o fomento à leitura por meio da criação de bibliotecas públicas, urbanas e rurais em todos os Municípios, com fortalecimento e ampliação dos acervos bibliográficos e arquivísticos, infraestrutura, acesso a novas tecnologias de inclusão digital, capacitação de recursos humanos, bem como ações da sociedade civil e da iniciativa privada,com objetivo de democratizar o acesso à cultura oral, letrada e digital.
112 – Propiciar condições plenas de funcionamento ao Ibram de modo a garantir com sua atuação, que os museus brasileiros sejam consolidados como territórios de salvaguarda e difusão de valores democráticos e de cidadania, colocadas a serviço da sociedade com o objetivo de propiciar o fortalecimento e a manifestação das identidades, a percepção crítica e reflexiva da realidade, a produção de conhecimento, a promoção da dignidade humana e oportunidades de lazer.
SUB–EIXO: 2.3 – Acesso, Acessibilidade e Direitos Culturais
124 – Criar dispositivos de atualização da lei de direitos autorais em consonância com os novos modos de fruição e produção cultural que surgiram a partir das novas tecnologias garantindo o livre acesso a bens culturais compartilhados sem fins econômicos desde que não cause prejuízos ao(s) titular(es) da obra, facilitando o uso de licenças livres e a produção colaborativa, considerando a transnacionalidade de produtos e processos de forma que se atinja o equilíbrio entre o direito da sociedade de acesso a informação e a cultura e o direito do criador de ter sua obra protegida, assim como o equilíbrio entre os interesses do autor e do investidor.
131 – Assegurar a destinação dos recursos do Fundo Social do Pré-sal para a cultura, aos programas de sustentabilidade e desenvolvimento do Sistema Nacional de Cultura, ampliando os investimentos nos programas que envolvam conveniamentos entre União, Estados, Municípios e Distrito Federal.

EIXO 3: CULTURA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
SUB–EIXO: 3.1 – Centralidade e Transversalidade da Cultura
140 – Implementar e fortalecer as políticas culturais dos estados, a fim de promover o desenvolvimento cultural sustentável, reconhecendo e valorizando as identidades e memórias culturais locais – incluindo regulamentação de profissões de mestres detentores e transmissores dos saberes e fazeres tradicionais, ampliando as ações intersetoriais e transversais por meio das interfaces com a educação, economia, comunicação, turismo, ciência, tecnologia, saúde e meio ambiente, segurança pública e programas de inclusão digital, com estímulo a novas tecnologias sociais de base comunitária.
141 – Incentivar a criação e manutenção de ambientes lúdicos, para o desenvolvimento de atividades artísticas e culturais em escolas públicas e espaços educacionais sem fins lucrativos, museus, hospitais, casas de saúde, instituições de longa permanência, entidades de acolhimento e abrigos, CAPs, CAPs – AD (Centro de Atenção Psicossocial), centros de recuperação de dependentes químicos e de ressocialização de presos (Apacs) e presídios.
SUB–EIXO: 3.2 – Cultura, Território e Desenvolvimento Local
152 – Promover, em articulação com o MEC, organizações governamentais e não governamentais, a criação de cursos técnicos e programas de capacitação na área cultural para o desenvolvimento sustentável.
154 – Fomentar e ampliar observatórios e as políticas culturais participativas com o objetivo de produzir inventários, pesquisas e diagnósticos permanentes, também em parceria com universidades e instituições de pesquisa, subsidiando políticas públicas de cultura, articuladas intersetorialmente e territorialmente, com ações capazes de preservar os patrimônios cultural e natural, inserindo as histórias locais nos conteúdos das instituições educacionais, identificando e valorizando as tradições e diversidade culturais locais, aproximando os movimentos culturais das questões sociais e ambientais, contribuindo assim para o desenvolvimento sustentável local e a redução das desigualdades regionais.
SUB–EIXO: 3.3 – Patrimônio Cultural, Meio Ambiente e Turismo
165 – Promover e garantir o reconhecimento, a defesa, a preservação e a valorização do patrimônio cultural, natural e arquivístico a partir de inventários e estudos participativos, em especial nas comunidades tradicionais, estimulando o turismo comunitário sustentável, por meio da articulação interministerial com participação popular, que crie parâmetros para a atuação nessa vertente da economia da cultura e destine recursos, inclusive por meio de editais, para a implantação e o fortalecimento de roteiros turísticos que articulem patrimônio cultural, memórias, meio ambiente, tecnologias, saberes e fazeres, valorizando a mão-de-obra local/regional, com a realização de ações voltadas para a formação, gestão e processos de comercialização da produção artístico-cultural da região.
175 – Valorizar as tradições culturais dos 5 biomas,o, como forma de proteção e sustentabilidade, bem como garantir a melhoria e conservação das vias de acesso a todos os municípios, revelando e valorizando suas potencialidades turísticas e culturais, com sua difusão em museus, sites específicos e redes sociais, preservando o patrimônio material e imaterial, regulamentando em lei o cerrado e demais biomas como patrimônio cultural.

EIXO 4: CULTURA E ECONOMIA CRIATIVA
SUB–EIXO: 4.1 – Financiamento da Cultura
187 – Com base no art. 3º inciso III da Constituição brasileira que estabelece a redução das desigualdades sociais e regionais, que seja garantido o reconhecimento do “custo amazônico” pelos órgãos gestores da cultura em projetos culturais, editais e leis de incentivo, em especial pelo Fundo Nacional de Cultura, assegurando dotação específica e diferenciada para os estados da Amazônia Legal, considerando as dimensões continentais, as diferenças geográficas e humanas e as dificuldades de comunicação e circulação na região, incluindo o Custo Amazônico na Lei Rouanet no Fundo Amazônia.
192 – Garantir, com a aprovação da PEC 150/2003, ainda neste semestre, as políticas de fomento e financiamento, via editais, dos processos de criação, produção, consumo, formação, difusão e preservação dos bens simbólicos materiais, imateriais e tradicionais (indígenas, ribeirinhas, afrodescendentes, quilombolas e outros) e contemporâneas (de vanguarda e emergentes), facilitando a mostra de suas obras artísticas, garantindo direitos autorais e registrando os artistas e suas obras como patrimônio nacional.
SUB–EIXO: 4.2 – Sustentabilidade das Cadeias produtivas
230 – Ampliar os recursos públicos e privados, para a sustentabilidade das cadeias criativas e produtivas da cultura, valorizando as potencialidades regionais e envolvendo todos os setores da sociedade civil e do poder público no processo de criação, produção e circulação dos bens e produtos culturais, objetivando ampliar a circulação e a exportação dos produtos culturais brasileiros.
236 – Criar um programa nacional (por região) de capacitação de agentes e empreendedores culturais, com foco nas cadeias produtivas, contemplando a elaboração e gestão de projetos, captação de recursos e qualificação técnica e artística, ofertando oficinas, cursos técnicos e de graduação, em parceria com as Instituições de Ensino Superior (IES).
SUB–EIXO: 4.3 – Geração de Trabalho e Renda
250 – Regulamentar as profissões da área cultural, criando condições para o reconhecimento de direitos trabalhistas, previdenciários no campo da arte, da produção e da gestão cultural, incluindo os profissionais da cultura em atividades sazonais.
252 – Investir na profissionalização dos trabalhadores da cultura, através da ampliação dos cursos de nível superior, técnicos e profissionalizantes, realizar concursos públicos em todas as esferas governamentais para o setor, equiparando nestes concursos o piso salarial de nível superior à carreira especialista em gestão pública ou equivalente e incluindo o reconhecimento de novas áreas de formação relacionadas ao campo.

EIXO 5: GESTÃO E INSTITUCIONALIDADE DA CULTURA
SUB–EIXO: 5.1 – Sistemas Nacional, Estaduais, Distrital e Municipais de Cultura
262 – Consolidar, institucionalizar e implementar o Sistema Nacional de Cultura (SNC), constituído de órgãos específicos de cultura, conselhos de política cultural (consultivos , deliberativos e fiscalizadores), tendo, no mínimo, 50% de representantes da sociedade civil eleitos democraticamente pelos respectivos segmentos, planos e fundos de cultura, comissões intergestores, sistemas setoriais e programas de formação na área da cultura, na União, Estados, Municípios e no Distrito Federal, garantindo ampla participação da sociedade civil e realizando periodicamente as conferências de cultura e, especialmente, a aprovação pelo Congresso Nacional da PEC 416/2005 que institui o Sistema Nacional de Cultura, da PEC 150/2003 que designa recursos financeiros à cultura com vinculação orçamentária e da PEC 049/2007, que insere a cultura no rol dos direitos sociais da Constituição Federal, bem como dos projetos de lei que instituem o Plano Nacional de Cultura e o Programa de Fomento e Incentivo a Cultura-Procultura e do que regulamenta o funcionamento do Sistema Nacional de Cultura.
279 – Criar um sistema nacional de formação na área da cultura, integrado ao SNC, articulando parcerias públicas e privadas, a fim de promover a atualização, capacitação e aprimoramento de agentes e grupos culturais, gestores e servidores públicos, produtores, conselheiros, professores, pesquisadores, técnicos e artistas, para atender todo o processo de criação, fruição, qualificação dos bens, elaboração e acompanhamento de projeto, captação de recursos e prestação de contas, garantindo a formação cultural nos níveis básico, técnico, médio e superior, à distância e presencial, fazendo uso de ferramentas tecnológicas e métodos experimentais e produção cultural.
SUB–EIXO: 5.2 – Planos Nacional, Estaduais, Distrital, Regionais e Setoriais de Cultura
308 – Defender a aprovação do Programa Cultura Viva e o Programa Mais Cultura no âmbito da proposta de consolidação das leis sociais como políticas publicas de Estado, com dotação orçamentária prevista em lei e mecanismo publico de controle e gestão compartilhada com a sociedade civil.
310 – Garantir que as conferências nacional, distrital, estaduais e municipais de Cultura tenham caráter de política pública e que suas diretrizes e decisões sejam incorporadas nos respectivos Planos Plurianuais e nas Leis de Diretrizes Orçamentárias, assegurando sua efetiva execução nas Leis Orçamentárias Anuais.
SUB–EIXO: 5.3 – Sistema de Informações e Indicadores Culturais
324 – Realizar imediatamente mapeamento preliminar das manifestações culturais, dos distintos segmentos (conforme a II CNC), dos povos e comunidades tradicionais (em conformidade com o decreto 6040), das expressões contemporâneas, dos agentes culturais, instituições e organizações, dos grupos e coletivos, disponibilizando o banco de dados resultante em uma plataforma livre de fácil acesso e com descentralização da informação; em paralelo, a criação de um órgão federal de estudos e indicadores culturais integrado ao SNC; mapear as cadeias criativas e produtivas, empreendimentos solidários; investir em capacitação técnica de equipes locais; atualizar continuamente o mapeamento preliminar e gerar produtos tais como: roteiros e eventos de integração e intercambio; catálogos com as varias linguagens e manifestações, publicação de anuários e revistas.
336 – Implantar o Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais e os respectivos sistemas estaduais e municipais, desenvolver mecanismos de articulação entre governo e sociedade civil, para facilitar e ampliar o acesso às informações e capacitar pessoal em todas as esferas, para a geração, tratamento e armazenamento de dados e informações culturais.

LIVRO, LEITURA, LITERATURA: DIREITO DE TODOS

A leitura e a escrita constituem elementos fundamentais para a construção de sociedades democráticas, baseadas na diversidade, na pluralidade e no exercício da cidadania; são direitos de todos, constituindo condição necessária para que possam exercer seus direitos fundamentais, viver uma vida digna e contribuir na construção de uma sociedade mais justa.” (Plano Nacional do Livro e Leitura – PNLL – dezembro de 2006)

A leitura e a escrita são direitos e necessidades relacionados com a prática cidadã, que ajudam as pessoas a construir sua individualidade e seu prazer estético, sendo transversais a todas as artes. O letramento – habilidade de ler criticamente e produzir textos – contribui de forma efetiva para o rompimento da fatalidade social e capacita o cidadão a criar seu espaço no mundo contemporâneo e a estabelecer as relações com os demais. Diretrizes que fundamentam uma Política de Estado, aliadas à gestão eficaz, são fundamentais para a concretização dos objetivos de toda política cultural para um país.

Por essas razões fundamentais ao desenvolvimento integral do ser humano é que se faz necessária a inclusão, no Plano Nacional de Cultura, de propostas que garantam a democratização do acesso à leitura e à escritura para todos os brasileiros.

O PNLL, avaliado e aprovado após três anos de sua implantação pela Pré-Conferência do Livro, Leitura e Literatura, sustenta que o melhor caminho para o acesso à leitura no Brasil é por intermédio da biblioteca de acesso público, seja ela escolar pública ou comunitária, na zona urbana ou rural, porque ela, quando bem estruturada, é:
• Centro de educação permanente, única forma de acesso ao livro e à informação na maioria dos municípios brasileiros;
• Centro de memória das cidades, que preserva e dá acesso à história e à cultura universal e local;
• Centro cultural, que pode agregar às suas atividades e serviços o diálogo com outras linguagens artísticas;
• Promotora do letramento, que é condição importante para o acesso a outras linguagens artísticas e às novas tecnologias.
Assim, pedimos sua atenção e apoio para as seguintes propostas, nos eixos 2 e 5, elaboradas e legitimadas pela Pré-Conferência do Livro, Leitura e Literatura:

Eixo 2 – Cultura, cidade e cidadania:

Garantir para toda a população urbana e rural, em sua diversidade, a criação, a manutenção e a sustentabilidade de bibliotecas públicas, comunitárias, itinerantes e escolares da rede pública e outros espaços de leitura, com quadro de profissionais qualificados que permitam o acesso à leitura literária, científica e informativa, em seus diversos suportes (livros, jornais, revistas, internet, livro acessível, em Braille, áudios-livro, equipamentos visuo-espaciais etc.), informatizadas, em rede, integradas e dinamizadas por mediadores de leitura.

Eixo 5 – Gestão e institucionalidade da cultura:

Consolidar o PNLL (Plano Nacional do Livro e da Leitura), por meio de mecanismos legais e da garantia dos recursos orçamentários; criar o Instituto Nacional do Livro, Leitura e Literatura, e incentivar a implantação de planos e fundos estaduais e municipais, mediados pelos Conselhos Estaduais e Municipais de Política Cultural, assegurando o controle e a participação social e criando um sistema de condicionamentos e contrapartidas previstas nos demais programas sociais do governo federal para as instâncias responsáveis pela institucionalização das políticas públicas; fortalecimento do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas Municipais.

Em resumo: a aprovação de propostas que garantam e viabilizem o acesso ao livro, à leitura, à literatura, e promovam a conseqüente melhoria do índice de letramento dos brasileiros, aliadas à consolidação institucional do PNLL e à criação de novos órgãos de gestão eficiente nesta área da cultura, vai ao encontro e potencializa toda ação proposta pelos vários segmentos representados nessa Conferência.

Brasília, 13 de março de 2010.

Fonte:
Neida Rocha

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Estante Virtual presente em 50 cidades de 22 a 26 de Março

Depois de revolucionar a Bienal do Livro no Rio de Janeiro com o serviço de troca de livros, vai novamente materializar a Estante Virtual! E dessa vez não será em apenas um lugar, mas em 50 cidades ao mesmo tempo!

De 22 a 26 de março, a Estante vai ter postos de busca em mais de 70 universidades de todo o país. De Pelotas/RS a Boa Vista/RR, os stands serão pilotados por sebos, livreiros virtuais e até mesmo leitores, que se engajaram nessa divulgação, como a Samia, de Rio Branco/AC, e o Tiago, de Santa Maria/RS.

Em cada posto de busca, os visitantes vão se deparar com um desafio: descobrir um livro que não esteja no portal! Isso mesmo, o desafio agora é achar algum título que não está na Estante.

Quem conseguir realizar a proeza, preencherá um cupom eletrônico para concorrer a R$100 em livros por posto de busca. E, claro, para tornar as coisas mais emocionantes, o tempo será limitado: 1 minuto, medido por uma ampulheta (de verdade, com areia!), que será também presenteada ao ganhador, como troféu. Já quem encontrar todos os livros que procurar (o caso mais comum!) também vai concorrer a 10 vales de R$ 100 em livros, estes sorteados entre todos os visitantes, de todos os 70 stands. Os nomes dos ganhadores serão divulgados no blog no dia 31/03/2010

O objetivo disso tudo é mostrar para todo o país que os sebos brasileiros, com acervos reunidos aqui na Estante, têm todos os tipos de livros. Ou seja, não servem apenas para se procurarem raridades, como muita gente boa ainda pensa, mas para qualquer demanda de livro. Seja ele lançado há 10 anos ou há poucos meses, seja ele um livro comum ou um best-seller, via de regra você pode comprá-lo nos sebos – e por um preço muito mais acessível do que nas livrarias!

Acompanhe na próxima semana, no blog da Estante , toda essa movimentação nacional! Vamos postar fotos e vídeos de toda a parte do Brasil. Veja também o regulamento da campanha e a lista das mais de 70 universidades com postos de busca.

André Garcia
Criador / Diretor
http://www.estantevirtual.com.br/

PS: As cidades em que se materializará:
Aracaju/SE,
Belém/PA,
Belo Horizonte/MG,
Boa Vista/RR,
Brasília/DF,
Camaçari/BA,
Campina Grande/PB,
Campinas/SP,
Campo Grande/MS,
Canoas/RS,
Criciúma/SC,
Cuiabá/MT,
Curitiba/PR,
Dourados/MS,
Florianópolis/SC,
Fortaleza/CE,
Goiânia/GO,
Ijuí/RS,
Iratí/PR,
João Pessoa/PB,
Juiz de Fora/MG,
Leme/SP,
Londrina/PR,
Macapá/AP,
Maceio/AL,
Manaus/AM,
Maua/SP,
Natal/RN,
Palmas/TO.
Pelotas/RS,
Petrópolis/RJ,
Piracicaba/SP,
Porto Alegre/RS,
Porto Velho/RO,
Recife/PE,
Ribeirão Preto/SP,
Rio Branco/AC,
Rio de Janeiro/RJ,
Salvador/BA,
Santa Maria/RS,
São Bernardo do Campo/SP,
São José dos Campos/SP,
São Leopoldo/RS,
São Luis/MA,
São Paulo/SP,
Sorocaba /SP
Teresina/PI,
Tubarão/SC,
Uberlândia/MG,
Vitória da Conquista/BA,
Vitória/ES,

Fonte:
Newsletter da Estante Virtual. edição 30.

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Nilton Manoel (Trovas Avulsas)

Canta o galo, nasce o dia!
do chão da praça sem nome,
põe num canto a moradia,
para lutar contra a fome.

vida com seus mistérios
mostra-nos e muito bem
que no Poder, homens sérios,
são sérios se lhes convém.

Dia da árvore, na escola,
faz-se festa às derrubadas;
a folhagem, sempre amola
sujando pátio e calçadas.

O mundo vive pedante;
grita e clama por socorro!
Gasta-se alto a todo o instante,
Não com gente… com cachorro!

Casa velha, quanto encanto!
tem cobras, cupins, lagartos…
uma história em cada canto
e fantasmas pelos quartos.

Na feira da corrupção
dois produtos têm destaque:
-laranja na execução;
pepino na hora do baque!

Meu filho só dá trabalho…
diz, na escola, o pai irado!
e o mestre olhando o pirralho…
por isto estou empregado!
======

Fonte:
Colaboração do autor

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Nilton Manoel

Poeta e prosador, normalista, pedagogo, especialista em Educação, contabilista, jornalista; dedica-se a artes visuais, a numismática e a filatelia.

Autor de Didática da Trova, Cem anos de jornalismo escolar, co-autor de Alfabetização e Letramento. No momento pesquisa a importância dos textos literários do programa Ler e Escrever e a didática poética dos textos do PNLD de 2010.

Pertence a Institutos Históricos e Geográficos, clubes de leitura e entidades de genealogia, Academia Virtual Brasileira de Letras, Academia Brasileira Poesia. Pertenceu a grupos de teatro e a Escola Municipal de Belas Artes.

Foi produtor e apresentador radiofônico de Cultura em Movimento, ex-Conselheiro Municipal de Cultura (3 gestões).

Em Educação: coordenou um dos núcleos do Mobral; ex-PCP da DRE/SP. Cursista dos projetos: Ipê, Profa, Letra e Vida, Teia do Saber, Escola Cidadã, Circuito de Gestão, Tecendo Saberes, TDAH, informática educacional básica e avançada, etc.

Tem comendas e prêmios recebidos.

Realiza, anualmente, os Jogos Florais Internacionais e Estudantis de Ribeirão Preto.

Livros reeditados: Cenas Urbanas, Trovas da Juventude; Caviar, Gororoba e Sal de Frutas, Sandálias de Peregrino, Poesia Mágica.

Fonte:
Colaboração do autor

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Trova 129 – Sinclair Pozza Casemiro (Campo Mourão/PR)

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19 de março de 2010 · 22:48

Antonio Abel Fernandes (Cascata Poética)

INSPIRAÇÃO

Novamente estou feliz hoje…
A alegria chegou no meio da madrugada
Como uma gaivota de asas prateadas
Planando leve como pluma ao vento…
Chegou como chega uma saudade,
Como chega uma verdade…

Como chega um esperado momento…
Chegou silenciosa…
Como pétala de rosa
Desprendida
E livre…

Chegou como uma folha de outono
Carregada pela brisa fresca e perfumada…

Chegou como um fiapo de algodão ao vento…
Como um leve e etéreo pensamento…
Como o sonho de uma criança feliz…
Como o som de palavras que um jovem enamorado diz
À sua amada…

Chegou como o eco de uma música distante…
Como o canto de um pássaro errante…
Como a primeira gota de chuva em terra quente…
Como o brilho fugaz e tremulante
De uma estrela cadente…

Chegou discreta,
Sem ruído…
Como chega o poeta
Em sua mesa predileta…
Num cantinho qualquer
De um bar
Por aí, perdido…

Chegou de mansinho
Como águia em seu ninho,
Como chega ao telhado o passarinho…
Mas chegou para ficar!
Pois aqui é o seu lugar!

RESPIRAÇÃO

De uns tempos para cá
Estou sentindo algo inusitado!…
Sinto-me feliz, em paz e relaxado!…

Já não me preocupo mais com o presente,
Nem com o futuro…
Esse tirano obscuro
Esse algoz inexorável
Que arrasta tanta gente
A um sofrimento inútil e interminável…

Nem me preocupa mais o meu passado…
O que fiz ontem de certo ou de errado
Tudo já caiu no esquecimento…
Creio até que já fui perdoado!

O amanhã, para mim,
Já não é mais assustador!…
Já não sinto mais aquele medo de doença ou “dor”…
Ouço apenas as batidas do meu coração…
E o ruído agradável e aveludado
Da minha respiração…

Há, sem dúvida alguma
Uma ligação
Entre o meu respirar
E o pulsar
Compassado
Do meu coração…

É no meu respirar que está o mistério,
O segredo
E o sagrado…
Durante o dia eu pratico uma respiração ritmada…
O ar entra e sai dos meus pulmões
Como o descer e o subir harmonioso
Dos degraus de uma perfeita escada!…

De uma forma tranqüila, sem pressa.
E sem agitações…
Sinto uma energia boa percorrendo a espinha…
E uma alegria
Diferente
Que é só minha!…

Creio que é nesta minha habitual atitude
Que está o segredo do meu bem-estar continuado…
E do meu prazer de viver
Pleno de saúde,
Sem tédio e sem enfado!…
————–

Fonte:
Colaboração do poeta.

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